PARTE III APROVEITAMENTOS HIDRÁULICOS



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PARTE III APROVEITAMENTOS HIDRÁULICOS

1. GENERALIDADES...3 2. APROVEITAMENTOS HIDROELÉCTRICOS...3 2.1 CONSTITUIÇÃO...3 2.2 BARRAGENS...4 2.2.1 TIPOS DE BARRAGENS...4 2.2.2 CONDICIONANTES DA SELECÇÃO DO TIPO DE BARRAGENS...7 2.2.2.1 CONSIDERAÇOES GERAIS...7 2.2.2.2 TOPOGRAFIA...7 2.2.2.3 CONDIÇÕES GEOLÓGICAS E GEOTÉCNICAS...8 2.2.2.4 MATERIAIS DISPONÍVEIS NO LOCAL...9 2.2.2.5 EVACUADOR DE CHEIAS. CAUDAL DE DIMENSIONAMENTO E LOCALIZAÇÃO...9 2.2.3 BARRAGENS DE GRAVIDADE...10 2.2.3.1 INTRODUÇÃO...10 2.2.3.2 SOLICITAÇOES...11 2.2.3.3 ESTABILIDADE...17 2.2.3.4 JUNTAS DE CONTRACÇÃO E DE BETONAGEM...20 2.2.4 BARRAGENS DE GRAVIDADE DE BETÃO COMPACTADO...20 2.2.5 BARRAGENS DE CONTRAFORTES...21 2.2.6 BARRAGENS-ABÓBADA...24 2.2.7 BARRAGENS DE ATERRO...28 2.2.7.1 CONDIÇÕES DA APLICAÇÃO - VANTAGENS E DESVANTAGENS...28 2.2.7.2 TIPOS BÁSICOS DE BARRAGENS DE TERRA E DISPOSIÇÕES A ADOPTAR...29 2.2.7.3 TIPOS DE BARRAGENS DE ENROCAMENTO DISPOSIÇÕES A ADOPTAR...31 2.2.7.4 ESTABILIDADE DO ATERRO E DA FUNDAÇÃO DE BARRAGENS DE ATERRO...35 2.2.7.5 LIGAÇÃO DE BARRAGENS DE TERRA A ESTRUTURAS DE BETÃO...36 2.3 DESCARREGADORES...38 2.3.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS...38 2.3.2 CONDICIONAMENTOS PRINCIPAIS...46 2.3.3 TIPOS DE EVACUADORES DE CHEIAS...48 2.3.4 TIPOS DE EVACUADORES DE CHEIAS NAS PEQUENAS BARRAGENS...49 2.3.5 CANAL DE DESCARGA...51 2.4 DESCARGAS DE FUNDO E TOMADA DE ÁGUA...53 2.5 CÂMARAS DE CARGA...56 2.6 BACIAS DE DISSIPAÇÃO...57 3. APROVEITAMENTOS HIDROAGRÍCOLAS...58 2

1. GENERALIDADES Aproveitamentos hidráulicos são todos os aproveitamentos cuja realização se baseia na utilização da água. Podem referir-se: - Aproveitamentos para abastecimento de água; - Aproveitamentos hidroeléctricos; - Aproveitamentos hidroagrícolas; - Aproveitamentos de fins múltiplos. Existem ainda armazenamentos para regularização de caudais, para fins recreativos, para controlo climático, etc. Os aproveitamentos para abastecimento de água, foram estudados com detalhe na disciplina de Hidráulica Aplicada I. Os aproveitamentos hidroeléctricos e os aproveitamentos hidroagrícolas são, em geral aproveitamentos mais vultosos e desenvolvem-se nos pontos seguintes. Os aproveitamentos de fins múltiplos têm, como o próprio nome indica, diversos fins tais como: o abastecimento de água, a produção de energia eléctrica, a rega e actividades recreativas, podendo ser cobertos todos os fins ou apenas alguns deles. Estas diferentes actividades devem ter tomadas de água e derivações independentes. A gestão integrada dos recursos disponíveis deve conciliar os diferentes interesses. Em geral dá-se prioridade aos abastecimentos de água e à rega. 2. APROVEITAMENTOS HIDROELÉCTRICOS 2.1 CONSTITUIÇÃO Os aproveitamentos hidroeléctricos compreendem um conjunto de elementos que permitem utilizar determinado caudal num curso de água, conduzindo-o a grupos turbo-alternadores onde a energia hidráulica correspondente ao desnível entre a tomada de água e a restituição é transformada em energia eléctrica. Um aproveitamento hidroeléctrico é, geralmente, constituído pelas seguintes obras: - Obra de retenção - barragem ou açude que dá origem a um reservatório a céu aberto albufeira. - Órgãos de segurança descarregadores principais ou secundários 3

- Descargas de fundo para esvaziar a albufeira, se necessário; - Tomada de água órgão de ligação entre a albufeira e o circuito hidráulico; - Circuito hidráulico constituído pelo canal de derivação, câmara de carga, conduta(s) forçada(s); - Restituição retorno ao curso de água; - Central constituída pelas turbinas (acopladas a alternadores), comandos e serviços auxiliares. - PT, Subestação e parque de linhas para ligação à rede geral do País. Constituem órgãos complementares: Chaminé de equilíbrio para protecção contra o choque hidráulico; Eclusa de navegação; Eclusa de peixes. 2.2 BARRAGENS 2.2.1 TIPOS DE BARRAGENS Existem diferentes critérios para a classificação de barragens, sendo frequente os que se baseiam na importância, na finalidade principal e nos materiais e tipos de estrutura. No que respeita à sua importância, as barragens podem classificar-se em pequenas e grandes barragens. A Comissão Internacional das Grandes Barragens classifica como grande barragem: - uma barragem com mais de 15 m de altura contada desde o ponto mais baixo da fundação até ao coroamento; - uma barragem com altura entre 10 e 15 m, desde que se verifique uma das seguintes condições: - o desenvolvimento do coroamento é superior a 150 m; - o volume armazenado é maior ou igual a um milhão de m 3 ; - o caudal de ponta de cheia é superior a de 2000 m 3 /s; - existem problemas especiais de fundação; - a barragem é de projecto não convencional. 4

