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Transcrição:

[Recensão a] PORRO, Pasquale. Forme e Modelli di Durata nel Pensiero Medievale. L'aevum, il tempo discreto, Ia Categoria «Quando» (Ancient and Medieval Philosophy. Series 1, XVI) Autor(es): Publicado por: URL persistente: Carvalho, Mário Santiago de Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Instituto de Estudos Filosóficos URI:http://hdl.handle.net/10316.2/33761 Accessed : 21-Jan-2021 03:58:40 A navegação consulta e descarregamento dos títulos inseridos nas Bibliotecas Digitais UC Digitalis, UC Pombalina e UC Impactum, pressupõem a aceitação plena e sem reservas dos Termos e Condições de Uso destas Bibliotecas Digitais, disponíveis em https://digitalis.uc.pt/pt-pt/termos. Conforme exposto nos referidos Termos e Condições de Uso, o descarregamento de títulos de acesso restrito requer uma licença válida de autorização devendo o utilizador aceder ao(s) documento(s) a partir de um endereço de IP da instituição detentora da supramencionada licença. Ao utilizador é apenas permitido o descarregamento para uso pessoal, pelo que o emprego do(s) título(s) descarregado(s) para outro fim, designadamente comercial, carece de autorização do respetivo autor ou editor da obra. Na medida em que todas as obras da UC Digitalis se encontram protegidas pelo Código do Direito de Autor e Direitos Conexos e demais legislação aplicável, toda a cópia, parcial ou total, deste documento, nos casos em que é legalmente admitida, deverá conter ou fazer-se acompanhar por este aviso. impactum.uc.pt digitalis.uc.pt

RECENSÕES PORRO, Pasquale. Forme e Modelli di Durata nel Pensiero Medievale. L'aevum, il tempo discreto, Ia Categoria «Quando» (Ancient and Medieval Philosophy. Series 1, XVI), Leuven: Leuven University Press, 1996, 532 p. Pela primeira vez na sua prestigiada história, a série 1 da colecção «Ancient and Medieval Philosophy», publicada sob os auspícios do De Wulf-Mansioncentrum da Universidade Católica de Lovaina (KUL), acolhe um título na língua do Lácio. Encontramo-nos perante um trabalho de longo fôlego que não belisca o rigor e a excelência da colecção lovaniense e que se mantém em certa tradição italiana de severa e circunspecta erudição historiográfica e filosófica. O seu autor, jovem estudioso de Filosofia Medieval com provas irrefutáveis de ampla e invulgar capacidade de análise e de crítica históricofilosófica, oferece-nos um incontornável contributo para a história das concepções filosóficas do tempo e das suas figuras («formas» e «modelos»), desde os Gregos, mormente Aristóteles, à escolástica jesuíta do séc. XVI, ou, por outras palavras, até à revolução cosmológica moderna. É sumamente impressionante - embora o A. não toque neste ponto - que Descartes insista, contra Gassendi, que visa o tempo «não abstractamente considerado» mas enquanto duração da própria coisa (V Resp. in Meditationes), no que representa um entendimento pontilístico da existência; ora, a tese da descontinuidade do tempo, e a consequente da divisibilidade infinita da duração, apesar de se assumirem como noções primitivas no inventor francês da Modernidade têm atrás de si uma história configuradora do uso de noções como tempus, duratio e aeternitas (e bem assim a recusa de aevum) nas quais se detecta o predomínio da duração, partilhável por Espinosa e por Descartes (modo ou atributo sob o qual se concebe uma coisa enquanto existe; já o tempo servirá para medir a duração). O retórico desmemorialismo cartesiano encontraria assim no livro de P.P um horizonte aparentemente insuspeitado: a desrealização do tempo, a duração como atributo da existência e como afecção concreta, eis o que a Modernidade foi capaz de pensar graças ao amadurecido germinar dessa moderna medievalidade. (Seja-nos permitido um desabafo: é impressionante como a área da Filosofia Medieval tem dado o tom a uma certa investigação mais generalizada no campo da História da Filosofia; atente-se, v. g., no caso da Filosofia Moderna, onde só agora se começa a assistira um deslocamento do estudo dos conceitos específicos de um sistema para as noções mais tradicionais conforme é testemunho recente fascículo de Les Études Philosophiques em relação a Descartes e a Espinosa, perspectiva na qual os filósofos medievistas contemporâneos têm um avanço considerável) Mas regressemos ao livro de P.P., doravante imprescindível para uma confecção de um dossier sobre o tempo, temática, aliás, a que as páginas desta Revista têm dado devido Revista Filosófica de Coimbra - ri." 13 (1998) pp. 169-178

