Anais XV Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto - SBSR, Curitiba, PR, Brasil, 30 de abril a 05 de maio de 2011, INPE p.8437 Análise das relações entre as variáveis ambientais e a incidência de Dengue no município de Campo Grande-MS Suely Franco Siqueira Lima Elisabete Caria Moraes Gabriel Pereira Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - Inpe Av. dos Astronautas, 1758 12227-010 São José dos Campos, São Paulo - Brasil {suely, bete, gabriel}@dsr.inpe.br Abstract. Federal government published the occurrence of an exponential increase of the incidence of dengue in 2010. The government has identified that in epidemiological weeks 1-9 Mato Grosso do Sul State was responsible by a variation of 1100.99% in incidence of dengue in comparison with other states between 2009 and 2010. This paper investigates if this higher rate of incidence of dengue in Campo Grande is related to significant environmental oscillations. Therefore, it was compared environmental disparities between 2009 and 2010, through environmental data from Land Remote Sensing Satellite (Landsat), Tropical Rainfall Measuring Mission (TRMM), Terra and Aqua satellites. The Landsat 5 images (Thematic Mapper) were used to classify the areas with vegetation and with water-covered in the urban perimeter. The monthly mean surface temperatures acquired were taken from Moderate Resolution Imaging Spectroradiometer (MODIS) MOD11 product aboard of Terra and Aqua. The average monthly rainfall was obtained through the product from the TRMM (3B43). The analysis of satellite data allowed to observe the environmental changes that check the same period between 2009 and 2010 provided an environment suitable for the growing population of Aedes aegypti and development of the dengue virus. Thus, the use of remote sensing contributes to the prevention of dengue. Palavras-chave: remote sensing, image processing, public health, sensoriamento remoto, processamento de imagens, saúde pública. 1. Introdução A dengue tem etiologia viral e se transmite pela picada de mosquitos Aedes aegypti infectados. É a mais importante arbovirose que afeta o homem e constitui um sério problema de saúde pública. A maior incidência desta doença se manifesta especialmente nos países tropicais, onde as condições do meio ambiente favorecem o desenvolvimento e a proliferação do mosquito (SESMT, 2005). Segundo Mendonça (2009) além dos aspectos relativos à própria mutação do vírus, diversos fatores ambientais e sociais estão associados à expansão dos vetores da dengue. Destacam-se como fatores ambientais as alterações climáticas e modificações nas paisagens e nos ecossistemas. Como fatores sociais evidenciam-se o crescimento populacional, a constituição de modos de vida, concentração e novos padrões da população, além da precariedade dos serviços de saúde pública. O estudo das relações causa e efeito desta doença seria mais eficiente com uma visão espacializada dos fatores sociais e ambientais e para isso podemos usar a geotecnologia. O uso do Sistema de Informações Geográficas (SIG) em pesquisa na área de saúde possibilita novos métodos de manejo das informações espaciais, o que amplia a conexão entre informações ambientais e de saúde (Medronho 2004). O Ministério da Saúde através da Secretaria de Vigilância em Saúde disponibilizou o Informe sobre a situação da dengue das Semanas Epidemiológicas 1 a 9 de 2009 / 2010. O boletim apresenta o seguinte cenário: Centro-Oeste com 108.881 (47,9%), Sudeste com 65.557 (28,9%), Norte com 37.030 casos (16,3%), Nordeste com 11.960 casos (5,3%) e Sul com 3.681 casos (1,6%) (Figura 1). Ressalta ainda que 35,4% do total de casos notificados no país, até o momento, estão concentrados em seis municípios: Goiânia-GO (14%), Campo 8437
