22º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 14 a 19 de Setembro 2003 - Joinville - Santa Catarina II-258 - REMOÇÃO DE MATÉRIA ORGÂNICA ATRAVÉS DO TRATAMENTO DE ESGOTOS SANITÁRIOS EM UM SISTEMA DE WETLANDS CONSTRUÍDOS Janete Feijó(1) Engenheira Civil pela Universidade Regional de Blumenau (FURB). Especialista em Gerenciamento e Controle da Qualidade Ambiental pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR). Mestre em Engenharia Ambiental pela Universidade Regional de Blumenau (FURB). Doutoranda em Engenharia Ambiental pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Professora da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Adilson Pinheiro Engenheiro Civil pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Mestre em Recursos Hídricos e Saneamento pelo Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (IPH/UFRGS). Doutor em Física e Química do Ambiente pelo Institut National Polytechnique de Toulouse (INPT). Professor do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Regional de Blumenau (FURB). Edésio Luiz Simionatto Químico, Mestre e Doutor em Química pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Professor do Departamento de Química da Universidade Regional de Blumenau (FURB). Endereço(1): Rua 2480, n. 350, bl. B, apto. 701 - Centro Balneário Camboriú - SC - CEP: 88330-000 - Brasil - Tel: (047) 361-0781 - e-mail: janetef@cttmar.univali.br RESUMO
Este trabalho apresenta resultados de um sistema de wetlands usado no tratamento complementar de esgotos sanitários através da passagem por módulos, onde se encontram plantados vegetais que favorecem a degradação da matéria orgânica e a remoção de nutrientes. O sistema foi implantado para tratar os esgotos provenientes de tanques sépticos do Parque Ecológico Municipal Rio Camboriú, produzidos por cerca de 30 funcionários da SEMAM Secretaria Municipal de Meio Ambiente e pelos visitantes do parque, onde foram registradas vazões médias de 1630 litros por dia. O monitoramento foi desenvolvido ao logo de doze meses, em três etapas. Na 1ª etapa, os esgotos produzidos no parque foram encaminhados para os quatro módulos de tratamento, enquanto que na 2ª etapa, os esgotos passaram a contribuir para apenas dois módulos, da mesma forma que na 3ª etapa. Entretanto, esta etapa contou também com a contribuição, para os outros dois módulos, de um esgoto pré-tratado na lagoa anaeróbia da Estação de Tratamento de Esgotos Sanitários do município de Balneário Camboriú, operada pela CASAN Companhia Catarinense de Águas e Saneamento. Foram analisadas as concentrações remanescentes de matéria orgânica (DBO5,20ºC e DQO) dos esgotos provenientes de tanques sépticos, com baixa carga orgânica, e dos provenientes da lagoa anaeróbia, com concentração elevada de carga orgânica. Foram verificados maiores valores de remoção de matéria orgânica para o caso do tratamento do esgoto com elevadas concentrações de carga poluidora, pré-tratado na lagoa anaeróbia. PALAVRAS-CHAVE: Wetlands, Tratamento complementar de esgotos, Remoção de matéria orgânica, Eficiência. INTRODUÇÃO Através da história, os wetlands têm sido utilizados para tratar águas residuárias de diversas fontes, desde águas pluviais, esgotos domésticos alguns tipos de efluentes industriais. Durante a década de 70, pesquisadores dos EUA e da Europa começaram a estudar o fenômeno dos wetlands como forma alternativa de tratar os esgotos, sendo que os americanos preocuparam-se em estudar mais os wetlands naturais e os europeus dedicaramse mais aos construídos (CORBITT e BOWEN, 1994). Os sistemas de tratamento de esgotos por wetlands têm características distintas que favorecem suas aplicações sobre determinadas áreas. São sistemas de fácil operação e manutenção, não gastam energia quando comparados com sistemas mecanizados e possuem boa remoção de nutrientes (CORBITT e BOWEN, 1994). Segundo Grites (1994), os wetlands construídos e naturais são sistemas de tratamento de esgotos que combinam processos biológicos, químicos e físicos. Segundo Corbitt e Bowen (1994), os wetlands usados para tratamento dos esgotos reduzem significativamente DBO5,20ºC, amônia, sólidos suspensos, nutrientes como nitrogênio e fósforo e outros poluentes como metais, através de processos químicos, físicos e biológicos, bem como através da absorção pela vegetação.
