Um quarto dos doutorados vão para as microempresas //PÁGS. 18-21
Um quarto dos doutorados é contratado por microempresas Estudo concluiu que espírito do Processo de Bolonha não está a ser cumprido em Portugal JOÃO D'ESPINEY joao. despiney@ionline.pt Vinte e seis por cento dos doutorados que entraram pela primeira vez no mercado de trabalho entre 2002 e 2009 foram contratados por microempresas. A conclusão consta no estudo sobre Empregabilidade e Ensino Superior em Portugal, que a Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES) publicou recentemente e a que o i teve acesso. Para os autores do documento, a conclusão "parece indiciar alguma capacidade de iniciativa empresarial por parte dos diplomados com habilitações superiores". Os dados recolhidos pela equipa de investigadores do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e do Centro de Investigações Regionais e Urbanas do Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade Técnica de Lisboa, com o apoio da A3ES, revelam que a taxa sobe quase para os 50% se se contabilizarem as pequenas e médias empresas (de 10 a 49 trabalhadores). O estudo, realizado por José Luís Cardoso, Vítor Escária, Vítor Sérgio Ferreira, Paulo Madruga, Alexandra Raimundo e Marta Varanda, indica ainda que os doutorados constituem mesmo a principal fonte de recrutamento das microempresas (até nove trabalhadores). Já nas PME são os licenciados que surgem à frente, seguidos pelas pessoas com mestrado (ver tabela). As actividades económicas terciárias são as que mais diplomados absorvem, em particular os sectores relacionados com os serviços às empresas e actividades nos domínios da saúde e acção social. Em termos geográficos, o estudo confirmou que as áreas metropolitanas continuam a concentrar o maior número de diplomados, mas constatou que se observa "uma perda de peso, sinalizando a disseminação crescente em regiões" fora dos grandes centros urbanos. ESPÍRITO DE BOLONHA ESTÁ A FALHAR O peso dos diplomados no grupo de indivíduos que entram pela primeira vez no mercado de trabalho registou um aumento sistemático entre 2002 e 2009 (de 14,4% para 23,9%) e os diplomados com mestrado e doutoramento também têm reforçado o seu peso, ainda que a um ritmo inferior (de 3,8% para 7,5%). Esta evolução, segundo os autores do estudo, "sinaliza um acréscimo de indivíduos que fazem um percurso académico contínuo, sem intercalar presenças no mercado de trabalho, o que contraria o espírito e os propósitos do Processo de Bolonha". A informação analisada neste estudo no que toca ao cumprimento dos objectivos do Processo de Bolonha suscitou mesmo "alguma preocupação relativamente à concretização da empregabilidade em qualquer dos subsistemas do ensino superior, com especial destaque para as dificuldades detectadas no subsistema universitário". "À semelhança das conclusões apontadas pelos peritos do Bologna Follow-up Group em alguns estudos, consideramos que a obtenção de empregabilidade no final do 1." ciclo de estudos superiores [licenciatura] é um objectivo de difícil alcance, não apenas devido à inadequação da formação obtida face às necessidades do mercado de trabalho, mas também por falta de ambição e motivação directa dos detentores de um grau académico de 1." ciclo para ingressarem de imediato na vida profissional", escrevem os autores, salientando ainda o facto de ser "possível que a conjuntura de crise económica e financeira vivida no país no período em que decorreu este estudo condicione as percepções do problema e venha a ditar uma diferente evolução das perspectivas de entrada no mercado de trabalho". Actividades terciárias são as que mais diplomados absorvera, em particular serviços às empresas, saúde e acção social A equipa de investigadores não tem dúvidas, no entanto, em afirmar que as conclusões a que chegaram "não são particularmente animadoras e obrigam a refazer expectativas algo irrealistas" que foram construídas em relação a este objectivo emblemático do Processo de Bolonha. O grupo de trabalho sobre empregabilidade constituído no âmbito do Bologna Follow-up Group já tinha concluído, num dos relatórios que produziu entre 2007 e 2009, que "a empregabilidade dos diplomados ao nível do bacharelato (equivalente à licenciatura em Portugal) é um problema muito especial, existindo a percepção generalizada, quer entre os diplomados quer entre os empregadores, de que as qualificações obtidas nem sempre são adequadas para o emprego" e de que "os empregadores valorizam muito a experiência profissional, pelo que os jovens diplomados com essa experiência tendem
a ser mais competitivos no mercado de trabalho e na obtenção de emprego".
Metade dos cérebros que fogem são de Engenharia, Ciências Sociais e Direito Dados até 2010 confirmam aumento da migração de diplomados para o estrangeiro As áreas de Engenharia, Ciências Sociais e Direito foram responsáveis por 53,5% dos diplomados que foram trabalhar para o estrangeiro entre 2004 e 2010. Num capítulo dedicado às dinâmicas de fuga de cérebros e de migração de diplomados do ensino superior, a equipa de investigadores concluiu, com base nos inquéritos ao emprego do Instituto Nacional de Estatística até 2010, que foi nas áreas de engenharia, indústrias transformadoras e construção que mais cérebros fugiram para o estrangeiro, com uma taxa média de 28,6% no período em análise. A seguir surgem as das ciências sociais, do comércio e do direito, com 24,9% e, em terceiro lugar, a da formação de professores e ciências da educação, com 13%. O estudo concluiu que "há alguma tendência para um aumento do fenómeno da migração de diplomados", incremento este que "parece transversal a todos os graus de ensino superior". A análise por grau de habilitações superiores indica que se verificou, com excepção dos bacharéis, "um incremento do número de indivíduos que declaram trabalhar fora de Portugal, sendo que em 2009 e 2010 os doutorados representavam, respectivamente, 11,5% e 13,5%" do total. Em 2010, e em termos absolutos, emigraram 4143 diplomados, dos quais 563 doutorados, 426 mestres e 3116 licenciados. No início deste capítulo, os autores do documento começam por salientar, porém, que na "maior parte dos casos as referências a este fenómeno são efectuadas sem qualquer base estatística". "Em parte isso é justificado por não existir informação fiável regular sobre movimentos migratórios em geral e, menos
ainda, informação que analise a distribuição por habilitações escolares dos migrantes", lê-se no estudo. A equipa de investigadores ressalva por isso que "não se devem encarar os valores apresentados como estimativas do número de migrantes". "Considerando que o propósito desta fonte de informação [inquéritos ao emprego do INE] não é medir este fenómeno, a mesma tem muitas limitações a este nível. O objectivo é mais ter indicação da tendência do que ter uma estimativa do valor absoluto." J.d'E.