Inter/multiculturalidade, relações étnico-culturais e fronteiras da exclusão



Documentos relacionados
ENSINO MÉDIO INTEGRADO: T R A V E S S I A S

ORIGEM E DESTINO Pensando a sociologia reflexiva de Bourdieu

INSTITUIÇÃO ESCOLAR NA DIVERSIDADE POLÍTICAS, FORMAÇÃO E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

O SOCIAL E AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS NA CONTEMPORANEIDADE DAS DESIGUALDADES À VIOLÊNCIA NO ESPAÇO EDUCACIONAL

TRABALHO DOCENTE: DESAFIOS NO COTIDIANO DA EDUCAÇÃO BÁSICA

EDUCAÇÃO SUPERIOR E PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO UTILITARISMO, INTERNACIONALIZAÇÃO E NOVO CONTRATO SOCIAL

EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA: O QUE DIZEM AS INVESTIGAÇÕES E PRODUÇÕES TEMÁTICAS NOS ÚLTIMOS DEZ ANOS?

A EDUCAÇÃO QUILOMBOLA

POLÍTICAS E PRÁTICAS EDUCATIVAS FORMAÇÃO, GESTÃO E TRABALHO DOCENTE

EDUCAÇÃO M U S I C A L E PEDAGOGIA. pesquisas, escutas e ações

Unidade I ESCOLA, CURRÍCULO E CULTURA. Profa. Viviane Araujo

Escritos sobre o sentido da escola

Ministério da Educação. Universidade Tecnológica Federal do Paraná Reitoria Conselho de Graduação e Educação Profissional

EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS TEMPO FORMATIVO JUVENIL

A IMPORTÂNCIA DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO PARA OS CURSOS PRÉ-VESTIBULARES

PROJETO DE LEI DO SENADO Nº, DE 2009 (de autoria do Senador Pedro Simon)

PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO: ELABORAÇÃO E UTILIZAÇÃO DE PROJETOS PEDAGÓGICOS NO PROCESSO DE ENSINO APRENDIZAGEM

Educação para os Media e Cidadania

OS CANAIS DE PARTICIPAÇÃO NA GESTÃO DEMOCRÁTICA DO ENSINO PÚBLICO PÓS LDB 9394/96: COLEGIADO ESCOLAR E PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO

ENSINO DE CIÊNCIAS NO ENSINO FUNDAMENTAL EM DIFERENTES ESPAÇOS EDUCATIVOS USANDO O TEMA DA CONSERVAÇÃO DA FAUNA AMAZÔNICA.

REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES NO PIBID

Perfil das profissionais pesquisadas

ITINERÁRIOS DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: O ESTÁGIO SUPERVISIONADO E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA

CAMINHOS QUE SE FAZEM AO CAMINHAR DIÁLOGOS ENTRE TEORIA E PRÁTICA EM REGISTROS DE PROFESSORAS

AIMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO CONTINUADA COLABORATIVA ENTRE PROFESSORES QUE ATUAM COM PESSOAS COM AUTISMO.

SUPERVISOR DARLAN B. OLIVEIRA

Só viverá o homem novo, não importa quando, um dia, se os que por ele sofremos formos capazes de ser semente e flor desse homem.

RESUMO. Autora: Juliana da Cruz Guilherme Coautor: Prof. Dr. Saulo Cesar Paulino e Silva COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA

Necessidade e construção de uma Base Nacional Comum

A REPÚBLICA NO LIVRO DIDÁTICO DE HISTÓRIA DO BRASIL

FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES NO CONTEXTO TECNOLÓGICO: DESAFIOS VINCULADOS À SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO

Escola e a promoção da igualdade étnico-racial: estratégias e possibilidades UNIDADE 4

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA (UFBA) ROSALENA BARBOSA MOTA

O ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA NUMA PERSPECTIVA VIRTUAL COLABORATIVA COM TECNOLOGIAS INTERATIVAS

Balanço DA Política Educacional Brasileira ( ) ações e programas

Propostas para uma Política Municipal de Migrações:

