capítulo 2 o estado do meio ambiente no Brasil o estado do meio ambiente no Brasil



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Transcrição:

capítulo 2 o estado do meio ambiente no Brasil 23

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dinâmicas territoriais e meio ambiente 1. O contexto geopolítico da configuração territorial brasileira Com uma superfície de cerca de 8.500.000 km 2, o Brasil ocupa quase a metade da América do Sul, limitando-se ao norte com a Venezuela, Guiana, Suriname, Guiana Francesa e Oceano Atlântico; ao sul, com o Uruguai; a oeste, com a Argentina, Paraguai, Bolívia e Peru e, a noroeste, com a Colômbia, sendo seu litoral leste banhado pelo Atlântico. Possui várias ilhas oceânicas, destacando-se as de Fernando de Noronha, Abrolhos e Trindade. O País tem fronteiras comuns com todas as nações da América do Sul, à exceção do Chile e do Equador. O território brasileiro apresenta posição singular no plano externo e interno. A primeira, associada à visão do país no mundo como reserva de recursos naturais tradicionais e, hoje, também, como detentor da biodiversidade da maior floresta equatorial do Planeta, e de seu banco genético, de potencial ainda desconhecido. A segunda, associada, internamente, à incorporação técnica, econômica e política do território exigida pela expansão produtiva do espaço nacional. A vastidão do território brasileiro, tanto em latitude (entre os paralelos de 5 0 16 20 " de latitude norte e 33 0 45 03 " de latitude sul), quanto em longitude (entre os meridianos de 34 0 47 30 " e 73 0 59 32 " a oeste de Greenwich), abriga um extraordinário mosaico de ecossistemas produzido não só por uma ampla diversidade climática, como também topográfica. O posicionamento do território brasileiro na borda ocidental do Oceano Atlântico, aliado às variações verificadas em seu relevo, condiciona diferentes características aos macrossistemas atmosféricos, sejam eles continentais ou oceânicos, imprimindo uma diversidade de domínios climáticos que variam do equatorial ao subtropical, com gradações de tipos e subtipos produzidos pela variabilidade geoecológica existente no país. Essas características contingenciaram, ao longo da história, as diversas formas de ocupação e uso pela sociedade dos espaços moldados pela natureza tropical e subtropical do país, conformando, em linhas gerais, cinco grandes regiões geográficas: Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste. 2. Território e água Quinto país em extensão territorial do planeta, o Brasil compartilha, fisicamente, suas maiores bacias hidrográficas (Mapa 1 - Bacias hidrográficas) a Amazônica e a do Prata com os demais países sul-americanos, possuindo, desse modo, além da liderança econômica no continente, a plataforma natural para conduzir o processo de integração econômica regional e se fortalecer diante dos blocos hegemônicos mundiais, sejam eles articulados pela frente americana, européia ou asiática. Com efeito, dentre os grandes rios nacionais, o Amazonas, um rio predominantemente de planície no território nacional, possui suas cabeceiras na região andina peruana, tornando o seu uso e, principalmente, a gestão desse uso um processo compartilhado entre os países que compõem a Amazônia sul-americana. Cabe observar, que o rio Amazonas forma a maior bacia hidrográfica do mundo, estendendo-se por 5.846.100 km 2, dos quais cerca de 3.836.520 km 2, em território brasileiro. Pode-se mesmo afirmar que uma das questões centrais que a sociedade e o Estado brasileiros deverão enfrentar no século XXI será aquela atinente ao uso planejado e compartilhado das grandes bacias hidrográficas e dos imensos recursos hídricos situados na face oriental da América do Sul, onde se estende o recorte territorial brasileiro. Nesse sentido, o uso compartilhado da bacia do Prata constituiu experiência pioneira na consolidação de práticas e normas efetivas de gestão compartilhada dos recursos comuns dos países componentes do Cone -Sul da América. Com aproximadamente 3.100.000 km 2, a importância geopolítica da bacia do Prata deriva-se não só de seu peso demográfico e econômico, mas também da identidade cultural que construiu historicamente no continente sul-americano. Dois tratados internacionais Tratado da Bacia do Prata (1969) e o Tratado do Rio Paraná (Itaipu, 1973) construíram as bases de cooperação externa necessárias para discutir o uso compartilhado dessa bacia. No caso da bacia Amazônica, o Tratado de Cooperação Amazônico - TCA (1978) é o instrumento legal existente de regulação internacional dos recursos hídricos, no âmbito do qual podem ocorrer novos mecanismos de ajuste e aprimoramento em 25

