O SISTEMA DE INFORMAÇÃO CONTÁBIL UTILIZADO NOS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA:



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Transcrição:

O SISTEMA DE INFORMAÇÃO CONTÁBIL UTILIZADO NOS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA: uma analise dos modelos utilizados pelos Empreendimentos Econômicos solidários incubados pelo PITCPES/UFPA Ailton Castro Pinheiro (Ailton@ufpa.br) Discente do Curso de Ciências Contábeis/UFPA Bolsista do Programa Incubadora Tecnológicas de Cooperativas Populares e Empreendimentos Solidários. Francivaldo Albuquerque Bacharel em Ciências Contábeis /UFPA Especialista em docência do ensino Superior Técnico do Núcleo Gestão-PITCPES/UFPA Resumo A contabilidade é uma Ciência que visa gerar informações para que gestores de diferentes entidades tomem decisões mais precisas, tendo como parâmetros os instrumentos gerados pelas técnicas contábeis, a fim de melhor dimensionar seu patrimônio. O objetivo deste trabalho é saber de que forma os Empreendimentos Econômicos Solidários (EES), que têm limitações na gestão e consequentemente controle dos processos de produção, fazem os registros das suas movimentações financeiras, e se o método utilizado é relevante para tomada de decisão. Neste sentido, fez-se um estudo dos instrumentos utilizados por alguns empreendimentos incubados pelo Programa Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares e Empreendimentos Solidários (PITCPES), com base nos documentos encontrados no acervo do PITCPES e de visitas realizadas aos empreendimentos. Para isto, fez-se um paralelo entre a contabilidade empresarial e contabilidade utilizada pelos EES, tendo em vista saber de que forma se há diferença no uso dos instrumentos contábeis nesses dois tipos de entidades. Introdução A Contabilidade é um instrumento de gestão que auxilia na tomada de decisões. Conforme Iudícibus (1995, p. 26) o objetivo principal da contabilidade (e dos relatórios dela emanados) é fornecer informação econômica relevante para que cada usuário possa tomar suas decisões e realizar seus julgamentos com segurança. A estrutura pedagógica da Contabilidade está voltada, em grande medida, para o ensino da Contabilidade das grandes empresas, como pode ser observada na estrutura curricular dos cursos de Ciências Contábeis, ou mesmo nos livros que tratam sobre o tema. No entanto, a Contabilidade é uma ciência e como tal precisa atender a necessidade de toda e qualquer entidade que atue de forma licita, independente do porte da mesma. Em tempos em que se acirram cada vez mais as desigualdades sociais e a concentração de renda, a Contabilidade precisa mostrar que tem um papel importante de Responsabilidade Social, mas para isso precisa de recursos humanos da área contábil que tenha um novo enfoque no que tange a Ciência Contábil. 1

