Ética no fotojornalismo: a banalização da dor alheia 1

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Transcrição:

Ética no fotojornalismo: a banalização da dor alheia 1 Tamires Camila de Oliveira ROCHA 2 Itamar de Morais NOBRE 3 Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal/RN (UFRN) Resumo O presente trabalho tem por objetivo analisar a questão da ética veiculada nas fotografias que são divulgadas nas grandes mídias. Sabemos que os acontecimentos, envolvendo imagens chocantes, revelam o sério problema na questão ética das imagens. Muitas vezes esses tipos de fotografias podem acarretar prejuízo na veracidade das informações jornalísticas, descaracterizando o contexto real da imagem, tornando-a ou não mais atraente e sedutora ao público. Palavras-chave: ética; fotojornalismo; dor; mídia; meios de comunicação; Introdução Recentemente percebemos que nos meios de comunicação a falta de ética que envolve as imagens vem revelando um sério problema na credibilidade das informações veiculadas, isto porque na grande maioria das vezes as fotografias, que são retratadas com elementos que causam espanto, tornando-se mais atraentes ao olhar público devido ao seu impacto na sociedade. Em contraponto, sabemos que esse tipo de retratação perde seu encanto uma vez que traz para o público espanto e desrespeito para aqueles jornais que ali divulgam essas fotografias. Esses elementos, de certa maneira, moldam o pensamento e a real ideia que a informação quer passar, pois aguça espanto nos que leem tais informações e se deparam com essas imagens. ¹ Trabalho apresentado no IJ04 Comunicação Audiovisual do XXXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação realizado em Fortaleza/CE entre os dias 3 a 7 de setembro de 2012. 2 Aluna de graduação em Comunicação Social Jornalismo, 5 período da UFRN. tamires.oliveirar@hotmail.com 3 Professor do Departamento de Comunicação Social e do Programa de Pós-Graduação em Estudos da Mídia (PPgEM), da UFRN. Pesquisador do Grupo de Pesquisa PRAGMA - Pragmática da Comunicação e da Mídia: teorias, linguagens, indústria cultural e cidadania. Integrante do Grupo de Estudos BOA-VENTURA - CCHLA/UFRN, em convênio com a Universidade de Coimbra-Portugal. Membro do Núcleo de Pesquisa: Fotografia, da INTERCOM Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. Membro da REDE FOLKCOM Rede de Estudos e Pesquisa em Folkcomunicação. E-mail: itanobre@gmail.com 1

O presente trabalho consiste em analisar a ética nas imagens veiculadas na mídia e o que essas representações causam nos leitores. Atualmente percebemos que os meios de comunicação não respeitam o olhar do leitor e divulga uma série de imagens chocantes que muitas vezes distancia as pessoas dos noticiarios devido ao grande sensacionalismo que tentam passar. O olhar alheio se instiga de tanto horror que espanta a curiosidade de quem folheia ou em até mesmo assistir os noticiários jornalisticos. No meio jornalístico a noção de ética está ligada a idéia de um código com regras determinada para o exercício da profissão, mas para a maioria, este código é subjetivo, variando de pessoa para pessoa, e se baseia muito mais na consciência de cada um do que normas preestabelecidas. (TRAVANCAS, p. 93, 1993). É a partir dessas questões que discutimos como não há respeito nas veiculações de imagens, pois na mídia vemos constantemente uma série de fotografias que chocam o público. Imagens de pessoas mortas, em situações de risco, destruição ambiental são corriqueiras no dia-a-dia da população. Vale salientar que a ética, na maioria das vezes, não tem um fundamento racional, mas sim emocional; pois é o leitor que encontra esse tipo de informação visual no seu dia-a-dia e julga para si se esses elementos deveriam ou não estar veiculados da maneira como vem sendo, pois fica disponível para toda que toda população o veja, seja ela criança ou adulto. Fotojornalismo seu papel nos jornais: um breve histórico As fotografias jornalísticas quando veiculadas, na grande maioria das vezes, oferecem auxílio de um texto corrido. Isso devido ao seu caráter de complementar as informações que ali são transmitidas. Esse texto ajuda na construção de sentido que a imagem oferece, pois cria recursos que são capazes de comprovar um determinado fato noticioso; assim o fotojornalismo consiste, portanto, no registro de uma narrativa escrita aliada a imagens. Vale salientar que as fotografias nos jornais ganharam grande credibilidade quando passaram a ser um elemento a mais nos jornais 2

