Palavras-chave: Religiosidade; Patrimônio Imaterial; Pertencimento.



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Transcrição:

PATRIMÔNIO IMATERIAL E RELIGIOSIDADE NA ILHA DOS MARINHEIROS/ RIO GRANDE (RS): O RECANTO NOSSA SENHORA DE LOURDES Camila Rola Alves Universidade Federal do Rio Grande FURG Resumo: A presente proposta de comunicação visa abordar a história e a memória do Recanto Nossa Senhora de Lourdes como patrimônio cultural imaterial da comunidade da Ilha dos Marinheiros, localizada na cidade do Rio Grande (RS). Para tanto, o trabalho se utiliza da metodologia da Análise de Conteúdo e, também, da História Oral. A inauguração do Recanto ocorreu em maio de 2007 e, desde então, o local vem sendo mantido pela comunidade, haja visto que o Recanto não recebe nenhuma ajuda da Prefeitura Municipal. A forma como o local é mantido evidencia um real laço de pertencimento, tendo em vista que o mesmo encontra-se bem preservado e com inúmeras manifestações de religiosidade. As ações culturais que ocorrem no Recanto Nossa Senhora de Lourdes abrangem desde missas, batizados, procissões e, em dias de festa, a comunidade dos ilhéus realiza atividades que contam com a Banda da Ilha e o Terno de Reis Cancioneiros da Ilha, práticas estas, que extrapolam a religiosidade e, se mantém vivas na história do Recanto; fazendo com que o local mantenha viva as tradições culturais e a religiosidade dos ilhéus. Palavras-chave: Religiosidade; Patrimônio Imaterial; Pertencimento. Na atualidade, o tema patrimônio vem cada vez tomando mais espaço. A discussão sobre este campo surgiu na Europa, há alguns séculos atrás, com a Revolução Francesa, pois um grande número de monumentos desapareceu, entretanto, as destruições da Segunda Guerra Mundial (bairros e cidades inteiras) é que, sem dúvida, tiveram as mais relevantes conseqüências sobre a consciência patrimonial européia, assim como sobre suas modalidades de restauração e de uso 1554

(POULOT, 2009, p.30), no momento em que foi sentida a necessidade de se salvaguardar o que tinha sobrado de patrimônio após as guerras. No Brasil, a partir da década de 1920, de fato iniciou-se a pensar sobre a preservação do patrimônio no país, com a Semana de Arte Moderna. Com tal evento, começou a ser discutida a questão patrimonial (no Brasil), até que na década de 1930, o patrimônio, no país, começa a ganhar um cuidado maior, com a Constituição de 1934, essa reflexão ganha espaço legal. No ano de 1936, o anteprojeto de Mário de Andrade, solicitado pelo Ministro da Educação e Saúde, Gustavo Capanema, determina as finalidades do Serviço do Patrimônio Histórico Artístico e Nacional (SPHAN). Como bem trata Choay, patrimônio histórico é: A expressão designa um bem destinado ao usufruto de uma comunidade que se ampliou a dimensões planetárias, constituído pela acumulação continua de uma diversidade de objetos que se congregam por seu passado comum: obras e obras-primas das belas-artes e das artes aplicadas, trabalhos e produtos de todos os saberes e savoir-faire dos seres humanos (CHOAY, 2006, p.11) Este patrimônio cultural, sendo ele material ou imaterial, faz parte de uma determinada comunidade, ou pode ser mais abrangente e representar um país, mas a partir do momento que aquele interage com o ambiente no qual está inserido e, as pessoas têm um pertencimento com o mesmo, é que surge o patrimônio. Pois, só é patrimônio aquilo que tem importância para determinado grupo fazendo parte das suas memórias e da sua identidade, tendo em vista que por meio de um patrimônio podemos entender melhor a história, a cultura, bem como as memórias do lugar onde este se encontra inserido. Como trata Poulot: O patrimônio não é passado, já que sua finalidade consiste em certificar a identidade e em afirmar valores, além da celebração de sentimentos, se necessário, contra a verdade histórica. Nesse aspecto é que a história parece, com tamanha freqüência, morta, no sentido corrente. Mas, ao contrário, o patrimônio é vivo, graças às profissões de fé e aos usos comemorativos que os acompanham (POULOT, 2009, p.12) O patrimônio trabalhado situa-se na Ilha dos Marinheiros, segundo distrito da cidade do Rio Grande, no estado do Rio Grande do Sul. A Ilha dos Marinheiros tem muitos patrimônios materiais e imateriais e, sendo a religião católica muito presente, as Capelas e o Recanto são patrimônios dos ilhéus; percebemos ser muito forte a religiosidade na Ilha. Escolhemos esse lugar como tema de pesquisa devido a falta 1555

