CENTRO HISTÓRICO EMBRAER Entrevista: Eustáquio Pereira de Oliveira São José dos Campos SP Abril de 2011 Apresentação e Formação Acadêmica Meu nome é Eustáquio, estou com sessenta anos, nasci em Minas Gerais, Vespasiano, Minas Gerais, é uma cidade que está próxima de Belo Horizonte, faz parte da Grande BH. Sou casado, tenho três filhos, casei em 74. Moro aqui em São José desde 71, quando eu iniciei aqui na empresa, e moro no bairro Bosque dos Eucaliptos, e eu me considero uma pessoa calma, tranqüila, bem posta, eu vejo que eu tenho pautado a minha vida em fazer as coisas com bastante firmeza, talvez isso possa ser considerado como uma falha, que eu não me arrisco muito, eu procuro fazer as coisas dentro de uma visão com um certo grau de certeza, eu sei que isso tem um lado bom e, às vezes, nem tanto, mas eu sou feliz com isso, sou feliz por isso. Ingresso na Embraer Eu vim para São José em 1971, em junho de 71, quando o CTA (Centro Técnico Aeroespacial) começou a trabalhar no projeto IPD-6504, vários empregados locados lá em Lagoa Santa onde tem a unidade, Rio de Janeiro... Então, várias pessoas vieram para somar a quem já estava no CTA para tocar esse projeto e aí vieram várias pessoas conhecidas, inclusive meu irmão veio para cá e, quando criou a Embraer, várias pessoas continuaram na cidade, continuaram na Embraer, e outras voltaram para o seu local de trabalho. Aí o meu irmão, em 71, me convidou para vir conhecer a cidade e, talvez, até trabalhar aqui e assim eu o fiz... Aproveitei um período de férias e vim aqui na Embraer conhecer e fui convidado, incentivado a trabalhar eu tinha, como eu disse, várias pessoas conhecidas trabalhando e me apresentaram o Ge Domingos que era um tipo chefe de sessão na época, na produção e aí então eu achei 1
interessante..., aí eu voltei, pedi minhas contas de onde eu trabalhava e vim... dia 16 de julho foi o primeiro dia de trabalho aqui na empresa. Não senti tanto, como eu disse, tinha várias pessoas com que a gente já convivia, isso facilitou bastante. O dia em que eu comecei a trabalhar me levaram lá no CTA no X-20 onde a gente estaria fazendo as atividades e na época a gente estava finalizando os Ensaios do Urupema (EMB 400 Urupema) que é um planador e eu participei praticamente do fechamento dos ensaios e, em seguida, passamos para o agrícola e, posteriormente, o Bandeirante (EMB 110 Bandeirante), uma seqüência assim bem rápida desses Ensaios, tanto do Ipanema (EMB 200 Ipanema) quanto do Urupema já estavam em andamento. E, com certeza, foi uma surpresa muito grande, eu não tinha contato muito de perto de uma aeronave, principalmente de uma estrutura de uma aeronave, eu tinha vinte anos de idade, não conhecia nada, a única coisa que eu tinha era muita vontade de conhecer, de crescer na vida e foi uma oportunidade única que eu tive e posso dizer que eu aproveitei o máximo dela, apesar de todas as diversidades das atividades que até então eu conhecia, eu fazia, e aquelas outras que eu estaria me envolvendo. Bandeirante Eu comecei a trabalhar na Embraer com o Bandeirante (EMB 110 Bandeirante) já com modificações com relação ao projeto inicial e eu tive o privilégio de trabalhar falando de Ensaios desde o início, os ensaios do Bandeirante, os ensaios táticos foram feitos lá no X-20. Em 73, nós viemos aqui para a (unidade) Faria Lima e fizemos o primeiro ensaio de vibração, que foi feito no (hangar) F-51, e nesse período já estava sendo levantado os dados para uma possível instalação de laboratórios de Ensaios estruturais na Faria Lima, e logo que foi finalizado os ensaios de vibração, veio a necessidade de fazer os ensaios de fadiga do Bandeirante, e o ensaio de fadiga estava previsto para ser feito no CTA (Centro Técnico Aeroespacial) também, mas nesse tempo se tomou a decisão de construir um hangar para que os ensaios fossem feitos na Faria Lima, e aí foi construído o hangar que é o F-45 onde fizemos ensaios até o início da década de 90... final da década de 90, no início da década de 2000 nós 2
