A Insolvência Culposa e a

Documentos relacionados
Insolvência intencional ou fortuita

INCIDENTE DE QUALIFICAÇÃO (Arts. 185 a 191 do CIRE)

Newsletter Dinis Lucas e Almeida Santos Sociedade de advogados RL

Responsabilidade Civil

Lei nº. 109/91 de 17 de Agosto Lei da criminalidade informática

Responsabilidade Civil

Responsabilidade Civil para Órgãos de Administração e Fiscalização

Breves notas sobre o regime do artigo 35.º do Código das Sociedades Comerciais

C N INTERPRETAÇÃO TÉCNICA Nº 2. Assunto: RESERVA FISCAL PARA INVESTIMENTO Cumprimento das obrigações contabilísticas I. QUESTÃO

Novas regras para insolvência avançam em Maio, mas falta regular actividade dos gestores.

REGULAMENTO DO REGISTO COMERCIAL. Portaria 657-A/2006, de 29 de Junho

ESCOLA DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DO MINIJO CURSO DE DIREITO CADEIRA OPCIONAL RECURSOS E PROCESSOS ESPECIAIS ANO LECTIVO º ANO 2º SEMESTRE

O S I S T E M A D E R E C U P E R A Ç Ã O D E E M P R E S A S P O R V I A E X T R A J U D I C I A L

Processo de arbitragem. Sentença

FICHA DOUTRINÁRIA. Diploma: CIVA Artigo: 18º

PROPOSTA DE LEI N.º 151/IX APROVA O REGIME DA RESPONSABILIDADE PENAL DAS PESSOAS COLECTIVAS. Exposição de motivos

Programação e Execução das Operações de Reabilitação Urbana

POC 13 - NORMAS DE CONSOLIDAÇÃO DE CONTAS

Ordem dos Advogados Largo São Domingos 14-1º, Lisboa Tel.: Fax:

SUSPENSÃO DO PROCESSO NO DIREITO PENAL TRIBUTÁRIO PORTUGUÊS

REGULAMENTO DA COMISSÃO DE AUDITORIA BANCO ESPÍRITO SANTO, S. A. Artigo 1.º Composição

POPULAR SEGUROS- COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.

COMPETÊNCIAS E FUNCIONAMENTO DOS ÓRGÃOS AUTÁRQUICOS

A comunicação prévia no RJUE. Fernanda Paula Oliveira

Processo n.º 656/2014

P.º R. P. 301/04 DSJ-CT

EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE

DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E BAIXA DE SOCIEDADE

FICHA DOUTRINÁRIA. Diploma: CIVA. Artigo: 9º; 18º. Assunto:

Grupo Parlamentar PROJECTO DE LEI N.º 163/X PROÍBE AS DISCRIMINAÇÕES NO EXERCÍCIO DE DIREITOS POR MOTIVOS BASEADOS NA DEFICIÊNCIA.

REGULAMENTO DE TAXAS E PROPINAS APLICÁVEIS AOS ESTUDOS E CURSOS DA UNIVERSIDADE DE AVEIRO

REGULAMENTO DE SÓCIOS (Artigo 4º dos Estatutos) ADMISSÃO DE SÓCIO EFECTIVO

Processo de arbitragem. Sentença

PEDIDO DE FISCALIZAÇÃO DA CONSTITUCIONALIDADE

Processos apensos T-6/92 e T-52/92. Andreas Hans Reinarz contra Comissão das Comunidades Europeias

REGULAMENTO DE ATRIBUIÇÃO DE APOIOS PELO MUNÍCIPIO DE MORA. Nota justificativa

ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA

Regulamento Financeiro do Partido Social Democrata (Aprovado na Comissão Política Nacional de )

SUMÁRIO: Regula a atribuição de incentivos à contratação de jovens à procura do primeiro emprego e de desempregados de longa duração.

TEXTO FINAL DOS PROJECTOS DE LEI N.ºS 486/X e 509/X ALTERAÇÕES AO REGIME JURÍDICO DO DIVÓRCIO. Artigo 1.º Alteração ao Código Civil

Falência e Dissolução / Liquidação

Política de Divulgação de Informações Relevantes e Preservação de Sigilo

Portaria n.º 129/2009, de 30 de Janeiro, Regulamenta o Programa Estágios Profissionais (JusNet 211/2009)

PROJECTO DE REGULAMENTO MUNICIPAL DE ATRIBUIÇÃO DE APOIOS FINANCEIROS E NÃO FINANCEIROS. Nota justificativa

Anexo ao Aviso do Banco de Portugal nº 5/2010

(a) O julgador violou o art. 9º CC, na medida em que cingiu a interpretação

PRESIDÊNCIA DO CONSELHO DE MINISTROS. Proposta de Lei n.º 140/XII. Exposição de Motivos

Recomendação n.º 8 /B/2004 [art.º 20.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril]

REGIME E TABELA DE EMOLUME TOS DO TRIBU AL DE CO TAS. CAPÍTULO I Disposições Gerais. ARTIGO 1. (Emolumentos e encargos)

REGULAMENTO FINANCEIRO DO CDS/PP

Legislação MINISTÉRIO DAS FINANÇAS

Programa de Formação para Profissionais

Legislação e tributação comercial

REGULAMENTO DO CURSO DE LICENCIATURA EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICO-PRIVADA DA FACULDADE DE DIREITO DE COIMBRA

Regulamento de Associados/as. Art. 1º. (Admissão e Recusa de Associados)

Deliberação Proc. n.º 3-AL/2013 (Ata n.º 79/XIV) Inelegibilidade de cidadãos falidos e insolventes para os órgãos das autarquias locais