170 Revista Filosófica de Coimbra acolhimento (recordamos e. g. os estudos sistemáticos de J. Reis). Além de nos ter agradado a imensurável informação patente em circunstanciadíssimas notas de pé de página (quantas vezes despertando-nos para novos problemas), fomos sensível ao à-vontade na movimentação diacrónica e ao trabalho de análise aturado (são cento e doze os autores estudados entre edições e mss.). Há um tempo para o estudo do tempo e hoje em dia, inevitavelmente, ninguém olha para esta noção como o poderia fazer antes de Ileidegger que alterou a nossa maneira de o entender. Assim, se é certo que tacitamente pode subjazer à escolha desta temática, pelo autor, o privilégio contemporimco que a ela não podemos deixar de conferir, e se era também previsível, dado o percurso de P.P. (que se dotornu estudando a natureza do tempo em Henrique de Gand), a escolha de uni tensa corou o presente - a investigação relativa a medidas Como «a'vtlni,> ((ap. 1 e 11).,tempo drscrclu (Cap. 111) e a categoria «quando» (Cap. IV) -- enganar-se-à quem pcns;u ir lei unia 1e-,i-que autorize uma interpretação metafísica do tempo (ou seque) rmtulõglì:i miro u prefere dizer a p. 488) posto ser antes sua convicção que o que curaeterir;i os nu sues medievais do tempo são menos valoraçõcs de teor metafísico e riais questões de ordem física. Nas suas palavras: «tempo (...) é essenzialmentc Ia quanlilà successiva inerente al movimento locale» (ibid.). Perguntar-nos-iamos. evidentemente, se o A. não exagera nesta interpretação, ou melhor, se ele, dada a perspectiva formal adoptada como baliza de pesquisa (aliás inatacável), a relação duração/cosmologia, não perde alguma sensibilidade para com óbvias dimensões metafísicas conexas, v. g., com a dimensão criatura]. É difícil - mesmo na época sob escrutínio do A. - que o tempo não seja uma privilegiada noção também substancialmente antropológica e vectorialmente metafísica. Pensemos e. g. nuns autor em que, como se compreende, P. P. é um reputado especialista, o teólogo du séc. XIII Henrique de Gand: quer J. Decorte que nós mesmo temos vindo a insistir, por rias distintas, no facto de que há um leitmotiv substancialmente'metafísico' no traço de rasura da ontologia aristotélica como alternativa ao tomasismo de Duzentos (vd., do autor belga. a sua contribuição a Via Scoti, Roma, 1995); ora, essa rasura não podia desperdiçar o exame de uma esfera tão significativa como a do tempo, posto que, com o teólogo de Gand, nos deparamos com uma proposta metafísica sobre a temporalidade radical da criatura (embora Heidegger nos tenha ensinado a exequibilidade do pensamento da finitude fora de qualquer recurso a esquemas criacionistas: vd. Einleitung in (]te PhilosopIlie GA 27, pp. 326, 337, 339, 340, passim). Evoquemos em qualquer caso tão-só uni texto henriquino (Quodl. X, q. 7. ed. R. Macken, p. 179, 1. 97-08), onde se pode descortinar algo da vasta gama da profundidade metafísica do ser criado: o acto da criação - pode aí ler-se - não consiste na consideração abstracta da posição da existência em toda a sua extensão ontológica. Destarte, talvez devamos mesmo dizer que Deus só cria a 'ex-istência' na medida em que isso significa intervir na 'cons-istência', isto é dizer, que apenas o ser criado efectivado deve ser sempre um concreto integral e realmente fundado. Tal como escrevemos algures, esta interpretação parece-nos promover uma alternativa cm relação ao sentido da autonomia da criatura específico do tomismo já que o Gandavense quis chamar aquela "escola " não tanto ao sentido da existência quanto ao do existencial e da sua (in -)cons-istência. Deixemos este confronto. Insistamos então ainda que haveria que reparar que se está longe de esgotar o dossier filosófico sobre o tempo na Idade Média. mesmo sob o prisma dos seus autores (lembramo-nos inevitavelmente do comentário a Pseudo- Dionísio feito por Pedro Hispano, autor aliás omisso desta obra de Porro). Pensamos, depois, em patamares tais com o do tempo qualitativo; ou o do tempo quantitativo, cujo surgimento parece ser contemporâneo da cunhagem das grandes moedas de prata nas cidades italianas; da laicização do tempo mecânico contra o tempo religioso; do tempo social; do tempo humano e divino; do tempo pontual (punktuelle Zeit, sprunhafte Zeitlichkeit ); da prática do anacronismo ou acronismo; do tempo histórico ou, se se quiser, pp. 169-178 Revista Filosófica de Coimbra - n. /3 (1998)

