Análise da Precipitação Prevista pelo Modelo Regional ETA Climático para a Região Nordeste do Brasil Wanderson dos Santos Sousa 1, Henrique Rennó de Azeredo Freitas 2, Javier Tomasella 3 1,2,3 Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, Rodovia Presidente Dutra, km 40, Cachoeira Paulista, São Paulo, Brasil, 12630-000. 1 wanderson.santos@cptec.inpe.br, 2 henrique.renno@cptec.inpe.br, 3 javier.tomasella@inpe.br ABSTRACT: In this study was realized an analysis and comparison of the precipitation field predicted by climatic regional model ETA of CPTEC and the precipitation field of the database PROCLIMA/CPTEC correspondent the observed data. The existence for possible systematic errors was checked. The study was realized on the northeast of Brazil for the period 1970-1990. Systematic errors associated with precipitation fields of the ETA model were found and these were corrected through the curve of probability occurrence of the precipitation data observed, obtaining satisfactory values after correction. Palavras-chave: semi-arid, climate change, ETA model 1. INTRODUÇÃO No Brasil, as precipitações totais anuais em pontos localizados variam de 300 mm no Nordeste árido até 8000 mm, na região Amazônica, com grande variabilidade espacial e temporal. Porém estes limiares poderão sofrer alterações no futuro, como já observado em projeções futuras do clima que sugerem ocorrências de secas nestas regiões, como conseqüência do aquecimento global, que poderá afetar a população, a agricultura e os ecossistemas naturais (Marengo, 2008). Do ponto de vista social e observando o histórico climático, a região mais vulnerável as mudanças do clima seria o interior do Nordeste conhecida como semi-árido ou simplesmente o sertão. Esta é constituída atualmente de 1133 municípios que apresentam algumas características específicas como precipitação pluviométrica média anual inferior a 800 mm; índice de aridez de até 0,5 calculado pelo balanço hídrico que relaciona as precipitações e a evapotranspiração potencial, no período entre 1961 e 1990; e risco de seca maior que 60%, tomando-se por base o período entre 1970 e 1990 (www.mi.gov.br). Considerando que as características climáticas são fundamentais nos critérios de delimitação do semi-árido e que o regime pluviométrico de uma determinada região mantém uma forte relação com as condições hídricas do solo, surgiu à preocupação de verificar qual seria a mudança na delimitação do semi-árido no Nordeste do Brasil frente às projeções do clima futuro, ou seja, se haveria municípios incluídos ou excluídos da delimitação atual. Neste contexto, esta sendo realizado um estudo para verificar a delimitação do semiárido do Nordeste do Brasil considerando os critérios acima citados e as mudanças climáticas futuras projetadas pelos cenários do modelo regional ETA climático do Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC). Porém o presente estudo apresenta a primeira fase do trabalho que sintetiza uma análise da discrepância dos campos de precipitação de dados observados do banco de dados do Programa de Monitoramento Climático em Tempo Real da Região Nordeste (PROCLIMA) do CPTEC e dos dados previstos pelo modelo ETA, para o clima presente (1970-1990). 2. MATERIAL E MÉTODOS 2.1. Área de estudo A Região Nordeste do Brasil é formada por nove estados, sendo eles: Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia, como mostrado
na Figura 1. Esta região tem cerca de 50 milhões de habitantes e abrange uma área de 1.561.177 km 2 sob um extenso planalto, antigo e aplainado pela erosão, caracterizando a região em diferentes sub-regiões: zona da mata, agreste, sertão e meio-norte. Figura 1. Região Nordeste do Brasil (Fonte: IBGE) A zona da mata estende-se do estado do Rio Grande do Norte ao sul da Bahia, numa faixa litorânea de até 200 km de largura. O clima é tropical úmido, com chuvas mais frequentes no outono e inverno. O solo é fertil e a vegetação natural é a mata atlântica, já praticamente extinta e substituída por lavouras de cana-de-açúcar desde o início da colonização. O agreste é a área de transição entre a zona da mata, região úmida e cheia de brejos, e o sertão semi-árido. Nessa sub-região, os terrenos mais férteis são ocupados por minifúndios, onde predominam as culturas de subsistência e a pecuária leiteira. O sertão, uma extensa área de clima semi-árido, chega até o litoral, nos estados do Rio Grande do Norte e do Ceará. As atividades agrícolas sofrem grande limitação, pois os solos são rasos e pedregosos e as chuvas, escassas e mal distribuídas. A vegetação típica é a caatinga. O meio-norte compreende da faixa de transição entre o sertão semi-árido do Nordeste e a região amazônica. Apresenta clima úmido e vegetação exuberante, à medida que avança para o oeste. 