Atividade Mercosul da Marcha Mundial das Mulheres uma prática social da educação popular

Maria Clarisse Vieira (UnB) Maria Emília Gonzaga de Souza (UnB) Denise Mota Pereira da Silva (UnB)

Propostas de atividades para alfabetização e letramento (origem da escrita e do mundo letrado)

Direito a inclusão digital Nelson Joaquim

FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO SANTA MARIA-RS/BRASIL EDUCAÇÃO: ECONOMIA SOLIDÁRIA E ÉTICA PLANETÁRIA

Gráfico 2 Distribuição dos países que apresentaram trabalhos sobre Educação de Professores no Congresso Mundial de Istambul 2010

PROFESSORA: GISELE GELMI. LOCAL: SÍTIO BANDEIRANTES

Relações Étnico-raciais no Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana. Ementa da Disciplina. Teleaula 1. Conceitos Básicos.

PARA ONDE VAMOS? Uma reflexão sobre o destino das Ongs na Região Sul do Brasil

O COORDENADOR PEDAGÓGICO COMO FORMADOR: TRÊS ASPECTOS PARA CONSIDERAR

A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR DE PEDAGOGIA DA FESURV - UNIVERSIDADE DE RIO VERDE

EDUCAÇÃO NÃO FORMAL E MOVIMENTOS SOCIAIS - PRÁTICAS EDUCATIVAS NOS ESPAÇOS NÃO ESCOLARES

A DIVERSIDADE ÉTNICO-RACIAL E A DE EDUCAÇÃO INFANTIL

LABORATÓRIO DE ESTUDOS DO TEXTO: UMA ABORDAGEM EXTENSIONISTA

INTEGRAÇÃO DE MÍDIAS E A RECONSTRUÇÃO DA PRÁTICA PEDAGÓGICA

Coleção Cadernos Afro-Paraibanos APRESENTAÇÃO

O REAL DO DISCURSO NA REPRESENTAÇÃO DA SOCIEDADE BRASILEIRA NA ESCRITA DA CIÊNCIA DAS CIÊNCIAS SOCIAIS.

CASTILHO, Grazielle (Acadêmica); Curso de graduação da Faculdade de Educação Física da Universidade Federal de Goiás (FEF/UFG).

TRANSVERSALIDADE CULTURAL: NOTAS SOBRE A PRÁTICA DE ENSINO E A TEMÁTICA AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA NAS SALAS DE AULA.

A MEMÓRIA DISCURSIVA DE IMIGRANTE NO ESPAÇO ESCOLAR DE FRONTEIRA

ILANA FINKIELSZTEJN EILBERG

EDUCAÇÃO INTEGRAL EM TEMPO INTEGRAL: Interfaces com os princípios da inclusão educacional

Orientadora: Profª Drª Telma Ferraz Leal. 1 Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPE.

Pedagogia Estácio FAMAP

Cenários de inovação para a educação na sociedade digital

A QUESTÃO ÉTNICO-RACIAL NA ESCOLA: REFLEXÕES A PARTIR DA LEITURA DOCENTE

Incentivar a comunidade escolar a construir o Projeto político Pedagógico das escolas em todos os níveis e modalidades de ensino, adequando o

Palavras-chave: Formação continuada de professores, cinema, extensão universitária.

A PEDAGOGIA COMO CULTURA, A CULTURA COMO PEDAGOGIA. Gisela Cavalcanti João Maciel

RELAÇÕES RACIAIS E EDUCAÇÃO: VOZES DO SILÊNCIO

INCLUSÃO DE ALUNOS SURDOS: A GESTÃO DAS DIFERENÇAS LINGUÍSTICAS

UNIDADE 10 PARA UMA EDUCAÇAO ANTIRRACISTA

LIBRAS: A INCLUSÃO DE SURDOS NA ESCOLA REGULAR

O ESTADO DA ARTE DO MESTRADO PROFISSIONAL EM ENSINO DE CIÊNCIAS E MATEMÁTICA DA UFRN A PARTIR DAS DISSERTAÇÕES E PERFIL DOS EGRESSOS

