Cancro da pele: podemos preveni-lo?



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Transcrição:

Cancro da pele: podemos preveni-lo? HUGO PEREIRA DA SILVA*, CARLOS FERRÃO** * Interno do Internato Complementar de Medicina Geral e Familiar ** Assistente Graduado de Medicina Geral e Familiar Centro de Saúde da Venda Nova Palavras-chave: Cancro da Pele; Factores de Risco; Prevenção INTRODUÇÃO EDITORIAIS O cancro da pele é a neoplasia mais frequente no homem, com uma incidência crescente apesar dos esforços desenvolvidos em campanhas educacionais e de prevenção. No presente artigo passamos em revista alguns aspectos referentes à epidemiologia, etiopatogenia, clínica e prevenção dos três principais tipos de cancro cutâneo. ASPECTOS EDITORIAIS EPIDEMIOLÓGICOS O cancro de pele constitui a forma mais frequente de neoplasia maligna na população caucasiana 1. A American Cancer Society estima, para o presente ano de 2003, o diagnóstico de cerca de um milhão de novos casos de basalioma e carcinoma espino-celular e cerca de 54.200 novos casos de melanoma maligno entre a população americana, bem como a morte de aproximadamente 9.800 americanos devido à doença 2. ETIOPATOGÉNESE EDITORIAIS A exposição aos raios ultravioletas (UV) solares parece ser o factor de risco ambiencial mais importante, sendo importante realçar que os raios UV prove- nientes de fontes artificiais de luz (solários, lâmpadas de bronzeamento) parecem ser tão perigosos como aqueles 2. O espectro solar é constituído por radiações de diversos comprimentos de onda: radiação ultravioleta C (UVC); radiação ultravioleta B (UVB); radiação ultravioleta A (UVA); radiação visível; radiação infra-vermelha. Sabe-se que toda a radiação UVC e cerca de 90% da radiação UVB são absorvidas, ao longo da atmosfera, pelo ozono, vapor de água, oxigénio e dióxido de carbono. Deste modo, a radiação UV que atinge a superfície terrestre é predominantemente constituída por UVA com um pequeno componente UVB 3, sendo o seu nível influenciado por vários factores ambienciais, dos quais destacamos: Altura do sol: os níveis de UV são tanto maiores quanto maior a elevação do sol no céu, com a consequente variação decorrente da hora do dia e da época do ano; Latitude: os níveis de UV são tanto maiores quanto maior a proximidade do equador; Nebulosidade: os níveis de UV são tanto maiores quanto menor é a nebulosidade; Altitude: quanto maior a altitude, maior o nível de UV (cerca de 10-12% por cada 1.000m); Ozono: quanto maior o nível de ozono, menor o nível de UV que atinge a superfície terrestre; Superfícies reflectoras: são exemplos a neve, a areia da praia e a água do mar, as quais poderão reflectir, respectivamente, até 80, 15 e 25% da radiação UV. Rev Port Clin Geral 2003;19:485-90 485

São hoje relativamente bem conhecidas as acções da radiação UV a diversos níveis, nomeadamente o olho, o sistema imunitário e a pele. A radiação visível desencadeia, ao nível do olho, o reflexo de constrição pupilar, mercê do qual é minimizada a penetração da radiação solar no olho. A eficácia deste sistema de defesa é posta em causa em condições adversas extremas, como acontece na existência de grandes superfícies reflectoras, de que a neve poderá ser o exemplo paradigmático. Os efeitos imediatos da exposição podem ser a fotoqueratite e a fotoconjuntivite, equivalentes à queimadura solar a nível da pele, situações habitualmente reversíveis sem sequelas a nível da visão. A chamada «cegueira da neve» constitui uma forma extrema de fotoqueratite. Por outro lado, parece hoje certo que a exposição aos UVB constitui um factor de risco major para o desenvolvimento de catarata, prevendo- -se que uma diminuição de 10% do ozono na estratosfera possa causar anualmente um acréscimo de 1,6 a 1,75 milhões de casos em todo o mundo 3. Vários estudos demonstraram que a radiação UV altera a actividade e distribuição