de divulgação desse patrimônio, pelo motivo do desconhecimento de muitos riograndinos acerca do local, portanto a pesquisa tem como objetivo passar o conhecimento sobre este patrimônio cultural, já que sobre o mesmo não existia nenhum tipo de pesquisa. Dessa forma, identificamos sua importância enquanto patrimônio da Ilha, bem como o pertencimento dos Ilhéus com o espaço. A história do Recanto Nossa Senhora de Lourdes começou no ano de 1996, neste ano a Ilha dos Marinheiros estava recebendo turistas de forma experimental, em uma destas visitas recebeu Edson Gobbi, o qual se mostrou encantado com o lugar e comentou ter encontrado um recanto para Nossa Senhora. Durante a Festa do Mar, em mais uma destas visitas de turistas ao local, Érico Gobbi 1 observou o local sugerido por seu filho e, considerou que o mesmo estava de acordo com sua imaginação para a colocação das imagens de Nossa Senhora de Lourdes e Santa Bernadete, as quais ele próprio havia esculpido. Depois de conversar com o dono das terras para ser feita a doação, no ano de 1998, em reunião, ficou acertado que fariam uma base de sustentação, para depois içar as imagens até o cume do morro. Assim como, também, ficou acertado sobre a limpeza do terreno, esta ficaria por conta da comunidade local, a qual iniciou o asseio no dia 20 de junho 2. Após o cuidado do terreno e o aplainamento, seriam feitas a base e a colocação dos postes para trazer a energia, a qual movimentaria o motor d água e a iluminação do local. O pedido foi feito à Prefeitura e somente foi atendido em 16 de março de 1999 (Documentos da OSCIP). Os materiais necessários para base, tais como: longarinas, sarrafos e tela foram doados por empresas privadas; o serviço foi feito com a ajuda de voluntários da PROSSEGUIR (Clínica de dependentes químicos localizados no mesmo bairro), este foi realizado em novembro de 2001. No dia 1 de fevereiro de 2002 foi realizado o translado das imagens, com a ajuda da Marinha, que disponibilizou um caminhão e mais alguns equipamentos necessários; as imagens passaram na balsa, pois a ponte ainda não estava pronta. A comunidade já aguardava no local, então começaram a operação para retirada das imagens do caminhão e, o içamento das mesmas até o cume do morro. A 1 Escultor clássico rio-grandino com obras em várias cidades do país e também no exterior. 2 Documentos da OSCIP, cedidos para pesquisa por Anna Lucia Dias Morisson de Azevedo. 1556

imagem maior precisou subir deitada sobre pranchões de madeira e cabos, depois das imagens colocadas foi rezado um terço em conjunto. A partir desta data, a comunidade, sem muitos recursos, se limitou a limpar e a pintar as imagens sempre quando necessário, plantou mudas para fixar as dunas e colocou algumas pedras, também para ajudar na fixação. Em dezembro de 2005, a comunidade com a coordenação regional do SEBRAE, colocou plantinhas e limparam a encosta do morro. Pouco a pouco foi se organizando o espaço doado em comodato, até que em 20 de fevereiro de 2007, Anna Lucia Dias Morisson de Azevedo, presidente da OSCIP e coordenadora do Projeto, começa a receber as primeiras doações da iniciativa privada para a construção do Recanto; sendo que o mesmo é um projeto da OSCIP - Sociedade Marinhense de Desenvolvimento Sustentável - essa é uma entidade sem fins lucrativos, criada em 23 de janeiro de 2004, com a finalidade de promover o desenvolvimento social, cultural e econômico da Ilha dos Marinheiros. A associação recebe por vezes apoio do SEBRAE, FURG, NEMA, AMPERG, prefeitura e outros. Seus projetos têm dado maior incentivo ao turismo, para isso tem preparado a comunidade para receber turistas dando, desde orientações sobre tradição local, até cursos de qualificação. Dentro das condições financeiras da entidade vem se fazendo o possível para viabilizar melhores condições de vida aos ilhéus. A partir de então, foi tomando forma o Recanto com a ajuda de diversos parceiros, como a Construtora Giacobbo, que se responsabilizou pela colocação da cerca e da construção do portal de entrada. A partir daí, outras empresas vieram Eletrotec, Inotec e a L&H Morisson. Totalizando um investimento de R$ 150.000,00, o qual foi empregado na construção do altar, do palco, da casa do zelador, dos banheiros, da casa das lembrancinhas, do lago e da casa do motor. A prefeitura doou os bancos, o calçamento e a ponte. Já o chafariz foi doado pelo apoiador e patrocinador F. A Nader. No dia 26 de maio de 2007, foi entregue aos ilhéus e ao público em geral, um recanto de fé, devoção e reflexão em harmonia com a natureza. Como podemos ver na imagem a seguir. 1557

