A SUPERVISÃO: UM OLHAR QUE VAI ALÉM DAS RELAÇÕES ESPECULARES 1

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Transcrição:

A SUPERVISÃO: UM OLHAR QUE VAI ALÉM DAS RELAÇÕES ESPECULARES 1 Anna Barreto Campello Carvalheira Chaves 2 INTRODUÇÃO O objetivo deste trabalho é refletir acerca da importância do papel da supervisão quando se apresenta no aprendiz uma dificuldade na condução de suas relações especulares com as pessoas por ele atendidas. Isso se dá porque ninguém consegue fugir a constituição subjetiva via o Outro, ninguém ascende a posição de sujeito sem ter uma imagem ideal de si constituída por um Outro olhar. A supervisão é uma forma diversa de olhar, que de algum modo mexe com esse ideal fazendo furo, na medida em que se interessa pelas lacunas no seu próprio modo de operar. Este texto foi pensado a partir da experiência vivida enquanto supervisora de estágio curricular na Universidade do Vale do Ipojuca em Caruaru. A partir da experiência foi possível perceber uma repetição operada pelo aprendiz nas relações com a supervisora e no setting. O Exemplo ilustrativo é o de um aluno que teve dificuldades em frequentar as supervisões, não justificando suas ausências, e ao narrar os seus casos clínicos surpreende, ao referir que após a primeira sessão todos os três casos, atendidos por ele passaram a faltar, e posteriormente desistiram dos atendimentos, sem sequer justificarem suas faltas. Houve como se pôde ver: uma repetição de sua relação tanto na supervisão como também nos seus atendimentos. O Estadio do espelho em Lacan tem um caráter fundamental, originário, que atravessa a vida do sujeito, o constitui, e além disso a dimensão especular ilustra os conflitos nas relações duais e reflete a alienação do sujeito a um Outro. Lacan (1949) em suas teorizações acerca do estádio do espelho e a constituição do eu, considera o conceito como uma matriz, assim o denominado estádio não é de forma alguma para ser visto enquanto uma fase delimitada na infância, mas pode ser lido fundamentalmente como algo que se replica nas relações duais. O sujeito se constitui diante do espelho a partir de um Outro olhar. A relação dual aparece de forma contundente no setting, e é fundamental o olhar da supervisão que como o próprio termo indica, apresenta uma visão que vai além, e funcionaria como um terceiro. Lacan articula o real, o imaginário e o simbólico ao falar do 1 Trabalho apresentado no VII Congresso Internacional de Psicopatologia Fundamental e Psicanálise e XIII Congresso Brasileiro de Psicopatologia Fundamental. João Pessoa PB, 2016. 2 Anna Barreto Campello Carvalheira Chaves, doutoranda em Psicologia Clínica pela Universidade Católica de Pernambuco. Mestre pela mesma Universidade.

espelho. Há um entrelace entre um Corpo virtual (corpo imagem) marcado pelo significante (corpo fala) e habitado pela libido (corpo gozo). Há uma identificação imaginária que é amarrada por um nome de gozo. Ele se identifica com esse eu ideal, com o estranho e o duplo de si. Há um jubilo, que identifica esse corpo ocupado pela libido, expresso pelo sorriso do infante ao se deparar com um outro de si mesmo, muitas vezes sendo reconhecido pelo olhar da mãe. Tomando como referência estudos da etologia Lacan demonstra que a partir do contato com a imagem, animais como os pombos e os gafanhotos, passam por uma metamorfose ao serem expostos as imagens. No caso os pombos apresentam uma modificação corporal passando a apresentar uma gônada madura e os gafanhotos passam a viver em grupo e não de forma isolada. Para Lacan nos seres humanos, a imagem também geraria uma transformação, uma metamorfose, visto que ela antecipa uma gestalt, ou seja há uma passagem de um corpo despedaçado para um corpo totalizante, ela antecipa algo que o corpo ainda seria imaturo biologicamente para constituir. Além disso, o espelho em Lacan é uma metáfora, e representa um Outro muitas vezes corporificado na figura da mãe e de seu olhar. A SUPERVISÃO ENQUANTO UM TERCEIRO OLHAR A posição do olhar no esquema óptico proposto por Henri Bouasse, e utilizado no seminário 1 de Lacan, no que se refere ao cone símbolico, permite a entrada no campo da linguagem a partir de determinada posição do olho. É neste aspecto que se pode pensar a posição da supervisão. Uma visão que de algum modo age enquanto excessão, e que marca os furos nos atendimentos. Os furos seriam muitas vezes oriundos de uma dificuldade do aprendiz em ver a questão do outro e de uma implicação do sintoma do discente nos seus atendimentos. Assim, Muitas vezes é comum que tomem partido nas sessões entre crianças e pais, sem entender as entrelinhas de algumas dinâmicas familiares. ás vezes marcados por uma visão idealizada, por uma imagem vinculada a um eu ideal ao se ver no outro, tendo dificuldades na imparcialidade. Como diz Lacan (1949): A assunção jubilatória de sua imagem especular por esse ser ainda mergulhado na impotência motora e na dependência da amamentação que é o filhote do homem nesse estágio de infans parecer-nos-á pois manifestar, numa situação exemplar, a matriz simbólica em que o [eu] se precipita numa forma primordial, antes de se objetivar na dialética da identificação com o outro e antes que a linguagem lhe restitua, no universal, sua função de sujeito. 08/33. Essa forma, aliás, mais deveria ser designada por [eu]-ideal(02), se quiséssemos reintroduzi-la num registro conhecido, no sentido [97] em que ela será também a origem das identificações secundárias, cujas funções reconhecemos pela expressão funções de normalização libidinal. ( ) Assim, é possível ver que o aluno ao tomar partido, não conseguindo suspender suas próprias opiniões, e críticas, apresentando dificuldades em enxergar as entrelinhas do caso em questão, estaria vinculado a isso que ninguém escapa, a matriz do espelho e a uma relação que passa