Ofício-Circulado 60009, de 21/05/ Direcção de Serviços de Justiça Tributária

RESPONSABILIDADE DOS ATORES POLÍTICOS E PRIVADOS

14/06/2013. Andréa Baêta Santos

A INSOLVÊNCIA DE PESSOAS COLETIVAS

Manual do Revisor Oficial de Contas. Directriz de Revisão/Auditoria 841

ÍNDICE GERAL. PARTE INTRODUTÓRIA O Processo de Insolvência. PARTE I Pressupostos do Processo de Insolvência

SIREVE (SISTEMA DE RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS POR VIA EXTRAJUDICIAL)

Regulamento n.º 1 /2007 BANCO DE CABO VERDE. Auditoria Geral do Mercado de Valores Mobiliários. Auditores dos Organismos de Investimento Colectivo

REGULAMENTO DAS PROVAS ORAIS DE AVALIAÇÃO E AGREGAÇÃO

CONTRATO DE SOCIEDADE DA IMPRESA SOCIEDADE GESTORA DE PARTICIPAÇÕES SOCIAIS, S.A. I Denominação, objecto e sede

Que tipo de trabalhadores se encontra abrangido pelo seguro de acidentes de trabalho por conta de outrem?

TÍTULO VII DA PROVA CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES GERAIS

Trabalhadores Independentes Atualizado em:

Organização e Gestão de Cooperativas ESAPL / IPVC

FICHA DOUTRINÁRIA. Diploma: CIVA. Artigo: 6º; 14º; Decreto-Lei n.º 347/85, de 23/08; Assunto:

Recurso jurisdicional em matéria administrativa. Assunto: Apensação de recurso contencioso. Suspensão da eficácia do acto.

CÓDIGOS REGIME JURÍDICO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO FINANCEIRA TERMOS DE DISPONIBILIZAÇÃO E DE UTILIZAÇÃO

RELATÓRIO. O presente RELATÓRIO é elaborado nos termos do disposto no artigo 155º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas CIRE.

Os privilégios creditórios em especial a sua influência no concurso de credores

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo. Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

REGIME EXTRAORDINÁRIO DE PROTECÇÃO DE DEVEDORES DE CRÉDITO À HABITAÇÃO EM SITUAÇÃO ECONÓMICA MUITO DIFÍCIL

LEGISLAÇÃO CSC PARA CONSULTA NO EXAME

OBSERVATÓRIO DOS DIREITOS HUMANOS

PRESIDÊNCIA DO GOVERNO REGIONAL Resolução do Conselho do Governo n.º 107/2010 de 14 de Julho de 2010

DECRETO N.º 265/XII. A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, o seguinte: Artigo 1.

Copyright Proibida Reprodução.

6. Pronunciamento Técnico CPC 23 Políticas Contábeis, Mudança de Estimativa e Retificação de Erro

Insolvência e restruturação de empresas - Maria do Rosário Epifânio 2015/2016

CÂMARA MUNICIPAL DE MOURA

Processo nº 486/2011 (Autos de Recurso Civil e Laboral) Data: 17 de Julho de ASSUNTO: - Marca - Capacidade distintiva SUMÁ RIO:

LEI ELEITORAL do PARLAMENTO EUROPEU. Lei nº 14/87, de 29 de abril

I - Regime de contabilidade de caixa. 1. Âmbito de aplicação. (artigo 1º do regime)

DIRECTRIZ DE REVISÃO/AUDITORIA 872

REGULAMENTO DE INCENTIVO À CRIAÇÃO DE EMPREGO Iniciativa Emprego Já

GRUPO III ESPELHO DE CORREÇÃO CRITÉRIO GERAL:

ACÓRDÃO Nº 22 / JUN/1ª S/SS

O Contencioso Administrativo

Transcrição:

1

A Insolvência Culposa e a Responsabilidade Civil, Advogado e Administrador Judicial Presidente da Direcção da APAJ

I - Incidente de Qualificação da Insolvência 3 Utilizando o incidente de qualificação da Insolvência, o legislador tentou atingir uma maior e mais eficaz responsabilização dos titulares de empresas e dos administradores de pessoas coletivas no sentido de evitar insolvências fraudulentas e culposas (Ponto 40 do Preâmbulo do CIRE*). Antes de 2012 Incidente processual típico obrigatório que visava julgar e, eventualmente, punir os responsáveis pela insolvência culposa Depois de 2012** Não-obrigatoriedade de abertura do incidente no pressuposto de tornar o processo de insolvência mais simples Artigo 36º, nº1, al. i) * Doravante, todos os artigos referidos sem a indicação expressa do respetivo diploma, consideram-se referentes ao CIRE. ** Lei 16/2012, de 20 de Abril

Regime: regulado pelo disposto nos artigos 185º a 191º; 4 Objetivo: apreciar a conduta do devedor e/ou administradores, em virtude da existência de culpa, pela insolvência da sociedade ou pessoa singular; Carácter: pleno (artigo 188º) ou limitado (artigo 191º); Tipos A insolvência pode ser considerada como culposa ou fortuita artigo 185º

II - Insolvência Culposa 5 ARTIGO 186º Insolvência Culposa 1 A insolvência é culposa quando a situação tiver sido criada ou agravada em consequência da atuação, dolosa ou com culpa grave, do devedor, ou dos seus administradores, de direito ou de facto, nos três anos anteriores ao início do processo de insolvência.

