Desenvolvimento de um Equipamento Triaxial de Grandes Dimensões para Enrocamentos



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Transcrição:

1 Desenvolvimento de um Equipamento Triaxial de Grandes Dimensões para Enrocamentos R. A. Hummes 1, M. Maccarini 2 e A. J. Dal Moro 3 Resumo Este artigo apresenta as etapas mais importantes do desenvolvimento de um equipamento triaxial de grandes dimensões destinado à determinação de parâmetros mecânicos de enrocamentos. O equipamento permite ensaiar corpos de prova com 66cm de diâmetro e 165cm de altura, tendo sido desenvolvido no Laboratório de Mecânica dos Solos da Universidade Federal de Santa Catarina, entre os anos de 2007 e 2009, em convênio entre a UFSC e a Tractebel Energia S.A. Além das partes mecânicas e hidráulicas, apresenta-se sucintamente o desenvolvimento de técnicas de moldagem de corpos de prova, proteção e reparo de membranas de borracha e implementação dos sistemas de controle e aquisição de dados. Ao término, faz-se uma avaliação do desempenho do equipamento, com base em resultados de ensaios exploratórios. Palavras-chave Barragens; Enrocamento; Ensaios de Laboratório; Grandes dimensões. I. INTRODUÇÃO Este artigo apresenta os principais aspectos relacionados com o desenvolvimento de um equipamento triaxial de grandes dimensões destinado à obtenção de parâmetros de resistência e compressibilidade de enrocamentos. Esse equipamento permite ensaiar corpos de prova com diâmetro de 66cm e altura de 165cm. Dentre os aspectos abordados estão: a) aparato mecânico, b) sistema hidráulico, responsável pela aplicação de pressões, c) instrumentação, d) controle e aquisição de dados, e) técnicas de moldagem do corpo de prova e f) ensaios exploratórios. Atualmente, o equipamento desenvolvido no Laboratório de Mecânica dos Solos (LMS) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) é o maior do Brasil. Permite ensaiar enrocamentos contendo partículas com até 12cm de diâmetro, possibilitando obtenção de parâmetros mecânicos representativos, dados esses necessários para projeto de barragens de enrocamento, sejam com face de concreto, sejam com núcleo. O equipamento permite ainda aplicação de pressões confinantes totais de até 2000kPa e a realização de ensaios drenados e não-drenados, com corpos de prova saturados. II. BARRAGENS DE ENROCAMENTO Enrocamentos são materiais largamente empregados na 1 Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil (PPGEC) da Universidade Federal de Santa Catarina (e-mail: andrehummes@hotmail.com). 2 Professor titular do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de Santa Catarina (e-mail: ecv1mac@ecv.ufsc.br). 3 Geólogo, funcionário da Tractebel Energia S.A., gerente do projeto de pesquisa (e-mail: dalmoro@tractebelenergia.com.br) construção dos seguintes tipos de barragens: a) barragens de enrocamento com face de concreto (BEFC) e b) barragens com núcleo impermeável, geralmente em argila. Também são bastante utilizados em ensecadeiras e em fechamentos de rio, estruturas essas que podem ser incorporadas ao corpo da barragem. Em todos esses casos, a elaboração de projetos requer o conhecimento das características mecânicas dos enrocamentos, obtidos por meio de ensaios, sem o que a segurança e a funcionalidade das estruturas ficam comprometidas. Não obstante, é comum a adoção de dados de literatura em projetos executivos. Em geral, os enrocamentos empregados em barragens provém de desmontes de rocha obrigatórios, tal como a construção de túneis de desvios e adução e de vertedouros. Os materiais obtidos possuem partículas com dimensões variadas, desde finos passantes da peneira n o 200 (0,074mm) até blocos com 1,5m de diâmetro (das Neves, 2002). A presença de partículas com grande diâmetro dificulta a realização de ensaios mecânicos de laboratório, pois requer equipamentos de grandes dimensões, o que resulta em custos elevados. Mesmo quando esses equipamentos estão disponíveis, na grande maioria dos casos a realização de ensaios com a granulometria de campo é economicamente inviável. Por esse motivo, são realizados ensaios com modelação física da granulometria, tomando-se curva granulométrica paralela à de campo, do mesmo material, e moldando-se corpos de prova com dimensões máximas da ordem de 0,5 a 2,0m. Geralmente, a relação entre a menor dimensão do corpo de prova e o máximo diâmetro