obrigatoriamente pelo campo do imaginário com o outro-outro. O aprendiz replica algo de sua matriz., ficando cego para o que se passa nas entrelinhas, tomando um partido específico ou pela criança ou por seus pais. O estágio curricular na área da psicanálise, pressupõe por parte do aluno, um desejo de perceber as formações do inconsciente, ou seja em buscar algo, para além do explicitado na fala das pessoas atendidas, por um conhecimento que está além do sabido e que depende também do seu trabalho de análise pessoal. Quando o aluno não possui essa busca, algo parece interromper-se. Essa busca pelas lacunas é imprescindível, tanto por parte do aluno enquanto futuro psicanalista, como também do supervisor ao escutar a narrativa do caso clínico. A repetição exemplificada anteriormente nas relações duais, deixa transparecer algo do sintoma do aluno, embora não vá ser analisado pelo supervisor, é preciso saber lidar para que o processo de supervisão possa ocorrer, assim é preciso perceber que há na supervisão uma diferença clara entre o lugar de analisante e o de aprendiz. Segundo Figueiredo e Vieira Na supervisa o, as posiço es de certo modo se invertem: quem escutou e respondeu ao sujeito que fala e demanda saber do que sofre ou porque sofre, agora e quem demanda saber sobre o que fazer disso. Assim, expo e algo de seu pro prio sintoma na o como analisando mas como aprendiz. Agora e ele quem endereça uma questa o sua sobre a questa o que lhe e endereçada.o trabalho de supervisa o se encontra precisamente na interseça o entre teoria e cli nica. E o ensino da cli nica que remete a teoria saber referencial e a ana lise do futuro analista saber singular. (FIGUEIEDO & VIEIRA, 1997) É claro que os limites entre o saber referencial e o saber singular, é tênue, mas é preciso que seja sustentado, pois o supervisor não é o psicanalista do aprendiz. Alguns aprendizes se prendem muitas vezes ás queixas e não a demanda de cada caso, ou seja, esquecem-se de observar a multiplicidade de significações. Muitas vezes há uma dificuldade no que diz respeito a atenção flutuante, e a perceberem algo para além do dito. É claro, que algumas questões subjacentes a essas dificuldades devem ser vistas na análise de cada um, o que aparece para o supervisor, é uma dificuldade em trazer o que está para além da concretude e do discurso explicitado, ou seja é preciso trazer a enunciação e não o enunciado do caso. E na psicana lise? Se o ponto de partida e o reconhecimento do saber como furado, vazado, lacunar, sempre incompleto, o saber em jogo no trabalho da supervisa o reduplica esse ponto de opacidade do saber que vem do relato de um sujeito endereçado a quem o escuta. O supervisor trabalha sobre o relato do relato, ou seja, trabalha por procuraça o. Procura encontrar na fala que um sujeito lhe dirige, ja como seu sintoma, traços a serem reconstitui dos da fala de um terceiro, que ja porta um saber-na osabido, sobre a qual deve fazer aparecer algum saber. Tarefa duplamente impossi vel? (FIGUEIREDO & VIEIRA, 1997) Realmente, como explanam Vieira e Figueiredo, uma tarefa por procuração, e que lida indiretamente com uma fala sintomática a respeito de um terceiro, pode parecer uma missão impossível, pois há a questão do analisante do aprendiz, e a forma como o aprendiz refere a sua própria questão ao trazer a questão de quem está atendendo. Esta ideia do relato sobre o relato é