de algumas células responsáveis pela activação da resposta imunitária, o que poderá aumentar o risco de infecção (viral, bacteriana, parasitária ou fúngica) e, mesmo, reduzir a eficácia da vacinação 3. A importância da radiação UVB como factor de risco para cancro de pele é conhecida desde há muito, sendo atribuída à radiação UVA um papel menos importante. Todavia, sabe-se hoje que a radiação UVA induz mutações no DNA responsáveis por cancro cutâneo quer no homem quer no animal 4. Estudos epidemiológicos sugerem que a radiação UV solar é responsável pelo desenvolvimento de neoplasias cutâneas através de mutações genéticas e imunossupressão e, possivelmente, por via do envelhecimento da pele 5. A radiação UVB é a principal responsável pela chamada queimadura solar, podendo ser relacionada com o desenvolvimento dos três principais tipos de cancro cutâneo (basalioma, carcinoma espino-celular e melanoma). Por seu turno, a radiação UVA poderá desempenhar papel relevante no envelhecimento cutâneo e estudos recentes mostraram que não só exacerba os efeitos carcinogénicos da radiação UVB como poderá ela própria ser responsável pelo desenvolvimento de cancro da pele, incluindo melanoma 6. Os efeitos da radiação solar na pele variam consoante os fototipos, definidos de 1 a 6 consoante as características da pele e cabelo, sendo habitualmente tanto mais deletérios quanto menor for o fototipo. O Quadro I apresenta as características principais de cada fototipo. Por outro lado, as crianças e adolescen- QUADRO I DESCRIÇÃO SUMÁRIA DOS DIVERSOS FOTOTIPOS EXISTENTES Fototipo Características 1 Pele clara muito pálida, por vezes sardenta. Queimaduras rápidas após exposição solar e raramente se bronzeiam. 2 Pele clara com cabelo louro ou ruivo, olhos azuis ou verdes e sardas. A pele queima-se fácil e intensamente e bronzeiam-se pouco. 3 Pele tipicamente caucasiana com pele clara. Bronzeiam-se e queimam-se moderadamente. 4 Bronzeiam-se rapidamente e queimam-se moderadamente. Pele branca a morena. Cabelo e olhos escuros. 5 Raramente se queimam e bronzeiam-se muito intensa e rapidamente. Pele escura. 6 Pele castanha muito escura. Olhos e cabelos escuros. 486 Rev Port Clin Geral 2003;19:485-90

tes são particularmente sensíveis, os efeitos são cumulativos e cerca de 80% da radiação recebida durante a vida ocorre durante os primeiros 18 anos, pelo que especial atenção nos aspectos preventivos deve ser dada até essa idade. Estão actualmente identificados numerosos factores de risco para cancro cutâneo, alguns dos quais passamos a referir. Existem factores de risco comuns aos três tipos de cancro de pele atrás mencionados, como sejam 7 : Pele clara e sardenta; Cabelo ruivo ou louro; Olhos esverdeados ou azuis; Queimadura solar fácil; História prévia de cancro de pele de qualquer tipo. Existem outros factores de risco que devem ser considerados consoante o tipo de cancro. Assim, podemos dizer que são também factores de risco para o melanoma 7 : Antecedentes de melanoma em familiares de primeiro e segundo graus; Presença de grande número de nevos pigmentados e/ou presença de um ou mais nevos pigmentados gigantes congénitos; Antecedentes de queimadura solar na infância ou adolescência; Exposição intensa e intermitente à radiação solar. Em relação ao basalioma e carcinoma espino-celular podem ser também considerados factores de risco 7 : Terapia com PUVA (psoraleno + UVA); Profissões com grande exposição solar contínua (por ex: agricultores, pescadores, trabalhadores de construção civil); Exposição continuada à radiação solar. EDITORIAIS CLÍNICA Os três tipos mais frequentes de cancro de pele são, como já referimos, o basalioma ou carcinoma baso-celular, o carcinoma espino-celular e o melanoma. O basalioma constitui o tipo mais frequente, atingindo sobretudo indivíduos de pele clara cronicamente expostos ao sol, preferencialmente nas