A. Pressupostos da Insolvência Culposa 1º Pressuposto: A acção ou omissão do administrador de direito ou de facto 6 [ Parece possível a inclusão de comportamentos que se consubstanciam em ações ou omissões, tanto que na prática é possível encontrar diversos comportamentos omissivos que poderão levar a empresa a uma situação de insolvência. Ac. TRC, de 28-05-2013 ( ) a lei reporta-se claramente à atuação (ou omissão) dos administradores de direito ou de facto. ]

Ac. TRC, de 14-04-2015 Ao reportar-se tanto aos administradores de direito como aos administradores de facto, ( ) o legislador não visa excluir da qualificação da insolvência os administradores de direito que não exerçam as suas funções de facto, mas estender também tal qualificação aos administradores de facto, isto é, àqueles que praticam atos de administração sem que se encontrem legalmente nomeados como titulares do cargo que exercem. 7

2º Pressuposto: Prévia declaração de insolvência por sentença transitada em julgado 3º Pressuposto: A produção ou agravamento do estado de insolvência 8 [ Ac. TRC de 07-02-2012 ( ) A ilicitude do comportamento do devedor ou dos seus administradores reparte-se por elementos objetivos e subjetivos. O elemento objetivo afere a ilicitude da atuação do devedor ou dos administradores pela sua correspondência com o estado de insolvência do primeiro: a conduta é ilícita se dela resulta a criação ou agravamento da situação de insolvência. ]

4º Pressuposto: O estabelecimento de um nexo de causalidade entre a ação ou omissão do administrador do devedor e a criação ou agravamento do estado de insolvência Artigo 186º, nº 2 (e nº3 segundo alguns). 9 [Ac. TRP de 27-02-2014 Ao contrário do que acontece com o nº 3 do artigo. 186º, o nº 2 do artigo 186º não presume apenas a existência de culpa, mas também a existência de nexo de causalidade entre a actuação dos administradores do devedor e a criação ou agravamento do estado de insolvência. ] Em sentido contrário.

[Ac. TRP de 10-02-2012 A mera alegação de alguma das situações descritas nos nºs 2 e 3 do artigo 186º do CIRE não é suficiente para a qualificação da insolvência como culposa, exigindo-se, ainda, a alegação e prova do nexo de causalidade entre a atuação ali presumida e a situação da insolvência nos termos previstos no nº1 do mesmo artigo. ] 10

5º Pressuposto: A existência de dolo ou culpa grave na prática daquela ação ou omissão Não tendo o legislador feito qualquer distinção, será relevante quer o dolo direto, o dolo necessário e o dolo eventual; Exclui-se o conceito de culpa leve. [ Consiste numa atuação dolosa quando aquele conhece da situação da sociedade e assume condutas que mostram que quer ou que se conforma com a insolvência ou o seu agravamento (vide RAMOS, Maria Elisabete, A insolvência da sociedade e a responsabilização dos administradores no Ordenamento Jurídico Português, op. cit., pp 23-24);] 11

[ Ac. TRC, de 07-02-2012 III A qualificação da insolvência como culposa reclama, portanto, uma conduta ilícita e culposa do devedor ou dos seus administradores. ( ) VI A censurabilidade da conduta é uma apreciação de desvalor que resulta do reconhecimento de que o devedor, ou os seus administradores, nas circunstâncias concretas em que atuaram, podiam ter conformado a sua conduta de molde a evitar a queda do primeiro na situação de insolvência ou agravamento do estado correspondente. ] 12

13 6º Pressuposto: Ter a ação ou omissão sido praticada dentro dos três anos anteriores ao início do processo de insolvência (período extensível até à sentença de declaração de insolvência artigo 4º, nº2)

B. ARTIGO 186º, nº 2 Insolvência Culposa Presunções inilidíveis 2 Considera-se sempre culposa a insolvência do devedor que não seja uma pessoa singular quando os seus administradores, de direito ou de facto, tenham: a) Destruído, danificado, inutilizado, ocultado, ou feito desaparecer, no todo ou em parte considerável, o património do devedor; b) Criado ou agravado artificialmente passivos ou prejuízos, ou reduzido lucros, causando, nomeadamente, a celebração pelo devedor de negócios ruinosos em seu proveito ou no de pessoas com eles especialmente relacionadas; c) Comprado mercadorias a crédito, revendendo-as ou entregando-as em pagamento por preço sensivelmente inferior ao corrente, antes de satisfeita a obrigação; d) Disposto dos bens do devedor em proveito pessoal ou de terceiros; 14

e) Exercido, a coberto da personalidade colectiva da empresa, se for o caso, uma atividade em proveito pessoal ou de terceiros e em prejuízo da empresa; f) Feito do crédito ou dos bens do devedor uso contrário ao interesse deste, em proveito pessoal ou de terceiros, designadamente para favorecer outra empresa na qual tenham interesse direto ou indireto; g) Prosseguido, no seu interesse pessoal ou de terceiro, uma exploração deficitária, não obstante saberem ou deverem saber que esta conduziria com grande probabilidade a uma situação de insolvência; 15

h) Incumprido em termos substanciais a obrigação de manter contabilidade organizada, mantido uma contabilidade fictícia ou uma dupla contabilidade ou praticado irregularidade com prejuízo relevante para a compreensão da situação patrimonial e financeira do devedor; 16 i) Incumprido, de forma reiterada, os seus deveres de apresentação e de colaboração até à data da elaboração do parecer referido no n.º 2 do artigo 188.º

No que se prende com as sociedades, no nº 2, o legislador enumerou taxativamente os casos que qualificou como insolvência culposa e que constituem verdadeiras presunções iuris et de iure. 17 [ Ac. TRC, de 07-02-2012 IX Trata-se, nitidamente, de uma presunção absoluta, inilidível ( ) dado que impõe um regime, não admitindo prova em contrário (artigo 350º, nº 2, in fine, do CC) ]

Presunção inilidível, tanto ao nível das condutas ilícitas e culposas do administrador como também, no nexo causal de violação de determinados deveres no que à insolvência diz respeito; 18 Nomeadamente, o dever de lealdade (artigo 64º, nº1, al. b) do CSC), traduzido no aproveitamento indevido que os administradores e/ou terceiros tiraram de bens ou recursos da insolvência (vide alínea b), d), e), f) e g) do nº 2 do artigo 186º).

