REGRAS ELEITORAIS, COMPETIÇÃO POLÍTICA E POLÍTICA FISCAL: EVIDÊNCIA DOS MUNICÍPIOS BRASILEIROS

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Transcrição:

REGRAS ELEITORAIS, COMPETIÇÃO POLÍTICA E POLÍTICA FISCAL: EVIDÊNCIA DOS MUNICÍPIOS BRASILEIROS Aluno: Marcos Mendes Orientador: João Manoel Pinho de Mello Introdução No Brasil, em cidades com menos de 200 mil eleitores, as eleições municipais são em um turno. Já em cidades com mais de 200 mil eleitores, as eleições são em dois turnos. Como podemos ver pela literatura prévia (por exemplo em Duverger, 1954), as regras eleitorais tem impacto decisivo no nível de competição política observado. Dessa forma, a partir da descontinuidade produzida pelo sistema eleitoral brasileiro, dispomos de uma oportunidade de avaliar empiricamente a interação entre competição política e variáveis fiscais sem que haja uma relação forte de causalidade reversa, dado que o grau de competição política é, em parte, determinado por regras eleitorais conhecidas e aplicadas de maneira independente de variáveis fiscais. Além disso, num corte apropriado da mostra, que, no caso de estudo, são munícipios com eleitorado entre 100 e 300 mil votantes, podemos supor que a única dimensão em que os elementos se diferenciam é na população, o que nos permite ignorar o efeito de fatores desconhecidos. Portanto, as regras eleitorais brasileiras possuem características semelhantes a um experimento controlado, o que torna os resultados particularmente robustos do ponto de vista econométrico. Observamos detalhadamente as disputas eleitorais em que o prefeito estava apto a disputar reeleição. No Brasil, apenas é permitido uma reeleição, de maneira que nenhum governante pode permanecer em um cargo de eleição majoritária (prefeito, governador e presidente da República) por mais de dois mandatos. Os resultados, assim como no estudo realizado por Besley e Case (1995) para governos estaduais nos Estados Unidos, demonstram que o limite de reeleição impacta as decisões de política pública. Objetivos O objetivo é medir o efeito causal da competição política sobre quatro variáveis fiscais, a saber: proporção dos investimentos sobre gastos totais, variação percentual do número de escolas, proporção dos gastos correntes sobre gastos totais e proporção dos gastos em folha de pagamento sobre gastos totais. Além de demonstrar que existe relação causal entre competição política e essas variáveis, busca-se medir a sua dimensão através de um modelo de regressão com descontinuidade, produzindo assim uma estimativa do coeficiente que as relaciona. Metodologia Em um primeiro estágio, observamos como a regra eleitoral é totalmente exógena ao processo eleitoral em si. Para refutar a hipótese de que municípios poderiam manipular o tamanho declarado do eleitorado, verificamos a distribuição por meio de um histograma e da densidade estimada no intervalo de 100 a 300 mil votantes.

Como não existe descontinuidade relevante em torno de 200.000 votantes, dificilmente poderia se argumentar que há manipulação. Ainda assim, testes adicionais foram realizados, sem apresentar indícios de endogeneidade. Em seguida, observamos os dados estatísticos para toda a amostra. As características de um município médio são bem distintas das observadas na sub-amostra de 100 a 300 mil votantes. Em especial, os indicadores de renda per capita e número de anos de escolaridade são bem mais elevados (333,82 e 6,49 respectivamente, contra 169,23 e 4,00 em todo o universo amostral). No entanto, para nenhuma dessas variáveis há descontinuidade em torno de 200.000 votantes, o que é particularmente importante para o estudo, já que a estratégia de identificação obriga que a população antes e depois sejam semelhantes em todos os aspectos que possam influenciar as variáveis de resultado.

Analisando as variáveis de competição política e finalmente as variáveis fiscais, notamos novamente que há diferenças entre a amostra e a sub-amostra, mas elas não significativas. Passada esta etapa, observamos como a competição política afeta a concentração partidária. As medidas utilizadas para avaliar o nível de competição política são o número efetivo de candidatos e o número de votos recebido pelo terceiro colocado nas eleições. Essa metodologia é sugerida por exemplo em Laakso e Taagepera, 1979.

