ÁGUA ARMAZENADA EM CISTERNAS E SEU IMPACTO NA SAÚDE DE POPULAÇÕES RURAIS DO MÉDIO SERTÃO PARAIBANO WATER TANKS AND STORED IN ITS IMPACT ON POPULATION HEALTH RURAL MIDDLE SERTÃO PARAIBA Tamires L. LUNA; Albertina F. SILVA; Jessica N. BARROS; Beatriz Suzana O. de CEBALLOS RESUMO: As condições precárias de saneamento básico nos países em desenvolvimento são a principal causa de surtos e epidemias de doenças de veiculação hídrica. Com isso, o presente estudo objetivou avaliar a relação entre as práticas de manejo da água armazenada em cisterna e sua relação com a saúde das pessoas beneficiárias. Foram entrevistadas famílias de comunidades rurais dispersas sem água encanada, do Município de Quixaba. Verificou-se que as análises microbiológicas das amostras de água das cisternas ao longo de 2010 e 2011 mostraram contaminação elevada por coliformes totais e E. coli em todas as águas, associada com a origem destas e às práticas de manejo do sistema de captação e armazenamento. Neste sentido, afirma-se que as cisternas que armazenam água de chuva causam impactos positivos na saúde dos habitantes do SAB ao diminuir a vulnerabilidade hídrica. Palavras-Chave: Água de Chuva, Política Pública, Veiculação Hídrica. ABSTRACT: The precarious conditions of sanitation in developing countries are the main cause of outbreaks and epidemics of waterborne diseases. Thus, this study aimed to evaluate the relationship between the management practices of water stored in tanks and its relationship to the health of the recipient people. families dispersed rural communities were interviewed without running water, the City of Quixaba. It was found that the microbiological analysis of water samples of tanks during 2010 and 2011 showed high contamination by total coliforms and E. coli in all waters, associated with the origin of and the management practices of the capture and storage system. In this sense, it is stated that the cisterns that store rainwater cause positive impacts on the health of inhabitants of the SAB to reduce water vulnerability. Keywords: Rainwater, Public Policy, Serving Hydro. 1 INTRODUÇÃO O acelerado crescimento populacional e o consequente aumento das atividades 17
produtivas são causas de demandas crescente de água de boa qualidade que somados à degradação dos recursos hídricos geram cenários de escassez em diversas regiões do planeta (TUNDISI, 2003). Nos países em desenvolvimento as condições precárias de saneamento básico são a principal causa de surtos e epidemias de doenças de veiculação hídrica. Doenças transmitidas pela água causam mais de 50% das internações hospitalares no Brasil e a metade das mortes de crianças de até um ano, muitas delas concentradas à na região nordeste (ZANCUL, 2006). O Semiárido nordestino (SAB) dispõe de 3% das águas doces do País e abriga uma população de 20.858.264 pessoas, quase 12% da população nacional. A captação de água de chuva é uma pratica popular desenvolvida com técnicas simples por diferentes povos ao redor do mundo há milhares de anos, especialmente em regiões áridas e semiáridas, que abrangem aproximadamente 30% da superfície da terra. Nestas regiões as chuvas ocorrem durante poucos meses do ano e com bastante variabilidade em quantidade e distribuição entre os anos (GNADLINGER, 2011). No SAB o sistema de captação e armazenamento de água de chuva em cisterna foi estimulado por organizações da sociedade civil desde 2002, como política pública com destaque do Programa Um Milhão de Cisternas Rurais - PIMC, sendo uma solução alternativa de abastecimento (ASA, 2009). É uma técnica simples e viável economicamente de obter água usada pelos habitantes da região que permite, mesmo com baixo índice pluviométrico (150 200 mm), acumular 16.000 L de água, quantidade suficiente para suprir aproximadamente com 9 L por pessoa por dia as necessidades de beber, cozinhar e de higiene pessoal de uma família com até 5 membros, durante até 8 meses de escassez (GNADLINGER, 2011). Toda nova tecnologia ou nova prática deve ser apresentada às comunidades beneficiadas por intermédio de multiplicadores da própria comunidade, em geral líderes comunitários, professores, agentes comunitários de saúde (ACS), agentes da vigilância ambiental em saúde (AVAS), entre outros (BETER, 2006). AVAS desenvolvem um conjunto de ações e serviços prestados por órgãos públicos relativos à Vigilância Ambiental em Saúde, visando conhecer, detectar e prevenir qualquer mudança nos determinantes e condicionantes do ambiente que interferem na saúde humana e 18
