ANTE-PROPOSTA DE DECRETO-LEI RELATIVO A ALGUNS VALORES MOBILIÁRIOS DE ESTRUTURA DERIVADA CONSULTA PÚBLICA DA CMVM N.º 1/2008 1. Introdução O Decreto-Lei n.º 172/99, de 20 de Maio, inaugurou um tipo de valor mobiliário, os warrants autónomos, cuja característica estrutural diferenciadora dos restantes valores mobiliários tradicionais reside no facto de este valor mobiliário ter como referência num outro valor mobiliário ou activo financeiro. O regime deste valor mobiliário de estrutura derivada, desenvolvido posteriormente por regulamento da CMVM e objecto de diversas actualizações ditadas pela maior experiência do mercado nacional relativamente a este valor, serviu posteriormente de base ao regime de outros valores mobiliários de estrutura derivada reconhecidos por regulamento da CMVM ao abrigo do n.º 2 do artigo 1.º do Código dos Valores Mobiliários, entretanto aprovado. Estão neste caso os certificados, reconhecidos pelo Regulamento da CMVM n.º 7/2002, cujo regime é largamente tributário do regime dos warrants autónomos, aplicável subsidiariamente, e os valores mobiliários convertíveis, introduzidos pelo Regulamento da CMVM n.º 15/2002, cujo regime sofreu, aliás, uma recente alteração relativa ao leque de emitentes admissíveis de modo a alinhar-se com o regime previsto para os warrants autónomos. Deste conjunto de valores mobiliários de estrutura derivada fazem ainda parte os valores mobiliários condicionados por eventos de crédito, que embora ainda colham soluções do regime dos warrants autónomos, apresentam uma natureza especial, desde logo porque não assentam directamente num outro valor mobiliário ou activo financeiro, obrigando a que o regime subsidiário seja aplicado com as devidas adaptações. Decorridos alguns anos sobre a introdução destes valores mobiliários, e reconhecendo a cada vez maior experiência do mercado português em relação à emissão e à circulação de valores mobiliários de estrutura derivada e a crescente integração a nível internacional dos mercados financeiros, num ambiente em que o regime de tipicidade deixou de vigorar 1, mostrou-se necessário e oportuno repensar o regime aplicável a estes, no intuito de o modernizar e simplificar, eliminando do mesmo normas injustificadas num mercado com a maturidade agora verificada. Para 1 Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 66/2004, de 24 de Março.
esta revisão contribuiu ainda o facto de o regime informativo relativo a oferta públicas e processos de admissão à negociação em mercado regulamentado ter sido objecto de harmonização a nível comunitário, através do Regulamento (CE) n.º 809/2004 da Comissão. Tal como já anunciado na recente alteração do Regulamento da CMVM n.º 15/2002, a CMVM efectuou um estudo da revisão do regime aplicável aos valores mobiliários de estrutura derivada em geral do qual resultou a ante-proposta de diploma agora apresentada a consulta pública. Considerado o contexto acima referido, os principais objectivos desta proposta legislativa são os seguintes: sistematizar o tratamento normativo dos valores mobiliários de estrutura derivada, procurando atingir uma regulação unitária e coerente, com natureza legislativa; actualizar o regime destes valores, tendo presente os desenvolvimentos normativos ocorridos desde a data de aprovação do Código com destaque para a eliminação da regra da tipicidade (art. 1.º CVM), a harmonização das regras sobre o conteúdo dos prospectos (Regulamento CE n.º 809/2004) e a densificação significativa dos deveres de conduta dos intermediários financeiros, por virtude da transposição da DMIF; simplificar o regime dos valores mobiliários de estrutura derivada, à luz dos cânones de better regulation, ponderada a evolução do mercado nacional e a maior familiaridade dos investidores em relação a estes instrumentos. A esta luz, a presente ante-proposta de diploma consolida num único diploma, de natureza legislativa, as características essenciais (comuns e especiais) dos warrants autónomos, certificados, valores mobiliários convertíveis e valores mobiliários condicionados por eventos de crédito. Esta proposta é composta por uma parte geral, correspondente ao Capítulo I, seguida de quatro capítulos especiais, dedicados a cada valor mobiliário de estrutura derivada objecto do diploma, e por um capítulo final contendo as disposições finais. 2. Âmbito Subjaz a esta proposta o propósito de incluir a disciplina de todos os valores mobiliários de estrutura derivada reconhecidos por regulamento da CMVM e ainda a dos warrants autónomos, em que o regime daqueles assenta em medida variável. Cabem aqui os warrants autónomos, os certificados, os valores mobiliários obrigatoriamente convertíveis, os valores mobiliários convertíveis por opção do emitente e os valores mobiliários condicionados por eventos de crédito (art. 1.º). A técnica legislativa utilizada é a de fazer uso de uma tipologia de valores mobiliários de estrutura derivada já conhecidos e antes regulados em Portugal. Não se crê, pois, ser necessário incluir uma definição de valor mobiliário de estrutura derivada. De todo o modo, deve ter-se presente a necessidade de reunir dois requisitos: em causa estão valores mobiliários em sentido técnico (o que exclui contratos derivados, como futuros e opções) cuja avaliação do direito representado depende de um activo subjacente que aquele toma como referência.