de partículas é da ordem de 6, ou superior. Além disso, quanto menor a diferença entre a granulometria de campo e a empregada nos ensaios, mais representativos os resultados (Marsal, 1973 e Veiga Pinto, 1982). Outro aspecto importante relativo ao emprego de enrocamentos na construção de barragens é a crescente tendência de se empregar cada vez mais enrocamentos de menor qualidade, isto é, provenientes de rochas menos sãs e com maiores porcentagens de finos, enrocamentos esses menos resistentes e mais compressíveis. No passado esses materiais eram descartados em bota-foras, porém hoje procura-se empregar todos os materiais disponíveis na obra, com objetivo de diminuir impactos ambientais e reduzir custos (Watzko, 2007). Isso aumenta a importância da realização de ensaios mecânicos de grandes dimensões. O desenvolvimento do equipamento triaxial aqui apresentado tem por objetivo possibilitar a realização de pesquisas e caracterizações de enrocamentos necessárias a projetos de novas barragens e a verificações da segurança de barragens existentes.

2 III. DESENVOLVIMENTO DO EQUIPAMENTO A seguir são apresentados os principais elementos que compõem o aparato mecânico, sistema hidráulico, instrumentação e os sistemas de controle e aquisição de dados. A. Aparato Mecânico O aparato mecânico é composto por: a) pórtico de reação vertical, com capacidade para 2200kN, b) câmara triaxial, em aço, com diâmetro interno de 100cm e altura interna de 185cm, c) base da câmara, com diâmetro de 120cm e entradas de pressões neutra e confinante, d) cilindro hidráulico com capacidade para 2200kN, destinado à aplicação da tensão desviatória, responsável por provocar ruptura dos corpos de prova. A câmara triaxial e sua base foram projetadas para resistir a tensão confinante total máxima de 2000kPa. Esse confinamento corresponde, grosso modo, à tensões horizontais que ocorrem nas bases de barragens de enrocamento com alturas da ordem de 250m. Portanto, o equipamento desenvolvido permite obter parâmetros representativos para barragens de grande porte. A Figura 1 apresenta uma vista frontal do pórtico de reação, da câmara triaxial e do cilindro hidráulico. Figura 1. Vista frontal do pórtico, câmara triaxial e cilindro hidráulico Na Figura 1 verifica-se que a parte superior do pórtico é unida à inferior por meio de barras verticais dotadas de porcas, permitindo que a altura interna do pórtico varie entre 105 e 310cm. Isso permite, além da realização de ensaios triaxiais, a realização de ensaios de: a) compressão unidimensional, com corpos de prova com 100cm de diâmetro e 50cm de altura, desenvolvido por Pacheco (2005) e b) cisalhamento direto, com corpos de prova cúbicos com 70cm de lado, desenvolvido por Hummes (2007). B. Sistema Hidráulico O sistema hidráulico tem as funções de aplicar: a) tensão desviatória, por meio do cilindro hidráulico, b) pressão confinante (até 2000kPa) e c) pressão neutra (até 1000kPa). Cada uma das três pressões é controlada por uma válvula proporcional acionada por computador, utilizando um software desenvolvido especificamente para o equipamento. O fato das moto-bombas e das válvulas proporcionais trabalharem com óleo e a câmara triaxial com água exigiu que fossem desenvolvidas interfaces óleo-água para as pressões confinante e neutra. Para tanto, empregou-se antigos cilindros hidráulicos, com altura de 287cm e diâmetro de 37cm, doados pelo Consórsio Itá S.A., cuja função original era acionamento de comportas de vertedouro na UHE Itá. No interior das carcaças dos cilindros foi instalada bexiga de borracha, com volume de 90 litros, a qual tem a função de separar o óleo da água, servido de interface. A Figura 2 a- presenta detalhes de um dos cilindros. Figura 2. Cilindros de interface óleo-água Dos cilindros de interface a água pressurizada segue para um quadro de distribuição (Figura 3), de onde é direcionada para a câmara triaxial. C. Instrumentação As seguintes variáveis físicas foram instrumentadas: a) pressões neutra e confinante, b) força desviatória vertical, c) deslocamento vertical do pistão do cilindro hidráulico, d) variação de volume do corpo de prova. As pressões neutra e confinante foram medidas por meio de transdutores de pressão com capacidades de 1000 e 2000kPa, respectivamente. Esse transdutores, tipo P8AP, foram adquiridos da fabricante alemã HBM (Hottinger