Poderão, assim, considerar-se pequenas barragens as que não cabem na classificação anterior. Tendo em conta a finalidade principal para que foram previstas as barragens podem classificar-se em: barragens para criar albufeiras, barragens de derivação, barragens de detenção barragens de fins múltiplos. As barragens para criar albufeiras visam permitir o armazenamento da água afluente em excesso em épocas húmidas, para ser utilizada em períodos secos. As barragens de derivação destinam-se a criar condições para captar água para canais ou condutas para usos muito diversos como o consumo público, a rega e a produção de energia eléctrica sem criar albufeiras de regularização, são os chamados aproveitamentos a fio de água. As barragens de detenção visam reter grande parte do material sólido afluente ou deter temporariamente as cheias, evacuando um caudal máximo compatível com a capacidade de transporte do leito existente a jusante, e evitando a inundação de determinadas zonas. Estas barragens podem ainda ter estes dois objectivos em simultâneo. Nas barragens de fins múltiplos verifica-se a coexistência de diferentes objectivos, sem que a importância de qualquer deles se sobreponha. Quanto aos materiais e estrutura, as barragens podem classificar-se nos seguintes tipos: Barragens de betão (e menos frequentemente de alvenaria) que podem ser: - de gravidade; - abóbada; - de contrafortes. Barragens de aterro que podem ser: - de terra; - de enrocamento. Algumas barragens têm trechos de betão e de aterro. Nas Figura 1 e 2 dão-se exemplos de perfis transversais de barragens de betão e de aterro. As barragens de gravidade, que são construídas de betão (e menos frequentemente de alvenaria), têm a estabilidade assegurada pelo peso próprio. O seu perfil transversal é aproximadamente triangular, com o paramento de montante vertical ou subvertical. 5

As barragens-abóbada apresentam curvatura para montante com a finalidade de transmitir o efeito da pressão hidrostática à fundação e aos encontros, tirando partido da resistência dos arcos à compressão e permitindo, assim, substancial redução do volume de betão em relação a barragens de gravidade. Barragem de gravidade Barragem de abóbada Barragem de contrafortes Figura 1 Barragens de betão Figura 2 - Barragem de terra perfil transversal As barragens de arco-gravidade são barragens abóbada muito espessas com pequena contribuição do efeito dos arcos. As barragens de contrafortes apresentam uma estrutura contínua a montante, que assegura a estanquidade, suportada a jusante por elementos descontínuos os contrafortes. 6

As barragens de aterro são o tipo mais comum de barragem. A construção do corpo da barragem faz-se utilizando unicamente materiais no estado natural, geralmente explorados próximo do local, sem a adição de materiais aglutinantes e com um mínimo de intervenção humana. As barragens de aterro requerem condições geo1ógicas e geotécnicas de fundação menos exigentes que as das barragens de outros tipos. É assim possível construir barragens de aterro em locais não propícios à construção de outras barragens. Uma barragem de aterro classifica-se como de terra se o seu corpo é constituído em mais de 50% por solo compactado. As barragens de terra podem ser homogéneas ou zonadas. As barragens de enrocamento são constituídas por maciços de materiais granulados (particulados de dimensões variáveis e com permeabilidade global significativa), que asseguram a estabilidade, e por uma zona impermeável. Esta última pode ser constituída por uma cortina sobre o paramento de montante (de betão armado, betão asfáltico, chapa de aço ou outro material impermeável) ou por um núcleo impermeável, mais frequentemente constituído por solo. Uma barragem de aterro é classificada como de enrocamento se mais de 50% do volume do seu corpo for constituído por enrocamento. 2.2.2 CONDICIONANTES DA SELECÇÃO DO TIPO DE BARRAGENS 2.2.2.1 CONSIDERAÇOES GERAIS A escolha do tipo de barragem a implantar num determinado local baseia-se sobretudo em critérios económicos e, em geral, é decidida após a definição preliminar de várias soluções de barragem e a obtenção das respectivas estimativas de custo. É evidente, que projectistas experientes poderão, em certos casos, apontar o tipo de barragem aconselhável, sem se basear na definição de outras soluções. Deve notar-se que a solução mais económica tem de considerar não só a barragem propriamente dita, mas também as obras acessórias, como o evacuador de cheias, descarga de fundo, tomada de água, centrais hidroeléctricas, se existirem, e as obras de desvio provisório durante a construção. Os principais condicionamentos da escolha do tipo de barragem são analisados de seguida. 2.2.2.2 TOPOGRAFIA A topografia do local é um dos factores mais importantes numa primeira escolha do tipo de barragem. 7

Uma barragem alta a construir num vale estreito e rochoso, será provavelmente de betão, com o evacuador de cheias, a descarga de fundo e a tomada de água (ou pelo menos alguns destes órgãos) incorporados na barragem. Uma barragem a construir num vale largo poderá ser de aterro, com o evacuador de cheias independente do corpo da barragem, podendo, porém, ser mais favorável uma solução de barragem de betão, de gravidade ou de contrafortes. A localização do evacuador de cheias é um factor importante para a escolha do tipo de barragem, fortemente condicionado pela topografia do local. 2.2.2.3 CONDIÇÕES GEOLÓGICAS E GEOTÉCNICAS As condições de fundação dependem das características geológicas e geotécnicas das formações ocorrentes. No caso de formações rochosas, terá de ter-se em conta o estado de alteração a fracturação (altitude e espaçamento), a permeabilidade e a deformabilidade; no caso de solos, a permeabilidade, a erodibilidade, a deformabilidade e a resistência mecânica. Para uma dada altura de uma barragem, as condições geotécnicas poderão admitir qualquer tipo de estrutura e, para alturas maiores, implicar a rejeição de alguns tipos. As diferentes formações mais correntemente encontradas para a fundação apresentam os seguintes condicionamentos (segundo o BUREAU OF RECLAMATION 1974): Rocha sã - Devido à elevada resistência mecânica e à dificuldade de percolação e de erosão interna, as fundações de rocha sã poucas limitações oferecem para qualquer tipo de barragem. No entanto, é necessária a remoção da rocha decomposta, sendo frequente em grandes barragens atingir-se uma profundidade de escavação de 10 m. Nas grandes barragens, é em geral necessário injectar as fracturas da rocha. Seixos Fundações de seixos, se compactas, são adequadas para barragens de aterro (terra ou enrocamento) e barragens de gravidade de pequena altura. Precauções têm de ser tomadas relativamente à erosão interna. Siltes e areias finas - Formações de siltes e areias finas podem ser usadas para barragens de gravidade de pequena altura e barragens de terra, podendo pôr problemas nas de enrocamento. As preocupações principais são os assentamentos, a percolação excessiva, a erosão interna da fundação e, no caso de areias pouco compactas em zonas sísmicas, a liquefacção. Argilas - Fundações de argila permitem a adopção de barragens de terra, mas requerem tratamento especial. Dando lugar a consideráveis assentamentos, especialmente se a argila é não consolidada 8