De acordo com Campos et al. (1999), estudos em escala real e experimental têm mostrado que esses sistemas possuem boa capacidade de redução de Demanda Bioquímica de Oxigênio - DBO5,20ºC, sólidos suspensos, nitrogênio, fósforo, traços de metais e orgânicos e patogênicos. Essa redução é efetuada por diversos mecanismos de sedimentação, filtração, precipitação e adsorção química, interações microbiana e da vegetação e complexação. Steer et al. (2002) monitoraram vinte e um sistemas de wetlands tratando efluentes provenientes de tanques sépticos e encontraram dados que indicam também que os wetlands podem reduzir coliformes fecais na ordem de 88 ± 27%, sólidos suspensos totais 56 ± 53%, Demanda Bioquímica de Oxigênio DBO5,20ºC 70 ± 48%, amônia 56 ± 31% e fósforo 80 ± 20%. A remoção da matéria orgânica biodegradável ocorre através de metabolismos biológicos. A diversidade da população microbiana na coluna de água estabiliza a matéria orgânica. No solo em geral, a matéria orgânica é absorvida e mais tarde, biologicamente, oxidada em produtos estáveis. Processos físicos de sedimentação atuam nos sistemas de água livre na superfície (FWS), e processos de filtração atuam nos sistemas de escoamento sub - superficial (SF) para a remoção da matéria orgânica associada com os sólidos suspensos. Tipicamente, as águas residuárias deverão sofrer algum tipo de pré-tratamento, onde uma parcela da DBO5,20ºC será removida, juntamente com os sólidos suspensos (CORBITT e BOWEN, 1994). Nos sistemas FWS, os sólidos sedimentáveis são rapidamente removidos dos primeiros estágios (nas áreas de entrada) pela gravidade. Neste caso, as águas residuárias, ao receberem um pré-tratamento antes da entrada do sistema, evitam causar formação de lodo e, conseqüentemente, reduzem condições adversas. Nos sistemas SF, os sólidos sedimentáveis são removidos pela filtração, pois a água se move através de um sistema de drenagem. Para os sólidos suspensos na forma coloidal, o mecanismo de remoção primária é o metabolismo bacteriano para ambos os tipos de sistemas de tratamento. Processos de sorção também poderão ocorrer em sistemas de escoamento sub-superficial (CORBITT e BOWEN, 1994). Segundo os autores, nos sistemas de água livre na superfície (FWS) pode ocorrer produção de sólidos suspensos devido à produção de algas, as quais também produzirão oxigênio dissolvido nos períodos diurnos. Este trabalho apresenta resultados de um sistema de wetlands usado no tratamento complementar de esgotos sanitários através da passagem destes por módulos onde se encontram implantados vegetais cujas raízes favorecem a degradação da matéria orgânica (DBO5,20ºC e DQO). MATERIAIS E MÉTODOS O sistema de wetlands foi implantado por Feijó (2001) para tratar os esgotos provenientes de tanques sépticos do Parque Ecológico Municipal Rio Camboriú, produzidos por cerca de
30 funcionários da SEMAM Secretaria Municipal de Meio Ambiente e pelos visitantes do parque, onde foram registradas vazões médias de 1630 L/d. O sistema implantado, apresentado na Figura 1, consiste em quatro módulos construídos, de 10,00 m2 cada, onde foram plantadas as espécies vegetais: Zizaniopsis bonariensis, Heleocharis interstincta e Zizaniopsis microstachya. A areia média, misturada à matéria orgânica (casca de arroz) na proporção 3:1, foi utilizada como suporte para fixação dos vegetais. Figura 1 Planta esquemática do sistema implantado. A distribuição dos esgotos nos módulos e a coleta, na saída dos mesmos, foram feitas através de tubos perfurados, envoltos em camada de brita