[ Ac. TRC, de 28-05-2013 19 I Demonstrados factos que integrem uma das diversas situações taxativamente previstas nas várias alíneas do artigo 186º, nº 2, do CIRE, a insolvência é culposa, não admitindo prova do contrário, ainda que se verifique a concorrência ou superveniência de elementos fortuitos que concorreram juntamente com a atuação dolosa ou culposa dos administradores para a insolvência.]

C. ARTIGO 186º, nº 3 Insolvência Culposa Presunções ilidíveis 20 3 Presume-se a existência de culpa grave quando os administradores, de direito ou de facto, do devedor que não seja uma pessoa singular, tenham incumprido: a) o dever de requerer a declaração de insolvência; b) A obrigação de elaborar as contas anuais, no prazo legal, de submete-las à devida fiscalização ou de as depositar na conservatória do registo comercial.

Aqui, o legislador procede à enumeração taxativa de duas situações em que se presume, iuris tantum, a existência de culpa grave. 21 Presunção meramente relativa, ilidível, uma vez que se limita a inverter o ónus da prova, podendo ser afastada mediante prova em contrário (artigo 350º, nº 2, 1º parte, do CC).

III Insolvência Fortuita 22 O legislador não estabeleceu uma definição legal de insolvência fortuita; No entanto, definiu positivamente a insolvência culposa no nº1 do artigo 186º, concluindo-se que será havida como fortuita toda a insolvência que não for culposa; Consubstancia-se nas condutas que prefiguram negligência ou culpa leve; Tomada de decisões mais arriscadas.

IV Incidente Pleno de Qualificação da Insolvência 23 A. TRAMITAÇÃO Artigo 188º, nº1: Inicia-se a requerimento:» Do Administrador de Insolvência ou qualquer interessado» Até 15 dias após a realização da Assembleia de apreciação do relatório» Em requerimento autuado por apenso, por escrito e de forma fundamentada» Indicação das pessoas que devem ser afetadas por tal qualificação

Juiz toma conhecimento dos factos alegados e, se o considerar oportuno, declara aberto o incidente de qualificação da insolvência, nos 10 dias subsequentes 24 Despacho irrecorrível, publicado de imediato no portal CITIUS nº 2 do artigo 188º

B. Incidente aplicável às pessoas singulares insolventes e seus administradores, com as especificidades previstas no artigo 186º, nº4: 25 1. Onde a isso não se opuser a diversidade das situações; 2. A pessoa singular insolvente não titular de empresa (cfr. art. 18º, nº2), não está obrigada a apresentar-se à insolvência, apesar de: a) mera omissão ou retardamento na apresentação b) Mesmo que agrave a sua situação económica

C. EXCEPÇÃO prevista no artigo 187º, para os casos de declaração de insolvência em processo anterior: 26 O incidente só é aberto se: a) Não o tiver sido no processo anterior, em consequência de aprovação de Plano de Pagamentos aos credores b) Se for provado que a situação de insolvência não se manteve ininterruptamente desde a data da sentença de declaração anterior.

D. Trâmites legais após a declaração do Juiz de que se encontra aberto o incidente Pleno de Qualificação:188º/3 27 1. Elaboração de parecer pelo Administrador de Insolvência; 2. Prazo: 20 dias ( se um mais longo não for fixado pelo Juiz); 3. Formula uma proposta, identificando as pessoas visadas (afectadas);

O parecer e as alegações vão com vista ao Ministério Público que se deverá pronunciar num prazo de 10 dias 188º/4 28 Se o Administrador e o M.P. propuserem a qualificação como fortuita, o Juiz tem a faculdade de proferir de imediato decisão nesse sentido Insuscetível de recurso 188º/5

Ac. TRC, de 30-06-2015 29 I O argumento a contrario sensu que se pode retirar do nº 5 do artigo 188º do CIRE é que não é possível decisão imediata nos casos de qualificação da insolvência culposa, ainda que o parecer do Administrador da Insolvência e do MP sejam ambos nesse sentido.

Se o Juiz não exercer a faculdade conferida no número anterior (artigo 188º, nº5 AI + MP propõem qualificação da insolvência como fortuita, aceite pelo Juiz), há lugar a: 30» notificação do devedor e citação pessoal dos sujeitos afetados pela qualificação da insolvência como culposa» Oposição Prazo: 15 dias» Respostas às oposições (pelo Administrador, pelo M.P. ou qualquer interessado) Prazo: 10 dias subsequentes ao prazo anterior 188º/ 6 e 7

Aplicam-se os artigos 132º a 139º relativos à reclamação de créditos, com as necessárias adaptações:» Artigo 132º - Autuação das impugnações e respostas» Artigo 133º - Exame das reclamações e dos documentos de escrituração do insolvente» Artigo 134º - Meios de prova, cópias e dispensa de notificação» Artigo 135º - Parecer da Comissão de Credores» Artigo 136º - Saneamento do Processo (inaplicabilidade da tentativa de conciliação)» Artigo 137º - Diligências instrutórias» Artigo 138º - Designação de dia para a audiência» Artigo 139º - Audiência 31

Constituição de Advogado No incidente de qualificação, a constituição de Advogado é facultativa, mas necessária ou aconselhável, pelo menos no Julgamento, mesmo que o AJ seja também Advogado, porque não pode exercer em simultâneo, no mesmo processo, as duas funções: 1) Porque é representante de uma parte/a MI, que tem um interesse: a satisfação dos créditos da MI e dos credores; 2) Porque pode ser ouvido no Julgamento; 3) Porque o AJ deve ter o direito de fazer perguntas ao insolvente, aos afectados ou às testemunhas no Julgamento e só o pode ou deve fazer através de Advogado (e não directamente ou por intermédio do Juiz, como alguma jurisprudência entende)! 32

V Incidente Limitado de Qualificação da Insolvência 33 Aplicável nos casos em que:» o Juiz conclui que o património do devedor não é presumivelmente suficiente para a satisfação das custas do processo e das dívidas da MI artigo 39º/1» é encerrado o processo de insolvência por insuficiência da massa, sendo aberto o incidente de qualificação Artigo 232º/5

