QUALIDADE SANITÁRIA E FISIOLÓGICA DE SEMENTES DE AVEIA PRETA (Avena strigosa SCHREB) DA ZONA SUL DO RIO GRANDE DO SUL 1 GILBERTO ANTONIO P. BEVILAQUA 2 e CARLOS ROBERTO PIEROBOM 3 Revista Brasileira de Sementes, vol. 17, n o 1, p. 19-22, 1995 RESUMO. Com o objetivo de avaliar o grau de incidência fúngica e o reflexo desta na qualidade fisiológica das sementes de aveia preta (Avena strigosa Schreb), foram analisados cinco lotes de sementes provenientes da zona Sul do Estado do Rio Grande do Sul, dos municípios de Pelotas, Pedro Osório, Herval e Piratini. As sementes foram analisadas pelo método de papel filtro em caixas de gerbox, com 25 sementes em 16 repetições, totalizando 400 sementes por lote, analisadas, individualmente sob microscópio estereoscópico. Os testes para qualidade fisiológica foram germinação, primeira contagem de germinação, emergência no campo, índice de velocidade de emergência, altura e peso da matéria seca de plântula. Os resultados obtidos permitiram concluir que: a) os fungos mais freqüentes em sementes de aveia preta da zona sul do Rio Grande do Sul foram Helminthosporium sp, Phoma sp., Alternaria sp., Fusarium sp., Cladosporium sp., Epicoccum sp., Rhizopus sp., Penicillium sp., Aspergillus sp., Nigrospora sp. e Curvularia sp; e b) dos gêneros que causam prejuízos à emergência de plântulas, apenas Helminthosporium sp. e Phoma sp. ocorreram em proporções elevadas. Termos para indexação: qualidade sanitária, qualidade fisiológica, sementes, aveia preta SANITARY AND PHYSIOLOGICAL QUALITY OF Avena strigosa SCHREB SEEDS FROM SOUTHERN RIO GRANDE DO SUL STATE ABSTRACT. The objective of the present work was to evaluate the fungical incidence of fungi and its reflex on physiological quality of Avena strigosa seeds. Five seed lots from the south zone of Rio Grande do Sul state, including Pelotas, Piratini, Herval and Pedro Osório counties were analised. The seed sanity was evaluated in blotter test, in gerbox with 25 seeds and 16 replications, totalizing 400 seeds per lot, individually evaluated under stereomicroscope. The physiological quality was evaluated with tests of germination, first count germination, speed emergence index, seedling lenght and dry matter weight of seedling. Results indicate that: a) The most frequent seed-borne fungi in Avena strigosa seeds in southern Rio Grande do Sul were Helminthosporium sp., Phoma sp., Alternaria sp., Fusarium sp., Cladosporium sp., Epicoccum sp., Rhyzopus sp., Penicilium sp., Aspergillus sp., Nigrospora sp., Curvularia sp.; 1 Aceito para publicação em 28.04.95 2 M.Sc., aluno do curso de Pós-Graduação em Agronomia FAEM/UFPeI - C.P. 354 - CEP 96.100 3 Ph.D., Prof. Titular, Depto. de Fitossanidade, FAEM/UFPeI
and b) only the genera Helminthosporium sp. and Phoma sp., which can cause seedling emergence damages, were found in high percentages. Index terms: sanitary quality, physiological quality, seed, Avena strigosa INTRODUÇÃO A aveia preta é uma forrageira de inverno de grande importância econômica, sendo uma das mais plantadas juntamente com o azevém, e vem aumentando a sua área cultivada, nos últimos anos na zona sul do Estado do Rio Grande do Sul. O uso de sementes de alta qualidade sanitária e fisiológica é de grande importância na implantação da pastagem, sendo responsável pelo sucesso ou fracasso no empreendimento. A importância dos patógenos associados às sementes foi colocada em trabalho realizado por Soave & Wetzel (1987); no entanto, são escassas as informações no que diz respeito à qualidade sanitária e fisiológica de sementes de forrageiras utilizadas pelos pecuaristas. A presença de microrganismos, após o ponto de maturação fisiológica, ou no armazenamento das sementes, é sempre uma séria ameaça à sanidade das sementes. Elevadas percentagens de sementes infeccionadas estão associadas com decréscimo no poder germinativo e menor desenvolvimento de plântula nos seus primeiros estádios (Yorinori, 1982). Para Roberts (1972), fungos de sementes podem ser responsáveis, além da transmissão de doenças na parte aérea e radicular do