finalizamos alguns ensaios que tinha ainda ocorrendo aqui e fomos para Eugênio de Melo. Então, o ensaio do Bandeirante, nós fizemos todos os ensaios táticos lá no CTA, ensaio de vibração no hangar improvisado, aqui na Faria Lima, e os ensaios de fadiga foram feitos lá no F-45, e os ensaios de fadiga, nós só fizemos de uma asa e nós tivemos a fuselagem e a outra asa como reação e, talvez para vocês que não saibam, aquele avião que nós temos na entrada (da Embraer) é o avião que foi feito o ensaio de fadiga. Quando eu ingressei na empresa não existia a sessão de Ensaios, quem comandava os ensaios era a Engenharia que estava locada na diretoria do Engenheiro Guido (Pessotti). As pessoas que trabalhavam diretamente com isso eram as pessoas de produção, então, quando eu fui contratado eu fui contratado na produção como chapeador, mas nunca trabalhei como chapeador, desde o primeiro dia eu comecei a trabalhar com ensaios. Eu não me lembro exatamente a data que foi criada a sessão na época, hoje seria a gerência de Ensaios, e essa sessão foi criada e o Gerveu Monte foi o chefe de sessão e aí então eu fui transferido para a Diretoria Técnica, e mais alguns outros funcionários, que já tinham sido admitidos posterior à minha entrada aqui na empresa, e nesse período que nós trabalhávamos lá no CTA os ensaios eram montados lá, mas a fabricação dos dispositivos eram feitos aqui na Embraer e tínhamos algumas pessoas que já estavam trabalhando aqui, usando o espaço de produção da serralheria lá no (hangar) F- 30 onde fabricamos os dispositivos ainda remanescentes para finalizar os ensaios estáticos e também começamos a fazer os dispositivos para possibilitar os ensaios de vibração, que foram feitos no (hangar) F-51. E, a partir do momento que eu cheguei aqui na empresa para fazer os ensaios de vibração, aí não mais eu voltei a atuar nos ensaios no CTA, que já estavam bem no finalzinho, estava praticamente fechando, e ficamos no F-51 fazendo os ensaios e quando... Eu tinha dito anteriormente que estava em negociação a construção do hangar de ensaios aqui na Faria Lima, inclusive a primeira ideia que se teve era transformar o F-51 em um hangar de ensaios e, basicamente, a gente tem o piso estrutural, diferente do piso de outros hangares, mas as decisões superiores concluíram que seria melhor construir um prédio novo visto que o (F-)51 atendia, mas teria que fazer muitas reformas e aí foi definido a área onde hoje é o F-45 e, então, o hangar foi construído e começamos ali a trabalhar. 3
Lá no F-45 começaram os trabalhos de montagem da linha Piper, por algum tempo e, posteriormente, foi transferido para o (hangar) F-60, na medida em que os ensaios foram tomando volume e a empresa crescendo, nós tivemos ensaios de Tucano (EMB 312 Tucano) acontecendo no F-45, ensaio do Xingu (EMB 121 Xingu), ensaio do Brasília (EMB 120 Brasilia) e (ERJ)145. Trajetória na Embraer No final da década de 90, com a entrada do (EMBRAER) 170 e, posteriormente, do (EMBRAER) 190, a necessidade de ensaiar esses dois aviões, esses dois programas, o (hangar) F-45 não comportava pelas dimensões, então viu-se a necessidade de construir um outro hangar e várias oportunidades apareceram de construir um hangar. Foram levantadas algumas áreas possíveis, aqui mesmo, na Faria Lima, tivemos duas áreas que foram trabalhadas para fazer, mas já tínhamos o problema do espaço e aí já tinha dado início a algumas atividades lá (na unidade) em Galvão Peixoto, existiu a possibilidade de Gavião Peixoto, onde fizemos um rankeamento que mostrava ser a melhor opção, mas nas decisões da diretoria, ele viu melhor ficarmos por aqui e fomos para (unidade) Eugênio de Melo. Eugênio de Melo era a fábrica da Engesa, eu me lembro que fiz parte de uma comissão que foi visitar a área para ver a possibilidade de aproveitar parte de um hangar existente, para transformar num laboratório de Ensaios. Vimos, com algumas dificuldades, pela disposição da estrutura que há lá, mas fomos convencidos de que era possível fazer modificações e a empresa resolveu então reformar o hangar transformando em laboratório e, em 2001, nós fomos para lá. Quando saímos daqui nós ainda tínhamos um ensaio do (ERJ) 145 acontecendo, estava finalizando o Ensaio de fadiga e fomos para lá para iniciar os Ensaio de estática do (EMBRAER) 170. Ensaios em Voo Quando eu comecei na empresa foi muito bom, meus vinte anos de idade, porque a maioria das pessoas que trabalhavam não eram muito diferentes, principalmente a parte de engenharia, então foi um desenvolvimento em conjunto e as pessoas que trabalhavam em Ensaios, o responsável pelo 4