Recensões 171 mesmo da divisão tempo/hora que Honório de Autun (autor também ausente do livro que recenseamos ) dividia assim, dando já mostras da tendência sistematizante escolástica para a atomização do tempo que ligava o séc. XII a Lucrécio: a hora divide-se em 4 'pontos', 10 'minutos ', 15 'partes', 40 'momentos ', 60 'sinais ' e 22560 'átomos'! Enfim, mesmo de um ponto de vista filosófico, importa ler a presente obra tendo em mente opinião de J. Le Goff sobre a ausência de uma representação e vocação única do tempo e da plenitude do(s) tempo ( s) como realidade ( s) do pensar medieval ( vd. entre nós o primeiro volume da Enciclopédia Einaudi). Se listamos estes tópicos dada a perspectiva mais historiográfica do autor, nada do que acabámos de dizer fere realmente o trabalho ímpar de P.P., tanto mais que haveria que optar entre tantos monumentos bibliográficos, e o nosso intérprete ateve-se prudentemente aos loci mais importantes na historiografia filosófica normal (e tomamos esta última palavra tal como Kuhn a usa para a ciência ). Desta feita, parece-nos extraordinariamente salutar a reivindicação e o estudo pormenorizado das dimensões naturalmente cosmológicas que adquirem ainda mais força dado o rigoroso positivismo do nosso A. Desiluda-se o leitor que ainda pense só vir a encontrar uma monótona sinfonia nas concepções relativas à s formas e aos modelos da duração. Sem podermos, como se compreende, dar aqui conta do conjunto das conclusões da obra, limitemo-nos a apresentar os três modelos muito gerais, e sobretudo metodologicamente operatórios, que o A. encontra entre os sécs. XIII e XIV, sobre o tempo enquanto medida dos entes criados: (i) aferição da sua natureza pela mobilidade dos entes (T. de Aquino ); ( ii) pela extensão do conceito de 'a'vum' (D. Escoto); ( iii) pelo instante do tempo discreto (Herveu de Nédellec ou Durando de Saint Pourçain ). De facto, longe de estes três modelos se nos apresentarem como unitários, conforme avisa o A., assinala-se como tese nuclear derradeira a progressiva «desvinculação terminológica e conceptual entre a ideia de duração e a de tempo em sentido estrito» ( p. 491). Assim se confirma uma distanciação para com o arqui - modelo augustinista ( retirar as coisas do tempo ) mediante a redimensionação da problemática em sede aristotélica que passa por conferir tempo às coisas. Poderíamos ainda exemplificar o decurso/ percurso tão prudentemente analítico seguido pelo autor ilustrando alguns dos seus coeficientes interpretativos mediante a menção aleatória de dois autores contemporâneos, digamos menos importantes, Francisco de Mayronis e Durando de Saint Pourçain (este último relevante numa catedrilha homónima da Universidade de Coimbra em pleno séc. XVI). Enquanto que sobre Mayronis, minorita que parece ter seduzido, no nosso séc. XV, o interlocutor da cabeça da gesta marítima lusitana, o Infante D. Henrique, Frei André do Prado, Porro limita-se a informar - nos ter aquele partilhado tese do dominicano Santo Alberto Magno sobre o wvum como duração contínua extensa ( p. 230 ), já sobre o igualmente dominicano Durando, o intérprete italiano estende - se sobremaneira, designadamente acerca do tempo discreto (p. 375-83). Mais do que a explicável desigualdade de espaço dos dois autores ( sobre o franciscano existe uma menor produção teórica histórico-interpretativa), ressaltaríamos o capital de informação mesmo assim adquirida. Destarte, se a evocação de Mayronis nos informa, uma vez mais, da quase inexistência de fonteiras conceptuais entre ordens, a relativa a Durando ( especialmente contraposta a Nédellec), confirmando-nos também este dado (p. 241), permite-nos entrever que as divergências no interior de uma Ordem não eram apenas de carácter «superficial» (este é o termo de Porro) ou sintoma de exaustibilidade expressa em estéril verborreia, como queriam os humanistas ( nomeadamente os italianos, os principais responsáveis pela desvalorização do conceito de Idade Média). O signatário destas linhas conta-se entre aqueles praticantes da coisa medieval (permita-se-lhe a aparente banalidade) que considera que a filosofia não termina em 1500; acompanha, depois, quem perspectiva como condição do filosofar o pensar contra a (i. e., depois da) filosofia medieval, desconstruindo-a no que ela tem de mais eloquentemente matricial, mas, dito isto, ele não poderia ser insensível Revista Filosófica de Coimbra - n. 13 (1998) pp. 169-178

