Tratamento da crise hipertensiva



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Transcrição:

AGOSTINHO TAVARES, OSVALDO KOHLMANN Jr. Por definição, as crises hipertensivas são divididas em emergências e urgências hipertensivas. As emergências hipertensivas são aquelas situações onde o rápido abaixamento da pressão arterial se faz necessário, embora não necessariamente para valores normais. Exemplos dessas situações são encefalopatia hipertensiva, hemorragia intracraniana, angina instável, infarto agudo do miocárdio, falência aguda do ventrículo esquerdo com edema agudo dos pulmões, aneurisma dissecante da aorta, ou eclâmpsia. Nas urgências hipertensivas estão incluídas a hipertensão acelerada e a maligna. Somente pressão arterial elevada sem dano progressivo dos órgãos-alvo não é considerada crise hipertensiva. As drogas de uso parenteral para as emergências hipertensivas estão listadas nesta revisão. As urgências hipertensivas podem ser tratadas com drogas de uso oral. Embora a nifedipina de uso sublingual esteja sendo extensivamente usada no tratamento das urgências hipertensivas, os graves efeitos colaterais e a incapacidade de manejá-los fazem com a nifedipina não seja recomendável para essa finalidade. Palavras-chave: crises hipertensivas, tratamento. HiperAtivo 1998;2:120-5 Escola Paulista de Medicina UNIFESP Endereço para correspondência: Rua Botucatu, 740 CEP 04023-062 São Paulo SP EMERGÊNCIAS E URGÊNCIAS EM HIPERTENSÃO O termo crise hipertensiva corresponde a uma variedade de situações clínicas, que diferem entre si pela severidade dos níveis pressóricos e pela necessidade de se reduzir mais ou menos rapidamente a pressão arterial. Assim, crise hipertensiva é arbitrariamente definida como qualquer elevação da pressão arterial diastólica acima de 120 mmhg acompanhada de sintomas a ela relacionados. Segundo o The Joint National Committee Fifth Report (1), as crises hipertensivas são classificadas em emergências hipertensivas, quando há agudamente lesão de um órgão-alvo, e urgências hipertensivas, quando não houver danos agudos aos órgãos-alvo. As situações clínicas de emergência hipertensiva compreendem encefalopatia hipertensiva, hemorragia intracraniana, falência aguda do ventrículo esquerdo com edema agudo do pulmão, aneurisma dissecante da aorta, eclâmpsia ou hipertensão severa da gravidez, angina instável e infarto agudo do miocárdio. A urgência hipertensiva reserva-se às situações de hipertensão acelerada ou maligna. Vale lembrar, no entanto, que não raras vezes a hipertensão maligna vem acompanhada de uma das situações emergenciais listadas anteriormente. Sendo assim, cabe ao médico a perspicácia e o bom senso em definir a situação clínica, pois dela depende a estratégia do tratamento. Não devemos confundir com crise hipertensiva aquelas situações onde o paciente se encontra com níveis tensionais diastólicos elevados, isto é, iguais ou até mesmo acima de 120 mmhg, e sem queixas ou com uma simples cefaléia. Essa situação é freqüentemente vista em todos os ambulatórios especializados, prontos-atendimentos e prontos-socorros do país e não merece internação ou tratamento mais intensivo. Lembramos que, na maioria das vezes, a cefaléia não está relacionada com a hipertensão e que o estresse e o desconforto causado pela dor fazem com que a pressão arterial aumente ainda mais. Aqui, a melhor conduta é o exame físico completo, com o objetivo de afastar qualquer possibilidade de situação emergencial, e o exame de fundoscopia, que revela a presença ou não de exsudatos, hemorragias e/ou papiledema bilaterais, o que caracteriza a malignização da hipertensão arterial. Afastadas essas possibilidades, a cefaléia deve ser tratada com analgésicos e uma receita com hipotensores deve ser fornecida. 120 HiperAtivo, Vol 5, N o 2, Abril/Junho de 1998