e contém elevada percentagem de humidade, não são adequadas para suportar barragens de betão, nem de enrocamento. Para ilustrar como o tipo de barragem influi na tensão máxima transmitida à fundação THOMAS (1979) indica os valores dessa tensão para barragens de100 m de altura: - Barragem de gravidade: 3 a 4 MPa; - Barragem de contrafortes: 5 a 7 MPa; - Barragem-abóbada: 7 a 10 MPa. 2.2.2.4 MATERIAIS DISPONÍVEIS NO LOCAL Os materiais necessários para a construção de barragens que deverão estar disponíveis no local ou relativamente próximo são: - Solos para aterros, - Rocha para enrocamentos e protecções (riprap), - Agregados para betão (areia, seixo e britas). A distância de transporte de solos ou de enrocamentos para barragens de aterro pode ter importância decisiva na escolha do tipo de barragem. 2.2.2.5 EVACUADOR DE CHEIAS. CAUDAL DE DIMENSIONAMENTO E LOCALIZAÇÃO O evacuador de cheias pode representar uma parcela importante do custo da barragem e obras acessórias. Os condicionamentos impostos ao evacuador de cheias agravam-se com o aumento do caudal de dimensionamento Esses condicionamentos respeitam à estrutura do evacuador e às condições topográficas e geotécnicas para a sua implantação. Não podem aceitar-se assentamentos diferenciais do evacuador de cheias que ponham em perigo a obra. Nalguns casos, a possibilidade de incorporar numa barragem de betão o evacuador de cheias (e outras obras acessórias) pode aconselhar esse tipo de barragem. Evacuadores de cheias com a estrutura sobre aterros de barragens de terra ou de enrocamento são de evitar, sendo só admissíveis excepcionalmente em barragens de muito pequena altura. Com efeito, são inevitáveis assentamentos diferenciais do aterro sobre o qual assentaria o evacuador após a actuação da carga hidrostática correspondente à albufeira cheia. 9

Tais assentamentos teriam os seguintes inconvenientes: poderiam dar lugar ao arrastamento do material do aterro por fugas de água através de fissuras e juntas do betão e ao levantamento de lajes da estrutura em resultado da actuação de elevadas pressões hidrodinâmicas, quando o escoamento sobre o evacuador encontrasse lajes desalinhadas. As soluções de evacuadores de cheias compatíveis com barragens de aterro são as de canal a céu aberto, nos encontros ou em portelas laterais, ou de evacuadores em poço, seguidos de galerias escavadas na rocha ou construídas em betão a céu aberto e cobertas por aterro. 2.2.3 BARRAGENS DE GRAVIDADE 2.2.3.1 Introdução As barragens de gravidade têm a estabilidade em relação ao derrubamento e ao deslizamento assegurada pela acção do peso próprio. Uma barragem de gravidade de betão com fundação adequada e convenientemente projectada e construída é uma estrutura com baixos custos de manutenção e elevada fiabilidade As barragens de gravidade de betão são particularmente adequadas para permitir a passagem de cheias sobre elas, podendo os evacuadores de cheias, do tipo de superfície, ser integrados na própria barragem, frequentemente nos troços correspondentes ao leito menor do rio. Também a descarga de fundo e obras de desvio provisório podem ser facilmente integradas naquelas barragens. Quando o circuito hidráulico de derivação para a central hidroeléctrica assim o permite, é possível construir centrais de pé de barragem, ou mesmo centrais no interior da barragem - Figura 3. Existem exemplos de centrais de pé de barragem situadas por baixo do trampolim do evacuador de cheias. Figura 3 Barragem de Idanha 10

O método de cálculo de estabilidade considera a fundação como rígida. No caso de grandes barragens com fundação deformável podem justificar-se cálculos de análise de resistência da barragem por métodos elaborados nomeadamente o dos elementos finitos. Este método originalmente desenvolvido para análise a duas dimensões permite a análise tridimensional. Sendo a construção de barragens de gravidade uma actividade multimilenária (exercida desde 1000 a 2000 a. C.), é natural que os critérios de construção e, posteriormente, de cálculo tenham evoluído consideravelmente. Desta evolução importa salientar o critério de Maurice Levy, apresentado em 1895 à Academia de Ciências de Paris: em qualquer ponto do paramento de montante de uma barragem de gravidade a tensão de compressão (não entrando em conta com a subpressão) deve ser superior à pressão hidrostática nesse ponto. Esta condição é equivalente à de se não verificarem tracções em qualquer ponto do paramento de montante, quando se tem em conta a subpressão como solicitação. 2.2.3.2 SOLICITAÇOES CONSIDERAÇOES PRÉVIAS As solicitações a que se pode encontrar submetida uma barragem de gravidade, Figura 4, dividemse em dois grupos: As que são directamente calculáveis pelas leis da hidrostática e hidrodinâmica e pelo conhecimento dos pesos volúmicos dos materiais; As que dependem das disposições construtivas da barragem e da localização da barragem; Em relação ao primeiro grupo, há a considerar; Forças horizontais e verticais acima da fundação devidas à água; Peso próprio do equipamento instalado; Forças de reacção verticais e horizontais na fundação. No segundo grupo incluem-se as seguintes forças: Forças de subpressão na fundação; Impulsos devidos aos sedimentos depositados na albufeira; Forças devidas ao gelo; Forças sísmicas; Forças devidas a cheias catastróficas (eventualmente, galgamento de barragem). 11

