Sozinhas: histórias de mulheres que sofrem violência no campo - Reflexões sobre uma Narrativa Transmídia 1

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Transcrição:

Sozinhas: histórias de mulheres que sofrem violência no campo - Reflexões sobre uma Narrativa Transmídia 1 Ana Carla de Araújo Fernandes PIMENTA 2 Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC RESUMO Esse artigo aborda a reportagem Sozinhas: histórias de mulheres que sofrem violência no campo para discutir a transmidialidade dentro do jornalismo. A narrativa é composta por uma reportagem na web com textos, fotos, áudios e vídeos; uma edição impressa; uma reportagem radiofônica; e uma matéria televisiva. Para a presente discussão nos valemos de um viés qualitativo composto por revisão bibliográfica e entrevistas com os produtores da reportagem. Concluímos pela relevância do planejamento, da necessidade de um maior investimento de tempo, e do envolvimento de profissionais com perfis diferenciados para a realização de produções transmídia. PALAVRAS-CHAVE: convergência; inovação; jornalismo; transmídia. Introdução O Jornalismo sempre se valeu do uso de novos formatos para inovar na produção de seus conteúdos, mas isso se acelerou no século XX e se expandiu ainda mais nesse início do século XXI, especialmente nos grandes veículos de comunicação, que utilizam da convergência de mídias para agregar múltiplos recursos em um mesmo produto. São várias as formas de narrativas jornalísticas que surgiram nos últimos anos, como as longforms, as grandes reportagens multimídias, os audiovisuais feitos a partir de vídeos em 360 graus, entre outros. Dentre as várias possibilidades de apresentação desses conteúdos jornalísticos estão as narrativas transmídias, que Jenkins (2009) explica como sendo uma história que se desenvolve por meio de diversas plataformas de mídia, com cada conteúdo 1 Trabalho apresentado no GP Conteúdos Digitais e Convergência Tecnológicas, XVIII Encontro dos Grupos de Pesquisas em Comunicação, evento componente do 41º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. 2 Mestranda de Jornalismo no Programa de Pós-Graduação em Jornalismo/PPGJOR da Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC, e-mail: anacarlapimenta20@gmail.com 1

colaborando para o todo. Imaginar essas potencialidades na produção de materiais jornalísticos e seus diferentes formatos possibilita novas maneiras de nos comunicar com o público e aproveitar o que cada mídia tem de melhor. Sozinhas: histórias de mulheres que sofrem violência no campo é uma reportagem que retrata histórias de mulheres agricultoras que enfrentaram violências física, psicológica e financeira. O material é composto por uma reportagem na web 3, uma reportagem impressa 4, uma reportagem radiofônica 5 e uma reportagem televisiva 6. Possuidor de uma temática sensível e um formato pouco usual no jornalismo, esse trabalho se destacou e foi vencedor de três prêmios jornalísticos em 2017. O primeiro foi o Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos, na categoria Produção Jornalística em Multimídia. O segundo foi o Prêmio NSC, na categoria Reportagem. O terceiro foi o Prêmio Massey Ferguson de Jornalismo, na categoria Multimídia. As pesquisadoras Elaide Martins e Raquel Longhi diferenciam as produções multimídias e transmídias. Ainda que narrativas multimídia e transmídia tenham pontos em comum, como o uso da multimidialidade, hipertextualidade e interatividade, entretanto, não se tratam de sinônimos. Ambas são possibilitadas a partir de diversos recursos, mas cada uma guarda suas especificidades. Em uma comparação muito simples, podemos dizer que a narrativa multimídia ampara-se na exploração dos recursos multimidiáticos (texto, áudio, vídeo, infográficos, etc.) com vistas à construção de um discurso unificado, enquanto a transmídia perpassa de uma mídia para outra para contar histórias construídas a partir de um mesmo enredo, mas com versões distintas e complementares e totalmente independentes. (LONGHI e MARTINS, 2015, p. 5). 3 A reportagem pode ser visitada no endereço: http://www.clicrbs.com.br/sites/swf/violencia_contra_mulheres_do_campo/index.html 4 Link do PDF da versão impressa da reportagem http://flipdc.clicrbs.com.br/jornaldigital/pub/dc/?numero=11655&edicao=3077 5 http://videos.clicrbs.com.br/sc/cbndiario/audio/radio-cbn-diario/2017/07/reportagem-especial-sozinhas-01-07- 2017/186537/ 6 http://g1.globo.com/sc/santa-catarina/jornal-do-almoco/videos/t/edicoes/v/reportagem-retrata-a-triste-realidade-dasmulheres-que-sao-vitimas-da-violencia-no-campo/5978562/ 2