Anais XV Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto - SBSR, Curitiba, PR, Brasil, 30 de abril a 05 de maio de 2011, INPE p.8438 Grande-MS (9,1%), Rio Branco-AC (4,8%), Belo Horizonte (4%), Porto Velho-RO (2,6%) e Aparecida de Goiânia-GO (2,5%). Entretanto, quando considera a incidência por 100.000 hab, o estado de Mato Grosso do Sul apresenta uma variação de 1100,99% se sobressaindo aos demais Estados e com uma grande discrepância entre 2009 e 2010, como mostrado na Figura 2. Dos casos notificados neste Estado, 19.417 casos (61,6%) estão concentrados em Campo Grande, seguidos dos municípios de Jardim (1.196; 3,8%) e Dourados (1.183; 3,7%). Figura 1. Casos notificados de dengue por semana epidemiológica, Brasil, 2009 2010. Fonte: Ministério da Saúde - Secretaria de Vigilância em Saúde (Informe Epidemiológico). Figura 2. Curvas epidêmicas da dengue no Estado de Mato Grosso do Sul em 2009 e 2010. Fonte: Ministério da Saúde - Secretaria de Vigilância em Saúde (Informe Epidemiológico). Desta forma o objetivo deste trabalho é identificar, através de imagens de satélites, se o aumento da taxa de incidência de casos de dengue em 2010 no município de Campo Grande está relacionado com oscilações ambientais significativas e, desta forma, oferecer dado que contribuam para o controle desta doença. O estudo foi baseado na metodologia apresentada em Lima et al. (2010), que analisa comparativamente algumas variações meteorológicas (temperatura e índice pluviométrico) e ambientais existente entre dois períodos através do mapeamento da vegetação e de corpos d água. Este trabalho analisou os dados ambientais do município de Campos Grande, MS nos anos de 2009 e 2010, período em que houve um aumento discrepante na notificação dos casos de dengue. Espera-se com este estudo contribuir para análise da evolução e proliferação da doença no município e, desta forma, contribuir para o direcionamento de políticas públicas locais. 8438
Anais XV Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto - SBSR, Curitiba, PR, Brasil, 30 de abril a 05 de maio de 2011, INPE p.8439 2. Metodologia de Trabalho O foco deste estudo está no centro urbano do município de Campo Grande que se localiza no Estado de Mato Grosso do Sul e ocupa uma área de aproximadamente 8.096,05 km² (Figura 3). Possui aproximadamente 766.461 habitantes com uma densidade de 94,67 hab./km². Figura 3. Área de Estudo município de Campo Grande - MS Foram utilizadas imagens do sensor TM do satélite Landsat-5 de 08/03/2009 e 23/02/2010 para gerar recortes da área urbana, que considerou a área habitada mais distante do centro urbano e como as fêmeas deste mosquito se dispersam em aproximadamente 288m (Maciel e Lourenço, 2009), acrescentou-se no raio deste polígono mais 288m, pois assim, considerou-se a distância de vôo do Aedes aegypti. A partir dos recortes foram gerados quatro mapas temáticos com as classes Área alagada e Vegetaço e foi considerado como verdade terrestre as imagens de alta resolução disponibilizada no Google Earth. Realizou-se uma classificação supervisionada por pixel a partir do algoritmo Maxver no programa Sistema de Processamento de Informações Georeferenciadas (SPRING). As áreas destas classes temáticas foram calculadas em km 2 para análise das possíveis oscilações ambientais. Também através de imagens de satélites foram adquiridos os dados de precipitação (produto 3B43 proveniente do Tropical Rainfall Measuring Mission-TRMM) e de temperatura da superfície (produto MODIS11C3 - Mensal) para os anos estudados. Como na metodologia de Lima et al. (2010), estes dados meteorológicos foram relacionados com os dados de cobertura e uso do solo para a identificação de possíveis oscilações ambientais encontradas em 2009 e 2010 passíveis de influenciar o aumento da incidência de casos de dengue confirmados no município estudado. 3. Resultados e Discussão Para gerar o recorte, foi delimitada a área urbana com um círculo passando pelo ponto urbano mais distante do centro da cidade. A partir deste polígono foi criado outro polígono considerando a distancia de vôo do Aedes aegypti (288m), este polígono serviu de base para o recorte das imagens do Landsat-5 de 08/03/2009 e 23/02/2010 como mostra a Figura 4. 8439