Figura 4 - Solicitações em barragens de gravidade As forças incluídas no primeiro grupo foram objecto de estudo em disciplinas anteriores, pelo que a sua avaliação não será mencionada a seguir. Em relação às forças que se incluem no segundo grupo, apenas as forças de subpressão, as forças exercidas pelos sedimentos finos e as forças sísmicas serão objecto de desenvolvimento no subcapítulo seguinte. FORÇAS DE SUBPRESSÃO A quantificação da subpressão é matéria de alguma controvérsia. Medições efectuadas em barragens construídas confirmam a existência de subpressões não só na base das barragens, como também em planos superiores ao longo dos quais a água penetrou ao longo do tempo. É habitual admitir, para efeitos de projecto, que a variação da subpressão entre as cargas hidrostáticas a montante e a jusante é linear, ao longo de um perfil horizontal de fundação. Esta hipótese corresponde a admitir uma fundação rochosa uniformemente fissurada ou um solo permeável homogéneo, o que é difícil de conceber em zonas de extensão considerável, como o são as de fundação de barragens de gravidade, ainda que de pequena altura. No entanto, esta hipótese é correntemente aceite, pois qualquer outra formulação pode suscitar objecções da mesma índole. Quando o terreno de fundação for aproximadamente homogéneo o traçado da rede de percolação é o método mais rigoroso para determinar o diagrama de subpressão. 12

Para diminuir o valor das subpressões, que como se verá subsequentemente conduzem a perfis transversais de maiores espessuras, e, portanto, mais dispendiosos, é normal criar disposições para a drenagem na fundação da barragem. Em barragens de gravidade de betão tais disposições são constituídas por uma galeria de drenagem, de onde partem drenos que penetram na fundação Figura 5. O diagrama da subpressão que passa a existir na fundação, quando forem executados drenos, é estabelecido caso a caso, em função da barragem e das condições de drenagem. Considera-se frequentemente um diagrama com dois trechos rectilíneos de acordo com a Figura 5, em que o valor de K depende da eficiência da drenagem. O U.S. Corps of Engineers considera valores de K compreendidos entre 0,25 e 0,50. Condições de fundação especiais podem exigir valores de K superiores a 0,50. Figura 5 - Diagrama da subpressão na fundação de uma barragem de gravidade com sistema de drenagem A água afluente à galeria é posteriormente bombada para jusante ou, se as cotas da galeria e do nível de água a jusante o permitirem, escoa-se por gravidade. O não funcionamento do sistema de drenagem conduz a situações de solicitação excepcionais às quais a barragem deverá ainda resistir. A fracturação da rocha de fundação pode dar origem a uma distribuição da subpressão bastante mais desfavorável para a estabi1idade da barragem (ou do conjunto da barragem e de uma zona da fundação) do que a variação linear. É o caso da existência de uma fractura preenchida por material de elevada permeabilidade (ao longo da qual praticamente não diminui a carga hidráulica do escoamento de percolação), ligada a outra de muito baixa permeabilidade (em que se dissipa a 13

totalidade da diferença entre as cargas hidrostáticas a montante e a jusante) -Figura 6. Por este efeito, a barragem e a cunha de fundação subjacente poderão ter a estabilidade comprometida. Figura 6 - Instabilidade do conjunto barragem e fundação com fracturas devido à subpressão Assim, as injecções para tratamento da fundação e os furos de drenagem são quase sempre praticados em grandes barragens de gravidade, com o que se evita o efeito anterior, ainda que as fracturas não tenham sido detectadas no reconhecimento geotécnico. Em pequenas barragens, é recomendável a realização de furos de drenagem. FORÇAS DE SEDIMENTOS FINOS Quando existe uma albufeira, os sedimentos transportados pelo curso de água vão-se depositando ao longo da albufeira, por ordem decrescente das suas dimensões. Os sedimentos mais finos podem acumular-se junto da barragem e exercer impulsões no paramento de montante. As descargas de fundo de albufeiras profundas só, localmente, reduzem a acumulação de sedimentos. Muitas barragens têm sido, porém, dimensionadas sem ter em conta a carga dos sedimentos finos. Em certos casos existe fundamento para desprezar essa carga: inicialmente o depósito de sedimentos praticamente não existe e com o tempo, quando poderia passar a ter significado, os sedimentos finos consolidam-se e deixam de se comportar como fluidos. A acção dos sedimentos finos pode ser considerada, combinando a força resultante da pressão hidrostática com a componente horizontal da carga de sedimentos determinada pela fórmula de Rankine (desprezando a coesão): 14

H γ s h = 2 2 1 senφ 1 + senφ γ s. - Peso volúmico submerso do material dos sedimentos; h - Altura dos sedimentos a montante sobre a base da barragem; φ - Ângulo de atrito interno. 1.3.2.4 -FORÇAS SÍSMICAS 1.3.2.4.1 -Considerações gerais Os sismos transmitem acelerações às barragens que diminuem a estabilidade das mesmas. Quer as acelerações horizontais, quer as acelerações verticais, devem ser aplicadas segundo o sentido que se mostrar mais desfavorável. Na condição de a albufeira estar cheia, as situações mais desfavoráveis correspondem a deslocações da fundação para montante e para baixo. O movimento para montante aumenta os impulsos exercidos pela água e pelos sedimentos em contacto com a barragem e origina uma força de inércia associada à massa da barragem, enquanto o movimento descendente diminui o peso da barragem e da água situada sobre os paramentos inclinados. Qualquer destes efeitos é naturalmente desfavorável do ponto de vista da estabilidade. Os regulamentos do projecto de estruturas definem zonas com diferentes riscos sísmicos a que estão associados valores das acelerações sísmicas, horizontais e verticais, no substrato rochoso. Os coeficientes sísmicos dependem desses valores e das características das estruturas. FORÇAS SÍSMICAS HORIZONTAIS Na análise da estabilidade da secção transversal duma barragem, a força de inércia associada à massa da barragem é aplicada ao centro de massa da referida secção independentemente da forma desta. O aumento de pressão da água no paramento de montante num ponto à distância y da superfície livre é obtido por: P=Cλγh em que, C coeficiente adimensional que traduz a distribuição e valor das pressões definido por: Cm y y y y C = 2 + 2 com, 2 h h h h 15