[...] a fotografia jornalística ganhou força, ultrapassando o carácter meramente ilustrativo e decorativo a que era votada. O fotojornalismo de autor tornou-se referência obrigatória. Pela primeira vez, privilegiou-se a imagem em detrimento do texto, que surgia como um complemento, por vezes reduzido a pequenas legendas. (SOUSA, 2004, p.20). Com essa mudança o fotojornalismo ganhou destaque nas redações e veio crescendo a cada instante. O trabalho do fotojornalista nas redações consiste em produzir imagens que complementam as notícias narradas por textos, fazendo com que elas tornem-se relevantes e eficazes de uma maneira mais real possível ao leitor na tentativa de que a sociedade compreenda o que está acontecendo no mundo. Atualmente não há fato que dispense a cobertura fotojornalística. Hoje as imagens dividem importância com os textos em revistas e jornais. Há até quem diga que imagem e texto se complementam no jornalismo: a primeira, mais emocional e sintética, atinge primeiramente e diretamente o leitor; o segundo, mais racional e analítico, leva mais tempo para ser assimilado. (ZUANETTI; REAL; MARTINS, 2002, p.18-19) A fotografia tem o poder de mostrar, revelar e servir como um documento que testemunhe a verdade. Então, podemos afirmar que a imagem por si fala, transmite e dá sentido a informações em conjunto com o texto, fixando, dessa maneira um sentido transitório. Sua inserção nos jornais passou por momentos bastante conturbados ao longo de seu processo de implantação no Brasil, isso devido a grandes dificuldades de impressão, a ditadura militar e a censura política. Aos poucos a fotografia veio adquirindo importância e espaço complementando as informações e revolucionando a imprensa. Fazendo, dessa maneira, um jornal mais atraente ao olhar. Nesta pesquisa utilizamos a análise de conteúdo para compreendermos a questão da ética no fotojornalismo. A pesquisa buscou compreender o que na verdade vem a ser ética e como os jornais retratavam e retratam a dor dos outros na mídia. Buscamos também entender qual postura as editorias dos jornais tomam em relação ao sensacionalismo e quais suas consequências para o mercado editorial. Como método de analise utilizamos a pesquisa bibliográfica, a observação e investigação das imagens veiculadas nos jornais da época e da atualidade. 3

Fotografia do presente, documento do futuro Fotografar é eternizar o momento. É congelar inrformações para que futuras gerações possam conhecer um fato que aconteceu no passado e que se perambula no presente, exibindo para o outro o segundo anterior que ele não pôde ver. Com esse aprisionamento do tempo, que a fotografia proporciona, podemos visualizar aquelas informações que ocorreram em períodos distintos e que às vezes nos ajudar a resolver problemas. Guardando na memória uma fase e um momento da história passado para que possamos relembrar determinados acontecimentos. Em Kossoy (2002) a fotografia implica uma transposição das realidades: é a transposição da realidade visual do assunto selecionado, no contexto da vida (primeira realidade), para a realidade da representação (imagem fotográfica: segunda realidade); trata-se pois, também de uma transposição de dimensões, ou seja, é uma espécie de espelho real, pois dá dimensões da vida. O registro fotográfico sinaliza a existência de determinados cenários socioculturais, econômicos e político, podendo-se refletir esta ou aquela ideologia. (OLIVEIRA, Erivam Morais de. O resgate da ética no fotojornalismo: a banalização das imagens nos meios de comunicação). Com a fotografia temos a possibilidade de investigar e descobrir informações, estabelecendo metodologias adequadas de pesquisa e análises para decifrar seus conteúdos, entendemos assim o seu real funcionamento. Com a capacidade de ser algo memorável, a fotografia tem o poder de revelar informações como também de mostrar sentimentos, dependendo daquilo que foi retratado As imagens são documentos para história e também para a história da fotografia. É a fotografia um intrigante documento visual cujo conteúdo é a um só tempo revelador de informações e denotador de emoções. (KOSSOY, 2001, p. 27) 4