Embora a reportagem Sozinhas utilize recursos multimídias, classificamos-a aqui como uma narrativa transmídia. Metodologia Para produzir este artigo utilizamos um viés qualitativo uma vez que trabalha com significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes. (MINAYO, 2004). Ele foi composto por uma vertente bibliográfica ou teórica, por um mapeamento e por uma pesquisa de campo. A pesquisa teórica buscou revisar os estudos que já foram feitos sobre transmidialidade, principalmente no jornalismo. Além disso, desejávamos estudar conceitos como convergência e inovação. A ideia foi nos valer também da pesquisa de campo. De acordo com Minayo (2004, p. 51) o trabalho de campo se apresenta como uma possibilidade de conseguirmos não só uma aproximação com aquilo que desejamos conhecer e estudar, mas também de criar um conhecimento, partindo da realidade presente no campo. Assim realizamos entrevistas com jornalistas que produziram narrativas transmidiáticas, no intuito de conhecer seus estímulos, suas ferramentas, suas dificuldades e suas avaliações sobre o processo. Desta forma buscamos obter uma visão mais abrangente sobre nosso objeto de estudo, construído tanto a partir de uma visão das teorias e estudos já realizados, quanto a partir de uma compreensão buscada junto àqueles que produzem jornalismo no dia-adia. A Construção de uma Narrativa Transmídia Pensar em inovação é uma necessidade de sobrevivência em qualquer área produtiva e no jornalismo não é diferente, principalmente numa conjuntura de crise. A inovação para a atividade, no entanto, apresenta um discurso voltado para o objetivo de comunicar da melhor maneira possível por meio de experiências novas, completas e comprometidas com o papel inicial da atividade. (LONGHI e FLORES, 2017, p. 24). O que sugere que há espaço para contar as histórias jornalísticas em gêneros e formatos diferentes dos tradicionais. 3

A narrativa jornalística transmídia inova no seu processo de contar suas histórias. Ela nasce a partir da convergência das mídias. O conceito de convergência é definido por Jenkins (2009, p. 29) como sendo um fluxo de conteúdos através de múltiplas plataformas de mídias. O autor observa que a convergência não deve ser compreendida como um processo tecnológico e sim como uma transformação cultural, a medida que os consumidores são estimulados a procurar informações e fazer ligações entre os diversos conteúdos. Talvez, num conceito mais amplo, a convergência se refira a uma situação em que múltiplos sistemas de mídia coexistem e em que o conteúdo passa por eles fluidamente. Convergência é entendida aqui como um processo contínuo ou uma série contínua de interstícios entre diferentes sistemas de mídia, não uma relação fixa. (JENKINS, 2009, p. 377). Alguns pesquisadores vem desenvolvendo estudos sobre as inovações no jornalismo e suas possíveis formas de narrativas. Longhi e Martins (2017) discutem sobre elas e concentram num mesmo espaço as definições de transmídia que vários autores produziram sobre o tema. Transmídia engloba uma narrativa, muitas histórias, muitas formas de mídias e muitos canais: Cada história é completa em si mesma, mas muitas tomadas juntas expandem nosso entendimento do assunto como um todo (MOLONEY, 2009); histórias vinculadas entre si por um mesmo enredo, com diferentes roteiros para cada mídia e que dependem da participação ativa do usuário para expandir o universo da narrativa. Para Scolari (2009), diz respeito a histórias contadas através de múltiplas plataformas, com a participação ativa do usuário; é uma narrativa que se expande em diferentes linguagens, meios ou canais, que contribuem para a construção do mundo narrativo (SCOLARI, 2009) ou de um universo (JENKINS, 2009). (LONGHI e MARTINS, 2017, p. 53). Assim, a reportagem Sozinhas: histórias de mulheres que sofrem violência no campo se encaixa nesse perfil narrativo, já que utilizou da transmidialidade para contar sua história. 4