ensaio, tinha um pouco mais de idade que eu, eu acho que não tinha ninguém com trinta anos, vinte e cinco, vinte e seis anos, e todo mundo com experiência zero, ou a grande maioria, pessoas que tinham sido graduados, então tudo era novidade. Na área de Ensaios a gente tinha uma grande facilidade em ensaiar quase tudo, independente se era um Ensaio específico do avião, mas você poderia ensaiar uma solução que você queria desenvolver para possibilitar você fazer o ensaio. Então, um determinado tipo de aço, coisa assim, você não necessariamente ficaria somente por cálculo, você conseguiria ver na prática aquilo funcionando e isso realmente foi um grande diferencial na minha vida, porque eu tive oportunidade para trabalhar com pessoas com muita inteligência, pessoas muito sábias que não tinham nenhum orgulho em dizer que estavam num patamar acima, porque na parte de aviação estava todo mundo começando e a gente pôde trabalhar junto, com vários deles e auxiliando naquilo que eles mentalizavam para tornar aquilo prático. E aí então, quando montamos o laboratório aqui na Faria Lima, trouxemos vários conceitos do laboratório do CTA (Centro Técnico Aeroespacial), o X-20, mas desenvolvemos muitas coisas aqui também e na época nós não tínhamos grupos distintos para atividades distintas, nós fazíamos quase tudo, então você participava de uma maneira geral e todas as atividades do Ensaio, mesmo aquelas coisas mais específicas de outras áreas. Isso é muito diferente nos dias de hoje, a empresa cresceu, muita coisa melhorou não há dúvida alguma, e nem poderia ser como foi no passado porque pelo volume de trabalho que se tem não daria nem para você pensar como para você fazer, como foi feito, se trabalhava com um programa, hoje nós temos vários programas ao mesmo tempo. Então, no laboratório hoje nós temos uma pessoal que só trabalha com materiais, tem um pessoal só de execução, temos um pessoal de engenharia, um pessoal que trabalha só com montagem e fabricação, onde a gente está lotado... Então, você tem uma sequência das atividades, então você praticamente só fica naquela atividade, mas ainda assim eu vejo a parte de ensaios com um diferencial muito grande em relação à empresa como um todo, porque você tem oportunidade de trabalhar com todos os programas e estruturalmente você trabalha com toda a estrutura, se você pensar em termos de produção, você tem uma área que só faz a asa, uma que só faz flap, tem um que junta as partes, quer dizer, até chegar o avião 5
preparado para voo ele passou por várias etapas, por várias pessoas diferentes, até mesmo para quem desenvolve...engenharias, você tem engenharia estrutural, engenharia de sistema, e a área de Ensaios você envolve tudo isso, inclusive até mesmo a parte de Defesa, que hoje está separada totalmente, mas ainda continuamos a trabalhar com os aviões de Defesa e o KC (KC-390) está caminhando para a mesma finalidade de trabalho do pessoal, isso para mim faz uma diferença muito grande. Embraer e Futuro Tem um ditado que diz que o futuro a Deus pertence, eu acredito nisso, mas eu creio que a empresa vai continuar a crescer e nós já olhamos aí momentos de grande dúvida, de grandes preocupações, e ela conseguiu passar por isso. Eu vejo que a direção da empresa tem tido um cuidado muito grande para não deixar que a situação chegue a um nível de perigo tão quanto chegou no passado, e é uma coisa que tem sido trabalhada e depende de cada um, de nós mesmos, para que nós tenhamos um sucesso tão bom quanto o sucesso que temos vivido nos dias de hoje. A empresa tem projetos, tem crédito, e eu acredito que o futuro será muito melhor do que tem sido. Ninguém vai viver o amanhã sem viver hoje, o ontem foi importante, mas o mais importante é hoje, ninguém tem o amanhã se não tiver o dia de hoje. O mundo mudou, as pessoas mudaram e precisamos nos preparar cada vez mais, já foi o tempo onde você conseguia assinar seu nome e você faria diferente, hoje já não comporta mais isso. Então, aqueles jovens que estão acessando a empresa, principalmente na área de produção, onde a pessoa entra e já tem um bom salário, as preocupações geralmente são o bemestar momentâneo, tem que se preparar, tem que estudar, estudar, acreditar, aproveitar as oportunidades, olhar as pessoas com mais tempo, as pessoas que tem mais experiência e tentar absorver tudo o que for possível porque experiência é só tempo e tempo você não faz, ele acontece. 6