Uma das maiores dificuldades dos Empreendimentos Econômicos Solidários (EES 1 ), que passam pelo processo de incubação é quanto ao tratamento de sua Contabilidade, conforme já observado em pesquisas anteriores de Dias, Fernandes e Silva (2002, p. 2). Geralmente na prestação de contas é quando ocorre a maioria dos conflitos, pois cooperados e associados querem cada vez mais transparência na gestão de empreendimentos. Seria interessante se os mesmos instrumentos contábeis utilizados pelas grandes entidades capitalistas fossem utilizados pelos EES. No entanto, Iudícibus (1995, p.82) afirma que os relatórios contábeis não são capítulos de novelas empresariais que qualquer pessoa mobralizada possa entender [...], ou seja, o usuário precisa possuir o mínimo de conhecimento Para o entendimento das informações, por isso, nos empreendimentos solidários, seria pouco relevante à aplicação de modelos contábeis rigorosos, por exemplo, os presentes na Lei nº 6404/76, justamente porque quem mais precisa das informações são os associados e cooperados que, salvas exceções, são pessoas de pouco conhecimento formal. Neste contexto, o objetivo do trabalho é identificar quais são os instrumentos contábeis utilizados pelos EES para o registro de suas movimentações financeiras e sua relevância para a tomada de decisão. Os Empreendimentos Econômicos Solidários e o Programa Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares e Empreendimentos Solidários De acordo com Eid e Gallo apud (MACIEL, 2008, p.2) os empreendimentos econômicos solidários são definidos como organizações coletivas de trabalhadores voltados para a geração de trabalho e renda, regidos, idealmente, por princípios de autogestão, democracia, participação, igualitarismo, cooperação no trabalho, auto sustentação, desenvolvimento humano e responsabilidade social. Nesse sentido, o empreendimento é um tipo diferente de organização do trabalho em relação às empresas capitalistas, pois o objetivo não é gerar lucro e nem concentrar a renda, mas sim proporcionar o bem estar de cooperados e associados, assim como o desenvolvimento social de seu entorno. Estes empreendimentos estão inseridos em outra economia: a Economia Solidaria que para Eid e Gallo (Idem, 2008, p.2) consiste em um conjunto de experiências coletivas de trabalho, produção, comercialização e créditos organizadas sob diversas formas: cooperativas e associações de produção, empresas autogestionaria, bancos comunitários, clubes de trocas, bancos do povo e diversas organizações populares urbanas e rurais. Portanto, trata-se de empreendimentos que possuem limitações em face de não disponibilizarem de conhecimentos capazes de operar determinadas exigências da produção, da gestão e do mercado. Isto porque um empreendimento Econômico Solidário (EES) caracteriza-se por: 1. Trabalho associativo e autogestionario; 2. Propriedade coletiva; 3. Respeito às diversidades; 4. Distribuição da riqueza e prática do preço justo; 5. Desenvolvimento local e sustentável. O Programa Integrado de Ensino, Pesquisa e Extensão intitulado Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares e Empreendimentos solidários-pitcpes/ufpa visa apoiar e acompanhar empreendimentos solidários no âmbito rural e urbano. Suas ações 1 Aqueles que estão pautados nos princípios da economia solidária (trabalho associativo e autogestionário, propriedade coletiva, respeito às diversidades, distribuição da riqueza, prática do preço justo e desenvolvimento local e sustentável). 2

buscam atender demandas relativas à gestão e inovação da produção, a partir da unidade entre economia e sociedade, tendo em vista a geração de trabalho e renda, na perspectiva do desenvolvimento local sustentável. O PITCPES constiu-se como laboratório de articulação entre ensino pesquisa e extensão, na medida em que tem por princípio habilitar discente de graduação e de pósgraduação à produção de conhecimento com base na pesquisa aplicada, ou seja, as reflexões teóricas são vinculadas ao exercício prático, a partir da troca entre o conhecimento técnico e os saberes populares dos trabalhadores(as) nos empreendimentos Solidários (PITCPES/UFPA2008). Características da Contabilidade Empresarial O objetivo da Contabilidade é prestar informações para a tomada de decisões. Em uma grande empresa onde o principal objetivo é gerar lucro, assim, as informações das Ciências Contábeis são utilizadas de maneira estratégica, para o maior crescimento da empresa, ou seja, aumentar os lucros e diminuir os custos. Em uma grande empresa como uma Sociedade Anônima (S.A.), por exemplo, os responsáveis pela tomada de decisões possuem instrumentos contábeis como Balanço Patrimonial, Demonstrações do Resultado do Exercício, Fluxo de Caixa, Demonstração das Origens e Aplicação dos Recursos e vários outros controles e relatórios financeiros, que possibilitem respostas às perguntas como, por exemplo: como está a saúde financeira e econômica da empresa? Quais os bens e direitos de propriedade da empresa? Quais as obrigações que têm o empreendimento no período de um ou mais ano? Quanto os sócios investiram? Qual o resultado alcançado no ano x? Qual a viabilidade de um determinado investimento? E outras indagações, além disso, fazem uso da auditoria, análise e planejamento orçamentário, que juntos com as demonstrações financeiras vão embasar melhor o processo de tomada de decisões. Em uma grande empresa capitalista a contabilidade faz uso da técnica contábil para que através dela possa obter os instrumentos necessários para a tomada de decisão. Segundo Sá (1994, p.419) a técnica contábil é um conjunto de procedimentos adotados em contabilidade para registrar ou levantar os fatos patrimoniais as técnicas são: escrituração (partidadas simples ou dobradas), as demonstrações financeiras, auditoria e análise das Demonstrações Financeiras. As empresas utilizam o método das partidas dobradas, como o principal método de escrituração. Este método é denominado de partidas dobradas (partida=registro=escrituração=lançamento) porque o mesmo valor é lançado em duas contas, no mínimo, através dos débitos e créditos. A finalidade de se lançar em dois lugares é manter a equação de trabalho ou de equilíbrio patrimonial em situação de igualdade (PADOVEZE, 1991, p.83). Como exemplo mostra-se um lançamento típico deste método: a companhia Albertina solicitou um financiamento ao Banco coroa no valor de $400.000.000,00 cujo valor foi depositado na conta bancária da empresa, aberto nesta oportunidade: Tabela 1: modelo simplificado de livro diário Data 20/12/xx Débito Banco conta movimento Crédito Financiamento Valor $400.000.000,00 Fonte: elaboração do autor, a partir de estudos bibliográficos. 3