Em um segundo estágio, usamos a descontinuidade como fonte de variação exógena para inferir o efeito causal de competição política sobre variáveis fiscais. Isso foi realizado através de um modelo de regressão com descontinuidade (RDD, na sigla em inglês). Este modelo implica em considerar os elementos em torno da descontinuidade semelhantes em tudo exceto ao tratamento. Esta hipótese equivale, em termos estatísticos, ao fato de que as variáveis não observadas no modelo estão distribuídas aleatoriamente em torno da descontinuidade. Dessa maneira, temos uma situação próxima a um experimento controlado, o que é altamente desejável. De forma mais rigorosa, explicitamos que boa parte dos dados se encontra na forma de painel, isto é, diversas unidades observacionais são distribuídas ao longo do tempo, num corte longitudinal. A metodologia padrão para se analisar dados em painel envolve a eliminação de efeitos fixos através da estimação de formas funcionais que relacionem não as variáveis em si, mas suas mudanças no tempo. Como dispomos de uma mudança exógena num instante conhecido, é possível delinear uma relação causal caso haja correlação significante. Outra ferramenta apropriada à análise estatística de dados dessa natureza é o uso de variáveis categóricas. Na medida em que supusermos que, para uma faixa suficientemente próxima, a única dimensão em que as cidades se diferenciam é na população, podemos captar tal variação numa relação binária que indica o avanço sobre o limiar exogenamente estabelecido para a mudança na regra eleitoral. Conclusões Através da descontinuidade da regra eleitoral em função do tamanho do eleitorado, pudemos identificar de forma inequívoca o efeito causal da competição política sobre variáveis fiscais. Demonstramos que a possibilidade de segundo turno induz a uma maior competição política e em seguida, observamos que essa maior competição política (ou, colocando de outra maneira, custos políticos de entrada menores) causa um aumento nos investimentos, construção de escolas e redução dos gastos correntes e em folha de pagamento. Os resultados possuem maior nível de significância se observarmos os casos em que o prefeito estava apto a concorrer à reeleição. Explicitamente, há um aumento de 28 por cento e 59 por cento em investimentos, em todas as disputas e nas que o prefeito estava apto à reeleição, um aumento de 13 por cento e 19 por cento no número de escolas. Há redução de 3 por cento e 5 por cento em despesas correntes e 2 por cento e 13 por cento nas despesas em folha de pagamento, porém destes, apenas o último número é estatisticamente significante. Em termos práticos, há uma transferência de recursos públicos de despesas correntes para investimento, o que se traduz em uma melhora de bem estar.

Cada ponto representa a média local dentro de um intervalo de 10.000 eleitores. Todos os gráficos acima demonstram efeitos causais no qual há nível de significância. Apesar da precisão da identificação fornecida pela descontinuidade, há preocupações válidas a respeito da generalidade dos achados. É possível que o efeito líquido dependa de particularidades na configuração estudada. Por exemplo, maior competição política pode afetar democracias recentes diferentemente de outras, mais consolidadas. Além disso, destacase que municípios têm menos mecanismos fiscais para manipular que governos nacionais. Tendo em vista essas limitações, o trabalho sugere que custos políticos de entrada menores são benéficos em uma democracia multipartidária.

Referência Bibliográfica 1. Chamon, M.; Mello, J.M.P. de; Firpo, S. Electoral rules, political competition and fiscal spending: regression discontinuity evidence from Brazilian municipalities, 2008. 2. Duverger, Maurice Political Parties, New York: Wiley, 1954. 3. Laakso, M. and Taagepera, R. The "Effective" Number of Parties: a Measure with Application to Western Europe, Comparative Political Studies, Vol 12, pp. 3-28, 1979. 4. Besley, T. and A. Case, Political Competition and Policy Choices: Evidence from the United States, Journal of Economic Literature, Vol. 841, pp. 7-73, 2003.