trigo, como pelo decréscimo na qualidade fisiológica das sementes e morte de plântulas. Em sementes de trigo (Triticum aestivum L.), os fungos associados às mesmas que apresentaram maior incidência foram Helmintosporium sp., presente em 100% das amostras, com infecção média de 21,7%, Aspergillus sp. (92,2%), Penicillium sp. (68,1%), Alternaria sp. (60%), Fusarium sp. (42%), sendo que este último apresentou uma incidência média de 5,2% (Goulart & Paiva, 1991). O objetivo do presente trabalho foi analisar o grau de incidência fúngica de vários lotes de sementes de aveia preta, provenientes da região sul do Estado do Rio Grande do Sul, bem como identificar os principais fungos existentes nas sementes e verificar os seus efeitos na qualidade fisiológica das sementes. MATERIAL E MÉTODOS Foram analisados cinco lotes de aveia preta (Avena strigosa Schreb), cultivar Comum, provenientes das cidades de Pelotas, Pedro Osório, Herval e Piratini, da zona sul do Estado do Rio Grande do Sul. As sementes provêm do ano agrícola 92/93, e foram colhidas em dezembro/janeiro de 1993. Após beneficiadas, foram armazenadas em condições ambientais até novembro/dezembro de 1993, quando foram realizados os testes. As plantas e sementes não foram tratadas com produtos fungicidas.
Os lotes analisados provém de diferentes produtores de sementes, exceto os lotes denominados Hervali e Herval2 que são do mesmo produtor, no entanto produzidos sob diferentes condições de clima e solo. Os lotes se constituem em semente fiscalizada que serão comercializadas pelos produtores. O trabalho foi desenvolvido no Laboratório de Patologia de Sementes e no Laboratório Didático de Análise de Se- mentes da Faculdade de Agronomia Eliseu Maciel, da Universidade Federal de Pelotas/RS. O método usado para detecção de fungos foi o papel filtro em caixas gerbox, com 16 repetições de 25 sementes, totalizando 400 sementes por lote. As sementes foram colocadas em temperatura de 20+2 C com 2.000 lux (24 horas de luz e 12 horas de escuro) e a contagem de ocorrência de fungos foi feita aos sete dias, conforme Neergard (1977). As sementes foram analisadas individualmente em lupa e o resultado expresso em percentagem. Para verificar a qualidade fisiológica das sementes, foram usados os seguintes testes: percentagem de germinação, conforme as RAS (1992), exceto para número de sementes, que foram usadas 200 sementes; primeira contagem de germinação, onde foram contadas as sementes germinadas no sétimo dia do teste de germinação; emergência no campo, onde foram usadas linhas com 50 sementes, e contadas as plântulas emergidas aos 20 dias após a semeadura (DAS) e o resultado expresso em percentagem; índice de velocidade de emergência (IVE), conforme Maguire (1967), onde diariamente foram contadas as plântulas emergidas até os 20 DAS; altura de plântula, onde foram medidas individualmente as plântulas emergidas aos 20 DAS e o resultado expresso em cm/plântula; peso da matéria seca (PMS), onde a parte aérea das plântulas emergidas aos 20 DAS foram cortadas e colocadas em estufa com ar forçado a 60 C por 72 horas e, após, pesadas. O resultado foi expresso em g/plântula. Para os testes de laboratório, o delineamento experimental foi inteiramente casualizado e, para os testes de campo, foi usado o delineamento em blocos casualizados, ambos com quatro repetições. Os dados foram analisados pelo Sistema de Análise Estatística - SANEST (Zonta et al., 1986). Os valores expressos em percentagem foram transformados em arc sen da raiz quadrada de x/100. RESULTADOS E DISCUSSÃO A ocorrência de fungos em sementes de aveia preta está apresentada na Tabela 1, onde observa-se que os fungos mais freqüentes nas amostras foram o Helmintosporium sp. e Phoma sp., com incidência média de 29 e 22%, respectivamente, o que concorda com relatos de Balardin & Loch (1987), que observaram ser o fungo Helmintosporium sp. mais freqüente em sementes de aveia amarela. Segundo os mesmos autores, esse é um fungo de solo que causa podridões nas raízes, podendo comprometer o estande inicial da lavoura.