Os sintomas que acompanham as emergências são relacionados aos órgãos que estão em falência devida à hipertensão. Ao contrário, os sintomas que se manifestam na hipertensão maligna são muito mais variados e dependem do tempo e da gravidade em que o paciente se encontra. O que mais freqüentemente vemos em nosso serviço é cefaléia occipital, alterações visuais, especialmente a turvação ou borramento visual, tonturas ou vertigem, dor abdominal, emagrecimento, fadiga e inapetência, náuseas e vômitos, proteinúria, discreta hematúria e variável grau de perda da função renal. É de consenso geral que as emergências hipertensivas requerem tratamento intensivo no sentido de se reduzir a pressão arterial, não necessariamente para os valores normais, o mais rápido possível, com a finalidade de se impedir a progressão da lesão do órgão-alvo e proteger a vida (1, 2). Ao contrário, a urgência hipertensiva pode ter seus níveis pressóricos reduzidos à normalidade num período de 24 horas (1). TERAPIA INICIAL Em qualquer situação de emergência hipertensiva, não mais que poucos minutos devem ser tomados para se admitir o paciente numa unidade de terapia intensiva, ter bom acesso venoso, estabelecer monitorização permanente da pressão arterial e baixar os níveis tensionais o mais rápido possível com drogas parenterais (Tabela I). mecanismos de auto-regulação (3, 4). Quando a pressão sanguínea diminui, ocorre vasodilatação, e quando a pressão aumenta, ocorre vasoconstrição, de tal modo que o fluxo sanguíneo permanece constante numa larga variação da pressão arterial. Assim, para indivíduos normotensos, o fluxo sanguíneo cerebral permanece constante entre pressões médias de 60 mmhg ou 70 mmhg a 150 mmhg. O mecanismo de auto-regulação é provavelmente miogênico, ativado por pressorreceptores localizados nas células musculares lisas dos vasos, embora haja evidências de que alterações metabólicas em resposta à hipoxia também possam modular o processo de autoregulação (5). Enquanto indivíduos com circulação normal podem tolerar rápidas quedas da pressão arterial para níveis hipotensores, pacientes com hipertensão arterial crônica, com doença cerebrovascular e pacientes idosos tendem a piorar os mecanismos normais de auto-regulação e desviam a curva para a direita. Esse desvio faz o fluxo sanguíneo cair criticamente no cérebro, no coração e nos rins em faixas de pressão arterial mais elevadas (Figura 1). Almeida e colaboradores (4) demonstraram que a redução gradativa da pressão arterial, durante 45 minutos, de hipertensos severos para valores ao redor de 140/ 90 mmhg determina queda de 44,7 + 6,8% da função renal às custas de uma redução de 41,6 + 8,3% no fluxo plasmático renal. O mesmo não aconteceu quando os autores reduziram a pressão arterial para os mesmos níveis em hipertensos moderados, demonstrando o grau de desajuste da auto-regulação Tabela I. Tratamento das crises hipertensivas medicamentos de uso parenteral. Medicamento Dosagem Início de ação Duração Nitroprussiato de sódio 0,25-10 µg/kg infusão IV Instantâneo 1-2 minutos Nitroglicerina 5-100 µg infusão IV 2-5 minutos 3-5 minutos Diazóxido 50-150 mg bolo IV 1-2 minutos 6-12 horas 15-30 mg/min infusão IV Hidralazina 10-20 mg bolo IV 10 minutos 3-8 horas 10-40 mg IM 20-30 minutos Enalaprilato* 0,625-1,25 mg IV 15 minutos 6 horas Fentolamina 5-15 mg IV 1-2 minutos 3-10 minutos Labetalol* 20-80 mg bolo IV 5-10 minutos 3-6 horas 2 mg/min infusão IV IV= intravenoso; IM = intramuscular * Não disponível no Brasil. Importante para a compreensão e a segurança do tratamento nas crises hipertensivas é o conceito de auto-regulação, a qual protege os órgãos da isquemia quando a pressão arterial cai abruptamente. O coração, os rins e o cérebro possuem renal em hipertensos severos (Figura 2). Gostaríamos de enfatizar que esses doentes não estavam em situações de emergência ou urgência, mas tinham apenas níveis pressóricos elevados cronicamente. HiperAtivo, Vol 5, N o 2, Abril/Junho de 1998 121