Fonte: Acervo Particular As Imagens de Nossa Senhora de Lourdes e de Santa Bernadete, como podemos ver na imagem abaixo, localizam-se no cume do morro atrás do altar. Fonte: Acervo Particular de Anna Lucia Dias Morisson de Azevedo Após a construção do Recanto de Nossa Senhora de Lourdes, este passou a fazer parte da vida da comunidade daquela localidade, a qual, como já foi citado, cuidou das imagens desde quando chegaram na Ilha. Dessa forma, as visitas de fiéis se tornaram mais frequentes. Este local, apesar de ser relativamente novo, foi se tornando patrimônio dos Ilhéus. 1558

O Recanto de Nossa Senhora de Lourdes é um patrimônio da Ilha, pois existe um pertencimento pelo local. É possível perceber isso, a partir das pesquisas nos documentos da OSCIP - Sociedade Marinhense de Desenvolvimento Sustentável. Isso porque, a partir das fotos das festas onde notamos um grande número de pessoas participando da mesma e, ficou mais claro ainda, após a entrevista realizada com Anna Lucia Morisson, a qual era presidente da OSCIP e coordenadora do projeto, onde ela relata que todo o cuidado do local ficou por conta dos moradores da redondeza, já que o Recanto, no dia da inauguração, foi entregue à cidade. Dessa forma, a prefeitura deveria cuidar e fazer as manutenções necessárias, porém, a mesma, após a inauguração, não efetuou manutenção alguma para o local. Entretanto, ao fazer uma visita ao recanto notamos que este se encontra bem cuidado pelos ilhéus, pois aquilo com o qual há preocupação e amor, é cuidado, desta forma é possível notar o pertencimento da comunidade com o local. As outras comunidades católicas das Capelas da Ilha, em dias de procissão, seguem até o local, tudo isso mostra o quanto tal ponto faz parte do dia a dia dos ilhéus. Conforme destaca Pelegrini: A acepção de patrimônio cultural não compreende apenas sítios arqueológicos, a arquitetura, os antigos objetos em desuso e o espaço dos museus; os bens que conferem identidades aos cidadãos abrangem também as experiências vividas, condensadas nas formas de expressão diversificadas, juízos de valor, celebrações, modo de usar os bens, os espaços físicos e o meio ambiente (PELEGRINI, 2009, p.37). Muitas das vivências, das expressões culturais da Ilha dos Marinheiros passaram a acontecer dentro deste espaço, não somente ritos religiosos. O dia da inauguração foi de muita comemoração, teve entrega de troféus aos homenageados, apresentação do Coral Municipal Cidade do Rio Grande, entre outras apresentações. Aconteceu uma procissão da Capela S. João Batista até o Recanto. Em seguida, deu-se início a apresentação da academia Ensaio, seguida por uma apresentação que contou a história de Bernadete. Quando terminada a encenação ocorreu uma missa e, para o encerramento, queima de fogos. Em 23 de dezembro de 2007, foi realizado O Natal de Lourdes, este fazia parte da programação das Ondas de Natal e, contou com a exposição de pinturas Entre o Mar e as Falésias, um conjunto de obras da artista plástica Anna Morisson. Pinturas que retratavam imagens do arquipélago dos açores. Houve também a 1559

exibição da Banda da Ilha dos Marinheiros, Evangeliza Show com Alviete, da comunidade Lar de Nazaré e o ministério de música Bendito Fruto. Apresentação do Terno de Reis da Ilha dos Marinheiros, na imagem a seguir, podemos observar o momento em que a Banda da Ilha chega para fazer seu concerto. Fonte: Acervo da OSCIP, Sociedade Marinhense de Desenvolvimento Sustentável. Neste dia também aconteceu encenação do Presépio Vivo, com pessoas da comunidade, logo em seguida a chegada da imagem peregrina pelo mar, junto com as pessoas que encenaram o presépio. Como podemos observar na imagem abaixo. Fonte: Acervo da OSCIP, Sociedade Marinhense de Desenvolvimento Sustentável. 1560