Os fungos Fusarium sp. e Alternaria sp. tiveram níveis médios de infestação de 10 e 5%, respectivamente, o que pode ser considerado baixo para condições da zona sul do Rio Grande do Sul, o que pode ter sido ocasionado pelas condições climáticas desfavoráveis aos fungos (primavera com temperatura amena e umidade relativa baixa), no período estudado. Os gêneros Cladosporium sp., Epicoccum sp., Rhizopus sp Phorna sp., Penicillium sp., Aspergillus sp., Nigrospora sp. e Curvularia sp., constatados de forma geral nos lotes em baixas proporções, são fungos de armazenamento que, na maioria das vezes, causam prejuízos na qualidade fisiológica de sementes (Balardin & Loch, 1987). Apesar das sementes analisadas estarem armazenadas há 1 ano, os fungos Aspergillus sp. e Penicillium sp. estiveram presentes em pequenas proporções, mesmo sendo considerados os principais fungos de armazenamento (Agarwal e Sinclair, 1987). Observando-se os dados de germinação, constantes na Tabela 2, nota-se que houve diferença no poder germinativo das sementes dos vários lotes, com o lote de Piratini mostrando-se inferior aos demais, mas não diferindo dos lotes de Herval 1, Herval 2 e Pedro Osório (Tabela 2). O lote de Piratini apresentou o valor mais baixo de germinação, inclusive abaixo do mínimo requerido para comercialização (70%), apresentando baixos índices de Fusarium sp. e Alternaria sp. que poderiam ocasionar prejuízos na qualidade fisiológica das sementes, no entanto apresentando elevada incidência de Phoma sp. (31%) e Helrninthosporium sp. (44%). Para a primeira contagem de germinação, houve diferença entre os lotes (Tabela 2), com os lotes de Pelotas e Hervai 1 apresentando-se superiores aos demais, sendo que o último não diferiu dos lotes Herval 2 e Pedro Osório. O lote de Piratini apresentou os valores mais baixos na primeira contagem, mas não diferiu dos lotes de Herval 2 e Pedro Osório. Ao observar-se os dados de emergência no campo constantes na Tabela 2, nota-se que o lote de Piratini esteve inferior aos demais, mas não diferiu do lote Herval 1. Para o IVE, o lote de Piratini apresentou-se também inferior aos demais (Tabela 3), o que confirma a indicação de um lote de baixa qualidade
fisológica. Para a altura e PMS de plântula, não houve qualquer diferença entre os vários lotes, onde observa-se que a incidência de patógenos associados à semente nas proporções observadas não afeta a altura e PMS de plântulas de aveia preta (Tabela 3). Nota-se que o lote de Pedro Osório apresentou alto vigor e alta incidência de Alternaria sp., Fusarium sp. e Phoma sp. e baixa incidência de Helminthosporium sp. Os demais lotes apresentaram alta incidência de Heminthosporium sp. e Phoma sp. e baixa incidência de Alternaria sp. e Fusarium sp., incluindo aí lotes de alto vigor como Pelotas e baixo vigor como Piratini, dando uma clara indicação que a alta incidência de Heminthosporium sp. e Phoma sp. não se relaciona com o vigor dos lotes. Existem várias pesquisas relacionando o nível de incidência de fungos e o vigor das sementes. Dias & Toledo (1993), em braquiária, e Yorinori (1982), em soja, constataram que a incidência dos fungos diminuiu a germinação das sementes. Já Lasca et