Compartilhada a partir do Jornal Diário Catarinense, a reportagem na web é composta por textos, fotos, áudios, vídeos e um webdoc 7. Já o material impresso é composto por uma edição especial contendo 16 páginas e um projeto gráfico diferenciado. Utilizamos o termo especial tendo em vista que até a realização dessa reportagem, as publicações no Caderno Nós eram feitas com apenas oito páginas e tendo a inserção de espaços publicitários. Já esse caderno, além de maior, não disponibilizou espaço para publicidades. A reportagem radiofônica possui 9 minutos e 34 segundos de duração e foi exibida no horário matutino junto a Rádio CBN Diário, enquanto a reportagem televisiva possui 7 minutos e 35 segundos e foi exibida junto ao Jornal do Almoço da RBS TV, programa que possui grande audiência de público. Vale destacar que todos os meios pertenciam, no momento de veiculação, ao Grupo RBS de Comunicação 8. Figura 1: À esquerda, Capa do Especial Sozinhas no Caderno Nós do Jornal Diário Catarinense e à direita, Página inicial do especial Sozinhas na internet. Ambas foram publicados no dia 1º de julho de 2017. 7 Termo definido pela própria reportagem para apresentar o documentário em vídeo disponibilizado na web. Nesse artigo não abordaremos o conceito de webdoc. http://videos.clicrbs.com.br/sc/diariocatarinense/videonews/188020/ 8 Na época da publicação desta reportagem, os meios de comunicação ainda pertenciam ao Grupo RBS. Embora a compra destes veículos pelo Grupo NSC Comunicação já estivesse em transação, ela só foi aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) em data posterior a 1º de julho de 2017. 5

Embora a reportagem tenha sido veiculada no dia 1º de julho de 2017, houve toda uma estratégia da equipe em produzir peças audiovisuais que circularam pelos meios digitais e impressos. A rede social Facebook foi importante para dar maior visibilidade ao trabalho. Para isso foi compartilhado no dia 29 de junho de 2017, um Teaser 9, vídeo curto de divulgação, que contou com 16 mil visualizações, 353 curtidas, 98 compartilhamentos e 20 comentários, de sua postagem até 9 de julho de 2018. Os números apresentados dão ideia da grande visibilidade que teve esse recurso midiático. Já no dia da veiculação da reportagem foi realizada uma postagem 10 com a mesma imagem da capa do Jornal. Todas as publicações convidam o público a interagir com o material e ler os conteúdos disponibilizados no site. Figura 2: À esquerda, postagem da capa do Teaser, publicado no dia 29 de junho, dois dias antes da veiculação da reportagem. À direita, postagem publicada no dia 1º de julho de 2017, convidando o leitor a conhecer essa história e navegar por seus links. É importante ressaltar que esse tipo de narrativa não se adequa a todo gênero jornalístico. Para Canavilhas (2013), existem gêneros mais apropriados à narrativa transmídia, dentre eles os originários do webjornalismo. Além disso o autor destaca que a grande reportagem, por ser um gênero que perpassa por todas as mídias e tem como característica a profundidade, contribui para uma maior liberdade narrativa e se ajusta melhor a esse tipo de relato. Um ponto importante de reflexão quando pensamos na produção de narrativas transmidiáticas é a sua distribuição, que pode ser potencializada através das redes 9 https://www.facebook.com/diariocatarinense/videos/1630253823682540/ 10 https://www.facebook.com/diariocatarinense/photos/a.246619255379344.56715.128170820557522/1632708823437 040/?type=3&theater 6

sociais, ampliando a difusão desses conteúdos. De acordo com Porto-Renó, Versuti, Moraes Gonçalves e Gosciola (2011) as redes sociais são capazes de propagar com rapidez as informações divulgadas, o que gera uma audiência de grande amplitude, já que os usuários passam a ser co-autores dos conteúdos. Outro recurso utilizado como estratégia de espalhamento foi o envio de informações sobre esse trabalho para alguns meios de comunicação e também para organizações que trabalhavam com o tema da reportagem. O objetivo era despertar antecipadamente interesse sobre o material que o veículo estaria disponibilizando nos dias seguintes, potencializando sua difusão. Figura 3: À esquerda, postagem sobre a reportagem no Portal de Notícias Acontecendo Aqui e à direita, postagem publicada no Portal MakingOf. Ambas foram veiculadas no dia 30 de junho de 2017. Fonte: https://acontecendoaqui.com.br/comunicacao/reportagem-multimidia-da-rbs-screvela-historias-de-mulheres-que-sofrem-com-violencia-no e http://www.portalmakingof.com.br/rbs_sc_conta_historias_de_mulheres_que_sofrem_com_viol encia_no_campo.html. Acesso em 10 fev 2018. 7