3 Baldwin Messtechnik). A força desviatória foi medida externamente à câmara triaxial com uma célula de carga com capacidade de 2MN, tipo C6A, também da HBM. O deslocamento vertical (axial) do corpo de prova durante a etapa de cisalhamento também foi medido externamente, tendo sido admitido igual ao deslocamento do pistão do cilindro hidráulico. Para isso, empregou-se um transdutor de deslocamento indutivo, com curso útil de 200mm (tipo WA/200mm-L), da HBM. Esse transdutor indutivo substituiu um transdutor tipo potenciométrico, também com curso de 200mm, porém de menor precisão. As medidas de variação de volume foram realizadas por meio de dois sensores de vazão da fabricante japonesa Oval Coorporation. Empregou sensores modelo Super Micro 39, com sensibilidade de 10ml/min e capacidade de até 100ml/min. Foi necessário empregar dois sensores, pois eles permitem fluxo em uma só direção. Como pode entrar ou sair água no corpo de prova durante o cisalhamento, foi necessário desenvolver sistema com dois sensores associados a válvulas de retenção de fluxo. Além disso, dada a sensibilidade dos sensores à partículas em suspensão, foi necessária a instalação de filtros de água para retenção de sólidos. A Figura 3 apresenta o projeto de distribuição de água onde estão instalados sensores de vazão, filtros e transdutores de pressão. D. Controle e Aquisição de Dados Tanto o controle do equipamento como a aquisição de dados de ensaios é realizado por meio de computador, utilizando software desenvolvido no LMS especificamente para essa finalidade. O equipamento é capaz de realizar ensaiar ensaios com controles de tensões desviatórias e de deformações axiais. Até o momento, foram implementadas somente rotinas para aplicação de trajetórias de tensões simples. Porém, está-se trabalhando para viabilizar a aplicação de trajetórias mais complexas, inclusive com instrumentação interna de deformações, o que permitirá realizar ensaios com deformações horizontais nulas (trajetórias Ko). Os controles das pressões neutra e confinante são realizados por meio de válvulas proporcionais, conectadas com os transdutores de pressão (malha fechada). Os controles de deformação axial e tensão desviatória, aplicadas pelo cilindro hidráulico, também são efetuados por válvula proporcional, em malha fechada com o transdutor de deslocamento indutivo e a célula de carga. As válvulas são controladas via placa PCI de 16 bits, com saída analógica de 0 a 10V. A aquisição de dados de pressões, deslocamentos, forças e variações de volume é realizada por um DataScan 7220, da fabricante inglesa MSL Measurement Systems Ltd, integrado ao software desenvolvido na UFSC. Após a implementação da instrumentação e dos sistemas de controle e aquisição de dados, foram realizadas diversas calibrações, testes e ajustes no equipamento. A Figura 4 apresenta os resultados de controle de posição do pistão responsável pela tensão desviatória. Foi definida pelo software velocidade de avanço de 1,0mm/min, obtendo-se 0,98mm/min. O erro foi de 2,0%, considerado baixo. Posição do Pistão (mm) 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 Tempo (min) Figura 4. Testes de controle de posição do pistão do cilindro hidráulico Como citado anteriormente, o cilindro hidráulico permite controle de posição ou força, porém não diretamente controle de velocidade. Nos testes, a velocidade foi controlada indiretamente, gerando-se continuamente valores de posição (setpoints) crescentes, em iguais intervalos de tempo. Figura 3. Quadro de distribuição de água IV. TÉCNICA DE MOLDAGEM DOS CORPOS DE PROVA A seguir são resumidas as principais dificuldades encontradas durante o desenvolvimento das técnicas de moldagem dos corpos de prova, desde a obtenção das membranas até a vedação dos mesmos. A. Membranas de Látex Uma das principais dificuldades encontradas durante a pesquisa foi a obtenção de membranas de borracha para revestir os corpos de prova. Devido à grande dimensões dos mesmos, não existe empresa nacional ou estrangeira que comercialize correntemente esse tipo de produto, que deve ser fabricado sob medida para se adequar exatamente às dimensões do corpo de prova (165cm x 66cm). Além disso, as membranas devem ter espessura suficiente para suportarem a compactação do enrocamento sem ocorrência de grande quantidade de furos, pois esses devem ser posteriormente reparados.