A retratação da dor dos outros na mídia É impossível passar os olhos por qualquer jornal, de qualquer dia, mês ou ano, sem descobrir em todas as linhas os traços mais pavorosos da perversidade humana [...] Qualquer jornal, da primeira à última linha, nada mais é do que um tecido de horrores. Guerras, crimes, roubos, linchamentos, torturas, as façanhas malignas dos príncipes, das nações, de indivíduos particulares; uma orgia de atrocidade universal. E é com este aperitivo abominável que o homem civilizado rega o seu repasto matinal. (BAUDELAIRE, 1860, apud SONTAG, 2003, p. 89-90). A ética é um elemento bastante complexo devido ao seu caráter individual, isso porque cada indivíduo tem pra si uma concepção daquilo que ela vem a ser. Nos meios de comunicação social, a ética é guiada pela reação do público à conduta destes meios e aos seus métodos de funcionamento (KEENE, 2002). Assim, o fotojornalista quando realiza sua captura fotográfica está ciente daquilo que quer ser mostrado, pois ele ao fazer sua imagem tenta abordar todos os elementos possíveis para que a sociedade entenda o que ele quer transmitir, ou seja, ele dá diretrizes capazes de decifrar a ideia somente com a simples imagem. Durante as guerras e conflitos por região eram comum encontrarmos imagens que chocavam a sociedade, mas isso era comum para a época, pois era um momento em que se lutava para o fim da dor das pessoas. Fotos de pessoas mortas, em situações de desalento, espancadas, eram corriqueiras, pois aquilo servia de denúncia e, em alguns casos, de alerta para que a população ficasse ciente do que estava contecendo ou o que poderia acontecer com ela. Nessa época, muitos fotojornalistas ganharam prestígio e alguns nem tanto. Como é o caso do fotógrafo Kevin Carter que em 1994 ganhou o prêmio Pulitzer ao fotografar a imagem de uma criança sendo observada por um abutre no Sudão. A fotografia foi publicada no New York Times (NYT) em 26 de março de 1993. Alguns meses após a publicação dessa fotografia, Carter cometeu suicídio devido a pressão que sofreu por não ter ajudado a criança que fora fotografada e pelo horror que guerra proporcionava, muitos afirmavam que ele já não suportava mais a guerra. É importante salientar que, cabe a cada autor estar ciente daquilo que julga bom ou mal para o olhar alheio, pois são os outros que irão visualizar esses produtos midiáticos, as fotografias. Então, quando fazemos uma imagem, que possivelmente, irá chocar devemos estar prontos para o que a população vem a dizer. Vivemos em um mundo democrático e temos o dever e a obrigação de deixar a opinião pública criticar o que vem sendo divulgado 5

na mídia. A questão ética é bastante confusa e contraditória tendo em vista o pensamento de cada um. O que para um pode ser algo bom, para outro isso não se aplica. Ou seja, cada indivíduo trata os determinados acontecimentos do mundo de uma maneira distinta e na fotografia isso não seria diferente, pois ela é um texto visual e assim todos tem uma ideia daquilo que está sendo transmitido. Para mostrar algo às pessoas que, de certa maneira, foge dos padrões populares devemos analisar com muito afinco no intuito de não causar pontos negativos para aqueles que veem, isto é, para não nos depararmos com o espanto alheio. A construção visual da notícia passa pela intenção e posicionamento do jornalista da imagem e pela ideologia pela qual essa imagem será construída utilizada e distribuída. A imagem produzida leva ainda consigo a carga subjetiva de seu produtor. Desde a escolha da objetiva pelo fotojornalista, o ponto de vista em relação ao fato, o enquadramento, até mesmo zona de nitidez da imagem revelam as intenções de que a produz ou quem a veicula. (CHINALIA, 2005). Imagens que falam por si Imagem 1: Criança morrendo de fome Kevin Carter (1993) 6

A imagem acima é uma fotografia comovente, pois choca aquele que a observa devivo a ideia que o autor tenta passar. O desprezo e o esquecimento da criança que morre de fome e que não tem a socorrer. A fotografia de Carter, apesar de possuir uma boa composição, é carregada de elementos que causam horror. O olhar fixo do abutre para sua presa, a criança que não possui forças para se erguer, a tensão que existe entre os dois personagens retratados, o abutre a espreita que sua presa e a criança que tenta se arrastar para o local que sua família se encontra são elemetos que deixam uma inquietação no olhar daquele que visualiza tal informação, pois trata-se de uma imagem forte publicada em um jornal que muitos tem acesso. Imagen 2: Criança faminta Eddie Adams (1976) O emprego de imagens de crianças sempre nos remete a sensação de liberdade e inocência, sabemos que sua utilização pública não é aconselhável. No Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) artigo 18 tem-se: É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor. A fotografia acima revela a imagem de um ser sem dono, como se estivesse abandonado por alguém e que estivesse esperando se carregado no colo, ou seja, uma imagem desumana, pois a criança mostrada na fotografia está despida, magra e suja, o que 7