RELAÇÕES DE GÊNERO NO CONTEXTO DA MATA SUL DE PERNAMBUCO: UMA INVESTIGAÇÃO EDUCATIVA

A PEDAGOGIA DA FELICIDADE DE MAKIGUTI

A DIVERSIDADE CULTURAL: Um desafio na educação infantil

DITADURA, EDUCAÇÃO E DISCIPLINA: REFLEXÕES SOBRE O LIVRO DIDÁTICO DE EDUCAÇÃO MORAL E CÍVICA

PERCURSOS HISTÓRICOS DA EDUCAÇÃO NO CERRADO

A INCLUSÃO DE ALUNOS COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS NUMA ESCOLA PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE GUARAPUAVA: DA TEORIA À PRÁTICA

Gênero no processo. construindo cidadania

Ensino de Ciências e. Múltiplos enfoques na formação de

A produção acadêmica sobre professores: Estudo interinstitucional da região Centro Oeste.

O USO DE TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO: A UTILIZAÇÃO DO CINEMA COMO FONTE HISTÓRICA Leandro Batista de Araujo* RESUMO: Atualmente constata-se a importância

Paulo Freire. A escola é

EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS: ELEMENTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DE UMA PRÁTICA DE FORMAÇÃO DOCENTE

Oficina Cebes DESENVOLVIMENTO, ECONOMIA E SAÚDE

EDUCAÇÃO NA FRONTEIRA ENTRE BRASIL E PARAGUAI: A REALIDADE DE UMA ESCOLA ESTADUAL EM PONTA PORÃ/MS

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ESTUDO ETNOGRÁFICO NA ESCOLA COMO INSTRUMENTO PARA A SUPERAÇÃO DA DESIGUALDADE RACIAL

INCLUSÃO ESCOLAR: UTOPIA OU REALIDADE? UMA CONTRIBUIÇÃO PARA A APRENDIZAGEM

UMA EXPERIÊNCIA DE FORMAÇÃO CONTINUADA NO CONTEXTO DE CRECHE

PROCESSO DE ATUALIZAÇÃO. apresentação em 21/03/13

Autor (1); S, M, R INTRODUÇÃO

Titulo: DILEMAS ENCONTRADOS POR PROFESSORES DE QUÍMICA NA EDUCAÇÃO DOS DEFICIENTES VISUAIS.

As diferentes faces do racismo e suas implicações na escola

Ética Profissional e os Desafios de Concretizar Direitos no Sistema Penal. Marco Antonio da Rocha

CENTRO DE ESTUDOS E DE DOCUMENTAÇÃO EM EDUCAÇÃO (CEDE) UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA (UEFS)

O ENSINO DA DANÇA E DO RITMO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA: UM RELATO DE EXPERIENCIA NA REDE ESTADUAL

CONSTITUINDO REFERENCIAIS TEÓRICO-METODOLÓGICOS: CONTRIBUIÇÕES DO PIBID PARA O TRABALHO COM ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO

Disciplina: Alfabetização

PLANEJAMENTO E AVALIAÇÃO. Prof. Msc Milene Silva

AÇÕES FORMATIVAS EM ESPAÇO NÃO ESCOLAR: UM ESTUDO DE CASO NO PROJETO SORRIR NO BAIRRO DO PAAR

Profª. Maria Ivone Grilo

Transcrição:

Inter/multiculturalidade, relações étnico-culturais e fronteiras da exclusão

Série Educação Geral, Educação Superior e Formação Continuada do Educador Editora Executiva Profa. Dra. Maria de Lourdes Pinto de Almeida Unoesc/Unicamp Conselho Editorial Educação Nacional Prof. Dr. Afrânio Mendes Catani USP Prof. Dra. Anita Helena Schlesener UFPR/UTP Profa. Dra. Elisabete Monteiro de Aguiar Pereira Unicamp Prof. Dr. João dos Reis da Silva Junior UFSCar Prof. Dr. José Camilo dos Santos Filho Unicamp Prof. Dr. Lindomar Boneti PUC / PR Prof. Dr. Lucidio Bianchetti UFSC Profa. Dra. Dirce Djanira Pacheco Zan Unicamp Profa. Dra. Maria Eugenia Montes Castanho PUC / Campinas Profa. Dra. Maria Helena Salgado Bagnato Unicamp Profa. Dra. Margarita Victoria Rodríguez UFMS Profa. Dra. Marilane Wolf Paim UFFS Profa. Dra. Maria do Amparo Borges Ferro UFPI Prof. Dr. Renato Dagnino Unicamp Prof. Dr. Sidney Reinaldo da Silva UTP / IFPR Profa. Dra. Vera Jacob UFPA Conselho Editorial Educação Internacional Prof. Dr. Adrian Ascolani Universidad Nacional do Rosário Prof. Dr. Antonio Bolívar Facultad de Ciencias de la Educación/Granada Prof. Dr. Antonio Cachapuz Universidade de Aviero Prof. Dr. Antonio Teodoro Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias Profa. Dra. Maria del Carmen L. López Facultad de Ciencias de La Educación/Granada Profa. Dra. Fatima Antunes Universidade do Minho Profa. Dra. María Rosa Misuraca Universidad Nacional de Luján Profa. Dra. Silvina Larripa Universidad Nacional de La Plata Profa. Dra. Silvina Gvirtz Universidad Nacional de La Plata ESTA OBRA FOI IMPRESSA EM PAPEL RECICLATO 75% PRÉ-CONSUMO, 25 % PÓS- CONSUMO, A PARTIR DE IMPRESSÕES E TIRAGENS SUSTENTÁVEIS. CUMPRIMOS NOSSO PAPEL NA EDUCAÇÃO E NA PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE.

Adir Casaro Nascimento José Licínio Backes (organizadores) Inter/multiculturalidade, relações étnico-culturais e fronteiras da exclusão

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Inter/multiculturalidade, relações étnico-culturais e fronteiras da exclusão / Adir Casaro Nascimento, José Licínio Backes, (organizadores). Campinas, SP : Mercado de Letras, 2015. (Série Educação Geral, Educação Superior e Formação Continuada do Educador) Vários autores. ISBN 978-85-7591-381-9 1. Afro-brasileiros 2. Diversidade cultural 3. Educação intercultural 4. Exclusão social 5. Multiculturalismo 6. Povos indígenas 7. Professores Formação I. Nascimento, Adir Casaro. II. Backes, José Licínio. III. Série. 15-08154 CDD-370.71 Índices para catálogo sistemático: 1. Relações étnico-culturais : Educação 370.71 capa e gerência editorial: Vande Rotta Gomide foto: Marina Meirelles Gomide preparação dos originais: Editora Mercado de Letras DIREITOS RESERVADOS PARA A LÍNGUA PORTUGUESA: MERCADO DE LETRAS VR GOMIDE ME Rua João da Cruz e Souza, 53 Telefax: (19) 3241-7514 CEP 13070-116 Campinas SP Brasil www.mercado-de-letras.com.br livros@mercado-de-letras.com.br 1 a edição OUTUBRO/2015 IMPRESSÃO DIGITAL IMPRESSO NO BRASIL Esta obra está protegida pela Lei 9610/98. É proibida sua reprodução parcial ou total sem a autorização prévia do Editor. O infrator estará sujeito às penalidades previstas na Lei.

SUMÁRIO INTRODUÇÃO... 7 capítulo 1 DE-COLONIZAR POSTULADOS OCCIDENTALES PARA EDUCAR COLABORATIVA Y ALTERNATIVAMENTE BAJO UNA NUEVA ÓPTICA INTERCULTURAL... 15 Rossana Stella Podestá Siri capítulo 2 DESARROLLO EDUCATIVO INTERCULTURAL: FRONTERAS JURÍDICAS E INSTITUCIONALES PERMEADAS, PERO TRANSICIONES ETNOCULTURALES Y SOCIOLINGÜÍSTICAS EN JUEGO SOCIAL... 39 Héctor Muñoz Cruz capítulo 3 INTENCIÓN E INVENCIÓN DE LA ESCRITURA: CON ESPECIAL REFERENCIA A LOS GUARANÍES... 65 Bartomeu Melià capítulo 4 EDUCAÇÃO INTERCULTURAL E OS POVOS INDÍGENAS: AS FRONTEIRAS ENTRE OS SABERES NA EDUCAÇÃO SUPERIOR INDÍGENA... 85 Antônio Hilário Aguilera Urquiza e Adir Casaro Nascimento