2.2. Dados 2.2.1 Dados Observados Os dados de precipitação observada foram adquiridos junto ao banco de dados do PROCLIMA no CPTEC no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). A série de dados apresenta resolução temporal diária para o período de 21 anos (1970 a 1990). Espacialmente, os dados estão bem distribuídos e abrangem todo o território brasileiro com um total de 6677 postos pluviométricos monitorados por diversos órgãos como: ANA Agência Nacional de Águas (3340); Alagoas (140); Bahia (256); Cargill (324); Ceará (644); Cemig (84); Defesa Civil (497); Espírito Santo (29); IAC Instituto Agronômico (84); Minas Gerais (81); Pará (5); Paraíba (164); PCDs Plataforma de Coleta de Dados (489); Pernambuco (277); Rio Grande do Norte (230); Sergipe (21); Simepar (12). Estes dados foram interpolados utilizando o método do inverso do quadrado da distância (Collischonn et al. 2005; Tucci et al. 2003; Mello et al. 2003) como mostrado na Equação 1, para uma grade de 0,25 x 0,25. A escolha da grade foi conforme a redução no tempo de processamento computacional na operação dos dados. 1 1 (1)
em que, x p é o valor da chuva interpolada; x i é o valor da chuva na i-ésima localidade vizinha; d i é o valor da distância euclidiana entre o i-ésimo ponto de vizinhança e o ponto amostrado. 2.2.2. Dados previstos pelo modelo regional ETA climático Os dados de precipitação prevista foram adquiridos junto ao CPTEC/INPE. Estes foram estimados pelo modelo regional ETA (Chou, 1996) climático em uma grade de 40 km para o período 1960 a 1990, porém para este estudo utilizamos a mesma resolução temporal e espacial dos dados observados. O modelo apresenta algumas configurações específicas como: resolução de 40 km na horizontal, 38 níveis na vertical, com o topo em 25 hpa. Na horizontal, as variáveis são distribuídas na Grade E de Arakawa, e a coordenada vertical é a coordenada ETA. O modelo possui complexa representação dos processos físicos que são tratados através de esquemas de parametrizações. As trocas turbulentas na vertical são resolvidas pelo esquema de Mellor-Yamada (1982). As trocas de energia na superfície se baseiam na teoria de Monin-Obukhov. Na parametrização dos fluxos superficiais é utilizado o modelo NOAH. A microfísica de nuvens é representada de acordo com Zhao e Carr (1997), e a parametrização de chuva convectiva segue o esquema de Betts-Miller-Janjic (Janjic, 1994). O tratamento dos fluxos radiativos na atmosfera foi desenvolvido pelo Geophysical Fluid Dynamics Laboratory e as taxas de aquecimento ou resfriamento devido aos processos radiativos são recalculadas a cada hora de integração. 2.3 Análise dos campos de precipitação Com a finalidade de avaliar a climatologia da precipitação, na região de estudo, foi calculada a média dos totais anuais de precipitação para o clima presente utilizando o software Grid Analysis and Display System (GRADS) dos dados observados e estimados, ambos interpolados a uma resolução de 25 km. Em seguida foi realizada a diferença entre as médias observadas e estimadas, permitindo verificar a existência de erros sistemáticos na precipitação. 2.4 Correção dos erros sistemáticos de precipitação Wood et al. (2002) mencionam que saídas de modelos atmosféricos apresentam significativos erros sistemáticos, e estes podem apresentar profundos impactos nas mais diversas simulações. Neste contexto, será utilizada a metodologia desenvolvida por Hay e Clark (2003), para correção dos possíveis erros sistemáticos da precipitação prevista utilizada no presente estudo, onde para cada mês do ano e para cada ponto da grade de previsão do modelo atmosférico são desenvolvidas duas curvas de distribuição de probabilidade, a dos dados observados e a dos dados previstos de chuva diária. Cada chuva prevista tem uma probabilidade associada, e o valor corrigido associado a esta mesma probabilidade é identificado sobre a curva de distribuição de probabilidade das precipitações observadas. A Figura 2 ilustra este procedimento. 90 80 70 Precipitação (mm) 60 50 40 30 Valor original Valor corrigido 20 10 0 0 5 10 15 20 24 30 35 40 45 51 Probabilidade (%) Figura 2. Curvas de distribuição de probabilidade de precipitação, linha azul dos dados observados e linha vermelha (tracejada) dos dados previstos pelo modelo ETA.