áreas corporais mais desprotegidas. Embora localmente invasivo e com tendência para recidivar, não origina metastização. O carcinoma espino-celular é o segundo tipo mais frequente, atingindo igualmente indivíduos cronicamente expostos ao sol mas de grupos etários mais avançados que os do basalioma, nas áreas corporais mais desprotegidas e quase sempre sobre lesões precursoras pré-existentes (por ex. queratoses actínicas). Além de localmente invasivo pode originar metastização em órgãos vitais. O melanoma é considerado um dos tumores malignos mais agressivos na espécie humana, sendo responsável por cerca de 75% das mortes por cancro da pele 7. Pode surgir em qualquer local do corpo e atinge mais frequentemente indivíduos de fototipo mais baixo. Ao contrário dos anteriores, parece estar mais associado à exposição solar intermitente, muitas vezes acompanhada de queimadura solar. PREVENÇÃO EDITORIAIS PRIMÁRIA No 59 o Encontro da American Academy of Dermatology foi feito o ponto da situação relativo a 15 anos de esforços educacionais no que diz respeito à prevenção do cancro cutâneo, tendo sido realçado que 8 : a população tem maior conhecimento sobre o cancro da pele e importância do uso de protectores solares; houve alterações mínimas relativas ao bronzeamento e exposição solar; embora se tenha verificado um aumento do uso de protectores solares, Rev Port Clin Geral 2003;19:485-90 487

estes não são usados diariamente; aumentou a incidência de queimaduras solares; aumentou a prática de bronzeamento artificial. Apesar destes dados um pouco desanimadores, a evidência sugere que a redução da exposição à radiação UV reduz a incidência de basalioma e carcinoma espino-celular 9. Tal pode ser conseguido diminuindo a exposição à radiação UV, usando quantidades adequadas de protector solar e vestuário e acessórios protectores adequados. A eficácia dos protectores solares na prevenção dos diversos tipos de cancro cutâneo é ainda controversa. Parece certo que os protectores previnem a queimadura solar e provavelmente o carcinoma espino-celular quando usados durante a exposição solar não intencional, não sendo possível retirar conclusões da sua eficácia preventiva quanto ao basalioma e melanoma 10. Por outro lado, o seu uso pode transmitir uma falsa sensação de segurança, prolongando a exposição intencional e, consequentemente, aumentando o risco de melanoma 10. Os protectores solares preferenciais deverão ser os resistentes à água e que confiram uma protecção contra os UVA e os UVB. Deverá ser tido em conta que o factor de protecção solar (FPS) mínimo para os UVB é o factor 15, capaz de absorver mais de 92% da radiação e que um protector com FPS 30 pode absorver mais de 97% da radiação UV 11. Deste modo, protectores solares com FPS superior a 30 poderão representar custos acrescidos sem benefícios adicionais, bem como aumentar a exposição a níveis perigosos de produtos químicos 12. Porventura mais importante que o uso correcto de protectores solares é a protecção física da pele da radiação UV. São atitudes recomendáveis o evitar a exposição solar, sobretudo nas horas de maior intensidade das radiações, bem como as fontes artificiais de bronzeamento 13. É igualmente recomendado o uso de roupa e acessórios protectores adequados. No Quadro II, mencionamos as recomendações que consideramos mais importantes e que deverão ser sistematicamente divulgadas. PREVENÇÃO EDITORIAIS SECUNDÁRIA Se bem que a detecção e tratamento precoces do cancro da pele possam melhorar o prognóstico da doença 14, não QUADRO II PRINCIPAIS RECOMENDAÇÕES PARA A PREVENÇÃO DE CANCRO DA PELE 1. Evitar a exposição ao sol, sobretudo em períodos de maior intensidade de radiação, quer fora quer dentro de casa. 2. Usar roupa adequada a uma protecção solar eficaz, cobrindo a maior área corporal possível. 3. Usar boné ou chapéu, preferencialmente com abas para protecção das orelhas. 