capítulo 5 RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: PROCESSOS DE RESISTÊNCIA E DE SUBVERSÃO DO CURRÍCULO HEGEMÔNICO/MONOCULTURAL... 111 José Licínio Backes capítulo 6 PODER, RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS E EXCLUSÃO: DIÁLOGOS ENTRE FOUCAULT E A EDUCAÇÃO INSTITUINTE DE NEGROS NO BRASIL... 131 Aloisio Monteiro e Ricardo Tadeu Barbosa capítulo 7 O PROJETO A COR DA CULTURA E O PROTAGONISMO AFRO-BRASILEIRO NAS ESCOLAS DE NOVA IGUAÇU: REVENDO AS FRONTEIRAS DA EXCLUSÃO... 159 Ahyas Siss e Ana Paula Cerqueira Fernandes capítulo 8 EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE CULTURAL, DESIGUALDADE E EXCLUSÃO: UMA ANÁLISE CRÍTICA DA COMPREENSÃO DOS PROFESSORES DE EDUCAÇÃO BÁSICA... 177 Ruth Pavan capítulo 9 CURRÍCULO MULTICULTURAL E DESAFIO A FRONTEIRAS DE EXCLUSÃO: REFLEXÕES E EXPERIÊNCIAS DE CONSTRUÇÃO DOCENTE COLETIVA... 195 Ana Ivenicki e Giseli Pereli de Moura Xavier capítulo 10 A TRANSCULTURALIDADE COMO ABERTURA À QUINTA DIMENSÃO... 211 Jacques Gauthier capítulo 11 FRONTEIRAS DA IDENTIDADE, MEDIAÇÃO INTERCULTURAL E TRÂNSITOS DO SELF... 229 Ricardo Manuel das Neves Vieira e Ana Vieira SOBRE OS AUTORES... 259

INTRODUÇÃO Este livro é resultado de diferentes pesquisas de docentes de universidades estrangeiras (ESECS-IPLeiria, de Portugal, Universidad Autônoma de Puebla, do México, e Instituto Superior de Estudos Humanísticos e Filosóficos, do Paraguai) e brasileiras (UFRRJ, UFRJ, UNIJORGE, UFMS e UCDB). Grande parte dos textos é resultado de pesquisas com financiamento de agências públicas (CNPq e FUNDCT/MS). Todos os autores têm uma trajetória de pesquisa vinculada aos estudos de grupos humanos que carregam as marcas da exclusão. A exclusão é vista não apenas como produto das relações econômicas, mas também como resultado das relações étnico-raciais, o que, no contexto dos estudos latino-americanos, vem sendo denominado de colonialidade, um padrão de dominação e subalternização produzido em torno das categorias de raça/etnia, por meio do qual os modos de ser, viver, conhecer e conviver dos povos indígenas e afro-brasileiros vêm sistematicamente sendo vistos como inferiores e primitivos, contribuindo para a sua exclusão social. Diante do contexto de subalternização e estereotipia dos povos indígenas e afro-brasileiros, os estudos inter/multiculturais vêm produzindo um conjunto de conhecimentos que questionam a colonialidade e a imposição do padrão euroamericanocêntrico como superior, único e universal. Além disso, preocupam-se em fortalecer Inter/multiculturalidade, relações étnico-culturais... 7