Anais XV Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto - SBSR, Curitiba, PR, Brasil, 30 de abril a 05 de maio de 2011, INPE p.8440 Figura 4. Recorte das imagens do Landsat 5 nas datas de 08/03/2009 e 23/02/2010 do município de Campo Grande MS. O recorte serviu como base para mapear as áreas alagadas e de vegetação nos anos 2009 e 2010 (Figura 5). Após o mapeamento, foi feito medida das classes para ambas as datas e observou-se que a área alagada em 2010 apresentou 1.274 km 2 a mais que em 2009 e a área com vegetação também apresentou um acréscimo de 50.844 km 2 em 2010, conforme apresentado na Tabela 1. Cabe ressaltar que a área agrícola também foi considerada na classe área com vegetação. Os resultados do mapeamento evidenciam variações que podem ter contribuído para o aumento da incidência de notificação de casos de dengue nas Semanas Epidemiológicas 1 a 9 de 2009 / 2010. Figura 5. Classes temáticas Área alagadas e Área com vegetação do município de Campo Grande, MS nos anos 2009 e 2010. 8440
Anais XV Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto - SBSR, Curitiba, PR, Brasil, 30 de abril a 05 de maio de 2011, INPE p.8441 Tabela 1- Amostragem do município de Campo Grande-MS ocupada por Água e Vegetação. 2009 2010 Área alagada/ km 2 1.176 2.450 Área com vegetação/ km 2 424.872 475.716 No valor médio mensal da precipitação entre os primeiros meses de 2009 e 2010 (Figura 6), se observa um aumento de considerável entre abril e maio do ano de 2010, o que é coerente com o aumento das áreas alagadas e de vegetação. Figura 6. Precipitação de 2009 e 2010 do município de Campo Grande, MS. Em relação à influência desta variável na proliferação do Aedes aegypti, sabe-se que a precipitação contribuiu para a renovação e oscilação dos corpos d águas, condições que favorecem o período de eclosão dos ovos e incubação do mosquito. A semana epidemiológica corresponde a um período de sete dias que se inicia no domingo e termina no sábado seguinte. Este trabalho está analisando as semanas epidemiológicas de 1 a 9, correspondentes aos meses de Janeiro e Fevereiro, além da primeira semana de Março. O maior índice de precipitação em 2010 ocorreu no mês de Fevereiro, superando o índice de 2009, o que pode justificar o pico de notificação de casos de dengue que se dá entre as semanas 4 e 9 (meses Fevereiro e Março) como mostrado na Figura 2. Nos valores médios mensais das temperaturas de superfície obtidos pelos sensores MODIS (Figura 7) podemos observar que em Janeiro de 2010 as amplitudes foram ideais para o desenvolvimento do mosquito, que segundo Beserra et al (2006) a temperatura ideal é de 30 o C. Figura 7. Média mensal (temperatura superfície) do município de Campo Grande, MS. Beserra et al (2006) afirma também que de 30 o C a 37 o C, a temperatura apresenta efeitos negativos sobre o desenvolvimento e a fecundidade do inseto. A temperatura em janeiro de 2009 esteve acima de 30 o C, o que pode ter contribuído para a não proliferação do mosquito nesta data. 8441
Anais XV Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto - SBSR, Curitiba, PR, Brasil, 30 de abril a 05 de maio de 2011, INPE p.8442 Mendonça (2003) afirma que a temperatura interfere no período de incubação do vírus da dengue e que o período de incubação varia de dez para sete dias quando a temperatura passa de 27º C para 37 o C. Desta forma, podemos inferir que a temperatura dos meses de Fevereiro e Março de 2010 foi ideal para o desenvolvimento do vírus e pode ter contribuído para o aumento da taxa de incidência de casos de dengue em 2010. As temperaturas de 2010 foram semelhantes às de 2009, entretanto, como observado anteriormente, a população de mosquito em 2009 pode ter sido menor por influencia da temperatura no desenvolvimento do mosquito. Se o período de incubação do vírus no mês de Fevereiro (temperatura