Equipe Multidisciplinar A ideia de tratar sobre a violência contra as mulheres no campo surge a partir de uma inquietação da jornalista Ângela Bastos, que exerce a função de repórter especial no Jornal Diário Catarinense (DC). Após algumas pesquisas sobre o tema, ela apresentou a intenção da produção de uma reportagem para editora do Caderno Nós, onde o trabalho foi posteriormente publicado. O Caderno Nós, é um encarte especial do Jornal Diário Catarinense com edições que circulam nos fins de semana, com oito páginas na edição impressa, além de conteúdo multimídia online, com vídeos, áudios e fotos. A jornalista Julia Pitthan 11 fala sobre a experiência como editora do Nós. Gosto de pensar que o Nós se ampara na experiência e no legado do jornalismo impresso, mas tem a ousadia de um nativo digital. No começo, nossa ambição era discutir temas polêmicos e que diziam respeito às grandes questões de Santa Catarina. Aos poucos, esse caráter analítico foi dando lugar a mais espaço para a reportagem. Não abrimos mão de alguns pilares que estão presentes desde a nossa fundação: perseguimos sempre o texto saboroso, a apuração de fôlego, o design gráfico e o fotojornalismo de qualidade. Porém, aos poucos, fomos nos permitindo embarcar também em pautas factuais. Por isso, além de ser a área mais nobre do DC para a grande reportagem, o Nós se tornou o espaço em que conseguimos aprofundar e refletir melhor sobre temas que ganham destaque ao longo da semana. Essa agilidade nos permitiu ganhar uma relevância ainda maior junto aos nossos leitores. (PITTHAN apud VIEIRA, 2017, p. 12). Após aprovação da pauta pela editora, foi definido qual repórter fotográfico acompanharia Ângela nesse trabalho. O escolhido foi Felipe Carneiro, que já havia trabalhado junto com ela em outros projetos. A partir dessa etapa, os dois seguiram em busca das entrevistas e das imagens que iriam compor a reportagem. Os profissionais ficaram uma semana viajando pelo estado de Santa Catarina, onde percorreram cerca de 3500 quilômetros. Na volta, muito trabalho para decupar as entrevistas e editar as fotos e os vídeos produzidos durante o período que ficaram na estrada. No total foram quase 11 Nos valemos aqui da entrevista de Vieira, tendo em vista que no período de nossa pesquisa de campo a editora estava em licença maternidade. 8

60 dias entre pré-produção, edição e montagem da reportagem completa 12. Concluído esse trabalho, a reportagem pode ser publicada. A repórter Ângela Bastos nos explicou que desde o início da produção dessa pauta, ela já havia pensado que este seria um trabalho multimídia. Embora a sua história profissional tenha começado no jornalismo impresso, desde que se implantou a redação online dentro do jornal Diário Catarinense ela concebe suas pautas para diferentes plataformas. Felipe Carneiro também diz pensar a produção imagética para multiplataformas, principalmente por trabalharem numa empresa que possui vários meios de comunicação. É importante ressaltar que para se produzir esses formatos é preciso planejamento e um maior investimento de tempo. Além disso, é essencial o envolvimento de profissionais com perfil diferenciado, que sejam capazes de produzir para mídias diversas. Essa mudança no perfil profissional é fruto da cultura da convergência, de acordo com Martins (2015), que afirma que os jornalistas contemporâneos precisam estar habilitados a produzir e formatar os conteúdos para diferentes mídias. Algumas Considerações O jornalismo vem se adequando às mudanças que vem ocorrendo na sociedade, muitas delas impulsionadas pelas tecnologias, outras pelas transformações culturais. Uma dessas adequações toma a forma de narrativas transmidiáticas. Mas ainda existe um grande espaço de exploração para elas. E para se produzir esses novos formatos é preciso planejamento, um maior investimento de tempo, e o envolvimento de profissionais com perfis distintintos e que enxerguem essas possibilidades de produções para plataformas diversas. Pensar nesses novos formatos de produção pode permitir a esses veículos ou profissionais incorporarem mais valor aos seus conteúdos. 12 As informações foram produzidas a partir de entrevistas feitas com a repórter Ângela Bastos, o repórter fotográfico Felipe Carneiro e o editor de vídeo, Francisco Duarte. 9