as lutas, resistências, conhecimentos e modos de ser, viver e conviver dos grupos não-hegemônicos, postulando possibilidades de diálogo, negociações e traduções entre as diferentes culturas e combatendo os processos de exclusão. Os onze capítulos desta coletânea, ainda que tenham em comum a temática da inter/multiculturaridade, fronteiras étnicoculturais e fronteiras da exclusão, foram organizados em torno de três eixos: o primeiro eixo, formado por quatro capítulos (Siri, Cruz, Melià, Urquiza e Nascimento), tem como ênfase as questões indígenas; o segundo eixo, formado por três capítulos (Backes, Monteiro e Barbosa; Siss e Fernandes), enfatiza a questão afrodescendente; e o terceiro, formado por quatro capítulos (Pavan, Ivenicki e Xavier; Gauthier, Vieira e Vieira), apresenta questões indígenas e afrodescendentes, articuladas com outras diferenças e com a educação na perspectiva da inter/multi/transculturalidade. No primeiro capítulo, De-colonizar postulados occidentales para educar colaborativa y alternativamente bajo una nueva óptica intercultural, Rossana Stella Podestá Siri destaca que, ao longo da vida intelectual, encontramos uma série de experiências e restrições que nos fazem crescer humana e intelectualmente. Nem sempre somos capazes de trabalhar em equipe, ainda que lidemos com muitas teorias sobre o assunto. A autora lembra que uma coisa é aprender cognitivamente sobre metodologias colaborativas, mas muito diferente é estar aberto para reconhecer a diversidade de aprendizagens e sujeitos. Ela traz a experiência desenvolvida desde 2007 com professores indígenas de diferentes povos do México na perspectiva da interculturalidade, em instituições de Educação Superior. Destaca, ainda, que o trabalho desenvolvido nas instituições foi precedido de um longo trabalho junto às comunidades indígenas e que essa aproximação entre comunidades indígenas e universidade continua sendo fundamental para a descolonização dos postulados ocidentais. No segundo capítulo, Desarrollo educativo intercultural: fronteras jurídicas e institucionales permeadas, pero transiciones 8 editora Mercado de Letras Educação

etnoculturales y sociolingüísticas en juego social, Héctor Muñoz Cruz argumenta que, no contexto atual, a existência de leis inclusivas que reconhecem a pluralidade criou melhores condições sociais e institucionais para desenvolver-se uma perspectiva intercultural nas escolas. Entretanto, o autor salienta que as transições étnicoculturais e sociolinguísticas não operam apenas com normas jurídicas. Um dos desafios fundamentais da educação intercultural é compreender adequadamente as dinâmicas do bilinguismo social e da comunicação intercultural e as novas configurações identitárias. O autor argumenta que, para o desenvolvimento e fortalecimento da educação intercultural no México, é fundamental que se tornem obrigatórios, em todos os níveis de ensino, a adoção da língua indígena e o desenvolvimento de metodologias e propostas bilíngues e interculturais. No terceiro capítulo, Intención e invención de la escritura: con especial referencia a los guaraníes, Bartomeu Melià desenvolve uma reflexão sobre a intenção da invenção da escrita, com especial referência à invenção da escrita guarani. Salienta que escrever é uma maneira de dizer-se tão pessoal, tão ligada ao nosso corpo, que pode ser confundida com a própria pele. Trata-se de uma máscara para dizer-se aos outros com grande verdade, mesmo que nem sempre ela prevaleça. O autor, de forma muito perspicaz e intensa, traz a questão da escrita a partir de duas perspectivas que se encontram profundamente ligadas: a experiência pessoal de vida e a análise dessa experiência. Trata-se de uma experiência vivida há mais de 30 anos, analisada agora como uma aventura maravilhosa e perigosa: a transição da pré-história sem escrita para a história escrita do povo guarani. Tudo isso intensamente refletido por alguém que convive há mais de 55 anos com os povos guarani. No quarto capítulo, Educação intercultural e os povos indígenas: as fronteiras entre os saberes na Educação Superior Indígena, Antônio Hilário Aguilera Urquiza e Adir Casaro Nascimento traçam algumas reflexões acerca da temática dos povos indígenas e sua interface com a educação intercultural, a Inter/multiculturalidade, relações étnico-culturais... 9