a cima de 30 o C) foi de 7 dias, houveram quatro gerações de mosquitos infectados para um único mês. Como proposto em Lima et al. (2010), se o mosquito tem em média 45 dias de vida, a geração nascida no início de janeiro infectaria até 15 de fevereiro, e a geração nascida na segunda quinzena de janeiro infectaria até 15 de março. A amplitude ideal de temperatura para incubação do mosquito e do vírus, o aumento das áreas inundas, o aumento da vegetação e o aumento da pluviosidade no ano de 2010, podem ter contribuído para o aumento da taxa de incidência de casos de dengue em 2010, comparado com o mesmo período de 2009. Segundo o censo do IBGE, Campo Grande em 2009 possuía uma população de 755.107 habitantes e em 2010 a população passou para 766.461 habitantes, apresentando um aumento de 1,48%. A Secretaria de Saúde notificou que o estado do Mato Grosso do Sul, teve um aumento de 1.110,99% de casos notificados de dengue em 2010, dos quais 61,6% (19.417casos) dos casos foram notificados em Campo Grande. Sendo assim, o aumento populacional é de pouca significância. 4. Conclusões A comparação dos dados orbitais permitiu observar que houve alterações ambientais entre o mesmo período de 2009 e 2010, as quais propiciaram um ambiente adequado ao aumento da população do Aedes aegypti e ao desenvolvimento do vírus da dengue. Fato este que pode ter contribuído para o aumento na ocorrência de notificação de dengue em 2010 no município de Campo Grande, MS. Desta forma, o sensoriamento remoto pode ser utilizado como um aliado nas atividades de vigilância entomológica, proporcionando dados para avaliações de fatos ocorridos e principalmente dados que contribuam para previsões e ações preventivas no combate a proliferação da doença. Referências Bibliográficas Beserra, E. B.; Castro Junior, F. P. de; Santos, J. W. dos; Santos, T. da S.; Fernandes, C. R.M. Biologia e Exigências Térmicas de Aedes aegypti (L.) (Diptera: Culicidae) Provenientes de Quatro Regiões Bioclimáticas da Paraíba. Neotropical Entomology. 2006, vol.35, n. 6, p. 853-860. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. <http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1>. Acesso em: 05 de julho de 2010. LIMA, S. F. S. MORAES, E. C.; Pereira, G.; Influência das variáveis ambientais no aumento da incidência de dengue em 2009: estudo de caso município de Cáceres. In: Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, 2010, Cáceres, MT. Anais do III Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Cáceres, MT. Embrapa Informática Agropecuária/INPE, 2010. p. 1010-1018. CD-ROM. Maciel, F. R.; Lourenco O. R. Presumed unconstrained dispersal of Aedes aegypti in the city of Rio de Janeiro, Brazil. Rev. Saúde Pública [online]. 2009, vol.43, n.1, pp. 8-12. ISSN 0034-8910. Mendonça, F. A. Aquecimento global e saúde: uma perspectiva geográfica - notas introdutórias. Revista Terra Livre, São Paulo, nº 20, p. 205-221, 2003. 8442
Anais XV Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto - SBSR, Curitiba, PR, Brasil, 30 de abril a 05 de maio de 2011, INPE p.8443 Mendonca, F. A. et al. Saúde pública, urbanização e dengue no Brasil. Sociedade & Natureza, Uberlândia, v. 21, n. 3, p. 257-269, 2009. Medronho, R. A.; Werneck, G. L. Técnicas de Análise Espacial em Saúde. In: Medronho, R. A. Epidemiologia. Editora Atheneu, São Paulo, p.427-446, 2004. Ministério da Saúde - Secretaria de Vigilância em Saúde. Informe Epidemiológico da Dengue Análise de situação e tendências 2010. Disponível em: < http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/informe_da_dengue_ate_a_semana9.pdf> Acesso em: 16 de Novembro de 2010. Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso. Plano Estadual de Contingência de Dengue 2005-2006. Cuiabá, Novembro de 2005. Disponível em: < http://www.saude.mt.gov.br/upload/documento/54/plano-decontingencia-dengue-para-o-ano-de-2006-%5b54-090709-ses-mt%5d.pdf>. Acesso em: 16 de Novembro de 2010. 8443