Não ficam abrangidas nem as obrigações convertíveis em acções nem as obrigações com warrant, dado que estas já encontram regulação no Código das Sociedades Comerciais. Quanto ao correspondente âmbito territorial de aplicação, uma vez que a anteproposta de diploma traduz limitações à emissão destes valores, nessa componente aplicar-se-á aos que sejam emitidos em Portugal. Porém, as regras sobre publicidade aplicam-se identicamente aos valores mobiliários de estrutura derivada que sejam comercializados em Portugal, ainda que sejam emitidos no estrangeiro. 3. Emitentes Os warrants autónomos, por comparação com os restantes instrumentos, apresentam o leque mais extenso de emitentes admissíveis. Entende-se, em linha com a recente alteração ao Regulamento da CMVM n.º 15/2002, que não se justificam as restrições aplicáveis aos restantes valores mobiliários pelo que se propõe uma regra geral relativa a emitentes (art. 2.º). A regra proposta é inspirada no actual regime das obrigações, pressupondo uma ampla legitimidade a todas as sociedades anónimas e compreendendo um limite quantitativo não aplicável a entidades financeiras, a sociedades cotadas, a sociedades com notação de risco ou a sociedades que assegurem uma garantia especial prestada por terceiros. Pergunta # 1 Concorda com a solução proposta? Pergunta # 2 Concorda com este elenco de emitentes a que não se aplicam os limites quantitativos? 4. Deliberação de emissão Apesar do carácter geral das regras propostas quanto à articulação da deliberação de emissão com o regime estatutário (art. 3.º), importa ter presente a natureza de cada valor mobiliário na aplicação destas regras. De facto, no que respeita a valores mobiliários condicionados por eventos de crédito, não faz sentido a referência a valores mobiliários próprios enquanto activos subjacentes, pelo que a norma do n.º 2 do proposto artigo 3.º não terá aplicação no que respeita a estes valores. Com vista à pretendida simplificação, propõe-se a eliminação da regra que impõe menções obrigatórias na deliberação de emissão, uma vez que estas não podem deixar de corresponder às características essenciais dos valores mobiliários e ao conteúdo mínimo conformador de uma adequada deliberação de emissão. Igual entendimento foi seguido no que respeita à regra relativa ao momento de determinação do preço de exercício ou indicador equivalente. Com efeito, as exigências da emissão e do próprio mercado impõem ao emitente a definição destas matérias. Pergunta # 3 Concorda com a proposta de eliminação da regra relativa a menções obrigatórias na deliberação de emissão? Pergunta # 4 Concorda com a proposta de eliminação da regra relativa ao momento de determinação do preço de exercício ou de indicador equivalente?
5. Características dos activos subjacentes Procurou-se um regime mais coerente quanto às características dos activos subjacentes, promovendo normativamente algumas indicações que hoje vigoram em regulamentos da CMVM. As exigências limitam-se agora a que o activo subjacente seja de fácil avaliação, designadamente através da existência de um mercado líquido e ordenado para a sua negociação; e seja objecto de informação pública fidedigna quanto ao seu preço, acessível diariamente em Portugal. Confirmou-se igualmente a regra, já vigente em termos regulamentares, de que o preço do activo subjacente deva ser representativo. Porém, este regime não deve valer em relação a valores mobiliários que apenas possam ser adquiridos por investidores qualificados. 6. Vencimento e prazo de liquidação No tocante ao conteúdo dos valores mobiliários, foi entendido não ser necessário estabelecer regras sobre direito de reembolso antecipado em caso de vencimento superior a 5 anos. Entende-se, com efeito, que a devida divulgação das características do produto permitirão a este investidor uma correcta avaliação das características consequências do seu investimento, pelo que se entende dispensável a manutenção desta imposição aos emitentes. Do mesmo modo, julgou-se não dever haver indicações sobre o prazo de liquidação destes valores, que serão fixados pela entidade gestora da estrutura de negociação. Com a eliminação desta regra remove-se ainda um obstáculo de harmonização ao regime de liquidação seguido pela plataforma Euronext nas várias jurisdições em que actua. A este propósito, deve ter-se presente que estes valores mobiliários se qualificam invariavelmente como instrumentos financeiros de natureza complexa, para efeitos do dever de adequação do intermediário financeiro (art. 314.º, n.º 2 d)). Assim, cabe ao intermediário financeiro advertir o cliente se o excessivo prazo de vencimento ou de liquidação determina riscos especiais. Pergunta # 5 Concorda com a eliminação da regra que exige o cumprimento antecipado das obrigações do emitente? Pergunta # 6 Concorda com a eliminação da regra relativa à liquidação? 7. Publicidade As preocupações de protecção dos investidores conduzem à desejabilidade na manutenção do regime referente à publicidade quanto à menção obrigatória do risco de perda do montante investido (art. 8.º do Regulamento n.º 15/2002 e art. 6.º do Regulamento n.º 16/2002).