nos vela a perceber o tratamento desumano que ela passa. A fotografia de Eddie Adams é composta por uma gradação muito hamoniosa de tons de cinza que decresce de baixo para cima, fazendo-a uma imagem bela. Imagem 3: Crianças fugindo após bombardeamento de aviões do Vietname do Sul. (Nick Ut 1972) Imagem de desespero da menina Phan Thi Kim Phuc e de outras crianças atingidas pelo bombardeamento, essa fotografia ilustrou muitas páginas e mostrou e ainda mostra o horror que a guerra proporcinava as pessoas. Nessa fotografia vemos o desespero emergindo das faces alheias e quando imagens desse tipo são expostas para a população inibi-se a ética. A dor das pessoas é mostrada para todos de uma meneira intensa. Imagem 4: Vítimas de Desastres Gás Bhopal Índia (Pablo Bartholomew 1984) 8

Na fotografia 4 temos uma cena que tortura o olhar de quem a observa. Esta imagem tem boa composição fotográfica, uma vez que possui cor atraente. É composta de um marrom uniforme e escuro é acrescentada de pontos alaranjados fazendo uma bela imagem, apesar de retratar a morte de uma criança. Compreendemos, na imagem, o óbito de uma criança vítima de um desastre. Em nossa atualidade nunca devemos publicar fotografias desse tipo, pois assusta aquela que observa e muitas vezes certos jornais perdem sua credibilidade, devido a tentativa de retratar aquilo que as pessoas têm medo. Vivemos em um mundo em que a imagem vale muito e se não tivermos um cuidado adequado em escolher o material para publicação poderemos estar nos comprometemos com nosso ideal. O conceito de fotografia e sua imediata associação à idéia de realidade se tornam tão fortemente arraigado que, no senso comum, existe um condicionamento implícito de a fotografia ser um substituto imaginário do real. (KOSSOY, 2002, p. 136). Conclusões Com esse estudo pretendeu-se compreender a questão da ética nas fotografias veiculadas nas mídias. Entender o que é aconselhável ser divulgado e mostrado para as pessoas. Ao passar dos anos o fotojornalismo adquiriu espaço e foi construindo seu lugar na mídia de uma maneira bastante envolvente e atraente. A evolução dos equipamentos fotográficos contribuiram para tal amadurecimento e melhoramento da notícia. Vivemos rodeados de reportagens que denuncia a guerra, a morte, o abandono e compreendemos o motivo de ser mostrado o terror para a população, pois é através da fotografia que constatamos e percebemos que o mundo necessita de ajuda. Mas devemos compreender também que nem toda imagem deve ser mostrada. Existem famílias por trás desses retratos que exibem o horror alheio. É importante pensar na questão ética, pois são seres humanos que ali estão retratados e são seres humanos que vêm a todo instante imagens que aterrorizam sua mente. Portanto, a ética deve ser avaliada na profissão de cada um para que não se coloquem em dúvida essas questões e que as imagens sejam reavaliadas antes de qualquer publicação. As veiculações de informações que desrespeitam o outro constituem falta de ética profissional de acordo com o código. 9

Bibliografia CHINALIA, Nelson Sebastião. Fotojornalismo: A manipulação visual da notícia. Artigo apresentado no I Encontro Paulista de Professores de Jornalismo, realizado na Universidade de Sorocaba, interior de São Paulo, organizado pelo FNPJ Fórum Nacional de Professores de Jornalismo, 2005. KOSSOY, Boris. Realidades e ficções na trama fotográfica. Cotia, SP: Ateliê Editorial, 2002. LIMA, Elaine de Moura. A manipulação da imagem no fotojornalismo dos impressos diários de Teresina. Trabalho apresentado no X Simpósio de Produção Cientifica e IX Seminário de Iniciação Cientifica da Universidade Estadual do Piauí- UESPI /2010. SANTAELLA, Lucia. Winfried, North. Imagem: cognição, semiótica, mídia. 1. Edição, 5 Impressão São Paulo: Iluminuras, 2008. SONTAG, Susan. A dor dos outros. SOUSA, Jorge Pedro. Fotojornalismo Introdução à História, às Técnicas e à Linguagem da Fotografia na Imprensa. Florianópolis: Letras Contemporâneas, 2004. ZUANETTI, Rose; REAL, Elizabeth; MARTINS, Nelson; et. al. O olhar do fotógrafo: A fotografia como documento histórico. Fotógrafo: O Olhar, a técnica e o trabalho. Rio de Janeiro: Editora Senac Nacional, 2002, p.17-22. 10