dinâmicas territoriais e meio ambiente As atividades econômicas desenvolvidas no Brasil estiveram, em sua história, fortemente relacionadas com a exploração de seus recursos e, portanto, das potencialidades naturais contidas em seu território. Nesse sentido, internamente, esse território nunca traiu o desenvolvimento nacional, fornecendo a base de recursos necessária à expansão da fronteira econômica, sempre que foi solicitado nos momentos de aceleração do processo de crescimento e, mais recentemente, de consolidação do mercado interno. Projetando espaços geográficos diferenciados, à medida que o mercado mundial demandava produtos com possibilidades e vantagens concretas de exploração, a implantação, em diferentes momentos históricos, de várias atividades exportadoras explica não somente a forma de ocupação do Brasil, como também, simultaneamente, a construção de sua diferenciação regional. Composto, até a década de 50, de ilhas de adensamento econômico, isoladas entre si e voltadas para o exterior, o país revelava a feição espacial herdada de um processo de ocupação que deixou marcas diferenciadas no extenso território nacional, conforme se desdobravam com grandes descontinuidades temporais e geográficas, os diversos ciclos econômicos voltados para exportação. Aí se inclui o ciclo do ouro, em Minas Gerais, que representou, a seu tempo, a experiência mais notável de indução do processo de articulação do interior do território e de afirmação da própria nacionalidade brasileira. termos de uma gestão pactuada dos recursos hídricos daquela porção setentrional do continente sul-americano. Cabe observar, ainda, que além da Usina Hidrelétrica de Itaipu, as hidrovias do Tietê e do Paraná- Paraguai encontram-se nessa bacia hidrográfica. 3. O Brasil: contexto econômico de configuração territorial A maneira como se distribuem os grandes planaltos e planícies e, sobretudo, o modo como se limitam as diferentes formas de relevo no Brasil (Mapa 2 ) concorrem, em grande parte, para explicar a fixação e o adensamento inicial da população ao longo da zona litorânea. A presença de escarpas abruptas do planalto brasileiro, próximas ao mar - em grandes extensões do litoral sudeste, constituiu, no passado, uma barreira natural à penetração do interior do país. Já no interior, a rarefação das atividades econômicas característica tanto do extrativismo praticado na imensa planície amazônica recoberta pela floresta tropical úmida, como da pecuária dominante no cerrado do planalto central, na caatinga do semi-árido nordestino 26

e nos campos subtropicais do Sul do país, só foi quebrada, de forma contínua, pela interiorização do cultivo do café no oeste paulista e das demais atividades agrícolas induzidas pela sua expansão. Nesse contexto, os rios constituíram os caminhos naturais de penetração do interior, conformando um padrão dendrítico tradicional de ocupação do território brasileiro modelado pela distribuição em suas margens dos núcleos urbanos, assim como das áreas agrícolas com maior intensidade de uso. Com efeito, no Brasil, em decorrência da natureza do relevo, embora predominem os rios de planalto, apresentando, por vezes, alguma dificuldade de navegabilidade associada a rupturas de declive, eles constituíram, como o São Francisco e o Paraíba do Sul, redes difusoras do povoamento do interior desde o período colonial. O deslocamento do café pelo Vale do Paraíba fluminense até atingir o planalto paulista representou não somente o primeiro grande movimento de desmatamento em direção ao interior do país, mas também a primeira diferença regional no Brasil que ia além da mera exploração das potencialidades naturais do território, apesar de encontrar aí condições excepcionais quanto à temperatura, pluviosidade e tipo de solo. Fonte: CPRM Transposta a barreira da Serra do Mar, a expansão dessa cultura pelo planalto paulista, em meados do século XIX, ao induzir, com êxito, a diversificação produtiva de outras atividades agrícolas, e também não-agrícolas, constitui um dos vetores do processo de urbanização/industrialização de São Paulo, passando a depender, também, da ampliação do mercado interno e da modernização do processo produtivo, para a própria reprodução da complexa economia e dos interesses que se articulavam a partir da atividade cafeeira. A consolidação da economia cafeeira servirá de suporte para o encaminhamento da centralização do poder no país, alterando sua estrutura política, social e espacial, ao deslocar o eixo econômico do norte para o sul. Essa mudança é que iria legitimar a supremacia política com o domínio econômico, pondo fim a um longo processo de ajuste quanto ao pólo geográfico do poder, a partir do qual se reestruturariam as relações políticas e econômicas no território brasileiro. Com a hegemonia econômica conquistada a partir da consolidação da atividade cafeeira, reforçava-se o pacto de poder político em torno de interesses comprometidos, crescentemente, com atividades articuladas na esfera financeira e industrial, cuja expansão pressupunha, também a formação de um mercado interno e o uso intensificado dos recursos naturais em escala nacional. O movimento de integração do espaço geográfico nacional necessário à formação e ampliação do mercado interno foi viabilizado pela constru- 27