Figura 1. Curvas de auto-regulação do fluxo sanguíneo cerebral em 14 pessoas. As 8 primeiras curvas, de cima para baixo, referem-se a pacientes hipertensos, enquanto as últimas 6 referem-se a normotensos. Verificar o desvio das curvas dos pacientes hipertensos para a direita. Cada círculo representa a pressão arterial habitual de cada indivíduo. (Extraído da referência 3.) Assim, nas primeiras horas, é prudente reduzir os níveis diastólicos para 100 mmhg a 110 mm Hg, ou 25% da pressão arterial média (6), e progressivamente, dependendo das condições clínicas, levar os níveis tensionais em direção a 140/90 mmhg. O nitroprussiato de sódio é a droga de escolha pela ação extremamente rápida e facilidade de manejo (6-8). A pressão arterial sempre diminui quando a droga é administrada, embora a dose seja variável de indivíduo para indivíduo (8). A dose inicial recomendada é de 0,25 µg/kg/min (1) e o ajuste posterior é determinado pela sensibilidade individual e pela necessidade de se atingir níveis pressóricos desejados. O efeito antihipertensivo do nitroprussiato desaparece dentro de poucos minutos após a interrupção da medicação. Por ser uma droga de uso parenteral e de potente ação hipotensora, é óbvio que seu uso deve ser restrito à unidade de terapia intensiva e com monitorização permanente e contínua da pressão arterial. O nitrato exógeno do nitroprussiato parece agir da mesma maneira que o endógeno fator relaxante derivado do endotélio, o óxido nítrico. Essa droga age, portanto, diretamente na musculatura lisa e promove vasodilatação simultânea nas artérias e veias. A vasodilatação venosa acarreta diminuição do retorno venoso ao coração, reduzindo o débito cardíaco e o volume sistólico, a despeito do aumento na freqüência cardíaca. Já a vasodilatação arterial impede o aumento da resistência periférica esperada pela queda do débito cardíaco. O nitroprussiato redistribui o fluxo sanguíneo para as áreas isquêmicas e não tem efeito sobre o sistema nervoso autônomo ou central. O nitroprussiato de sódio é metabolizado a cianeto por grupos sulfidrílicos nas hemácias e rapidamente transformado em tiocianato no fígado. Se os níveis plasmáticos de tiocianato elevarem-se acima de 10 mg/dl a 12 mg/dl, por período prolongado, a toxicidade pode se manifestar por fadiga, náuseas, desorientação, psicose, ou acidose metabólica. Havendo suspeita de toxicidade, o nitroprussiato deve ser descontinuado e 4 mg a 6 mg de uma solução a 3% de nitrito de sódio deve ser administrada por via endovenosa durante 2 a 4 minutos, seguidos pela infusão de 50 ml de uma solução de tiossulfato de sódio a 25% (8). Embora o nitroprussiato possa aumentar a pressão intracraniana, muitos autores o consideram a melhor terapia para encefalopatia hipertensiva. Os diuréticos não estão indicados nas crises hipertensivas. Após a estabilização da pressão arterial com vasodilatadores, talvez seja lógico o uso de um diurético, uma vez que os vasodilatadores apresentam como efeito colateral a retenção hidrossalina. A escolha de um diurético de alça ou de um tiazídico depende inteiramente da função renal. A Tabela I mostra as principais drogas de uso parenteral usadas no tratamento das emergências e urgências hipertensivas. Das drogas listadas na Tabela II para o uso em crises hipertensivas, administradas por via oral, a nifedipina parece ser a mais popular nos Estados Unidos (8). Administrada por via oral ou sublingual, a nifedipina apresenta efeito hipotensor dentro de 15 minutos, embora não haja suporte racional para o uso da nifedipina sublingual, uma vez que o pico de concentração plasmática e a velocidade do aparecimento do pico são maiores com o uso oral (9). Não obstante, várias outras drogas têm sido recomendadas no manuseio das crises hipertensivas, tais como captopril, clonidina e prazosina. O captopril, em particular, tem demonstrado eficácia no tratamento das crises hipertensivas, provavelmente pelo papel do sistema renina-angiotensina na fisiopatogenia da hipertensão maligna. Tendo o início de ação mais rápido entre os inibidores da enzima conversora, o captopril, em uma única tomada de 150 mg, reduziu para níveis da normalidade a pressão arterial de oito dos doze pacientes com hipertensão arterial maligna tratados por Almeida e colaboradores (10) (Figura 3). O início de ação foi de 15 minutos e o controle da 122 HiperAtivo, Vol 5, N o 2, Abril/Junho de 1998

Figura 2. Na parte superior, as barras indicam a diminuição progressiva da pressão arterial pela infusão de nitroprussiato de sódio. Na parte inferior, as linhas tracejadas indicam o comportamento da função renal (depuração do paraaminoipurato) e as colunas, o fluxo plasmático renal. À esquerda estão representados os pacientes com hipertensão moderada; à direita, os com hipertensão severa. (Extraído da referência 4.) Nitro = nitroprussiato de sódio; Cont = período controle; Rec = período de recuperação; PA = pressão arterial; FPR = fluxo plasmático renal; RFG = ritmo de filtração glomerular. pressão arterial deu-se entre 60 e 90 minutos. Embora seja mais rara a administração oral de hipotensores nas emergências e urgências, essa prática é muito freqüente nos pacientes que têm níveis pressóricos elevados e não se encontram em tais circunstâncias. Igualmente ao já demonstrado com o uso de nitroprussiato (Figura 2), o uso Tabela II. Tratamento das crises hipertensivas medicamentos de uso oral. Medicamento Dosagem Início de ação Duração Captopril 25-100 mg 15 minutos 4-6 horas Nifedipina 5-10 mg 5-15 minutos 3-5 horas Clonidina 0,2 mg inicialmente 30 minutos 6-8 horas 0,1 mg/hora até 0,8 mg Labetalol* 200-400 mg 30 minutos 8-12 horas * Não disponível no Brasil. HiperAtivo, Vol 5, N o 2, Abril/Junho de 1998 123