4 A solução encontrada foi adquirir bobinas de mantas de látex, com largura de 1,1m, comprimento de 20m e espessura de 3,2mm e fabricar as membranas por meio de colagem. Ocorreram dificuldades também na determinação do tipo de cola mais adequado (para garantir resistência e estanqueidade) e na seleção da melhor técnica de fabricação. Após a realização de diversos testes, foi possível obter membranas suficientemente flexíveis, resistentes e estanques. A Figura 5 apresenta os resultados obtidos nos ensaios de deformabilidade realizados com as membranas. Força (N/m) 500 400 300 200 abria-se a próxima, repetindo-se o procedimento até que as 32 janelas tivessem sido conferidas. Foram realizados testes para determinação dos deslocamentos horizontais do corpo de prova decorrentes da abertura de uma janela, sem vácuo. Verificou-se que esses deslocamentos foram pouco significativos, menor que 1,0mm, devido em grande parte a: a) o arqueamento de tensões no interior do corpo de prova e b) o confinamento propiciado pela membrana de látex. Por isso, a recolocação da maioria das janelas ocorreu de forma relativamente fácil, sem necessidade se esforços horizontais apreciáveis. Para retirada completa do molde foram testadas diferentes pressões de vácuo, medindo-se os deslocamentos horizontais correspondentes. Concluiu-se que o vácuo mínimo necessário é de 60kPa. A Figura 6 ilustra os testes realizados. 100 0 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Deformação específica (%) Figura 5. Deformabilidade das membranas de látex A rigidez (J) obtida nos ensaios foi de 5261N/m, valor esse baixo o suficiente para garantir que durante os ensaios a membrana não cause aumento significativo no confinamento do corpo de prova. B. Molde Metálico e Compactação O desenvolvimento da técnica de moldagem de corpos de prova de enrocamento foi uma das etapas mais importantes da pesquisa. As principais dificuldades estão relacionadas com a ocorrência de furos na membrana de látex durante a compactação. A compactação foi realizada no interior de um molde metálico, dividido em 32 partes ou janelas, e utilizando uma placa vibratória acoplada a uma chapa de aço circular, com diâmetro de 64cm. Primeiramente, a membrana de látex foi colocada no interior do molde, já posicionado sobre o pedestal da base da câmara, e sem seguida foi colocado em seu interior o enrocamento da primeira camada de compactação, com espessura final de 15cm. Foi então inserida a placa vibratória e o material compactado até atingir a massa específica desejada. Durante a compactação, verificou-se a ocorrência de furos e rasgos decorrentes da pressão exercida pelas partículas e pela placa sobre a membrana, contra a parede interna do molde. Os rasgos maiores possuíam até 20mm de comprimento. Após a compactação de todo o corpo de prova, contou-se cerca de 15 furos e/ou rasgos. Antes da retirada do molde foi necessário reparar todos os furos, sem o que não seria possível a formação de vácuo suficiente para impedir deformações horizontais significativas do corpo de prova. O reparo ocorreu por meio das 32 janelas que compõem o molde. Primeiramente, abria-se uma janela, sem vácuo, verificava-se a existência ou não de furos e, caso existissem, colava-se um remendo de látex com espessura de 1,0mm. Fechava-se então a primeira janela e Figura 6. Medidas de deslocamento horizontal do corpo de prova para diferentes pressões de vácuo C. Vedação do Corpo de Prova O remendo dos furos da membrana antes da retirada do molde não garante sua total estanqueidade, pois pequenos furos podem passar desapercebidos pela inspeção