4. Usar óculos com lentes capazes de filtrar radiação UVA e UVB. 5. Usar sempre protector solar com FPS entre 15 e 30 quando exposto ao Sol, tendo o cuidado de o aplicar 30 minutos antes do início da exposição e o reaplicar de 2/2 horas, a seguir ao banho e sempre que haja transpiração excessiva. 6. Aplicar o protector solar em todas as áreas expostas, incluindo lábios, orelhas,mãos e pés. 7. Não esquecer que a exposição é maior quando existem superfícies reflectoras (por ex. areia, água e neve). 8. Evitar ao máximo a exposição solar até aos 18 anos em geral, e nos primeiros 12 meses em particular. 9. Se o tempo estiver nublado, ter particular cuidado, pois a ausência de sensação de calor por filtração da radiação infra-vermelha pode fazer aumentar o tempo de exposição à radiação UV não filtrada. 10. Evitar o bronzeamento com lâmpadas artificiais. 488 Rev Port Clin Geral 2003;19:485-90

QUADRO III RECOMENDAÇÕES PARA O DIAGNÓSTICO PRECOCE DE CANCRO DA PELE EM DOENTES DE BAIXO RISCO Organização Recomendações American Academy of Dermatology Auto-exame regular da pele American Medical Association Auto-exame mensal da pele American Cancer Society Dos 20 aos 39 anos - Exame completo da pele de três em três anos 40 anos ou mais - Exame anual completo da pele U. S. Preventive Services Task Force Falta de evidência científica para recomendar quer exame de pele de rotina por médicos de família quer auto-exame da pele Canadian Task Force on Falta de evidência científica para recomendar quer exame de pele de rotina Preventive Health Care por médico quer auto-exame da pele QUADRO IV DESCRIÇÃO DO MÉTODO ABCD PARA DETECÇÃO DE MELANOMA A - Assimetria B - Bordo C - Cor D - Diâmetro A assimetria é sugestiva de melanoma se, ao dividir a lesão em duas, as metades não são idênticas. É sugestivo de melanoma se os bordos são irregulares ou mal definidos. A variação da cor é sugestiva de melanoma se existir mais de uma sombra de pigmento. É sugestivo de melanoma um diâmetro maior que 6 mm. QUADRO V LISTA DOS SETE CRITÉRIOS Sinais Major*: 1. Alteração no tamanho 2. Alteração da forma 3. Alteração na cor Sinais Minor**: 1. Inflamação 2. Ulceração ou hemorragia 3. Alterações sensoriais 4. Diâmetro maior ou igual a 7 mm *Um ou mais sinais major: referenciar rapidamente para biópsia ** 3 ou 4 sinais minor Considerar referenciação para dermatologista Fonte: Whited JD, Grichnik JM. Does this patient have a mole or a melanoma? JAMA 1998; 279:696-701. existem dados convincentes que provem o benefício de programas de rastreio generalizado 15. Para além disso, a capacidade de identificação de lesões potencialmente malignas varia com o treino do médico 16. Enquanto que a sensibilidade e especificidade de um exame de pele total para rastreio de cancro efectuado por um dermatologista alcança valores de 94 e 98% respectivamente, estes valores parecem ser signficativamente menores quando o exame é efectuado por outros médicos 16. Não havendo riscos sérios decorrentes de um exame completo da pele por rastreio, este poderá, porém, conduzir a tratamentos e biópsias adicionais desnecessários em lesões de carácter benigno, com o consequente aumento dos custos 17. As recomendações para o rastreio dependem do grau de risco do doente. Para os doentes de alto risco (por ex. história familiar de melanoma em parente de primeiro grau ou antecedentes pessoais de cancro de pele) a Canadian Task Force Preventive Health Care e a United States Preventive Services Task Force recomendam a referenciação a um dermatologista para exame de rastreio e monitorização das lesões 18. Nos restantes doentes não há unanimidade nas recomendações. No Quadro III, apresentamos as recomendações de Rev Port Clin Geral 2003;19:485-90 489