engloba a vigilância da qualidade da água para consumo humano (BARRETO, 2003). Considerando o P1MC como uma política pública massiva (um milhão de cisternas, 5 milhões de pessoas a serem beneficiadas com água) e seu potencial impacto na qualidade de vida da população, o propósito deste trabalho é conhecer a relação entre as práticas de manejo dos sistemas de captação e de armazenamento das águas chuva em cisternas em comunidades rurais do sertão paraibano e a saúde dos consumidores. Leva-se em consideração que embora construídas com a finalidade de captar e armazenar água de chuva, nas estiagens prolongadas as cisternas tendem ser abastecidas com água de outras fontes como as transportadas por carros-pipas. No primeiro caso (água de chuva), a qualidade pode ser afetada pelo manejo inadequado do sistema de captação e armazenamento, e no segundo, pela origem da água, não sempre satisfatória para consumo. Com isso, o presente estudo objetivou avaliar a relação entre as práticas de manejo da água armazenada em cisterna e sua relação com a saúde das pessoas beneficiárias. 2 MATERIAL E MÉTODOS Foram entrevistadas famílias de comunidades rurais dispersas sem água encanada do Município de Quixaba, distribuídas numa área de 157 km² com 1.700 habitantes (1066 na zona rural e 633 na zona urbana). O município, situado no bioma caatinga do semiárido do sertão paraibano na microrregião de Patos, possui pluviometria média anual de 431,8mm. Em Quixaba foram construídas 158 cisternas entregues a 158 famílias, que são as únicas fontes de água. Para este trabalho foram selecionadas 10 famílias (6,5%) que possuem cisternas do PIMC distribuídas em 4 comunidades (Motorista, Aroeiras, Serrota Vermelha e Cacimba de Areia). Os critérios de escolha foram tempo de construção das cisternas, programa (P1MC, FUNASA, outros) e órgão financiador. Em uma primeira fase de aproximação se realizaram visitas aleatórias a 30 famílias para estabelecer contato e outra de observação e aplicação de questionários semiestruturados aos chefes de família, que fazem a gestão das águas nas 19
residências. Também foram contatadas a secretaria de saúde, AVAS (Agentes de Vigilância Ambiental em Saúde) que fazem parte do programa de controle da qualidade dessa água do Ministério da Saúde/SUS e que coletam amostras de água potável da rede de distribuição na sede do município. Foram também contatados os ACS (Agentes Comunitários de Saúde) que atendem à população com visitas mensais às famílias. 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO Nas comunidades rurais dispersas de Quixaba, 80% das famílias utilizam água armazenada em cisterna para consumo humano. Considerando a importância das cisternas na gestão da água domiciliar nestas comunidades e após um surto diarreico, a secretaria de saúde iniciou com os AVAs o monitoramento sistemático da qualidade da água de 4 delas com um sistema rotativo de amostragem. A atitude evidenciou inquietude pela qualidade das águas das cisternas e a saúde da população sendo o único município do estado da Paraíba que monitora sistematicamente essas águas, visto que não há ainda um programa governamental de controle da qualidade das águas de cisternas. Todas as famílias coletam água de chuva, mas afirmaram abastecer as cisternas com água de carro da operação pipa do Exército Brasileiro ou da prefeitura com frequência quinzenal (30% das famílias) ou mensal (50%). A água transportada pelos caminhões sob controle do Exército é parte de uma política pública para o abastecimento humano nos períodos de escassez (Operação Pipa) ou de calamidade pública e é água tratada pela CAGEPA, entretanto alguns Piperos independentes captam de açudes próximos águas de qualidade duvidosa. As análises microbiológicas das amostras de água das cisternas ao longo de 2010 e 2011 mostraram contaminação elevada por coliformes totais e E. coli em todas as águas, associada com a origem destas e às práticas de manejo do sistema de captação e armazenamento. Um dos objetivos do P1MC é abastecer as cisternas com água de chuva de boa qualidade para diminuir doenças de veiculação hídrica e preservar ou melhorar essa qualidade através da conservação e do manejo higiênico do sistema, para o qual se adotam barreiras sanitárias que minimizam o risco de contaminação. Essas 20