O modelo de Informação Contábil utilizado pelos EES Nos Empreendimentos Econômicos Solidários o objetivo não é gerar o lucro, mas sim o bem estar de seus membros, no entanto o não gerar lucro não significa que o empreendimento não tenha que se desenvolver economicamente. A diferença é que em uma empresa apenas os sócios se beneficiarão dos lucros, enquanto nos EES todos terão direito às sobras (excedente econômico que constitui o lucro de uma empresa) e ainda a comunidade, em que estão inseridos, pois umas das características dos empreendimentos solidários é o desenvolvimento local e sustentável. Diferentemente do modelo utilizados pelas grandes empresas, nos EES a escrituração é feita, inicialmente, utilizando o método das partidas simples, que Marion (1995, p.123) aborda da seguinte maneira: Há empresas, ou mesmo pessoas físicas, que fazem contabilidade pelo método das partidas simples, ou seja, contabilizam apenas um débito ou apenas um crédito. Suponha-se um pequeno agricultor, sem muita preocupação de controle, realizando os seguintes lançamentos: 1. Venda avista de sua produção: debita (ou lança entrada de dinheiro) o caixa 2. Compra a vista de sementes: credita (ou lança saída do dinheiro) 3. Empresta dinheiro do Banco x: credita (ou lança como divida) o banco x. 4. Vende a prazo para a cooperativa y: debita (ou lança como valor a receber) a cooperativa y. Como resultado deste método (partida simples), os EES obtêm os seus instrumentos, que serão utilizados para o controle das movimentações financeiras, são eles: controle de caixa (controla a entrada e saída de dinheiro), controle da conta corrente bancária (serve para ter um controle do dinheiro que se dispõe no banco), controle de contas a pagar (evidencia as obrigações da entidade) e controle de contas a receber (evidencia o direito que a entidade tem com seus clientes). Assim, vejo um exemplo de demonstração de método das partidas simples em uma cooperativa que atua no ramo da venda de açaí in natura, em que se realizou as seguintes operações no 03/02/2008: 1. Vendeu 30 rasas de açaí, no valor de R$70,00 a unidade, obtendo com isso uma receita de R$2.100,00; 2. Comprou da cooperativa z R$270,00 em material para uso diário, pagando metade à vista e metade a prazo para pagar em 30 dias; 3. Fez um empréstimo bancário, para pagar alongo prazo, no valor de R$ 3.000,00 4. Vendeu uma parte de sua produção no valor de R$3.000,00 recebendo metade a vista e a outra metade a prazo com vencimento em 30 dias. Tabela 2: modelo de ficha de controle de caixa FICHA DE CONTROLE DE CAIXA DATA HISTÓRICO ENTRADA SAIDA SALDO Saldo do dia R$500,00 anterior 03/02/2008(lançamento Venda de açaí R$2.100,00 nº 01) 03/02/2008(lançamento Material de uso R$135,00 nº 2) diário 03/02/2008(lançamento Venda da produção R$1.500,00 nº 4) 4