8. Warrants autónomos Às disposições gerais, seguem-se as normas específicas de cada valor mobiliário em particular. No capítulo dos warrants autónomos encontramos as regras relativas à noção do valor mobiliário, um alargamento do elenco de emitentes admissíveis, já referido na parte geral, e ainda as regras a warrants sobre valores mobiliários próprios e sobre valores mobiliários alheios. 9. Certificados À semelhança da opção tomada quanto aos demais valores mobiliários de estrutura derivada, também as normas sobre certificados encontram a sua origem na regulamentação da CMVM sobre a matéria (Regulamento da CMVM n.º 7/2002). Assim, uma vez que as disposições gerais determinam já os seus possíveis emitentes, ficaram reservadas para este capítulo especial a noção e as modalidades destes valores mobiliários (artigos 11.º e 12.º). Neste último aspecto, uma alteração pontual à redacção da norma esclarece que, em coerência com a lógica de modernização e simplificação que perpassa esta proposta, as modalidades enunciadas são meramente exemplificativas. 10. Valores convertíveis No caso dos valores mobiliários convertíveis, as normas especiais constantes do projecto de decreto-lei limitam-se a enunciar os dois tipos já reconhecidos pelo Regulamento da CMVM n.º 15/2002 e, como sucede no caso dos warrants sobre valores mobiliários próprios (e já considerando a última alteração àquele regulamento), a alargar o âmbito dos possíveis emitentes a quaisquer sociedades anónimas, desde que respeitados os limites de emissão previstos na lei societária (artigos 13.º a 15.º). No que toca aos activos subjacentes de valores mobiliários convertíveis por opção do emitente, optou-se por deixar cair a especial caracterização dos índices ou cabazes admissíveis, na medida em que essa matéria passou a ser tratada ao nível das características exigidas aos activos subjacentes de qualquer valor mobiliário de estrutura derivada que possa ser adquirido por investidores não qualificados (artigo 5.º) No regime dos valores mobiliários obrigatoriamente convertíveis, a admissibilidade de cláusulas de reajustamento automático da relação de conversão decorre da aplicação do disposto no Código das Sociedades Comerciais, aplicável por via da remissão constante do n.º 2 artigo 13.º deste projecto. Esta é a razão pela qual se prescindiu de reproduzir a norma equivalente constante do regulamento da CMVM relevante. 11. Valores mobiliários condicionados por eventos de crédito Em relação a este tipo de valores mobiliários, foi entendido ser de manter a exigência de um valor nominal mínimo se puder haver perda do montante investido. Com efeito, a recente turbulência financeira provou que os mercados estão cada vez mais integrados, e que muitos investidores foram surpreendidos ao verem os seus investimentos afectados pela alteração das condições do mercado de crédito. Assim,
é consagrada a proposta de manutenção da solução segundo a qual o valor nominal mínimo dos valores mobiliários condicionados por eventos de crédito que não garantam o reembolso em dinheiro do preço de subscrição é de 25.000 - que hoje já vigora através do art. 3.º do Regulamento n.º 16/2002. Contudo, entende-se que a norma apenas colhe justificação estando em causa investidores não qualificados, propondo-se que a mesma não seja aplicável a valores mobiliários condicionados por eventos de crédito que apenas possam ser adquiridos por investidores qualificados. 12. O processo de consulta Relativamente a esta ante-proposta legislativa, a CMVM convida os participantes no mercado, os investidores e o público em geral à apresentação de comentários, no âmbito da consulta que decorrerá até ao dia 30 de Março de 2008. Prevê-se ainda a realização de uma sessão pública de esclarecimentos, conforme será oportunamente divulgado. Os contributos devem ser remetidos para a CMVM, preferencialmente, para o endereço de correio electrónico cmvm@cmvm.pt. As respostas à consulta pública podem igualmente ser expedidas, por correio normal, para a Avenida da Liberdade, n.º 252, 1056-801 Lisboa; telefax n.º 21 353 70 77/78. Encoraja-se que os comentários se refiram ao conteúdo integral das propostas. Porém, para orientar os destinatários da consulta, são formuladas algumas questões concretas a que se convida que sejam dadas respostas. Atendendo a razões de transparência, a CMVM propõe-se publicar os contributos recebidos ao abrigo desta consulta. Assim, caso o respondente se oponha à referida publicação deve comunicá-lo expressamente no contributo a enviar. Qualquer dúvida ou esclarecimento adicional sobre a presente consulta pública poderá ser elucidada pelo Dr. Paulo Câmara, Director do Departamento Internacional e de Política Regulatória da CMVM.