algo que nos faz pensar, pois sempre terá a marca de quem escutou e narrará de uma forma única. É nesse sentido que se faz necessário contornar o que há de sintomático do discente através dos furos no caso, com a perspectiva de uma visão que poderá trazer a tona questionamentos para o próprio aprendiz O supervisor precisa ter noção de que o setting replica de forma clara, as relações do psicanalista aprendiz com o seu espelho. É pelo fato de estar ainda iniciante no próprio processo de um trabalho pessoal, que isso é dificultado no caso do aprendiz. O aprendiz acaba por trazer a tona através dos furos dos casos, algo que não parecia ser advindo das pessoas atendidas, mas uma barreira que se interpunha nas próprias relações do aluno com o outro. O estádio do espelho como matriz, nos faz pensar o que se passa do aluno com o supervisor, até mesmo quando está conseguindo caminhar nas entrelinhas, é fundamental não confundir a posição de psicanalista com a de supervisor, mas sustentar um lugar de apontar furos no caso trazido por procuração, que são oriundos do sintoma de cada um. O supervisor prende se aos furos da narrativa, que invariavelmente vão remeter no aluno as suas próprias dificuldades que poderão ser levadas ou não por ele ao seu psicanalista. A GUISA DE UMA CONCLUSÃO: A FALTA DO FURO NO IDEAL O supervisor, com sua escuta, ouve a narração de cada aluno, observa as filigranas, o que se repete nesta narrativa na forma de contar cada um dos casos, estando atento que tem algo que se replica nas relações duais, inclusive na relação do discente com o supervisor e opera buscando os furos do caso trazido por procuração. O Esta dio do Espelho de Lacan e o precursor da diale tica da alienaça o do sujeito no eu. O sujeito jamais apreende a si mesmo, a na o ser sob a forma do seu eu (moi), estritamente dependente do outro especular, que constitui sua identidade. Por essa raza o, a relaça o que o sujeito mante m consigo mesmo e com os outros (seus objetos) permanece sempre mediada pelo eixo Imagina rio. (GRECO, 2011, p.4-5) Na realidade o furo seria a ideia de não haver furos. É quando o aluno tem dificuldades em perceber os furos da história trazida, ou acredita que já sabe sobre o que traz, preso aos seus ideais e não trazendo para a supervisão no momento da narrativa a possibilidade de surpreender-se com a sua própria forma de narrar e com as filigranas do caso. Muitas vezes, ao perceber esses furos, o estranho em si, as dificuldades apresentadas na condução dos casos na supervisão, podem até mesmo fazer com que o aluno formule questão para para sua análise pessoal, afinal é uma estranha coincidência que todos os analisantes faltem a partir da primeira sessão como no caso apontado no início deste trabalho. Deste modo, a teorização de Lacan a respeito do estádio do espelho, abre portanto a possibilidade de um rumo de pesquisa interessante para se pensar também na supervisão, levando-se em consideração que as principais dificuldades na condução dos casos clínicos dizem respeito a relações especulares, as quais podem ser indicadas indiretamente pela dificuldade de se surpreender com os casos clínicos.

Referências: FIGUEIREDO, A. C. ; VIEIRA, M. A. (1997). Sobre a supervisa o: do saber sobre a psicana lise ao saber psicanali tico. Cadernos IPUB (UFRJ), Rio de Janeiro, v. 9, p. 25-30. GRECO, M. (2011) Os espelhos de Lacan. Revista Opção Lacaniana Ano 2, Vol. 6, novembro 2011 LACAN, J.(1953-1954) O seminário livro 1: Os escritos técnicos de Freud. Rj: Jorge Zarpar. (1949) O estádio do espelho e a constituição do eu tal como nos é revelada na experiência psicanalítica. in Escritos (1966). RJ: Jorge Zahar Editor, 1998, p 96-103. Trad. de Vera Ribeiro.