visual. A estanquidade poderia ser verificada depois da saturação do corpo de prova e do preenchimento da câmara com água, porém a existência de furos nessa etapa demandaria tempo e esforços significativos para correção do problema. A solução adotada foi revestir o corpo de prova com uma segunda membrana de látex, com 1,0mm de espessura, após a retirada do molde. A estanqueidade dessa membrana é verificada cuidadosamente por meio de pressão de ar e imersão em tanque com água. Os testes realizados demonstraram a eficiência dessa técnica. A vedação das membranas no pedestal e no top-cap foi obtida por meio de anéis de borracha (o-rings) e abraçadeiras de aço. A Figura 7 apresenta um corpo de prova sem o molde metálico, com vácuo aplicado e já com a segunda membrana instalada, pronto para ser ensaiado.

5 Deformação axial (%) 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 0,0 Deformação volumétrica (%) -0,2-0,4-0,6-0,8-1,0-1,2 Redução de Volume Figura 9. Deformação volumétrica durante o cisalhamento Figura 7. Corpo de prova pronto para ensaio V. ENSAIOS EXPLORATÓRIOS Ao término da pesquisa foram realizados ensaios triaxiais exploratórios com a finalidade de verificar o desempenho do equipamento com um todo, ou seja, a eficiência da cada componente trabalhando simultaneamente com os demais. Nesses ensaios, foi utilizada brita de granito, com partículas de até 25,4mm de diâmetro, compactada com teor de umidade higroscópico. A saturação ocorreu aplicando-se vácuo no topo do corpo de prova e conectando a drenagem da base em reservatório de água, ou seja, provocando ascensão da água por diferença de pressão. O corpo de prova foi consolidado com tensão efetiva de 350kPa e cisalhado drenadamente. As Figuras 8 e 9 apresentam os resultados obtidos. Tensão (kpa) 1200 1000 800 600 400 200 Tensão Confinante Total Pressão Neutra Tensão Desviatória 0 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 Deformação axial (%) Figura 8. Variações de tensão confinante, pressão neutra e tensão desviatória durante o cisalhamento Na Figura 8 observa-se que a tensão confinante total manteve-se constante em 790kPa durante todo o ensaio, indicando bom controle da válvula proporcional. Já a pressão neutra teve pequeno aumento no início do ensaio, de 440 até 480kPa, com lenta e contínua redução até 440kPa ao término do mesmo. Esse aumento foi provocado pelo acionamento do cilindro hidráulico no início da fase de cisalhamento e foi decorrente das características do sistema hidráulico, as quais já foram alteradas para evitar esse problema. Além disso, o sistema hidráulico não permitiu aplicação de pressões neutras e confinantes menores que 400kPa, o que será possível após a realização de ajustes futuros. Ainda na Figura 8, observa-se oscilação significativa da tensão desviatória. Isso foi decorrente de limitações identificadas no sistema de controle, em particular da placa PCI de 8 bits com saída analógica, a qual já foi substituída por outra de 16 bits. Essa troca deverá eliminar os problemas. VI. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os objetivos principais da pesquisa foram plenamente a- tingidos, ou seja, foi desenvolvido: a) um equipamento triaxial de grandes dimensões e b) técnicas de moldagem dos corpos de prova, possibilitando a realização de ensaios com enrocamentos. Devido à inexistência de equipamentos desse porte no Brasil, enfrentou-se diversas dificuldades que demandaram tempo e esforços significativos para serem superadas. Muito embora esse tipo de equipamento exista em outros países, as tentativas de obtenção de informações junto a outras