Rege-se pelo regime do incidente pleno com as seguintes especificidades (artigo 191º):» alegações do AI ou qualquer outro interessado para efeito de qualificação da insolvência como culposa apresentadas no prazo de 45 dias, a contar da data de declaração de insolvência ou da data de decisão de encerramento» o prazo para o AI apresentar o seu parecer, se o incidente for suscitado por outro interessado, é de 15 dias 34 Nesse caso, também fica o devedor insolvente obrigado ao dever de apresentação e de colaboração, nos termos do disposto no artigo 83º

[ Ac. TRC, de 30-06-2015 35 III Por força do artigo 83º, nºs 3 e 4 do CIRE, a obrigação de prestar informações/colaboração é extensível a qualquer pessoa que tenha desempenhado cargo de administrador/gerente nos dois anos anteriores ao início do processo de insolvência. ]

» Os documentos da escrituração do insolvente devem ser patenteados pelo próprio, a fim de poderem ser examinados por qualquer interessado al. b), do nº 1 do artigo 191º 36» No incidente limitado não se aplica o disposto no artigo 189º, nº 2, al. d) face à inexistência ou insuficiência de bens para pagar qualquer crédito, inclusive as custas do processo, ou seja, não há lugar à perda de créditos sobre a insolvência ou sobre a massa (porque é óbvio que estes também não são pagos).

Conceito de Interessados para efeitos dos artigos 188º e 191º: 37 1) Credores 2) todos aqueles com legitimidade para apresentar o pedido de declaração da insolvência, nos termos do disposto nos artigos 19º e 20º

VI Os efeitos ou consequências da sentença de Qualificação da Insolvência como Culposa Artigo 189, nº 2 38 Os efeitos são fixados na própria sentença que qualifica a insolvência como culposa O Juiz deve estabelecer o respectivo prazo de duração, atendendo ao grau de culpa das pessoas visadas

Antes de 2012: ARTIGO 189º Sentença de Qualificação 39 2 Na sentença que qualifique a insolvência como culposa, o juiz deve: a) Identificar as pessoas afectadas pela qualificação; b) Decretar a inabilitação das pessoas afectadas por um período de 2 a 10 anos; - (Norma declarada inconstitucional) c) Declarar essas pessoas inibidas para o exercício do comércio durante um período de 2 a 10 anos, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa; d) Determinar a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre massa insolvente detidos pelas pessoas afectadas pela qualificação e a sua condenação na restituição dos bens ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos.

Depois de 2012: ARTIGO 189º Sentença de qualificação 2 Na sentença que qualifique a insolvência como culposa, o juiz deve: a) Identificar as pessoas, nomeadamente administradores, de direito ou de facto, técnicos oficiais de contas e revisores oficiais de contas, afectadas pela qualificação, fixando, sendo o caso, o respectivo grau de culpa; b) Decretar a inibição das pessoas afectadas para administrarem patrimónios de terceiros, por um período de 2 a 10 anos; c) Declarar essas pessoas inibidas para o exercício do comércio durante um período de 2 a 10 anos, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada a actividade económica, empresa pública ou cooperativa; d) Determinar a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos pelas pessoas afectadas pela qualificação e a sua condenação na restituição dos bens ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos; e) Condenar as pessoas afectadas a indemnizarem os credores do devedor declarado insolvente, no montante dos créditos não satisfeitos, até às forças dos respectivos patrimónios, sendo solidária tal responsabilidade entre todos os afectados. 40

[ A al. b) do nº 2 do artigo 189º gerou muita discussão na doutrina e na jurisprudência O Tribunal Constitucional decretou a inconstitucionalidade desta norma, com força obrigatória geral no Ac. TC nº 173/2009, de 2 de Abril de 2009, fundando no facto de o normativo em assunto violar os artigos 18º, nº 2 e 26º, nº 1 da CRP, bem como o princípio da proporcionalidade: 41 ( )pena que fere o sujeito sobre quem recai com uma verdadeira capitis diminutio ( ). Consequência que, tendo também presente a globalidade dos efeitos da insolvência, e em particular a inibição para o exercício do comércio, não pode deixar de ser vista como inadequada e excessiva. ]

1º Efeito - Artigo 189º, nº 2, al. b) - Inibição para a administrar património de terceiros (2 10 anos) - alteração 42» Solução mais congruente com os objectivos que o CIRE visa prosseguir» Preocupação do legislador relativamente à tutela do interesse público» Função repressora e simultaneamente preventiva dos comportamentos que podem levar à insolvência

2º Efeito - Artigo 189º, nº 2, al. c) - Inibição para o exercício do comércio e para a ocupação de cargos em órgãos sociais [» Período de 2 a 10 anos» Deve-se atender ao grau de culpa e ao comportamento do próprio devedor» A pessoa fica impedida da prática de todo e qualquer exercício do comércio, por si ou por interposta pessoa» O CIRE não aponta nenhuma solução para o incumprimento desta imposição legal» A inibição pode também conduzir à proibição de ocupação de certos cargos para representação de órgãos de sociedades comerciais ou civis, associações, fundações privadas de actividade económica, empresas públicas e cooperativas. ] 43

3º Efeito - Artigo 189º, nº 2, al. d) - Perda dos créditos» Consequência específica de carácter patrimonial que impende sobre os sujeitos afectados e que visa proporcionar uma melhor satisfação dos créditos do insolvente» Constitui uma penalização pela sua responsabilidade na insolvência» Caso já se tenha verificado o pagamento desses créditos e ordenado na própria sentença a sua restituição, o AI não deve recorrer à resolução em benefício da MI nos termos do artigo 120º ss, cabendo-lhe apenas a cobrança de tais créditos.» Deve ser estabelecido um limite temporal 3 anos que antecederam o início do processo. 44