λ - quociente entre aceleração do sismo e a aceleração da gravidade; γ - peso volúmico da água; h altura da água a montante sobre a base da barragem; Cm máximo valor de C, função do declive do paramento de montante Figura 7. Figura 7 - Coeficiente de pressão máxima e de pressão na base, para paramentos de declive constante Pode demonstrar-se analiticamente que a força horizontal total H m acima de um ponto situado à distância y da superfície livre e o respectivo momento derrubante, M m, em relação ao mesmo ponto são obtidos por: Hm=0.726 Pm y Mm=0.299 Pmy 2 Para barragens com paramento de montante constituído por um troço inclinado e um troço vertical, o procedimento a observar é o seguinte: Se a altura do troço vertical é superior ou igual a metade da altura total da barragem, considera-se, para efeito de cálculo das pressões devidas a sismos, como se todo fosse vertical; Caso contrário, considera-se um paramento imaginário resultante da união linear dos pontos de intersecção do paramento com a superfície livre e com o leito. FORÇAS SÍSMICAS VERTICAIS Neste caso, quer o peso da barragem, quer o peso da água situada sobre os paramentos devem ser modificados de acordo com a aceleração vertical adaptada. 16

2.2.3.3 ESTABILIDADE DEFINIÇÃO DO PROBLEMA Definidas as solicitações actuantes numa barragem de gravidade, para diferentes situações, tornase necessário determinar as tensões e os deslocamentos em qualquer ponto da estrutura e analisar a estabilidade da barragem em relação ao deslizamento. A análise de tensões e de deslocamentos, em barragens de grande altura, pode ser realizada pelo método dos elementos finitos, que permite ter em conta a deformabilidade da fundação. Em pequenas barragens sobre fundação que se possa considerar rígida, é suficiente calcular as tensões verticais na secção da fundação e verificar a estabilidade ao deslizamento. REACÇÃO DA FUNDAÇÃO Em condições de estabilidade (solicitações não dinâmicas), a resultante das cargas verticais e horizontais transmitidas pela barragem à fundação é equilibrada pela reacção desta. O diagrama das tensões verticais de reacção da fundação - Figura 8(b) - é calculado excluindo-se a subpressão das forças actuantes pelas fórmulas da compressão excêntrica. = V A1 L 1 6e L = V B2 1 + L 6e L Se a esse diagrama se subtrair o da subpressão definido no caso da Figura 8(c), pela variação linear entre as cargas hidrostáticas nas extremidades da fundação, obtém-se o diagrama de tensões efectivas verticais, de reacção. Se, porém, a subpressão a montante exceder a tensão de reacção vertical, a tensão efectiva correspondente é de tracção, a que a fundação é suposto, não resistir. Considera-se então que se abre uma fenda na fundação, na zona em que as tensões efectivas seriam de tracção ao longo da qual se instala uma subpressão constante e igual à carga hidrostática a montante - Figura 8(e). O diagrama de tensões verticais de reacção apresenta neste caso um patamar, correspondente à carga hidrostática a montante, e o valor B5 na extremidade de jusante. O valor B5 e o comprimento do patamar são determinados pelas condições seguintes: - a resultante do diagrama de tensões verticais de reacção iguala a resultante das solicitações verticais, excluída a subpressão 17

V = A L + 3 1 ( B A ) 2 5 3 L - o momento das tensões de reacção em relação ao centro de massa da fundação iguala o momento das solicitações (excluída a subpressão) ( V A L) e = M 3 1 Figura 8 - Barragem de gravidade Diagramas de subpressão e tensões na fundação Obtido e l -definido na Figura 8(a) - pode calcular-se L l por considerações geométricas. L 1 L 3 e 2 = 1 e, finalmente, B5, por recurso à primeira fórmula atrás apresentada ( V A xl) 2 3 B 5 = + A L 1 3 É prática corrente não admitir tracções (em termos de tensões efectivas) em qualquer ponto do paramento de montante, o que equivale a impor que a resultante das forças actuantes (incluída a 18

subpressão) acima de qualquer secção horizontal, tenha o ponto de aplicação dentro do núcleo central dessa secção. Isto deve-se a que não sendo o betão um material com resistência apreciável à tracção se poderiam produzir fendas devidas às tracções onde se instalariam subpressões que contribuiriam para a instabilidade e para aumentar a progressão dessas mesmas fendas. Igualmente se deve verificar que não sejam ultrapassadas na extremidade de jusante, as tensões de compressão admissíveis para o betão utilizado, ou para a fundação. DERRUBAMENTO Devido às solicitações da pressão hidrostática e da subpressão, a barragem pode ter tendência para rodar em torno da extremidade de jusante da fundação. Para que a barragem não seja derrubada, o ponto de aplicação da resultante das forças actuantes deverá situar-se a montante daquela extremidade. A não admissibilidade de tracções a montante implica que a resultante das forças actuantes (incluída a subpressão) passe pelo terço central da fundação, o que representa uma reserva de segurança em relação à condição anteriormente mencionada. Assim, não é necessário verificar a estabilidade de barragens de gravidade em relação ao derrubamento. DESLIZAMENTO A resultante das solicitações horizontais tende a deslocar a barragem para jusante, o que é contrariado pelas forças tangenciais de atrito e de coesão no contacto betão-fundação. Se a barragem for fundada em rocha, as forças de coesão não costumam ser consideradas. Sendo a superfície de fundação sempre irregular, existem forças de corte que podem ser significativas, mas de difícil quantificação. Assim, em barragens de gravidade de betão fundadas sobre rocha considera-se que está assegurada a estabilidade em relação ao deslizamento desde que se verifique a condição ( ) φ > V S tg H Em que φ é o ângulo de atrito entre o betão e a fundação e S é a força de subpressão na fundação, sendo portanto as forças de coesão e de corte consideradas como reserva de segurança. O coeficiente de atrito betão-rocha toma normalmente valores compreendidos entre 0,65 e 0,75. 19

2.2.3.4 JUNTAS DE CONTRACÇÃO E DE BETONAGEM Se o desenvolvimento de uma barragem de gravidade de betão exceder significativamente 15 m (o que será habitual), é necessário dividir a estrutura por juntas transversais para atender à retracção do betão (juntas de contracção). O espaçamento das juntas é determinado em função da capacidade da central de betonagem, das características do betão utilizado e do equipamento utilizado na sua colocação. Em barragens de pequena altura as juntas são seladas por perfis de estanquidade metálicos de borracha ou de PVC, colocados durante a betonagem junto ao paramento de montante -Figura 9. Figura 9 Perfil de estanquidade numa junta de contracção Nas grandes barragens, recorre-se à injecção das juntas com calda de cimento no final da construção para o que, além de colocar perfis de estanquidade junto aos paramentos de montante e jusante se deverá instalar, durante a betonagem os dispositivos necessários para fazer chegar a calda de cimento a toda a junta. Os blocos entre juntas de contracção são betonados por camadas de cerca de 1.5 a 2 m de espessura, sendo necessário um intervalo de tempo entre a betonagem de duas camadas sucessivas que permita a dissipação do calor de hidratação do cimento. Dadas as grandes massas de betão envolvidas em certos casos, é arrefecida a água de amassadura ou os próprios inertes, ou são previstos circuitos de refrigeração perdidos no betão. 2.2.4 BARRAGENS DE GRAVIDADE DE BETÃO COMPACTADO O betão compactado é o material resultante de um processo de construção que combina as técnicas económicas e rápidas, de colocação de aterros com as excelentes propriedades do betão, nomeadamente a resistência e a durabilidade. É colocado nas barragens de gravidade em camadas contínuas de grande área, sendo compactado por cilindros, vibradores ou não, em vez dos vibradores clássicos imersos no betão. Os teores de água e de cimento são mais baixos do que na construção clássica, o que reduz o calor libertado pela hidratação do cimento e permite além de eliminar ou diminuir o número de juntas 20