nº 2. As paredes dos módulos foram construídas em alvenaria rebocada e o fundo em concreto. O controle do nível dos esgotos no interior dos módulos foi feito através de mangueiras flexíveis, o que possibilitou a coleta das amostras para análise. O monitoramento, realizado ao longo de doze meses, foi dividido em três etapas, de acordo com a Figura 2. Na 1ª etapa (coletas de 1 a 10), os esgotos produzidos no parque foram encaminhados para os quatro módulos de tratamento, enquanto que na 2ª etapa (coletas de 11 a 20) os esgotos passaram a contribuir para apenas dois módulos (1 e 2), da mesma forma que na 3ª etapa (coletas de 21 a 30). Entretanto, a 3ª etapa contou também com a contribuição, para os outros dois módulos (3 e 4), de um esgoto pré-tratado na lagoa anaeróbia da Estação de Tratamento de Esgotos Sanitários do município, operada pela CASAN Companhia Catarinense de Águas e Saneamento. Figura 2 Esquematização das etapas do monitoramento. Durante a 1ª etapa, as coletas eram quinzenais, enquanto que nas demais etapas, o monitoramento passou a ser feito através de coletas semanais. Foram analisadas as concentrações remanescentes de matéria orgânica (DBO5,20ºC e DQO) dos esgotos provenientes de tanques sépticos, com baixa carga orgânica, e dos provenientes da lagoa anaeróbia, com concentração elevada de carga orgânica.
RESULTADOS Demanda Bioquímica de Oxigênio - DBO De acordo com a Figura 3, o esgoto apresentou variação da DBO5,20ºC do esgoto afluente no início de operação, tendendo a estabilizar-se após a 6ª coleta. Da mesma forma, os percentuais de remoção de matéria orgânica no esgoto tratado variaram bastante ao longo da 1ª etapa, apresentando picos de remoção (60 % a 76 %) nas coletas 2 e 4. Entretanto, em várias amostras o esgoto afluente apresenta característica de esgoto diluído (fraco). Figura 3 Evolução da demanda bioquímica de oxigênio DBO Em função da contribuição indevida de precipitação e de falhas operacionais ocorridas a partir da 11ª coleta até a coleta 17 (início da 2ª etapa), não foram verificados bons índices de remoção de DBO5,20ºC, uma vez que o esgoto afluente já se apresentou com baixos teores de matéria orgânica. Entretanto, as concentrações de matéria orgânica no esgoto efluente ma ntiveram-se constantes ao longo de toda a 2ª e início da 3ª etapas do monitoramento (coletas de 11 a 22), mesmo depois de sanados os problemas, onde os teores de matéria orgânica do esgoto afluente passaram a apresentar valores mais significantes. Durante a 3ª etapa do monitoramento, os índices de remoção de matéria orgânica variaram entre 20 e 89 % para a DBO5,20ºC. Nesta etapa, apesar das flutuações na concentração de matéria orgânica no esgoto afluente proveniente do parque, os teores verificados no esgoto efluente mantiveram-se constantes, evidenciando uma tendência à estabilização do sistema. Entretanto, ainda foram constatados baixos teores de matéria orgânica do esgoto afluente, característicos de esgoto fraco. A partir da 21ª coleta, dois módulos passaram a receber esgoto proveniente da lagoa anaeróbia. Observa-se que os resultados dos parâmetros analisados do esgoto afluente proveniente da CASAN conferem-lhe uma característica de esgoto forte, o que possibilitou uma boa avaliação da eficiência do tratamento durante esta etapa. Os índices de remoção de matéria orgânica foram elevados, variando de 86 a 94 % para a DBO5,20ºC. Também pode ser observada uma linearidade nos teores de matéria orgânica (DBO5,20ºC) no esgoto efluente CASAN, ao longo desta etapa do monitoramento.