barreiras são: limpeza dos telhados (área de captação), dos dutos e das cisternas antes das chuvas, desvio das primeiras águas de cada evento chuvoso que lavam as telhas e arrastam sujeiras que não devem atingir a cisterna, uso de bomba (manual) para retirar água da cisterna, cuidados higiênicos com a água dentro da casa e com seu armazenamento, desinfecção no ponto final de uso (residências) antes do consumo (ANDRADE NETO, 2004). Embora originalmente para águas de chuva, nos momentos de escassez (estiagens prolongadas) que justificam a acumulação de água de carro pipa nas cisternas as barreiras sanitárias devem ser mais cuidadosamente aplicadas. Todos os entrevistados disseram fazer a limpeza do telhado uma vez por ano e usarem filtros nos ductos para impedir a entrada de sujeira, asseguraram eliminar as primeiras águas de chuvas. Entretanto todas retiram água da cisterna com baldes ao invés da bomba e embora afirmarem que é usado somente para este fim, é um veículo de contaminação porque fica apoiada no chão, a corda não é lavada e às vezes é utilizada na amarração de animais. A maioria não desinfeta a água antes de beber. Estas barreiras são eficientes para as águas de chuvas e para as águas de outras fontes, pois nas secas 100% das cisternas recebem águas de carro-pipa, em geral com água de qualidade duvidosa. Em 60% das famílias houve casos de diarreia em adultos e crianças com frequências semanal, mensal ou semestral. Pode ser devido ao uso de água não apropriada, falta de higiene e manejo inadequado das cisternas e da água que afeta à saúde, mas também se continua usando águas dos açudes, barreiros ou cacimbas para lavar roupa, banho prolongado, dessedentação animal. Os ACS realizam visitas mensais e fazem a distribuição de hipoclorito de sódio para desinfetar a água antes de beber, porém poucas famílias o usam e aquelas que o aplicam não o fazem de maneira incorreta (doses muito baixas ou muito altas). Muitas famílias não cloram a água porque acham gosto ruim, ou porque consideram que água distribuída pelo caminhão pipa já está tratada. A falta de conhecimento e de apropriação dos conceitos de barreiras sanitárias, usos higiênicos da água e da associação entre água boa/ higiene/ melhorias na saúde, revela maior necessidade de educação para a saúde a ser transferida pelos AVAS e ACS, como 21
também necessária maior capacitação desses profissionais com a reciclagem continua. 4 CONCLUSÕES As cisternas que armazenam água de chuva causam impactos positivos na saúde dos habitantes do SAB ao diminuir a vulnerabilidade hídrica e garantir perto da residência água de boa qualidade que, se usada como cuidado (9 L.pessoa -1.dia - 1 ) pode satisfazer as necessidades básicas de beber e cozinhar para 5 membros durante 8 12 meses. O PIMC busca satisfazer necessidades hídricas básicas com água de qualidade adequada para beber e seu uso continuo deveria diminuir a incidência de doenças de veiculação hídrica. O manejo higiênico e controlado da água de chuva armazenada na cisterna e a higiene da família são fundamentais para garantir ausência de contaminação da água, entretanto nas comunidades estudadas não são aplicadas as barreiras sanitárias corretamente. Entretanto, o pequeno volume disponibilizado (OMS recomenda um mínimo 20L. pessoa -1.dia -1 ) obriga às famílias a continuar recorrendo às fontes tradicionais para os demais usos ( o gasto ). Por sua vez a estiagem prolongada determina o uso de água de carro pipa, mas também a certeza da assistência por esse tipo de abastecimento gerou o habito de usar água de chuva da cisterna para qualquer uso, transformando-a em um tanque no quintal para encher com qualquer tipo de água, ao invés de armazenar água de chuva boa para beber e cozinhar durante todo o ano. Os resultados ressaltam a necessidade da vigilância da qualidade da água dos sistemas de abastecimento alternativos, tanto das águas das cisternas como dos carros pipa, pelos órgãos competentes de saúde, como também ações que viabilizem a garantia de abastecimento de água potável consumo humano em comunidades rurais que sofrem com a falta de acesso a água de boa qualidade em quantidade apropriada. Essas ações devem ser acompanhadas de educação continuada às famílias pelos Agentes Comunitários de Saúde (ACS) e pelos Agentes de Vigilância Ambiental em Saúde (AVAS), que devem estar capacitados para serem multiplicadores das boas práticas. 22
5 REFERÊNCIAS ANDRADE NETO, C. O. Proteção sanitária das cisternas rurais. In: Anais do Simpósio Luso-Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental, n. 11., 2004, Natal-RN. Anais...Natal: ABES/APESB/APRH, 2004. GNADLINGER, J. Recursos Hídricos em Regiões Áridas e Semiáridas. Campina Grande: Instituto Nacional do Semiárido, 2011. TUNDISI, J.G. Água no século XXI: Enfrentando a escassez. São Carlos: RiMa, IIE, 2003, 246p. ZANCUL, M.S. Água e saúde. Revista Eletrônica de ciências, n. 32, São Carlos, abril, 2006. BARRETO, R. L. Estruturação da vigilância ambiental no estado da Bahia. Monografia (Trabalho de Conclusão do Curso de Saúde Coletiva) - núcleo de Estudos em Saúde coletiva. Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2003. 23