Figura 3. Valores da pressão arterial média (PAM) em 12 pacientes com hipertensão maligna que receberam captopril (C) ou captopril mais furosemida. (Extraído da referência 9.) indiscriminado de hipotensores orais, de ação rápida, pode precipitar rápido e não desejado decréscimo na pressão arterial para níveis hipotensores. O fenômeno da primeira tomada com prazosina é bastante conhecido. O efeito hipotensor da nifedipina tem resultado em infarto do miocárdio (11) e acidente vascular cerebral (12). A rápida e intensa redução da pressão arterial pode ser danosa para pacientes que apresentam doença aterosclerótica avançada, particularmente nas circulações cerebral e miocárdica. Antes de administrar qualquer droga por via oral, o médico deve considerar que ainda não dispomos de antídotos para se elevar a pressão arterial sob tais circunstâncias. TERAPIA CRÔNICA Após o paciente encontrar-se estável e em condições de receber drogas hipotensoras por via oral, mesmo que não tenha os níveis tensionais na faixa da normalidade, iniciamos imediatamente a terapia crônica concomitante à inicial. Isso reduz tanto o risco de intoxicação pelo nitroprussiato de sódio como o tempo na unidade de terapia intensiva e no próprio hospital. À medida que vamos tendo sucesso com a terapia crônica, a infusão do nitroprussiato pode ser descontinuada progressivamente, desde que os níveis pressóricos diastólicos não ultrapassem níveis de 120 mmhg, ou que o paciente não apresente sinal ou sintoma de crise hipertensiva. 124 HiperAtivo, Vol 5, N o 2, Abril/Junho de 1998

Treatment of hypertensive crises AGOSTINHO TAVARES, OSVALDO KOHLMANN Jr. By definition, hypertensive crises are divided into hypertensive emergencies and hypertensive urgencies. Hypertensive emergencies are those situations that require immediate blood pressure reduction, not necessarily to normal ranges. Examples include hypertensive encephalopathy, intracranial hemorrhage, unstable angina pectoris, acute myocardial infarction, acute left ventricular failure with pulmonary edema, dissecting aortic aneurysm, or eclampsia. Hypertensive urgencies include accelerated and malignant hypertension. Elevated blood pressure alone, in the absence of a progressive target organ damage is not considered as a hypertensive crisis. Parenteral drugs for hypertensive emergencies are listed in this review. Hypertensive urgencies can be managed with oral doses of drugs with relatively fast onset of action. Although sublingual administration of fast-acting nifedipine has been widely used for this purpose, several serious adverse effects have been reported with its use, and the inability to control the rate or degree of fall in blood pressure makes this agent not recommended. Key words: hypertensive crises, treatment. HiperAtivo 1998;2:120-5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. The Fifth Report of the Joint National Committee on Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Pressure (JNC V). Arch Intern Med 1993;153:154-208. 2. Mann SJ, Atlas SA. Hypertensive emergencies. In: Laragh JH, Brenner BM, eds. Hypertension: Pathophysiology, Diagnosis, and Management. 2 nd ed. New York: Raven Press, 1995;pp.3009-22. 3. Johansson B, Strandgaard S, Lassen NA. The hypertensive breakthrough of auto-regulation of cerebral blood flow with forced vasodilatation, flow increase, and blood-brainbarrier damage. Circ Res 1974;34-35(suppl 1):167-74. 4. Almeida JB, Saragoça MA, Tavares A, et al. Severe hypertension induces disturbances of renal autoregulation. Hypertension 1992;19(suppl II):II-279-II-283. 5. Kontos HA. Regulation of the cerebral circulation. Ann Rev Physiol 1981;43:397-407. 6. Calhoun DA, Oparil S. Treatment of hypertensive crisis. N Engl J Med 1990;25:1177-83. 7. Kaplan NM. Hypertensive crises. In: Kaplan NM, ed. Clinical Hypertension. 6 th ed. Baltimore: Williams & Wilkins, 1994;pp.281-97. 8. Gifford Jr RW. Management of hypertensive crises. JAMA 1991;266:829-35. 9. McAllister Jr RG. Kinetics and dynamics of nifedipine after oral and sublingual doses. Am J Med 1986;81(suppl 6A):2-5. 10. Almeida FA, Ribeiro AB, Marson O, et al. Tratamento da crise hipertensiva com captopril. Arq Bras Cardiol 1981;37:425-9. 11. O Mailia JJ, Sander GE, Giles TD. Nifedipine-associated myocardial ischemia or infarction in the treatment of hypertensive urgencies. Ann Intern Med 1987;107:185-6. 12. Schwartz M, Naschitz JE, Yeshurn D, et al. Oral nifedipine in the treatment of hypertensive urgency: cerebrovascular accident following a single dose. Arch Intern Med 1990;150:686-7. HiperAtivo, Vol 5, N o 2, Abril/Junho de 1998 125