transversais e dispensar instalações de refrigeração do betão, facilitar a colocação do betão e progredir mais rapidamente em altura. O betão compactado reduz o custo de barragens de gravidade em virtude de permitir diminuir a mão de obra, o período necessário para construção (e consequentemente os correspondentes encargos financeiros), a quantidade de cimento utilizado e, nalguns casos, eliminar os próprios moldes dos paramentos de montante e de jusante. A utilização do betão compactado em barragens de gravidade iniciou-se nos anos sessenta, tendo depois dado lugar a muitas barragens, em vários países, a mais alta de 100 m, mas em especial nos E.U.A. e no Japão, que utilizam técnicas e critérios diferentes. 2.2.5 BARRAGENS DE CONTRAFORTES O perfil transversal de uma barragem de gravidade capaz de assegurar a estabilidade contra o deslizamento e o derrubamento é determinado pelo respectivo peso próprio e, portanto, pelo volume de material utilizado. O peso próprio terá de contrabalançar os efeitos destabilizadores da impulsão hidrostática e da subpressão, que inevitavelmente actua numa área vasta. As tensões no betão são muito inferiores às da capacidade de resistência respectiva. As barragens de contrafortes, que consistem de elementos impermeáveis a montante e de elementos descontínuos a jusante, os contrafortes, têm, como ilustra a Figura 10, as seguintes vantagens sobre as barragens de gravidade maciças: Reduzem a subpressão; Mobilizam como força estabilizadora o peso da água acima do paramento de montante; Utilizam uma maior fracção da capacidade de resistência do betão. Figura 10 - Barragens de contrafortes. Efeito da redução da subpressão e do peso da água acima do paramento de montante. 21

Os principais tipos de barragens de contrafortes (Figura 11) são: - Barragens de lajes e contrafortes -Figura 11 (a) - em que as lajes são de betão armado, inclinadas de cerca de 45º e podem estar apoiadas ou encastradas nos contrafortes; - Barragens de contrafortes de cabeça espessa - Figura 11(b), (c) e (d) - que pode ser em tê, arredondada e em diamante; as formas arredondada e em diamante procuram transferir a pressão hidrostática para forças axiais sobre os contrafortes, com eliminação ou redução da tracção nas respectivas cabeças; as geratrizes do paramento de montante formam um ângulo com a horizontal próximo de 60º. - Barragens de contrafortes ocos ou barragens de gravidade celulares -Figura 11(e) - que são essencialmente constituídas por contrafortes de cabeça espessa e de alma oca ou são barragens de gravidade com um vazio interior; no caso de contrafortes, as geratrizes do paramento de montante formam ângulos com a horizontal variando entre cerca de 65º e 90º. - Barragens de abóbadas múltiplas -Figura 11(f) que, no caso de abóbadas cilíndricas, têm as geratrizes formando ângulos de cerca de 45º com a horizontal; as abóbadas exercem forças axiais nos contrafortes por se anularem as componentes transversais. 22

Figura 11 - Barragens de contrafortes: contrafortes e lajes (a), contrafortes de cabeça em tê (b), em diamante (c) ou arredondada (d), contrafortes ocos (e) e arcos múltiplos (f). As barragens de contrafortes permitem uma substancial redução do volume de betão em relação às barragens de gravidade. No entanto, o custo da unidade de volume do betão é muito superior, devido à muito maior incidência da cofragem. Esse custo unitário é ainda mais elevado no caso de barragens de abóbadas múltiplas. Segundo THOMAS 1979, a percentagem do volume de barragens de contrafortes em relação ao de barragens de gravidade varia consoante a configuração do local de implantação. Para uma altura de cerca de 20 m, o volume de betão exigido por uma barragem de contrafortes e lajes será da ordem de 40% do que requer uma barragem de gravidade; para uma barragem de contrafortes de cabeça espessa, ter-se-á um valor de 60% a 75% e, para uma barragem de abóbada múltiplas, um valor de 30% para alturas até 40 m, podendo atingir cerca de 70% para uma altura de 150 m. As barragens de contrafortes têm ainda as seguintes vantagens: 23

A colocação de menores volumes de betão e a maior área superficial, que favorece a dissipação do calor de hidratação do cimento, possibilitam a execução mais rápida; A constituição da barragem por elementos independentes favorece a adaptação da estrutura a assentamentos da fundação; Tal como as barragens de gravidade, as barragens de contrafortes permitem construir o evacuador de cheias sobre a barragem (só na zona da alma dos contrafortes, no caso de arcos múltiplos) e o galgamento durante a construção. Para constituir o paramento do evacuador de cheias, as caudas das almas dos contrafortes são alargadas de forma a dar lugar a um paramento contínuo - Figura 12. Figura 12 Barragem de contrafortes com evacuador de cheias sobre a barragem O cálculo de estabilidade de barragens de contrafortes é análogo ao das barragens de gravidade, devendo atender-se à modificação do diagrama de subpressões. Parece desenvolver-se na actualidade a tendência para o emprego de barragens de gravidade de betão compactado em detrimento das de contrafortes. 2.2.6 BARRAGENS-ABÓBADA As barragens-abóbada transmitem a carga hidrostática às fundações e aos encontros por meio de forças de compressão desenvolvidas nos arcos. A consideração de uma barragem-abóbada como estrutura bidimensional constituída por um conjunto de arcos muito raramente se aproxima da realidade: apenas quando construída em vales excepcionalmente profundos e estreitos. É este o caso da célebre barragem de Vajont, Figura 13, com cerca de 260 m de altura e 150 m de corda no coroamento. 24