4º Efeito - Artigo 189º, nº 2, al. e) - Indemnização dos credores (Novidade)» A responsabilidade é limitada ao valor do passivo a descoberto e não ao montante dos danos efectivamente causados aos credores. Assim, os credores apenas deverão ser indemnizados no montante dos créditos não satisfeitos, não podendo a indemnização ser superior a esse montante» A responsabilidade consagrada é solidária entre as pessoas afectadas pela qualificação, [apesar de existir uma repartição interna dessa responsabilidade, nos termos da al. a) do nº 2 do artigo 189º, que impõe ao Juiz a fixação do grau de culpa das pessoas afectadas.] 45

» A responsabilidade abarca todos os créditos que ficaram por satisfazer, ficando assim abrangidos os créditos sobre a massa, créditos sobre a insolvência, créditos comuns, garantidos e até subordinados. 46» O quantum indemnizatório deve ser fixado pelo Juiz. Quando tal não afigure possível, deverá este fixar os critérios a utilizar na sua quantificação nº 4 do artigo 189º

» Se o montante desses danos não puder ser averiguado, mormente, por não haver elementos para fixar a quantidade, ou seja, se não for possível fixar o valor exato dos danos a indemnizar, tal não deve excluir a efectivação do direito à indemnização; 47» Sendo de deixar para liquidação, através da dedução do incidente a que alude o artigo 358º do CPC, o apuramento do seu montante;

[ Ac. TRC de 27-05-2015 II A lei nº 16/2012 de 20/04 (com entrada em vigor em 21/5/2012), que alterou o CIRE, aditou ao art. 189º, nº 2 a alínea e), com o que criou um novo efeito da qualificação da insolvência ao estabelecer os pressupostos para a constituição do direito de indemnização a favor dos credores. Tratando-se de uma lei sobre o modo de constituição do direito de indemnização (alterando e ampliando a fattispecie constitutiva), não se aplica aos factos anteriores. (a 2012).] 48

Outros efeitos: 49 5. Preclusão da exoneração do passivo restante artigo 238º, nº1, al. c), e) e f), artigo 243º, nº 1, al. b) e c) e artigo 246º, nº 1 6. Preclusão da administração da massa pelo devedor Artigo 228º, nº 1, al. c)

7. Efeitos Penais [» São tipificados como crime de insolvência dolosa os actos que levam a uma diminuição do património do devedor ou a uma diminuição fictícia do seu ativo, à criação ou agravamento artificial dos seus prejuízos e compra a crédito para venda por preço inferior ao corrente, com o objectivo de retardar a situação de insolvência» Qualquer dos 4 tipos legais de crime se considera praticado, no caso de o devedor ser pessoa colectiva, por quem tiver exercido de facto a respectiva gestão ou direcção e tenha praticado algum dos factos previstos nos tipos em causa. ] 50

Artigo 227º do CP Insolvência Dolosa É um tipo de crime em que o devedor, visando intencionalmente prejudicar os credores, pratica alguns dos factos elencados no nº1 do artigo. Pode abranger pessoas singulares, administradores, gerentes, etc. e abrange o devedor ou terceiros. 51 Artigo 227º A do CP Frustração de Créditos Abrange aqueles que após ser proferida sentença condenatória exequível, destruam, danifiquem, ocultem ( ) o património para frustrar o seu pagamento Artigo 228º do CP Insolvência Negligente Agravação ou criação do Estado de Insolvência com prejuízo para os credores, de forma negligente

Artigo 229º do CP Favorecimento de Credores Uma vez proferida a sentença de insolvência ou conhecida a sua iminência, beneficiam-se credores em detrimento de outros 52 Artigo 229º-A Agravação Normativo que agrava as penas previstas para os 4 tipos de crime referenciados em 1/3, se deles resultarem frustrados créditos de natureza laboral, em sede de processo executivo ou de insolvência. A sentença proferida no penso de qualificação, quer aponte no sentido de insolvência culposa ou fortuita, não é vinculativa para efeitos da decisão do processo penal Art. 185º

VI Responsabilidade Civil 53 I. Responsabilidade Civil antes de 2012» A responsabilidade civil indemnizatória apenas surgia indirectamente, por força do incidente de qualificação da insolvência» Efeitos práticos muito limitados»recorria-se às regras gerais do CC e CSComerciais»Responsabilidade ad hoc semelhanças com a responsabilidade civil extracontratual prevista no artigo 483º do CC

» Assim, a imputação dos prejuízos aos administradores passava, em última instância, pelos artigos 71º a 84º do CSC. 54 Deste modo, no âmbito da responsabilidade civil dos gerentes/administradores de facto, apenas tínhamos: Responsabilidade Civil Contratual para com a sociedade artigo 72º, nº 1do CSC Responsabilidade Civil Extracontratual para com os sócios, os credores sociais e terceiros artigos 78º, nº1 e 79º, nº1 do CSC e artigo 483º ss. do CC

Pressupostos da Responsabilidade Civil: 1. Facto omissão do dever de diligência de um gestor criterioso e ordenado artigo 64º, nº1, al. a) do CSC; 55 2. Culpa presunção de culpa artigo 72º, nº1 do CSC e artigos 798º e 799º do CC; 3. Ilicitude os administradores devem demonstrar que actuaram diligentemente, tendo a gestão sido norteada por deveres de cuidado e competência técnica artigo 64º do CSC;

4. Dano prejuízos causados à sociedade, aos sócios, aos credores sociais ou a terceiros; 56 5. Nexo Causalidade praticada no exercício da sua actividade de gestão, por causa ela, ou ainda em representação da sociedade, causando directamente danos.