partir da realidade da Educação Superior. Mostram que há tempos os indígenas acessam crescentemente as universidades, fenômeno que desencadeia inúmeras consequências em termos de políticas públicas, exercício da prática intercultural e revisões metodológicas e epistemológicas do modelo eurocêntrico de universidade. Mais especificamente, os autores trazem a realidade dos povos indígenas de Mato Grosso do Sul, em particular, a situação dos estudantes indígenas nas Instituições de Ensino Superior do estado, as relações de saberes e os direitos básicos dessas sociedades. Trata-se de estudo reflexivo e teórico, tendo por base experiências no trabalho com povos indígenas, considerando o acesso e permanência na Universidade como um direito à diversidade cultural. No quinto capítulo, Relações étnico-raciais na educação superior: processos de resistência e de subversão do currículo hegemônico/monocultural, José Licínio Backes mostra como a presença de universitários negros organizados em torno de um projeto coletivo introduz novas questões para o currículo. Os acadêmicos negros questionam o mito da democracia racial, os processos de discriminação sutil e camuflada que circulam nos espaços acadêmicos e a ausência da história e cultura africanas. Agindo dessa forma, ainda que o currículo seja marcadamente monocultural, a presença ativa de acadêmicos negros vai forjando outro currículo: um currículo menos etnocêntrico, portanto, um currículo que acolhe as diferenças. O autor aponta que é preciso dar mais ênfase à formação inter/multicultural dos professores para que o currículo hegemônico seja modificado, pois, sendo o professor um efeito do contexto que o produz, para que tenha condições de mudar, é urgente mudar o contexto que produz o professor, incluindo o contexto de sua formação inicial e continuada. No sexto capítulo, Poder, relações étnico-raciais e exclusão: diálogos entre Foucault e a educação instituinte de negros no Brasil, Aloisio Monteiro, em coautoria com Ricardo Tadeu Barbosa, traz o pensamento de Michel Foucault para analisar as relações raciais no Brasil. Os autores mostram como a escravidão foi um produto da modernidade e como os saberes modernos produziram 10 editora Mercado de Letras Educação

o continente africano e seus povos como hostis, sem história, sem cultura, incivilizados e atrasados. O capítulo aponta também a luta e a resistência dos povos negros no Brasil, com destaque para os quilombos. Os autores argumentam que esses processos históricos e culturais produziram uma complexidade de relações raciais no Brasil, em que a subalternidade, a violência e a exclusão social são marcas contra as quais os negros continuam lutando, desconstruindo o imaginário social racista. Nesse sentido, Monteiro e Barbosa destacam a aprovação da Lei 10.639/2003, resultado da luta do movimento negro que contribui para uma educação não pautada exclusivamente pela cultura ocidental, incluindo a cultura e a história africanas. No sétimo capítulo, O projeto cor da cultura e o protagonismo afro-brasileiro nas escolas de Nova Iguaçu: revendo as fronteiras da exclusão, Ahyas Siss e Ana Paula Cerqueira Fernandes apontam a possibilidade de pensar uma formação inicial e continuada de professores que contribua para diminuir os processos de exclusão. O texto mostra que, no contexto brasileiro, a exclusão e a desigualdade sempre tiveram uma forte conotação racial. Ao trazerem a análise da experiência desenvolvida no município de Nova Iguaçu, mais especificamente o Projeto Cor da Cultura, os autores mostram, por meio de uma proposta educacional que também contempla a formação de professores, que a educação escolar, ainda que não seja a única responsável pela exclusão e reprodução das desigualdades, tampouco a única solução para o seu combate, pode contribuir significativamente para a desconstrução das relações classistas, racistas e sexistas e, por conseguinte, para combater os processos de exclusão. No oitavo capítulo, Educação, diversidade cultural, desigualdade e exclusão: uma análise crítica da compreensão dos professores de Educação Básica, Ruth Pavan, seguindo a teoria crítica, analisa as relações entre desigualdade, diversidade e exclusão. Argumenta que a desigualdade e a exclusão são resultado das relações sociais assimétricas e desiguais de poder, e não provocadas pelo próprio indivíduo. Além disso, critica a estratégia de utilizar a diversidade cultural para atribuir aos indivíduos os infortúnios e Inter/multiculturalidade, relações étnico-culturais... 11

