V ENCONTRO ESTADUAL DOS DEFENSORES PÚBLICOS DE SÃO PAULO TESES APROVADAS



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TESE 08/12 Nome: BRUNO HADDAD GALVÃO Área de Atividade: CRIMINAL (VARA) REGIONAL SÃO JOSÉ DO RIO PRETO Endereço: RUA MARECHAL DEODORO, N.º 3131. Bairro: CENTRO CEP: 15015-000. Cidade: SÃO JOSÉ DO RIO PRETO Telefone.: (17) 3218-8216. Fax (17) 3222-1628 E- mail.: BGALVAO@DPESP.SP.GOV.BR SÚMULA Caso o bem subtraído seja insignificante, é possível a desclassificação do crime de roubo para o crime subsidiário. ASSUNTO CRIME DE ROUBO. RES FURTIVA INSIGNIFICANTE. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME REMANESCENTE. ITEM ESPECÍFICO DAS ATRIBUIÇÕES INSTUCIONAIS DA DEFENSORIA PÚBLICA CRIMINAL. ROUBO. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA Não há dúvidas de que o crime de roubo é complexo, eis que nada mais é do que a somatória do delito de furto com outro delito, como o de constrangimento ilegal. Neste sentido, a doutrina de Luiz Flávio Gomes e Rogério Sanches Cunha 1 : O crime de roubo é complexo, unidade jurídica que se completa pela reunião de dois tipos penais: furto (art. 155, do CP) e constrangimento ilegal (art. 146, do CP). Tutelase, a um só tempo, o patrimônio e a liberdade individual da vítima. Assim, furto sem uma segunda figura típica a ele atrelada numa mesma circunstância fática não é roubo, e vice versa. Por esta razão, ambos os delitos devem estar plenamente configurados para que, unidos, formem o roubo. No entanto, percebe-se que muito embora, em tese, esteja configurado o delito de constrangimento ilegal em alguns casos concretos, o mesmo não ocorre quanto ao delito de furto. Para que haja furto, necessário se tratar de fato típico, ilícito e culpável (este último elemento para parte da doutrina). O fato típico, conforme a teoria constitucionalista do delito, de certa forma inspirada no funcionalismo de Claus Roxin, é composto de três dimensões, sendo elas: a) formal; b) material; c) subjetiva. Na dimensão formal temos: a) conduta; b) adequação típica; c) nexo de causalidade; d) resultado naturalístico (para os crimes materiais). A dimensão material abrange: a) juízo de desaprovação da conduta (criação ou incremento de risco proibido relevante); b) princípio da ofensividade (lesão ou perigo concreto de lesão relevante a 1 Direito Penal: parte especial. Volume 03. São Paulo: RT, 2008, p. 128. 30