Apuração do saldo Total da entrada+ saldo do dia anterior Total da saída Saldo do dia R$4.100,00 R$135,00 R$3.965,00 Responsável------------------------------------------------- folha nº----- Fonte: Curso de contabilidade para EES, elaborados por ALBUQUERQUE & PIRES (2008, p.7), Técnicos do PITCPES-UFPA, 2008. Tabela 3: modelo de ficha de controle de conta bancária CONTROLE DE CONTA CORRENTE BANCARIA AG: x C/G: xxyyss BANCO: B DATA ENTRADAS SAIDAS SALDO HISTÓRICO VALOR HISTORICO VALOR VALOR 03/02/2008(lançamento nº 03) Empréstimo R$3.000,00 Fonte: de contabilidade para EES, elaborados por ALBUQUERQUE & PIRES (2008, p.8), Técnicos do PITCPES-UFPA, 2008. Tabela 4: modelo de ficha de contas a receber CONTROLES DE CONTAS A RECEBER NOME DO CLIENTE VALOR A RECEBER VENCIMENTO LIQUIDAÇÃO (DATA) OBSERVAÇOES (DATA) Cooperativa Y(lançamento nº 4) 1.500,00 3/03/2008 05/03/2008 Fonte: de contabilidade para EES, elaborados por ALBUQUERQUE & PIRES (2008, p.9), Técnicos do PITCPES-UFPA, 2008. Tabela 5: modelo de ficha de controle de contas a pagar CONTROLE DE CONTAS A PAGAR NOME DO VALOR A PAGAR VENCIMENTO LIQUIDAÇÃO (DATA) OBSERVAÇOES FORNECEDOR (DATA) Cooperativa Z R$135,00 03/03/2008 04/03/2008 Fonte: de contabilidade para EES, elaborados por ALBUQUERQUE & PIRES (2008, p.7), Técnicos do PITCPES-UFPA, 2008. Embora haja alguns números relativos ao negócio, percebe-se que o método das partidas simples é imperfeito por revelar insuficiência de dados para a tomada de decisão. Essa razão por que tal método não é largamente utilizado (MARION, 1995, p.124). O regime contábil 2 utilizado pelos EES também se diferencia dos utilizados pelas empresas, enquanto a empresa utiliza o regime da competência 3, os EES fazem uso do regime 2 Processo de registro em contabilidade; normas que orientam o controle e o registro dos fatos patrimoniais (SÁ, 1994,p.394). 3 Norma contábil pela qual os ingressos e os custos são atribuídos ao exercício a que pertencem, embora recebidos e pagos em outros exercícios (SÀ, 1994, p394). 5