responsabilizá-los pelas mazelas socialmente produzidas pela lógica da sociedade capitalista. A autora traz também os resultados de uma pesquisa realizada por ela, junto a professores de educação básica, que mostra que a exclusão e a desigualdade, quando percebidas pelos professores, não se referem apenas à questão econômica, mas também à questão racial, crença, geração, gênero e outros. Pavan também aponta que a formação docente incluiu a discussão da desigualdade apenas na década de 1980 e só bem recentemente a questão da diversidade cultural e exclusão. Nesse sentido, sugere qualificar o processo de formação docente, enfatizando a análise crítica da exclusão e da desigualdade, bem como contemplando o debate inter/multicultural crítico da diversidade cultural. No nono capítulo, Currículo multicultural e desafio a fronteiras de exclusão: reflexões e experiências de construção docente coletiva, Ana Ivenicki e Giseli Pereli de Moura Xavier argumentam em favor da construção coletiva de um currículo multicultural. Segundo as autoras, um currículo multicultural desafia cotidianamente os preconceitos e a exclusão. As autoras fazem uma interessante discussão sobre as diferentes formas de entender o multiculturalismo, trazendo as contribuições de Freire, Candau, McLaren, Moreira, Walsh e Banks, entre outros. O texto também descreve os desafios de uma experiência desenvolvida pelas autoras, em parceria com um município do Rio de Janeiro, para a construção de referenciais curriculares municipais multiculturalmente orientados. As autoras lembram que a construção de referenciais curriculares multiculturais não se dá fora das relações de poder, portanto, é um processo de luta e embate que contribui para combater os preconceitos e os processos de exclusão. No décimo capítulo, A transculturalidade como abertura à quinta dimensão, Jacques Gauthier argumenta que o multiculturalismo foi importante para dar visibilidade aos conhecimentos proibidos e desvalorizados pelo projeto colonizador, isto é, os conhecimentos ameríndios e africanos. Da mesma forma, a interculturalidade crítica também tem sido importante para a afirmação das culturas nativas e coloca em xeque os poderes e 12 editora Mercado de Letras Educação

opressões instituídas pela cultura dominante. Como mostra o autor, existe também a transculturalidade, umbilicalmente ligada às forças da natureza e à espiritualidade e presente, sobretudo, nos povos indígenas e africanos. O autor aposta na possibilidade de construção de uma ciência que recorre a intuicetos, uma mistura de intuições e conceitos, por meio dos quais as pesquisas transculturais produzem devires inesperados com uma fecundidade ímpar e uma humanidade descolonizadora e descolonizada de si. No décimo primeiro capítulo, Fronteiras da identidade, mediação intercultural e trânsitos do self, Ricardo Vieira e Ana Vieira mostram como os seres humanos são classificadores e estabelecem distinções, produzindo inclusões e exclusões. Esses processos de classificação muitas vezes, e especialmente na ótica dos grupos hegemônicos, produzem a negação e a desvalorização do outro. Porém, é possível produzir outras formas de relação entre os grupos humanos, em que os conflitos e tensões sejam negociados. Para tanto, no processo educativo, o professor deve ser um mediador para construir pontes entre as fronteiras culturais. O professor pode ser um facilitador e um incentivador dos encontros entre culturas e sujeitos diferentes. Ele pode ser um tradutor cultural de tal modo que, como humanos, aprendamos desde cedo a conviver em comum, sem apagar, negar e inferiorizar as diferenças, sem negar as tensões e conflitos, aprendendo a viver interculturalmente. Esperamos que a leitura dos capítulos contribua para a reflexão e a construção de um mundo onde a exclusão seja permanentemente combatida e as relações étnico-culturais se deem na lógica da inter/ multiculturalidade. Enfim, esperamos que contribua para vivermos no contexto atual, sem excluir, discriminar, estereotipar e, principalmente, sem (re)produzir desigualdades sociais. Adir Casaro Nascimento José Licínio Backes (organizadores) Inter/multiculturalidade, relações étnico-culturais... 13