Figura 13 - Barragem de Vajont (Itália) Perfil transversal e alçado de jusante Na realidade o funcionamento estrutural de uma barragem-abóbada é tridimensional, podendo a mesma ser entendida como constituída por arcos e consolas. Aliás, o processo desenvolvido nos anos vinte, pelo U.S. Bureau of Reclamation e pelo engenheiro suíço Stucky, para calcular as tensões nas barragens-abóbada, consistia em atribuir uma repartição arbitrária das cargas por arcos e consolas e determinar os respectivos deslocamentos; o cálculo era repetido com nova repartição de cargas até se obter compatibilidade entre os deslocamentos dos arcos e das consolas (método designado por trial load). Na actualidade o cálculo das tensões é frequentemente conduzido pelo método dos elementos finitos. As barragens de arco são aplicáveis normalmente em vales em que o valor do quociente cordaaltura (L/H), ao nível do coroamento, é inferior a quatro ou mesmo seis. Como excepção cita-se a barragem de Pieve di Cadore (Itália) em que é L/H=7.45. Com o advento do cálculo automático e do desenho por meios automáticos, generalizou-se a substituição de arcos circulares por arcos com outras curvaturas para definir a barragem, com o que se conseguem formas estruturais melhor adaptadas ao vale e sujeitas a tensões mais favoráveis. Thomas, 1979, propõe a seguinte classificação quanto ao valor do quociente entre a espessura máxima na base, e, e a altura máxima, h: e - barragem-abóbada delgada 0. 2 h 25

e - barragem-abóbada de espessura média 0.2 0. 3 h - barragem-abóbada espessa - barragem de arco gravidade e 0.3 h e 0.5 h Barragens cúpula são barragens em abóbada de dupla curvatura. Nas barragens-cúpula, o perfil central apresenta, em geral, balanço no coroamento para jusante e balanço para montante na parte inferior, com a finalidade de diminuir as tensões de tracção nas consolas. Esta forma origina frequentemente tensões de tracção durante a construção, pois que esta, em virtude dos problemas resultantes da dissipação do calor de hidratação do cimento e da retracção do betão, é realizada por blocos, separados por juntas aproximadamente verticais e normais aos paramentos. O monolitismo da estrutura de barragens-abóbada é assegurado, na parte final da construção, por injecção com calda de cimento das juntas entre blocos. Nas barragens de arco-gravidade, a participação dos arcos não é preponderante sobre a das consolas e, como tal, aquelas barragens apresentam uma espessura que é uma fracção elevada da altura. Convém sublinhar que as barragens-abóbada, para além de exigirem menores volumes de betão do que as barragens de gravidade ou de contrafortes, oferecem maior segurança. Com efeito, o factor de segurança das barragens de gravidade e de contrafortes baseia-se na tensão de corte do betão ou da fundação, enquanto o das barragens-abóbada se baseia nas tensões de compressão no betão e nas fundações das barragens. Esta maior segurança é evidenciada nos ensaios de rotura de barragens efectuados em modelos reduzidos. Um dos mais lamentáveis desastres da história de barragens modernas é o da rotura da barragem de Malpasset no sul de França, ocorrida em 1959. A barragem-cúpula, de 60 m de altura e 6,76 m de espessura na base, ruiu repentinamente, quando o nível estava pela primeira vez, a 0,28 m do nível máximo, originando quatro centenas de mortos e o arrasamento da cidade de Fréjus. A ruína da barragem originou a sua divisão em blocos; como se se tratasse de uma explosão, o que se explica por a barragem ter deixado de funcionar como estrutura tridimensional, em consequência da rotura da fundação de xisto muito diaclasado. 26

Segundo uma equipa de engenheiros e geólogos a rotura deveu-se, Figura 14, a que: - Existia ao longo do encontro esquerdo uma diaclase continua, paralela às camadas de xistos e uma outra diaclase contínua que atingia a superfície da rocha, a jusante, isolando as duas diáclases uma cunha de rocha. - A actuação da carga sobre rochas fracturadas, como o xisto, originou grande decréscimo da permeabilidade, o que tornou a zona tracejada praticamente impermeável. - A subpressão aumentou lentamente devido à barragem subterrânea (constituída pela cunha impermeável) - Em determinado momento, a diaclase paralela à camadas abriu, a montante, criando uma ligação à albufeira e o consequente estabelecimento da pressão hidrostática que, associada à impulsão da barragem, fez deslizar a cunha de rocha e originou a rotura do arco sobrejacente. Figura 14 Barragem de Malpasset. Causa da rotura Em face da complexidade da análise tridimensional das barragens arco, vários centros de investigação, entre os quais o LNEC, especializaram-se em ensaios estruturais em modelos reduzidos de barragens de betão. A carga hidrostática é simulada no modelo pela pressão exercida por mercúrio ou pela aplicação de cargas por pequenos macacos hidráulicos. Inicialmente, só a carga hidrostática era considerada, passando depois a incluir-se o peso da estrutura e, mais recentemente, os efeitos da temperatura, da deformabilidade da fundação e dos sismos. 27