al. (1983), em trigo, colocou que o nível de infecção fúngica não diminuiu a germinação e vigor da semente. Para Mantovanelli et al. (1991), em trigo, a incidência de fungos Helminthosporium sp. não afetou a germinação de sementes, no entanto Alternaria sp., Aspergillus sp. e Phoma sp. reduziram o vigor das sementes, portanto resultados muitas vezes divergentes. CONCLUSÕES Com base nos resultados conclui-se que: - Os fungos mais freqüentes nas sementes de aveia preta da zona sul do Rio Grande do Sul foram Helminthosporium sp., Phoma sp., Alternaria sp., Fusarium sp., Cladosporium sp., Epicoccum sp., Rhizopus sp., Penicillium sp., Aspergillus sp., Nigrospora sp. e Curvularia sp. - Dos gêneros que causam prejuízos à emergência de plântulas, apenas o Helminthosporium sp. e Phoma sp. ocorreram em proporções elevadas. REFERÊNCIAS AGARWAL, V.K. & SINCLAIR, J.B. Principles of seed pathology. Boca Raton, C.R.C. Press., 2v. 1987. BALARDIN, R.S. & LOCH, L.C. Efeito do thiran sobre a germinação de sementes de centeio e aveia. Rev. Bras. de Sementes, 9(1):113-7. 1987. BRASIL. Ministério da Agricultura. Regras para análise de sementes. Brasília, 1992. 365p. DIAS, D.C.F.; TOLEDO, F.F. Germinação e incidência de fungos em testes com sementes de Brachiaria decumbens. Rev. Bras. de Sementes, 15(1):81-6. 1993. GOULART, A.C.P.; PAIVA, F.A. Incidência de fungos em sementes de trigo (Triticum aestivum L.) produzidas no estado do Mato Grosso do Sul, safra 1990. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE SEMENTES, 7, Campo Grande, 1991. Resumos de trabalhos técnicos. Campo Grande, 1991. LASCA, C.C.; VALARINI, P.J.; BARROS, B.C., CHIBA, S. Danos ocasionados por Helminthosporium sativum em sementes de trigo. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE SEMENTES, 3, Campinas, 1983. Resumos de trabalhos técnicos. Campinas, 1983. MAGUIRE, J.D. Aid in selection and evaluation for seedling emergence and vigour. Crop. Sci., 2:176-87. 1967. MANTOVANELLI, M.C.H.; VIEIRA, C.P.; BARRETO, M. Incidência de fungos em sementes de trigo (Triticum aestivum L.) e seu efeito na germinação e vigor. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE SEMENTES, 7, Campo Grande, 1991. Resumos de trabalhos técnicos. Campo Grande, 1991.
NEERGARD, P. Seed pathology. London: McMillan, 1977. 2v. ROBERTS, E.H. Viability of seeds. Londres: Chapman and Hall, 1972. 448p. SOAVE, J.; WETZEL, M.M.V. Patologia de sementes. Campinas: Fundação Cargill, 1987. 480p. YORINORI, J.T. Doenças da soja causadas por fungos. Informe Agropecuário, 8(94):40-6, 1982. ZONTA, E.P., SILVEIRA, P. & MACHADO, A.A. Sistema de análise estatística para microcomputadores - SANEST. Pelotas: Instituto de Física e Matemática, Universidade Federal de Pelotas, 1986.