de caixa 4. Conforme já observado em pesquisas anteriores de Dias, Fernandes e Silva (2002 p.9): A adoção do princípio da competência viria a criar conflitos (a curto prazo) entre o saldo de caixa e o lucro apurado, e por este motivo pensamos que o procedimento ora adotado atende às necessidades dos cooperados, por outro lado, em função da não adoção do principio da competência, algumas informações não são contabilizadas tempestivamente, notadamente àquelas que envolvem apropriação de despesa. Neste sentido acreditamos que a superação deste problema está na adoção de um sistema híbrido de registro das contas de resultado, onde as receitas, por serem à vista, não precisarão ser apropriadas, mas determinadas despesas poderão ser apropriadas, possibilitando controle de contas a pagar e receber. Outro instrumento utilizado pelos EES é o orçamento que no âmbito da Contabilidade Pública, tendo como parâmetro um modelo mais tradicional de orçamento, Kohama (1998, p.64), conceitua da seguinte maneira: orçamento é um ato de previsão de receita e fixação da despesa para um determinado período de tempo, geralmente, um ano, e constitui o documento fundamental das finanças do Estado, bem como da contabilidade pública. Diante da fragilidade do sistema contábil utilizado inicialmente pelo EES, no que se refere à tomada de decisão, eles utilizam o orçamento como apoio para a tomada de decisão. Este orçamento é feito com base nos relatórios financeiros básicos e por isso são simples previsão de receitas e despesas com base nas experiências dos anos anteriores. Portanto entende-se, que o orçamento é um instrumento de planejamento minucioso, onde serão previstos receitas e fixados despesas, para que os EES tomem decisões utilizando parâmetros para isso, como por exemplo, qual é a meta de venda para o próximo ano; quanto deve ser a produção; quanto poderá consumir em suas atividades cotidianas; qual o alvo do empreendimento em relação a sobras etc. (FERNANDES, 2007). No final do ano realiza-se um confronto entre os valores orçados e os realizados, com o objetivo de identificar as variações favoráveis ou desfavoráveis em relação ao orçamento. Identificadas às variações, medidas devem ser tomadas no sentido de corrigir a rota e direcionar as ações em direção dos alvos. Considerações Finais Os empreendimentos Econômicos Solidários utilizam, inicialmente, um método simples para fazer o registro de suas movimentações financeiras, são simples devido as suas próprias características: pessoas de baixa escolaridade e que sobrevivem com renda mínima. Através do método das partidas simples é possível se chegar a um sistema contábil simplificado, em que se utiliza dos controles financeiros básicos: caixa, banco conta corrente bancária, contas a pagar e a receber. Esses controles financeiros são de extrema importância no início do empreendimento, pois através deles é possível manter a transparência financeira; a apuração do resultado do exercício, que é feito através dos confrontos entre as receitas e as despesas; distribuição das sobras que é o resultado positivo da apuração do resultado e também para o controle efetivo do patrimônio. Apesar de ter uma importância significativa para a gestão dos EES, os controles não são o suficiente para que possam ser usados como instrumentos de tomada de decisões, justamente porque não fornecem informações suficientes que embasem o processo decisório. Outro instrumento utilizado pelos EES é o orçamento, este ajuda no processo decisório do 4 Norma contábil pela qual os ingressos são atribuídos ao exercício em que são recebidos e os custos ao exercício em que são pagos (SÀ, 1994, p394). 6

empreendimento, pois é utilizado como uma ferramenta de planejamento a fim de colocar as metas que eles desejam alcançar. Esse orçamento é feito com base nas informações advindas dos controles financeiras e se diferencia do orçamento empresarial, por seu caráter simplificado, pois são feitos de maneira que todos os associados e cooperados possam entender. Pensa-se que os EES poderiam utilizar o mesmo método e instrumentos hoje praticados pelas grandes empresas capitalistas, mas a maneira como organizam o seu controle patrimonial atende a necessidade dos cooperados e associados, porém na medida em que estes empreendimentos tiverem uma evolução no seu patrimônio será preciso uma evolução também no sistema contábil. 7

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AlBUQUERQUE& PIRES.Curso:Contabilidade para Empreendimentos Solidários,Belém PA:PITCPES/UFPA,2008 BARBIER, René. A pesquisa-ação. Tradução de Lucie Didio. Brasília: Líber Editora, 2007. DIAS, Lidiane Nazaré da Silva. SILVA, Marinaldo, FERNANDES, José Wilson. A importância da Contabilidade nas organizações populares: o caso do sistema de informação contábil utilizado na Cooperativa de Serviços Gerais do município de Belém. 2 seminário de controladoria, São Paulo: USP, 2002. GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5º Ed. São Paulo: Atlas, 1999. IUDÍCIBUS, Sergio de. Teoria da Contabilidade. 4º Ed. São Paulo: Atlas, 1995. MACIEL, Alanne Barbosa. Curso: Associativismo e Cooperativismo, Belém- PA:PITCPES/UFPA2008 MARION, José Carlos. Contabilidade Básica. 3º Ed. São Paulo: Atlas, 1995. PADOVEZE, Clóvis Luís. Manual de Contabilidade Básica. 2º Ed. São Paulo: Atlas, 1991. SÁ, A.Lopes de. Dicionário de Contabilidade. 8º Ed. São Paulo: Atlas, 1994. FERNANDES, José Luiz Nunes. Contabilidade Gerencial: eficaz ferramenta da controladoria. 1ºEd. Belém-PA, 2007. ANGÉLICO, João de. Contabilidade Pública. 8º Ed. São Paulo: Atlas, 1995. KOHAMA, Helio. Contabilidade Pública. 6º Ed. São Paulo: Atlas, 1998. 8

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