172 Revista Filosófica de Coimbra ao inciso «istud autem non videtur sufficienter dictum» (tópica do afastamento de Durando em relação ao seu confrade Nédellec, v. g. p. 377) com que se assinala um pensar constantemente em processo e profundamente individual ou interiorizado tão inquietantemente comum nesses tempos avessos à superficialidade do trabalho mental. Para terminar, vale a pena referir devidamente que o livro de P.P. também nos interessa a nós, portugueses, pelo facto de chegar a estudar posições como as dos Conimhricenscs, de Fonseca ou de Suárez ( ao qual atribui a análise mais ampla da categoria 'quando' na segunda escolástica na esteira distante de Egídio Romano). Recordemos porém que a temática do tempo em Pedro da Fonseca havia sido trabalhada, entre nos, pelo menos por V. de Sousa Alves e por M. Baptista Pereira, este último em notável e conspícua tese doutoral. Nesse particular, porém, haveria que fazer, pelo menos, ligeiros repaors l.m primeiríssimo lugar, corrigir afirmações da nota 171 (p. 459), Designadamente a que ainda liga Fonseca ao projecto do Curso Conimbricense (vd. A. Niarons rir / 'r r), uni observarmos que a relação Curso Conimbricense/Suárez é a inversa do que a que se pode perceber na nota seguinte dessa mesma página (vd. também p. 473, n. 202), e. (m,ilmcnte. dar como incorrecta a cota do mss de Coimbra referido (p. 461) T 38, publicando que são três os textos de Luís de Molina existentes na Biblioteca Geral da 1 niversidadc de Coimbra, De iustilia (SP - 0-5 - 5) Concordia liberi arbitrit e Appendi.x ad concordiam liberi arbitrii (RB - 34-36 e R - 34-21). Alário San naco ele Corraliro SKINNER, Quentin. Reason and Rhetoric in the Philosophy of Hobbes. (Cambridge: Cambridge University Press, 1996) xvi + 477 pp O objectivo central deste volume é testar as características da aspiração central de Hobbes em matéria de filosofia política: transformá-la numa disciplina científica de acordo com os cânones da ciência moderna emergente. Não se trata porém de descobrir elementos radicalmente novos no que se refere à intenção de construir uma scientia cir'ilis rigorosa. Esta intenção programática, como é sabido, é uma constante dos principais textos de Hobbes desde The Elements of Law até ao Leviatã passando pelo De Cn e. A análise de Skinner pretende reapreciar a partir de uma leitura rigorosa dos textos publicados e de muitos manuscritos inéditos e de uma ponderação do contexto cultural em que se inscreve a obra de Hobbes, os contornos mais precisos da sua compreensão da nova ciência civil. Muitos comentadores leram o texto hobbesiano como se a sua concepção da scienlia ciei/is não fosse mais do que a simples transposição da sua compreensão da metodologia das ciências naturais. O seu intento de expor e investigar os grandes temas da moral e da política more geometrico mantém - se ao longo da obra. Mas, como alguns comentadores mais recentes sublinharam, nos textos posteriores aos Elementos, Hobbes introduz várias diferenças entre os métodos das ciências da natureza e as ciências humanas. No próprio De Cive, Hobbes salienta que ao tratar-se dos corpos artificiais investigados pela ciência política não se pode prescindir, como nas ciências da natureza, da consideração da finalidade para que foram criados. Quentin Skinner procura neste volume explorar alguns aspectos desta questão tentando determinar em que sentido Hobbes terá realmente feito uma verdadeira distinção entre os métodos das ciências da natureza e os das ciências humanas. A tese central de Skinner parece poder reduzir - se ao facto de Hobbes ter chegado, por volta de 1651. à conclusão de que as ciências humanas, ao contrário das ciências da natureza, precisavam de um complemento retórico. Nelas, a força da razão, por si só, revela-se estruturalmente incapaz pp. 169-178 Revista Filosófica de Coimbra - n." 13 (/998)