Os modelos reduzidos tendem a ser, em virtude do seu custo elevado e da sua pouca flexibilidade, utilizados, principalmente, como controlo e calibração de modelos matemáticos. Não obstante o desenvolvimento destes últimos, é ainda fortemente recomendada a realização de ensaios em modelo reduzido de grandes barragens, que apresentem condições fora do comum. 2.2.7 BARRAGENS DE ATERRO 2.2.7.1 CONDIÇÕES DA APLICAÇÃO - VANTAGENS E DESVANTAGENS As barragens de aterro, requerendo condições geotécnicas de fundação menos exigentes do que as barragens de betão, estão particularmente indicadas para os locais onde estas últimas não sejam possíveis, ou impliquem dispendiosas operações para remoção das formações de cobertura ou para o tratamento do maciço rochoso. As barragens de aterro têm-se tornado muito atraentes em virtude, quer dos avanços no conhecimento das propriedades dos solos e dos enrocamentos, que permitem proceder a cálculos para análise pormenorizada do comportamento dos aterros, quer do aumento significativo da facilidade de escavar, transportar e compactar grandes volumes de aterro. Estas barragens têm a vantagem de utilizar essencialmente materiais existentes na região e de não necessitar de grandes quantidades de materiais com preparação industrial, nomeadamente betão, aço, madeira, o que em zonas de difícil acesso representa uma vantagem importante. As barragens de enrocamento, construídas essencialmente por materiais granulares (particulados) colocados em camadas e compactados, podem ser técnico-economicamente preferíveis às de terra quando se verifiquem algumas das seguintes condições: Estarem ou tornarem-se facilmente disponíveis grandes volumes de enrocamento (nomeadamente quando estes provêm da escavação de túneis ou evacuadores de cheias ou quando existem condições favoráveis à exploração de pedreiras); A obtenção de solos para aterro é difícil e as distâncias de transporte são grandes; O clima é particularmente chuvoso, impedindo a fácil colocação de grandes quantidades de solos. Deve, porém, notar-se que as barragens de enrocamento podem, em determinadas condições de fundação, pôr problemas idênticos aos criados pelas barragens de terra, como já se referiu. No caso de construção da barragem por fases é, em geral, mais adequada uma barragem de aterro, pois não existe o problema da ligação entre as obras das diferentes fases. 28

Porém as barragens de aterro também apresentam desvantagens, nomeadamente, em caso de galgamento, que, pelo processo de erosão do aterro (mais fácil no caso das barragens de terra no que nas barragens de enrocamento), pode levar à rotura das barragens. As barragens de aterro põem maiores condicionamentos durante a construção, pois, não permitem a passagem do caudal no rio por aberturas no corpo da barragem. Além disso, exigem obras de desvio provisório dimensionadas para caudais com maiores períodos de retorno do que as barragens de betão, pois os prejuízos na parte já construída são muito mais elevados em caso de insuficiência das obras de desvio provisório. A ensecadeira de montante destas obras é frequentemente incorporada na barragem. Em comparação com as barragens de betão, as barragens de aterro apresentam maiores condicionamentos para a implantação de obras hidráulicas, como evacuadores de cheias, descargas de fundo e centrais hidroeléctricas. 2.2.7.2 TIPOS BÁSICOS DE BARRAGENS DE TERRA E DISPOSIÇÕES A ADOPTAR As barragens de aterro classificam-se: de terra ou de enrocamento, consoante os materiais predominantemente utilizados, sejam solos ou enrocamentos. As barragens de terra são basicamente das classes seguintes: -Barragem de perfil homogéneo. Uma barragem de terra de perfil homogéneo utiliza solos de um único tipo (com excepção dos materiais para filtros e drenos e protecção de taludes). O material deve ser suficientemente impermeável para que o caudal de percolação seja baixo. Desde que a albufeira se mantenha o tempo suficiente à mesma cota, a água de percolação surgirá no paramento de jusante a uma altura de cerca de 1/3 da a1tura da água a montante, independentemente da inclinação do paramento e da permeabilidade do material. Este facto poderá originar instabilidade do talude. Para o evitar, dispõe-se um dreno no pé a jusante ou um tapete drenante - Figura 15(b) e (c). A solução de dreno vertical - Figura 15(d) -é menos frequente. -Barragem de terra de perfil zonado O tipo mais comum de barragem de terra de perfil zonado, é aquele em que existe, um núcleo central muito pouco permeável, ladeado por maciços estabilizadores mais permeáveis. Esse núcleo poderá ser muito pouco espesso, e então será obtido por meio de calda de argila (ou por parede moldada) ou por um muro de betão armado, ou poderá ter espessura média a elevada e ser 29

constituído por solo argiloso com percentagem de finos (siltes e argilas) que garantam baixa permeabilidade -Figura 16. Figura 15 - Percolação em barragens de terra de perfil homogéneo (a) com dreno no pé de jusante (b), com tapete drenante (c) e com dreno vertical (d). Entre o núcleo e os maciços laterais terão de interpor-se filtros para evitar a erosão interna por arrastamento de finos, quer para jusante por efeito do escoamento controlado pelo nível na albufeira, quer para montante após esvaziamento da albufeira, devido à pressão intersticial. Nas barragens de aterro hidráulico, os maciços laterais são obtidos por deposição de areias transportados hidraulicamente, sendo os seus taludes pouco inclinados. Figura 16 Barragens de terra de perfil zonado com núcleo fino (a) ou espesso (b) 30

Quando uma barragem de terra é construída sobre uma formação permeável espessa, a diminuição da percolação é conseguida por meio de uma trincheira que é preenchida com solo impermeável, com uma parede de argila ou betão - ou parede moldada ou por uma cortina de injecções (Figura 17). Nalguns casos, é usado um tapete impermeável, prolongado para montante da barragem. A percolação através da fundação, se importante, deve ser controlada para evitar a erosão interna. Procede-se à sua intercepção por poços de alívio, a jusante da barragem, equipados para medir o caudal e dar alarme em caso de aumento anormal. Os taludes exteriores de maciços de terra de barragens de aterro são protegidos contra a erosão que, no talude de montante, resultaria da acção das vagas na albufeira e no talude de jusante, da acção da chuva e do escoamento superficial. Figura 17 - Barragens de terra sobre fundação permeável. Corta-águas por trincheira (a), parede (b), cortina de injecções (c) ou tapete impermeável a montante (d). A protecção do talude de montante é conferida por uma camada de enrocamento ou por lajetas de betão, com filtros colocados entre a protecção e o solo do aterro. A protecção a jusante é assegurada por enrocamento ou por cobertura vegetal adequada. A água do escoamento superficial sobre o talude de jusante é recolhida em valetas, geralmente associadas a banquetas, nas barragens altas. 2.2.7.3 TIPOS DE BARRAGENS DE ENROCAMENTO DISPOSIÇÕES A ADOPTAR As barragens de enrocamento dividem-se essencialmente em duas classes, consoante a localização do elemento que assegura a impermeabilidade da barragem: cortina, a montante (Figura 18); ou núcleo, geralmente de solo muito pouco permeável, no interior do perfil (Figura 19). 31

Figura 18 - Muros corta-águas na base de cortinas de barragens de enrocamento. Cortinas de betão armado (a), de material asfáltico (b) e metálicas (f) -BUREAU OF RECLAMATION 1974 Figura 19 Barragem de enrocamento com núcleo de argila (Bureau of Reclamation, 1974) 32