Esse conteúdo transmídia não se encaixa na produção noticiosa diária, pois necessita de um maior tempo para ser produzido, se enquadrando na criação de relatos de maior profundidade, como reportagem, gênero que se adapta a qualquer mídia. Nesse artigo, tratamos a reportagem Sozinhas: histórias de mulheres que sofrem violência no campo como uma produção transmídia já que ela possui conteúdos que se completam em diferentes plataformas, embora a empresa a tenha divulgado como um produto multimídia. Consideramos que a utilização desse formato jornalístico transmídia funcionou bem para essa reportagem, e um dos fatores decisivos foi o fato de que o Grupo RBS, hoje NSC Comunicação, possuir diversos veículos de comunicação em mídias diferentes, canais que foram bem utilizados para a distribuição dessa narrativa. Referências BASTOS, Ângela. Entrevista I. [dez. 2017]. Entrevistadora: Ana Carla Pimenta. Florianópolis, 2017. 1 arquivo.mp3 (94 min.) CANAVILHAS, João. Jornalismo transmídia: um desafio ao velho ecossistema midiático. In: RENÓ, Denis; CAMPALANS, Carolina; RUIZ, Sandra; GOSCIOLA, Vicente (orgs). Periodismo transmedia: miradas multiples. Bogotá: Editorial Universidad del Rosario, 2013, p. 53-68. CARNEIRO. Felipe. Entrevista II. [jan. 2018]. Entrevistadora: Ana Carla Pimenta. Florianópolis, 2018. 1 arquivo.mp3 (40 min.) DUARTE, Francisco. Entrevista III. [jan. 2018]. Entrevistadora: Ana Carla Pimenta. Florianópolis, 2018. 1 arquivo.mp3 (15 min.) JENKINS, Henry. Cultura da convergência. 2ª ed. São Paulo: Aleph, 2009. LONGHI, Raquel Ritter, MARTINS, Elaide. Transmídia, crossmídia e intermídia na grande reportagem multimídia. Um estudo das estratégias narrativas na série Tudo Sobre, da Folha de S. Paulo. Anais do 13º Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo, 2015, Campo Grande/MS. Disponível em < http://soac.unb.br/index.php/enpjor/xiiienpjor/paper/ download/4676/1148>. Acesso em 5 mai 2018. 10

LONGHI, Raquel Ritter, MARTINS, Elaide. Narrativas digitais webjornalísticas: transmídia, intermídia e convergência. In: BOTELHO-FRANCISCO, Rodrigo Eduardo et al (orgs). Pensar em Rede: Pesquisa Aplicada em Jornalismo e Tecnologias Digitais. Macapá: UNIFAP, 2017. LONGHI, Raquel Ritter, FLORES, Ana Marta M.. Narrativas webjornalísticas como elemento de inovação: casos de Al Jazeera, Folha de S. Paulo, The Guardian, The New York Times e The Washington Post. Revista Brasileira de Ciências da Comunicação, São Paulo, v. 40, n.1, jan/abr. 2017, p. 21-40. Disponível em <http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=69851024002>. Acesso em 13 mar 2018. MARTINS, Elaide. Convergência e narrativa transmídia no jornalismo: transformações nas práticas e no perfil dos profissionais. Brazilian Journalism Research, v. II, n. 2, 2015, p. 184-203. Disponível em <https://bjr.sbpjor.org.br/bjr/article/view/720>. Acesso em 10 fev 2018. MINAYO, Maria Cecília de Souza (org). Pesquisa Social: Teoria, método e criatividade. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. PORTO-RENÓ, D., VERSUTI, A. C., MORAES GONÇALVES, E., GOSCIOLA, V. Narrativas transmídia: diversidade social, discursiva e comunicacional. In: Palabra Clave, Bogotá, v. 14, n. 2, p. 201-215, dez. 2011. Disponível em: <http://palabraclave.unisabana.edu.co/index.php/palabraclave/article/view/1973>. Acesso em: 15 jan 2018. VIEIRA, Lívia de Souza. Métricas de impacto no jornalismo online: o caso do caderno Nós, do Diário Catarinense. Anais do 13º Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo, 2017, São Paulo/SP. Disponível em < http://sbpjor.org.br/congresso/index.php/sbpjor/ sbpjor2017/paper/viewfile/707/525>. Acesso em 1 jul 2018. 11