dinâmicas territoriais e meio ambiente ção de uma rede técnica pautada na expansão de rodovias e na geração/distribuição de energia, a partir da segunda metade da década de 50, e mais intensamente nos anos 70, quando se avolumam, também, os incentivos fiscais e creditícios necessários à expansão de projetos produtivos fora das áreas de maior desenvolvimento. A criação de Brasília, nesse período, altera não apenas o mapa político do país, mas também promove o redesenho da rede de circulação nacional, que a partir daquele momento passava a subordinar-se, crescentemente, à ampliação do mercado interno, além de servir de plataforma de penetração ao espaço amazônico, dentro da geopolítica de desenvolvimento e segurança com a qual se promoveu a incorporação daquela remota fronteira de recursos, impactando, diretamente, seus frágeis ecossistemas florestais. O discurso da integração nacional fundamentou o nacionaldesenvolvimentismo, assumindo forma elaborada e ação política agressiva a partir da década de 70, quando a aceleração do processo associado de urbanização-industrialização passa a alterar, de modo radical, o ritmo e a forma de articulação e uso do território nacional. inserção no mercado interno e externo, tanto as regiões periféricas mais próximas do planalto das araucárias do oeste do Paraná, como as mais distantes dos Cerrados no planalto central além do Nordeste ou da Amazônia, foram sendo incorporadas à fronteira de recursos do país. Em termos espaciais, tal movimento ocorreu não só pela expansão horizontal de extensas fronteiras agrícolas modernizadas - como no caso do oeste do Paraná, da Região Centro-Oeste e, mais recentemente, dos chapadões do oeste da Bahia e sul do Maranhão e Piauí assim como através de pontos e manchas deixados na paisagem pela extração mineral e pelos projetos de agricultura irrigada no semi-árido nordestino. Nesse contexto, o movimento de expansão e intensificação do turismo no litoral nordestino tem se revelado um poderoso vetor de transformação desse espaço regional, portador de novos riscos e oportunidades à sociedade e ao meio ambiente do Nordeste. A esse movimento de incorporação de áreas ao espaço econômico nacional, associou-se um processo de urbanização e de industrialização que significou, simultaneamente, a desconcentração econômica e demográfica rumo ao interior, resultando na expansão e adensamento da rede urbana nacional, que passa a contar com a presença de cidades grandes e de numerosas cidades médias fora do eixo litorâneo de ocupação histórica do território brasileiro. A incorporação dos recursos naturais constituirá a condição central da ampliação da fronteira econômica do país, depois de atingida a escala de concentração industrial e financeira em torno do núcleo paulista. Nesse sentido, embora obedecendo a lógicas e momentos diferenciados de expansão/ Nesse sentido, o Brasil chega ao ano 2000 com treze cidades acima de 1milhão de habitantes, apresentando, além das duas metrópoles nacionais São Paulo e Rio de Janeiro, com população superior a 5 milhões de habitantes, outras 11 metrópoles regionais que coincidem, em sua maior parte, com as capitais político-administrativas dos estados mais povoados da federação. 28