bem jurídico tutelado); c) imputação objetiva do resultado (o resultado deve decorrer diretamente do risco proibido criado ou incrementado). Por fim, na dimensão subjetiva se encerra o dolo e/ou requisitos subjetivos especiais (antigo dolo específico). O Direito Penal, como visto, não se presta para tutelar todas as lesões ao bem jurídico. Para isso, existem outros ramos do Direito, ficando sua intervenção limitada aos casos em que há lesão jurídica relevante. É o princípio da intervenção mínima do Direito Penal, composto de subsidiariedade e fragmentariedade do mesmo. Um Direito Penal subsidiário é aquele que só pode intervir quando os outros ramos do Direito não forem capazes de prevenir e repelir a prática do ato ilícito. Um Direito Penal fragmentário, por sua vez, significa que o mesmo somente atua quando a conduta e o resultado (lesão ou perigo concreto de lesão) forem relevantes. Assim, não é qualquer conduta ou lesão que admitem aplicação de sanções penais, precisando que sejam relevantes. A soma da fragmentariedade e subsidiariedade resulta no que chamamos princípio da intervenção mínima. O princípio da insignificância ou bagatela encontra guarida na fragmentariedade do Direito Penal, ou seja, tratando-se de conduta ou lesão irrelevantes, o mesmo não poderá incidir no caso concreto. A Tipicidade Material, conforme a teoria constitucionalista do delito, defendida no Brasil por Luiz Flávio Gomes, na Argentina por Eugênio Raul Zaffaroni e em toda Europa de forma quase unânime, afirma que não basta o fato ser formalmente típico (conduta, nexo de causalidade, resultado naturalístico e adequação típica), devendo o mesmo ser materialmente típico. O princípio da insignificância torna o fato materialmente atípico, eis que a conduta e a lesão são tão ínfimas ao bem jurídico protegido que não afronta o denominado princípio da ofensividade. Este é, aliás, o posicionamento do Supremo Tribunal Federal, conforme majestoso voto do Ministro Celso de Mello no H.C. 84.412-0 que, embora um pouco longo, merece leitura em sua íntegra: MED. CAUT. EM HABEAS CORPUS 84.412-0 SÃO PAULO RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO PACIENTE(S): BILL CLEITON CRISTOVÃO OU IMPETRANTE(S): LUIZ MANOEL GOMES JUNIOR COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EMENTA: PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IDENTIFICAÇÃO DOS VETO- RES CUJA PRESENÇA LEGITIMA O RE-CONHECIMENTO DESSE POSTULA- DO DE POLÍTICA CRIMINAL. CONSEQÜENTE DESCARACTERIZAÇÃO DA TIPICIDADE PENAL, EM SEU ASPECTO MATERIAL. DELITO DE FURTO. CONDENAÇÃO IMPOSTA A JOVEM DE-SEMPREGADO, COM APENAS 19 ANOS DE IDADE. RES FURTIVA NO VALOR DE R$ 25,00 (EQUIVALENTE A 9,61% DO SALÁRIO MÍNIMO ATUALMENTE EM VIGOR). DOUTRINA. CONSI- DERAÇÕES EM TORNO DA JURISPRUDÊNCIA DO STF. CUMULATIVA OCOR- RÊNCIA, NA ESPÉCIE, DOS REQUISITOS PERTINENTES À PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO E AO PERICULUM IN MORA. MEDIDA LIMINAR CONCEDIDA. DECISÃO: Trata-se de habeas corpus, com pedido de medida liminar, impetrado contra acórdão emanado do E. Superior Tribunal de Justiça, que, em sede de idêntico processo, por votação majoritária, denegou o writ ao ora paciente, em decisão assim ementada (fls. 37): PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. FURTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. 31

I - No caso de furto, para efeito de aplicação do princípio da insignificância, é imprescindível a distinção entre ínfimo (ninharia) e pequeno valor. Este, ex vi legis, implica eventualmente em furto privilegiado; aquele, na atipia conglobante (dada a mínima gravidade). II (...) O ora impetrante - após afirmar que Não se pode ignorar que o Direito Penal somente deve incidir naquelas situações em que existir uma real violação ao bem jurídico protegido (fls. 03) e que, Em outras palavras, deve haver uma agressão que justifique a incidência da pesada sanção de natureza penal (fls. 03) -, postula a concessão de medida liminar, para fazer cessar a coação ilegal, determinando-se a paralisação do feito originário - Processo nº 238/2000, 1ª Vara Criminal de Barretos - (...), até o julgamento do presente writ (fls. 14 - grifei). Passo, em conseqüência, a apreciar o pedido de medida cautelar deduzido na presente sede processual. O exame da presente causa propõe, desde logo, uma indagação: revelase aplicável, ou não, o princípio da insignificância, quando se tratar de delito de furto que teve por objeto bem avaliado em apenas R$ 25,00 (vinte e cinco reais)? Essa indagação, formulada em função da própria ratio subjacente ao princípio da insignificância, assume indiscutível relevo de caráter jurídico, pelo fato de a res furtiva equivaler, à época do delito, a 18% do valor do salário mínimo então vigente (janeiro/2000), correspondendo, atualmente, a 9,61% do novo salário mínimo em vigor em nosso País. Como se sabe, o princípio da insignificância - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material, consoante assinala expressivo magistério doutrinário expendido na análise do tema em referência (FRANCISCO DE ASSIS TOLEDO, Princípios Básicos de Direito Penal, p. 133/134, item n. 131, 5ª ed., 2002, Saraiva; CEZAR ROBERTO BITENCOURT, Código Penal Comentado, p. 6, item n. 9, 2002, Saraiva; DAMÁSIO E. DE JESUS, Direito Penal - Parte Geral, vol. 1/10, item n. 11, h, 26ª ed., 2003, Saraiva; MAURÍCIO ANTONIO RIBEIRO LOPES, Princípio da Insignificância no Direito Penal, p. 113/118, item n. 8.2, 2ª ed., 2000, RT, v.g.). O princípio da insignificância - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público em matéria penal. Isso significa, pois, que o sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificarão quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade. Revela-se expressivo, a propósito do tema, o magistério de EDILSON MOUGENOT BONFIM e de FERNANDO CAPEZ ( Direito Penal - Parte Geral, p. 121/122, item n. 2.1, 2004, Saraiva): Na verdade, o princípio da bagatela ou da insignificância (...) não tem previsão legal no direito brasileiro (...), sendo considerado, contudo, princípio auxiliar de determinação da tipicidade, sob a ótica da objetividade jurídica. Funda-se 32