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Analisando as médias dos totais anuais de precipitação, no período 1970 a 1990, para os dados observados e para os dados previstos pelo modelo ETA, observamos que os valores de precipitação para a média dos dados observados variam de 306,018 mm a 5027,31 mm e para a média dos dados previstos de 253,618 mm a 3507,43 mm. Por estes limiares já se verifica uma diferença entre os valores das médias, portanto para facilitar o entendimento do comportamento espacial destas na região Nordeste do Brasil calculamos a diferença entre a média anual dos dados observados e a média anual dos dados previstos, mostrado na Figura 3a, onde verificamos valores bastante elevados nas diferenças. Observamos nesta figura que o modelo ETA subestima a precipitação em regiões no norte do Pará e superestima a precipitação no sul e leste do Nordeste, Minas Gerais, Espírito Santo, sudeste de Tocantins e Goiás. Estes elevados valores foram associados a erros sistemáticos do modelo ETA em estimar a precipitação no Nordeste do Brasil, então foram necessárias correções nas precipitações. Com os dados de precipitação do modelo ETA corrigidos, baseados nos dados observados, foram calculadas as médias como descritas anteriormente e observamos que os valores variam de 301,186 mm a 4960,5 mm. As diferenças entre as médias dos dados observados e previstos corrigidos também foram calculadas e observamos uma diminuição no erro associado, conforme Figura 3b. Porém o modelo ETA ainda subestima a precipitação no norte do Pará e Maranhão e leste da região Nordeste e quase todo o Tocantins. Figura 3. Diferença entre a média anual dos dados observados e a média anual dos dados previstos pelo modelo ETA (a); e a diferença entre a média anual dos dados observados e a média anual dos dados previstos corrigidos (b). 4. CONCLUSÕES Foram encontrados erros sistemáticos nas estimativas de precipitação, para a região Nordeste do Brasil no período 1970 a 1990, do modelo regional ETA climático, sendo necessário realizar correções baseadas nos dados de precipitação observada. Com as correções calculadas observou diminuição nos valores dos erros sistemáticos. Dessa forma, concluímos que os dados de precipitação previstos pelo modelo ETA podem ser utilizados para os mais diversos estudos, desde que sejam corrigidos os erros sistemáticos. Observados os valores máximos e mínimos nas médias anuais dos dados observados, vimos que estes podem conter algum erro nas medições pontuais que por sua vez interpolados para os pontos mais próximos acarretam em valores irreais para a região. Com isso, pretende posteriormente verificar estes pontos e averiguar se estes dados estão corretos ou não, dessa forma melhorando a interpolação na região.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Chou, S. C. Modelo regional Eta. Climanálise, v.1, Edição Especial, p. 203-207, 1996. Collischonn, W.; Tucci, C. E. M.; Clarke, R. T.; Dias, P. L. S.; Sampaio, G. Previsão Sazonal de Vazão na Bacia do Rio Uruguai 2: Previsão Climática-Hidrológica. Revista Brasileira de Recursos Hídricos. Associação Brasileira de Recursos Hídricos (ABRH), vol. 10, n. 4, p. 61-72, 2005. Hay, L. E.; Clark, M. P. Use of Statistically and Dynamically Downscaled Atmospheric Model Output for Hydrologic Simulations in Three Mountainous Basins in the Western United States. Journal of Hydrology, v. 282, p. 56-75, 2003. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br>. Acesso em Maio de 2010. Janjic, Z. I. The step-mountain Eta coordinate model: Further developments of the convection, viscous sublayer, and turbulence closure schemes. Monthly Weather Review, 122, 927 945, 1994. Tucci, C. E. M.; Clarke, R. T.; Collischonn, W.; Dias, P. L. S.; Sampaio, G. Long term flow forecast based on climate and hydrological modeling. Water Resources Research, v. 39, n. 7, p. 3(1-11), 2003. Marengo, J. A. Vulnerabilidade, impactos e adaptação à mudança do clima no semi-árido do Brasil. Parcerias Estratégicas. Brasília, DF. N. 27. 2008. Mello, C. R; Lima, J. M.; Silva, A. M.; Mello, J. M.; Oliveira, M. S. Krigagem e inverso do quadrado da distância para interpolação dos parâmetros da equação de chuvas intensas. Revista Brasileira de Ciência do Solo, vol.27, n. 5, p. 925-933, 2003. ISSN 0100-0683. Mellor, G. L.; Yamada, T. Development of a Turbulence Closure Model for Geophysical Fluid Problems. Reviews Geophysics, 20(4), 851 875, 1982. Ministério da Integração Nacional. Disponível em: <http://www.mi.gov.br>. Acesso em Fevereiro de 2010. Wood, A. W.; Maurer, E. P.; Kumar, A.; Lettenmaier, D. P. Long-range experimental hydrologic forecasting for the eastern United States. Journal of Geophysical Research Atmospheres, 107, 4429, 2002. Zhao, Q.; Carr, F. H. A Prognostic Cloud Scheme for Operational NWP Models. Monthly Weather Review, vol. 125, p. 1931 1953, 1997.