universidades não renderam resultados. Teve-se de desenvolver integralmente na UFSC o equipamento e as técnicas de ensaios. Um dos principais resultados da pesquisa foi o desenvolvimento da técnica de moldagem dos corpos de prova. Metodologias descritas na bibliografia consultada (Marsal, 1973 e Veiga Pinto, 1982) foram avaliadas e algumas delas testadas, porém com obtenção de resultados menos satisfatórios que os atingidos com a técnica desenvolvida na UFSC. O aparato mecânico e o sistema hidráulico tiveram desempenho satisfatório durante os testes, muito embora algum ajustes tiveram de ser efetuados. O pórtico de reação suportou bem as cargas aplicadas. O sistema hidráulico não apresentou vazamentos significativos, tanto na linha de óleo como na de água. As válvulas proporcionais conseguiram controlar adequadamente as pressões confinante e neutra,

6 sem que essas sofressem oscilações apreciáveis. Os sensores de vazão e as válvulas de retenção de água a eles associadas tiveram bom desempenho. O sistema de resfriamento de óleo teve excelente eficiência. A célula de carga e o transdutor de deslocamento indutivo não apresentaram problemas. O software de controle e aquisição de dados também teve desempenho satisfatório. Todavia, alguns problemas foram detectados: a) pequena inclinação da câmara triaxial, provavelmente provocada por excentricidades, b) vazamentos de água pelas escotilhas da câmara c) dificuldades no equilíbrio de pressões de água no quadro de distribuição quando da abertura de válvulas de esfera associadas aos sensores de vazão. Esses problemas já foram corrigidos. Com o desenvolvimento do equipamento aqui apresentado espera-se contribuir para melhor compreensão do comportamento mecânico de enrocamentos brasileiros. Dessa forma será possível a elaboração de projetos de barragens mais racionais, reduzindo seu caráter empírico atual e a necessidade de adoção de parâmetros mecânicos obtidos na bibliografia técnica. Com isso será possível garantir a construção de barragens mais seguras e confiáveis. VII. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem as contribuições de L. A. Gómez, da UFSC, M. C. Meireles, da LEME Engenharia Ltda, recebidas durante o desenvolvimento da pesquisa. VIII. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Periódicos: [1] E. M. das Neves, "Algumas considerações sobre a mecânica dos enrocamentos, Solos e Rochas, n o 25, PP. 161-203, 2002. Livros: [2] R. Marsal, Mechanical properties os rockfill, in Embankment-Dam Engineering, Casagrande Volume. New York: Wiley, 1973. Relatórios Técnicos: [3] R. A. Hummes, M. Maccarini, A. J. Dal Moro, Testes Laboratoriais de Compressão Triaxial de Enrocamento em Amostras de Grandes Dimensões, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Relatório final da pesquisa, set. 2009. Dissertações e Teses: [4] A. V. Pinto, Modelação de enrocamentos, Dissertação demmestrado, Universidade de Nova Lisboa, Portugal, 1982. [5] A. Watzko, Barragens de enrocamento com face de concreto no Brasil, Dissertação de Mestrado, Departamento de Engenharia Civil, Universidade Federal de Santa Catarina, 2007. [6] D. Pacheco, Compressão unidimensional em enrocamento de basalto: desenvolvimento do equipamento e realização de ensaios, Dissertação de Mestrado, Departamento de Engenharia Civil, Universidade Federal de Santa Catarina, 2005. [7] R. A. Hummes, "Compressibilidade e resistência ao cisalhamento de rejeitos de beneficiamento de carvão mineral em equipamentos de grandes dimensões," Dissertação de Mestrado, Departamento de Engenharia Civil, Universidade Federal de Santa Catarina, 2007.