II. Responsabilidade Civil depois de 2012 (Lei 16/2012 de 20/04) 57 A. Artigo 17º-D, nº11 (no PER) em acção autónoma O devedor, bem como os seus administradores de direito ou de facto, no caso de aquele ser uma pessoa colectiva, são solidária e civilmente responsáveis pelos prejuízos causados aos seus credores em virtude de falta ou incorreção das comunicações ou informações a estes prestadas correndo autonomamente ao presente processo (de revitalização) a acção intentada para apurar as aludidas responsabilidades.

B. Responsabilidade (automática) na insolvência culposa 58 Condenar as pessoas afectadas a indemnizarem os credores do devedor declarado insolvente no montante dos créditos não satisfeitos, até às forças dos respectivos patrimónios, sendo solidária tal responsabilidade entre todos os afectados. Artigo 189º, nº 2, al. e)

[ Quando o Juiz, na sentença que qualifica a insolvência como culposa, condena as pessoas afectadas a indemnizar os credores do devedor 59 Trata-se de uma causa de responsabilidade civil delitual, com pendor sancionatório. Recuperou-se substancialmente a solução que fora acolhida nos artigos 126º-A e 126º-B do CPEREF, com algumas divergências ]

Características da Responsabilidade Civil dos afectados 1. Responsabilidade solidária (com eventual diferente grau de culpa dos vários afectados) 60 [- Na perspectiva do ressarcimento da MI e, consequentemente, dos credores. Contudo, nos termos da al. a) do nº 2 do art. 189º, impõe ao Juiz a fixação do grau de culpa das pessoas afectadas Determina a repartição interna dessa responsabilidade, com a eventual aplicação das regras do direito de regresso, entre os responsáveis com diferentes graus de culpa! ]

2. Responsabilidade limitada a) Ao valor dos créditos não satisfeitos b) ao valor do património (de cada um dos afectados) 61 3. Responsabilidade por todos os créditos [ Se a responsabilidade abarca todos os créditos que ficaram por satisfazer, ficam também abrangidos os créditos sobre a massa e os créditos sobre a insolvência, seja eles comuns, garantidos ou subordinados.]

4. Responsabilidade não aplicável a factos anteriores a 20/04/2012 Efeito prático é ainda pouco visível, uma vez que apenas agora começam a surgir os primeiros casos. 62 [ Ac. TRC de 27-05-2015 II A lei nº 16/2012 de 20/04 (com entrada em vigor em 21/5/2012), que alterou o CIRE, aditou ao art. 189º, nº 2 a alínea e), com o que criou um novo efeito da qualificação da insolvência ao estabelecer os pressupostos para a constituição do direito de indemnização a favor dos credores. Tratando-se de uma lei sobre o modo de constituição do direito de indemnização (alterando e ampliando a fattispecie constitutiva), não se aplica aos factos anteriores. ]

5. Responsabilidade automática com a insolvência culposa [ A condenação segundo a al. e) do artigo 189º é um verdadeiro imperativo do Tribunal, uma vez que qualificada a insolvência como culposa, não poderá deixar de responsabilizar o culpado 63 AC TC nº 280/2015 Esses efeitos jurídicos são cumulativos e automáticos, como claramente decorre do proémio do nº 2 do artigo 189º, pelo que, uma vez proferida tal decisão, não pode o Juiz deixar de aplicar todas essas medidas. ]

6. Responsabilidade quantificada em Julgamento complexo 64 Havendo lugar à condenação, poderemos ter um julgamento complexo, que além de apreciar as questões inerentes não só à qualificação da insolvência, mas terá ainda de apreciar a responsabilidade civil dos administradores e à liquidação dos danos a indemnizar artigo 189º, nº 2, al. e), 1º parte.

7. Responsabilidade quantificada em execução de sentença (art. 189º, nº2, al. e), 2º parte) 65 O Juiz pode remeter para execução de sentença a discussão sobre os critérios necessários à quantificação da indemnização a satisfazer pelo afectado com a qualificação da insolvência, nos termos do nº4 do artigo 189º, que são os seguintes: a) O valor global dos créditos reconhecidos e não satisfeitos de que são titulares os credores da devedora insolvente (passivo);

b) O valor dos bens vendidos no processo de insolvência (activo) c) O valor real dos bens da insolvente indevidamente alienados em prejuízo dos credores (a considerar, segundo certa jurisprudência); d) O grau e intensidade da culpa do afectado com a qualificação da insolvência; e) A circuntância da actuação do sócio-gerente da insolvente ter, apenas, agravado a situação de insolvência daquela, ou se tenha traduzido num facto criador/gerador da própria insolvência da devedora; 66

f) Só nos 3 anos anteriores ao início do processo de insolvência (artigo 186º, nº 1, in fine) 67 Artigo 4º, nº 2 do CIRE [ 2 - Todos os prazos que neste código têm como termo final o início do processo de insolvência abrangem igualmente o período compreendido entre esta data e a da declaração de insolvência Isto significa que, quando a relevância de certo acto ou evento, para determinados efeitos, depende da sua prática ou ocorrência até à data do início do processo, esse prazo é estendido até à prolação da sentença ] Luís A. Fernandes e João Labareda, in Código da insolvência e da recuperação de empresas anotado, Vol. I

Quantum indemnizatório (resumo) [ Assim, no que respeita ao quantum indemnizatório, atento o disposto no nº4 do preceito, fica aberta a porta à possibilidade do Juiz ter em consideração factores que designadamente em razão das circunstâncias do processo, devam mitigar o recurso a meras operações aritméticas de passivo menos o resultado do activo, nesta senda podendo/devendo ser ponderados o grau de ilicitude e culpa manifestadas nos factos determinantes da qualificação de insolvência, e, em princípio, só dos últimos 3 anos anteriores ao processo de insolvência! ] 68

C. Legitimidade extraordinária e exclusiva do administrador da insolvência, na pendência da insolvência, para a acção social de responsabilidade (artigo 82º, nº3) 69 1) O insolvente fica imediatamente privado, por si ou pelos seus administradores, dos poderes de administração e de disposição, nos termos dos nºs 1 e 4 do artigo 81º do CIRE e do artigo 75º do CSC ilegitimidade da sociedade