Demanda Química de Oxigênio - DQO Como pode ser visto na Figura 4, os valores de DQO no esgoto afluente também apresentaram variações nas primeiras coletas, sendo, também, característicos de esgoto fraco, principalmente a partir da 5ª coleta. Entretanto, foram verificados índices de redução de matéria orgânica de até 76 %, como pode ser observado já no 1º resultado. Figura 4 Evolução da demanda química de oxigênio DQO. A contribuição indevida da precipitação e as falhas operacionais, que resultaram num esgoto afluente com pouca carga orgânica, também prejudicaram o desempenho do sistema entre as coletas 11 e 17, impossibilitando uma avaliação precisa na eficiência do mesmo quanto à remoção de matéria orgânica (DQO). No final da 2ª etapa (coletas 18 a 20), os índices de remoção de DQO estiveram entre 65 e 80 %, chegando a 91% durante a 3ª etapa (coleta 26), embora os demais valores afluentes apresentam baixos teores de matéria orgânica (DQO). A partir da 7ª coleta, apesar das flutuações na concentração de matéria orgânica no esgoto afluente proveniente do parque, os teores verificados no esgoto efluente mantiveram-se constantes, evidenciando uma tendência à estabilização do sistema. Durante a 3ª etapa (coletas de 21 a 30), nos módulos que receberam o afluente da CASAN, os índices de remoção de matéria orgânica foram elevados, variando de 72 a 92 %. Também pode ser observada, para a DQO, uma linearidade nos teores de matéria orgânica no esgoto efluente da CASAN, ao longo desta etapa do monitoramento. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os sistemas de Wetlands são eficazes para tratamento de muitos tipos de poluição da água, podendo efetivamente remover ou converter grandes quantidades de poluentes, incluindo a matéria orgânica, sólidos suspensos e excesso de nutrientes (IDE et al., 2000). De um modo geral, a instabilidade do sistema recentemente implantado resultou na verificação, em algumas análises durante a 1ª etapa, de teores ainda elevados de matéria orgânica (DBO5,20ºC e DQO) presentes no esgoto tratado. Durante a 2ª etapa, a instabilidade dos valores apresentados no esgoto afluente ao sistema impossibilitou a verificação precisa dos índices de eficiência quanto à remoção de matéria orgânica. Os resultados obtidos durante a 3ª etapa do monitoramento apresentaram valores constantes tanto no afluente quanto no efluente do sistema. Isto refletiu na tendência à estabilização do
mesmo, embora os teores de matéria orgânica, apresentados no esgoto afluente produzido no parque, ainda conferiram-lhe características de esgoto fraco. Entretanto, os maiores índices de remoção de matéria orgânica, obtidos com a introdução do esgoto proveniente da lagoa anaeróbia da CASAN, durante a 3ª etapa, se devem ao fato da tendência à estabilização do sistema, à linearidade dos valores de entrada e à característica de esgoto afluente forte, o que proporcionou uma maior atividade microbiológica no consumo da matéria orgânica presente no esgoto. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CAMPOS, J. R. (Org.) Tratamento de Esgotos Sanitários por Processo Anaeróbio e Disposição Controlada no Solo. Rio de Janeiro: PROSAB. 1999. CORBITT, R. A. BOWEN, P. T. Constructed Wetlands for Wastewater Treatment. Applied Wetlands Science and Technology. Lewis Publishers. Great Britain. p. 221. 1994. FEIJÓ, J. Tratamento de Esgotos Sanitários Através de Escoamento Sub-superficial em Módulos com Vegetais. Blumenau. Universidade Regional de Blumenau. (Dissertação de Mestrado). 2001. GRITES, R. W. Design criteria and pratice for constructed Wetlands. Wat. Sci Tech, v. 29, n. 4, p. 1-6. 1994. IDE, C. N., BARBEDO, A. G. A., ROCHE, K. F., IMOLENE, L. M., VAL, L. A. A. Reuso de Efluentes de Lagoas de Estabilização na Produção de Biomassa Verde. In: Anais do XXVII Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária e Ambiental. Porto Alegre. 2000. AIDIS. STEER, D. FRASER, L. BODDY, J. SEIBERT, B. Efficiency of small constructed wetlands for subsurface treatment of single-family domestic effluent. Ecological Engineering. v. 18, p. 429-440. 2002.