Esse dia também contou com a chegada do Papai Noel, distribuição de balas e presentes e o enceramento foi com uma Missa Natalina. No ano seguinte, em 2008, foi realizada a primeira Festa de Nossa Senhora de Lourdes. Depois dessa festa, sem incentivo, ajuda financeira da Prefeitura, nenhuma outra festa foi realizada. A comunidade realiza batizados comunitários no Recanto, quando um padre se desloca até a Ilha dos Marinheiros. Casamentos nunca foram realizados no local. Entretanto, o lugar recebe a visita de muitos devotos de Nossa Senhora de Lourdes e, podemos notar, que no lugar são inúmeras as placas de agradecimento por graças alcançadas; em dia de festas os rio-grandinos deslocam-se da cidade até a Ilha para prestigiar. Nestas festas, como relata Anna Lucia Dias Morisson de Azevedo, as atividades realizadas no Recanto sempre têm o objetivo de valorizar a cultura local, quando temos uma festa, sempre convidamos o Terno de Reis, a Banda da Ilha (Trecho da entrevista realizada no dia 19 de dezembro, 2003). O Terno de Reis - Cancioneiros da Ilha - na noite de Natal, depois de ter passado em todas as casas no mês de dezembro anunciando o natal, vão até o Recanto e lá, colocam o Menino Jesus na manjedoura. De várias maneiras o Recanto se faz presente na cultura da Ilha dos Marinheiros. Fonte: Acervo da OSCIP, Sociedade Marinhense de Desenvolvimento Sustentável. 1561

Na imagem acima visualizamos uma das apresentações que o Terno de Reis realizou no Recanto. O importante de trabalharmos com o patrimônio é que podemos dar voz e vez para estes lugares, os quais, muitas vezes, não são conhecidos e merecem ser mais divulgado, além de receber maior atenção. Considerações finais Após a pesquisa, nos resta salientar que a Ilha dos Marinheiros foi, e continua sendo, muito importante para a cidade do Rio Grande, pois essa ainda guarda muito da memória de tempos passados, nela a cultura dos colonizadores se mantém viva. E o Recanto de Nossa Senhora de Lourdes só veio a somar, tanto na religiosidade da localidade, quanto em outros aspectos culturais, já citados anteriormente, portanto podemos falar sim, este é um patrimônio da Ilha. Patrimônio é um tema que vem sendo abordado constantemente. Sabemos que para este existir é necessário um envolvimento, pertencimento de determinado grupo, pois ele não existe isolado. Partindo do pressuposto de que as pessoas de um mesmo grupo compartilham valores, de que se sentem partícipes, formulou-se o conceito normativo de pertencimento (PELEGRINI, FUNARI. 2008, p. 23). Ao fim da pesquisa, sobre o Recanto, torna-se possível concluir que este é um patrimônio da Ilha dos Marinheiros, já que possui pontos como pertencimento pela comunidade local. Tal constatação é possível, ao sabermos que os cuidados referentes a manutenção, por exemplo, desde a doação das imagens, ficou por conta da comunidade. Neste local acontecem outras manifestações de valor histórico e cultural, os quais a comunidade, a partir do momento que se apropriou deste, Abraçou-o juntamente com os outros tantos patrimônios culturais. Referências CHOAY, Françoise. A Alegoria do Patrimônio. 4. Ed. São Paulo: Estação Liberdade: UNESP, 2006. PELEGRINI, Sandra C. A. FUNARI, Pedro Paulo. O que é patrimônio cultural imaterial. São Paulo: Brasiliense, 2008. 1562

PELEGRINI, Sandra C. A. Patrimônio Cultural: consciência e preservação. São Paulo: Brasiliense, 2009. POULOT, Dominique. Uma história do patrimônio no ocidente, séculos XVIII XXI: do monumento aos valores; tradução Guilherme João de Freitas Teixeira. São Paulo: Estação Liberdade, 2009. 1563