diversas organizações internacionais relativas aos doentes de baixo risco 18. A aplicação clínica da mnemónica internacional ABCD (Quadro IV) pode melhorar a detecção de lesões suspeitas 19, com uma sensibilidade de 92 a 100% e especificidade de 98% para a detecção de melanoma 20. Poderá ser adicionalmente aplicada uma lista de sete critérios (Quadro V), cuja sensibilidade e especificidade rondam, respectivamente, 79 a 100% e 30 a 37%. CONCLUSÕES EDITORIAIS As medidas mais eficazes na prevenção do cancro da pele são, provavelmente, a evitação da exposição às radiações UV e, quando tal não é possível, a adopção de atitudes protectoras adequadas. Os profissionais de saúde poderão desempenhar um papel importante no aspecto educacional, bem como na detecção precoce de lesões suspeitas a requerer tratamento adequado. REFERÊNCIAS EDITORIAIS BIBLIOGRÁFICAS 1. Sociedade Portuguesa de Dermatologia e Venereologia. O Cancro da Pele. Lisboa: Sociedade Portuguesa de Dermatologia e Venereologia. Disponível em: URL: http://www.dermo.pt/detalhes/?det=66 2. Division of Cancer Prevention and Control. Skin Cancer: preventing America s Most Common Cancer. Atlanta: Centers for Disease Control and Prevention; 2003. Disponível em: URL: http:// www.cdc.gov/cancer/nscpep/skinpdfs/skin- FS2003.pdf 3. World Health Organization. Intersun: The Global UV Project. (n.l.): WHO; 2002. Disponível em: URL: http://www.who.int/peh-uv/ [Acedido em 13/10/03]. 4. Chapman MS. Sunscreens: The Importance of UVA Protection. (n.l.): Medscape Portals; 2002. Disponível em: URL: http://www.who.int/pehuv/ 5. Ichihashi M, Ueda M, Budiyanto A, Bito T, Oka M, Fukunaga M, Tsuru K, Horikawa T. UVinduced skin damage. Toxicology. 2003; 189(1-2):21-39. 6. Skin Cancer Foundation. SPF and UV Explained. (n.l.): The Skin Cancer Foundation. Disponível em: URL: http://www.skincancer.org/ prevention/ spf.php/ [Acedido em 08/10/03]. 7. Jerant AF, Johnson JT, Sheridan CD, Caffrey TJ. Early Detection and Treatment of Skin Cancer. Am Fam Physician. 2000; 62:357-74. 8. Stasko T. Is Slop a Failure? The Current Status of Photoprotection. (n.l.): Medscape Portals; 2001. Disponível em: URL: http://www.medscape.com/viewarticle/418874. [Acedido em 13/10/03]. 9. National Cancer Institute. Prevention of Skin Cancer. (n.l.): National Cancer Institute; 2003. Disponível em: URL: http://cancer.gov/cancerinfo/pdq/prevention/skin/healthprofessional/ 10. Vainio H, Miller AB, Bianchini F. An International evaluation of the cancer-preventive potential of sunscreens. Int J Cancer. 2000; 88: 838- -42. 11. Martin Memorial Health Systems. El Cáncer de la Piel Los Protectores Solares. (n.l.): Martin Memorial Health Systems; 2003. Disponível em URL: http://www.mmhs.com/clinical/adult/spanish/skin/screens.htm. 12. Kurtzweil P. Seven Steps to Safer Sunning. (n.l.): U. S. Food And Drug Administration; 1997. Disponível em: URL: http://www.fda.gov/fdac/ features/596_7sun.html/ 13. Humphreys TR. Skin Cancer: Recognition and Management. Clin Cornerstone 2001;4:23-32. 14. Balch CM. Cutaneous melanoma. Philadelphia: Lippincott, 1992:165-87. 15. Koh HK, Geller AC. Public health interventions for melanoma. Prevention, early detection, and education. Hematol Oncol Clin North Am 1998;12:903-28. 16. Whited JD, Grichnik JM. Does this patient have a mole or a melanoma? JAMA 1998;279:696- -701. 17. U.S. Preventive Services Task Force. Screening for Skin Cancer: Recommendations and Rationale. Am Fam Physician. 2002; 65:1623-6. Disponível em http://www.aafp.org/afp/ 20020415/ us.html 18. Zoorob R, Anderson R, Cefalu C, Siadni M. Cancer Screening Guidelines. Am Fam Physician. 2001; 63: 1101-12. 19. Friedman RJ, Rigel DS, Kopf AW. Early detection of malignant melanoma: the role of physician examination and self-examination of the skin. CA Cancer J Clin 1985; 35:130-51. 20. Katsambas A, Nicolaidou E. Cutaneous malignant melanoma and sun exposure. Recent developments in epidemiology. Arch Dermatol 1996;132: 444-50. 490 Rev Port Clin Geral 2003;19:485-90