no brocardo civil minimis non curat praetor e na conveniência da política criminal. Se a finalidade do tipo penal é tutelar um bem jurídico quando a lesão, de tão insignificante, torna-se imperceptível, não será possível proceder a seu enquadramento típico, por absoluta falta de correspondência entre o fato narrado na lei e o comportamento iníquo realizado. É que, no tipo, somente estão descritos os comportamentos capazes de ofender o interesse tutelado pela norma. Por essa razão, os danos de nenhuma monta devem ser considerados atípicos. A tipicidade penal está a reclamar ofensa de certa gravidade exercida sobre os bens jurídicos, pois nem sempre ofensa mínima a um bem ou interesse juridicamente protegido é capaz de se incluir no requerimento reclamado pela tipicidade penal, o qual exige ofensa de alguma magnitude a esse mesmo bem jurídico. (grifei) Na realidade, e considerados, de um lado, o princípio da intervenção penal mínima do Estado (que tem por estinatário o próprio legislador) e, de outro, o postulado da insignificância (que se dirige ao magistrado, enquanto aplicador da lei penal ao caso concreto), na precisa lição do eminente Professor RENÉ ARIEL DOTTI («Curso de Direito Penal - Parte Geral», p. 68, item n. 51, 2ª ed., 2004, Forense), cumpre reconhecer que o direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor - por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes - não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social. A questão pertinente à aplicabilidade do princípio da insignificância - quando se evidencia que o bem jurídico tutelado sofreu ínfima fetação (RENÉ ARIEL DOTTI, Curso de Direito Penal - Parte Geral, p. 68, item n. 51, 2ª ed., 2004, Forense) ssim tem sido apreciada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: ACIDENTE DE TRÂNSITO. LESÃO ORPORAL. INEXPRESSIVIDADE DA LESÃO. PRINCIPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CRIME NÃO CONFIGURADO. Se a lesão corporal (pequena equimose) decorrente de acidente de trânsito é de absoluta insignificância, como resulta dos elementos dos autos - e outra prova não seria possível fazer-se tempos depois -, há de impedir-se que se instaure ação penal (...). (RTJ 129/187, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO - grifei) Uma vez verificada a insignificância jurídica do ato apontado como delituoso, impõe-se o trancamento da ação penal, por falta de justa causa. (RTJ 178/310, Rel. Min. MARCO AURÉLIO - grifei) HABEAS CORPUS. PENAL. MOEDA FALSA. FALSIFICAÇÃO GROSSEIRA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CONDUTA ATÍPICA. ORDEM CONCEDIDA. É bem sabido que a conduta criminosa além de se amoldar formalmente ao tipo, ou seja, estar descrita da forma determinada pelo texto legal, deve também estar em conformidade materialmente com a norma dali retirada, isto é, deve ofender relevantemente o bem jurídico tutelado ou, ao menos, levar perigo concreto e acentuado ao mesmo. Assim sendo, na hipótese de roubo de pequeno valor (bagatelar), é de se reconhecer o crime de bagatela quanto ao delito de furto, restando apenas configurado o crime remanescente. FUNDAMENTAÇÃO FÁTICA A incidência do crime de roubo na Justiça Estadual é significativa, assim como os demais delitos contra o patrimônio. Não são raras as vezes que o Defensor Público se depara, ao analisar a exordial acusatória, com crimes de roubo de um boné, de pequena quantia em dinheiro ou outros bens insignificantes sob o ponto de vista do princípio da ofensividade e intervenção mínima do Direito Penal. Geralmente são casos em que o réu aborda a vítima e, mediante grave ameaça, subtrai bem de pequeno valor. A punição é severa, com pena mínima de 04 (quatro) anos. 33

No entanto, o estudo da tipicidade material nos demonstra que é possível pleitear uma reprimenda menos gravosa nestes casos, sobretudo pelo fato do crime de roubo ser complexo. A depender do caso, a punição pelo crime de roubo é certa (04 anos de reclusão, no mínimo). No entanto, esta tese apresenta um meio alternativo (desclassificação), escorado no Direito, de haver punição pelo Direito Penal, mas a uma pena outra e menos gravosa sob o ponto de vista quantitativo. Assim, é de fundamental importância o trato do tema no Pré-Encontro Estadual. SUGESTÃO DE OPERACIONALIZAÇÃO A operacionalização é simples. Poderá ocorrer nos debates, memoriais escritos, recurso. 34