2) Legitimidade Activa Nas acções do artigo 82º, nº 3, o AJ actua em representação da massa insolvente e não em nome próprio, sendo a massa insolvente a titular do interesse na obtenção da indemnização e não o AJ: 70» Neste sentido - a maioria da doutrina e é a nossa modesta opinião!» Em sentido contrário Prof. Elisabete Ramos e Susana Gonçalves

3) Artigo 82º, nº 3 do CIRE O AI tem exclusiva legitimidade para propor e fazer seguir, durante o processo de insolvência: a) as acções de responsabilidade que legalmente couberem: i. Em favor do próprio devedor; ii. Contra, nomeadamente, os administradores, de direito ou de facto, fundadores, membros dos órgão de fiscalização, sócios e associados; iii. Independentemente do acordo do devedor ou dos seus órgãos sociais, sócios, associados ou membros 71

iv. Não dependem de deliberação da Assembleia Geral dos sócios (caso contrário e por regra poderia oporse a uma acção contra o próprio administrador que nomeou! Privando a MI da respectiva indenização com prejuízo dos credores) 72 b) as acções destinadas à indemnização dos prejuízos causados à generalidade dos credores da insolvente pela diminuição do património integrante da massa insolvente, tanto anteriormente como posteriormente à declaração de insolvência;

c) as acções contra os responsáveis legais pelas dívidas do insolvente (cfr. Artigo 6º, nº 1 al. b) e nº 2 do CIRE), que não dependem de deliberação dos seus: 73 i. Sócios ii. Órgãos sociais iii. associados iv. Membros 4) Todas as acções presentes no artigo 82º correm por apenso ao processo de insolvência (artigo 82º, nº 6)

D. Artigo 78º do CSC [ Ilegitimidade dos credores da sociedade - Princípio par conditio creditorum (igualdade entre os credores, de acordo com a sentença de verificação e de graduação de créditos) 74 1) O próprio interesse dos credores, na satisfação dos seus créditos, determina a centralização do poder de reclamar, a favor do devedor, as indemnizações devidas, que irão integrar a massa insolvente; 2) impondo a igualdade entre os vários credores e impossibilitando que algum deles possa obter, por via distinta do processo de insolvência, uma satisfação mais rápida ou completa dos seus créditos;]

3) [ Evitando uma proliferação/multiplicação de acções com o mesmo objecto/fim e com identidade de sujeitos que acarretariam um atraso na satisfação dos credores; 4) Torna incompatível o artigo 82º, nº 3, al. b), do CIRE com o artigo 78º, nº 4 do CSC, prevalecendo a legitimidade especial e exclusiva do AI, por ser uma norma especial em casos de insolvência e com os fundamentos supra referidos; 5) A 1º norma revogaria tacitamente a 2º, além da desactualização desta (falência, massa falida) (artigo 7º, nº 2 CC); ] 75

6) [ Assim, quanto ao destino dos montantes indemnizatórios, o beneficiário directo será a massa insolvente; 7) Os valores integrados na massa devem ser distribuídos pelos credores cujos créditos tenham ficado por satisfazer; 8) Devendo a soma distribuída corresponder à medida dessa insatisfação; 9) Deve respeitar a graduação previamente fixada na sentença de verificação e graduação de créditos. ] 76

Vantagens e Inconvenientes da Responsabilidade Civil Insolvencial 77 Representa uma via alternativa à responsabilidade societária e, como refere Maria Rosário Epifânio, trata-se de uma responsabilidade insolvencial em que: 1. Vantagem Prova mais fácil [ É facilitada a prova dos vários pressuposto constitutivos da responsabilidade civil, bem como a prova em matéria de danos indemnizáveis, cujo montante vai estar dissociado do nexo de causalidade do facto que o gerou;]

2. Inconveniente Limitada aos últimos três anos anteriores aos processo de insolvência [ Ficará circunscrita aos actos praticados nos três anos anteriores ao início do processo, com a salvaguarda do artigo 4º, nº2 do CIRE.] 78 3. Vantagem Responsabilidade Societária Não obstante, admite-se continuar a fazer sentido, em certos casos, a propositura de acções societárias cumulativas em três casos: a) Quando os danos sofridos pelos credores são superiores ao passivo a descoberto;

b) nos casos em que os actos praticados extravasem o limite temporal dos três anos; c) se os danos resultarem de uma actuação com culpa leve, não censurável em termos de qualificação da insolvência 79 4. Inconveniente Caso Julgado Relativamente aos factos que não extravasem a limitação constante do artigo 189º, nº2 al. e) e nº4, fica precludida tal possibilidade, por efeito do caso julgado, quanto a esta matéria 5. Vantagem - A qualificação da insolvência como culposa não é vinculativa nas acções previstas no artigo 82º, nº3.

VI - Bibliografia 80 COSTEIRA, Maria José, A insolvência de Pessoas Colectivas Efeitos no insolvente e na pessoa dos Administradores, Julgar nº 18 2012, Coimbra Editora; EPIFÂNIO, Maria do Rosário, Manual de Direito da Insolvência, 2013, 5º edição; FERNANDES, Luís A. Carvalho, LABAREDA, João, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, Vol.I, 2005, Quid Juris, Sociedade Editora; RAMOS, Maria Elisabete, A insolvência da sociedade e a responsabilização dos administradores no ordenamento jurídico português, Prima@Facie, n.º 7, 2005; SILVA, Fátima Reis, Processo Especial de Revitalização Notas práticas e Jurisprudência recente, Abril 2014, Porto Editora;

Agradecimentos 81 Grato pelo convite da Exma Srª. Bastonária da Ordem dos Advogados, Drª Elina Fraga, e do Instituto de Acesso ao Direito. Grato pela atenção dispensada!