À exceção de Brasília e Guarulhos, essas cidades constituem o núcleo das nove regiões metropolitanas definidas pelo IBGE na década de 70.Nesse grupo, incluem-se as cidades de Salvador, Belo Horizonte, Fortaleza e Brasília, com mais de 2 milhões de habitantes, além de Curitiba, Recife, Manaus, Porto Alegre, Belém, Goiânia e Guarulhos. Com uma população de 34.389.320 habitantes, essas grandes cidades concentravam cerca de 20% dos 169.799.170 habitantes do país em 2000. Nesse mesmo ano, contudo, as cidades médias - entre 200 mil a 500 mil habitantes - que em 1980 concentravam 9,3% da população total do país em 37 núcleos urbanos, chegaram, em 2000, detendo 13,7% dessa população, distribuída entre 76 cidades, enquanto as cidades maiores - de 500 mil a 1milhão de habitantes - passavam, nesse mesmo período, de 8 para 18 centros urbanos, concentrando, respectivamente, 3,4% e 7,4% da população total do país. Nesse contexto, a urbanização surge notadamente em áreas de menor densidade populacional do Centro-Oeste e da Amazônia, como força dinamizadora e, ao mesmo tempo, resultante da redistribuição da população e de suas atividades. A expansão da agropecuária modernizada no Centro-Oeste constitui, assim, o braço avançado do processo de reorganização agroindustrial em curso, que tem significado não só a mudança de estabelecimentos da região metropolitana de São Paulo em direção ao seu interior imediato, como aos estados sulinos mais próximos. Existem, portanto, na atualidade, riscos e oportunidades para o ordenamento do uso do território brasileiro mais adequado a um desenvolvimento em bases econômica, política e ambientalmente sustentáveis, em termos de alocação de investimentos e de atividades, em direção ao grande arco de penetração das áreas de floresta ainda preservadas da Amazônia. Como resultado de um povoamento que teve na expansão e na posse espontânea do território a base de sua dominação política, os estados brasileiros e suas subdivisões internas herdaram uma superfície territorial extremamente diferenciada, aí incluídos Estados como o do Amazonas, com 1.577.820 km 2, que corresponde a cerca de 18% do território nacional, ao lado de outros, como o de Sergipe, com 22.050 km 2. Nesse sentido, cabe observar que a configuração territorial dos estados brasileiros atuais moldou-se, grosso modo, nas transformações das primitivas Capitanias, cuja dimensão era limitada apenas pela extensão concedida na linha da costa, e cuja expansão territorial ampliava-se para o sertão interior na medida da capacidade de ex- 29

dinâmicas territoriais e meio ambiente Com a consolidação da abertura democrática, culminando na promulgação da Constituição Federal de 1988, consagra-se o princípio da descentralização do poder, aprofundando os mecanismos legais de consolidação da divisão federativa do território nacional. Nesse contexto, as entidades federativas na atualidade não se limitam mais aos vinte e seis Estados e a um Distrito Federal, herdeiros da divisão político-administrativa que as contingências históricas foram traçando no território nacional, mas a eles se acrescenta um universo de cinco mil quinhentos e sessenta e um municípios que compartilham, com relativa autonomia, o pacto que sustenta a Federação brasileira na contemporaneidade. ploração dos donatários. Nesse contexto, segundo Rodrigo (1927), as antigas províncias tinham uma divisão territorial muito defeituosa, tendo cabido na partilha, a algumas, grandes vastidões incultas; a outras, diminutas nesgas de terra. Durante o Império, sendo o Brasil um Estado unitário, cujo governo e administração se concentravam, preponderantemente, no poder central, de onde emanava, praticamente, toda a autoridade provincial, esse desequilíbrio territorial não chegava a causar grande perturbação ou desigualdade sensível na administração pública. As Províncias eram, propriamente, divisões territoriais do Estado central e não partes componentes deste; a Nação é que se compunha de Províncias. Na federação republicana, contudo, essa diferença na dimensão territorial entre os Estados-membros acabaria potencializando, de alguma forma, acentuada desigualdade em suas condições econômicas e administrativas em âmbito estadual e, agora, também, na escala municipal. Do ponto de vista político, a década de 80 conheceu uma distensão generalizada que iria legitimar, de certo modo, o processo de desconcentração do espaço econômico e de interiorização da ocupação, conforme revelado nos diferentes níveis de densidade populacional (Figura 2 -Mapa de densidade demográfica, cap. 4, pg. 299), que converge na direção da concretização de novas realidades locais, contrárias a algumas tendências gerais observadas na economia e no espaço brasileiro no pós-guerra. A reformulação do arcabouço constitucional legitima a profunda transformação operada nos limites internos do mapa político nacional na última década. A comparação das alterações operadas nas fronteiras municipais, entre 1940, quando existiam 1.574 municípios, e 2000, quando o número de municípios chega a 5.507, revela a emergência de um novo mapa político do Brasil nos dias atuais (Mapa 3 - Divisão municipal 2000). Com efeito, a última carta constitucional, ao legitimar a ampliação da escala de intervenção do poder municipal em sua área de jurisdição, fez com que o município passasse a assumir,, responsabilidades múltiplas, na qualidade de entidade infra-estatal com vida própria, que estende sua ação para além do seu centro urbano imediato, fazendo com que sua dimensão territorial, vis-à-vis seus recursos 30

e potencial econômico e ambiental, constituíssem novas realidades a serem consideradas. Mapa 3 - Divisão municipal - 2000 O município equipara-se, enfim, como pessoa jurídica de direito público interno e, portanto, entidade infra-estatal consolidada, à União e aos Estados, passando a assumir com eles inúmeras atribuições compartilhadas quanto à regulação do uso do território, notadamente no campo ambiental. Nesse sentido, a legislação ambiental tem suscitado na agenda pública brasileira questões renovadas quanto aos limites da competência federal, estadual e municipal sobre o uso do território e dos recursos naturais nele contidos. Cabe observar, que a mesma legislação constitucional que abraçou o projeto descentralizador do poder, ampliou, simultaneamente, as condições de criação de uma outra divisão do espaço político nacional, constituída pelas Terras Indígenas e Unidades de Conservação, cuja implementação no território, vem, também, reforçar o papel da sociedade civil na gestão local. Essa nova divisão ambiental do território, apesar de não reivindicar o domínio da representação político-administrativa, acabou adquirindo legitimidade, por via da força política alcançada mundialmente pelo movimento ambiental. Na atualidade, se os recortes territoriais voltados para a conservação da natureza e da cultura indígena, no nível nacional, representam em torno de 20% do território brasileiro, na região da Amazônia Legal, eles chegam a delimitar cerca de 30% de sua área territorial. Representando mais da metade do território nacional, os estados que compõem a Amazônia Legal (AM, PA, MT, TO, RO, RR, AP, AC e parte do MA) transferem, de certo modo, o peso de sua dimensão física e estratégica para o da legitimidade política que possuem no conjunto da federação brasileira. Há que se observar, ainda, que a Amazônia Legal concentra cerca de 94% do território abrangido pelas terras Iidígenas e unidades de conservação no País, que, em janeiro de 2002, alcançavam, respectivamente, 101.822.449 ha e 76.544.735 ha Fonte: IBGE no total do Brasil, dos quais 99% e 87%, respectivamente, se encontravam naquela região. Nessa região, as terras indígenas e unidades de conservação ganharam expressão política concreta, uma vez que muitos municípios dos estados de Roraima e Amazonas, por exemplo, possuem grande parte de seus territórios submetidos a contingenciamentos legais, derivados da necessidade de se conservar seja a natureza, seja a cultura indígena, tornando mais complexa a gestão do espaço político em nível local/regional. O ambientalismo reforça, desse modo, a tendência contemporânea de aprofundamento das diferenças no uso do território, ao atuar localmente, segundo uma lógica e interesses articulados, em sua maior parte, em âmbito global. O esforço de análise d, de que trata o presente capítulo, fiel à sua contemporaneidade, segue a mesma tendência, procurando ressaltar as pressões de maior impacto que determinados usos e abusos dos recursos naturais exercem sobre o território. As seções a seguir apresentadas relatarão o estado, as pressões e os impactos referentes a temas selecionados pelo IBAMA e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. 31