CALIBRAÇÃO DE EXTRATORES PARA A RECOMENDAÇÃO DE ADUBAÇÃO FOSFATADA NO ALGODOEIRO EM SOLOS DO CERRADO DE MATO GROSSO 1 Gilvan Barbosa Ferreira 1, Johan Kely Alves Barbosa 2, José Da Cunha Medeiros 1,, Napoleão Esberard De Macêdo Beltrão 1, Artur Franco Barreto 3, Gleibson Dionísio Cardoso1, Genildo Bandeira Bruno 4 ; (1)Embrapa algodão; (2) e-mail Johank@bol.com.br (3,4)CCA-UFPB. RESUMO O uso de um extrator de P disponível calibrado com a resposta da planta à adubação fosfata permite à aplicação da dose de máxima eficiência econômica estimada, racionalizando e reduzindo o custo de produção. Com o objetivo de calibrar Mehlich-1 (M-1), Mehlich-3 (M-3), Bray-1 (B-1), Olsen e Resina para a previsão do P disponível para o algodoeiro e determinar as mudanças nos seus teores críticos em função da capacidade tampão de fosfato, foi realizado esse experimento em casa de vegetação, na Embrapa Algodão (Campina Grande, PB), com nove solos de MT. Utilizou-se um fatorial 9 x 4 num delineamento inteiramente ao acaso, com quatro repetições. As amostras de solos foram corrigidas em sua fertilidade, incubadas com 0, 100, 200 e 300 mg/dm 3 de P e cultivadas com a Aroeira por 90 dias. Avaliou-se diversas características da planta e se fez as análises de tecido vegetal e dos solos pelos extratores Mehlich-1, Mehlich-3, Bray-1, Olsen e Resina. Os níveis de interpretação nas tabelas oficiais de MT devem ser refeitos para contemplarem a variação do fator capacidade tampão de fosfato (CTP). Os extratores B-1, M-3 e M1 são os mais apropriados, pois melhor discriminam os níveis críticos para solos com diferentes CTP. INTRODUÇÃO O algodoeiro é cultivado nos solos do cerrado de Mato Grosso com o uso de altos níveis de insumo e tecnologia. A produtividade alcançada na safra 2002/2003 foi de 3.540 kg/ha de algodão em caroço, em 300,3 mil ha com a produção de 48,4% (653,8 mil t) do total produzido no país (829,4 mil t) em 300,3 mil ha (MAPA/CONAB, 2003). Apenas o Mato Grosso do Sul teve uma produtividade (3.705 kg/ha) maior. Para produzir 2.500 kg/ha de algodão em caroço o algodoeiro precisa extrair do solo e acumular na parte aérea 34 kg/ha de P 2 O 5, dos quais 22 kg/ha é exportado com a colheita (Grespan & Zancanaro, 1999). Assim, 31,2 kg/ha de P 2 O 5 deixou as áreas de cultivo em MT com a colheita este ano. Essa quantidade de P precisa ser retornada aos solos, corrigida pela eficiência dessa adubação (< 40% do P aplicado é absorvido pelas plantas, Malavolta, 1989) e pelas perdas devido à erosão do solo. O P é o nutriente formador da produção, sendo exigido para maiores formação de flores e tamanhos médios de capulhos e de sementes, menor crescimento vegetativo pós-floração e maturação uniforme, para regularizar o ciclo e aumentar a produção total; ele influi pouco nas características tecnológicas da fibra, porém melhora o seu comprimento (Grespan & Zancanaro, 1999; Silva, 1999). Seus teores nos solos devem ser suficientes para a planta realizar todo seu potencial produtivo. Isto ocorre em níveis considerados altos, onde é quase nula a probabilidade de resposta à adubação. As áreas sem a reposição adequada do nutriente esgotam-se rapidamente. É necessário que se faça análise do solo anualmente e se acompanhe as mudanças nos teores de P disponível no solo e esses sejam mantidos em níveis adequados. A diferença entre o remédio e o veneno é a dose. Portanto, o extrator deve ser calibrado para estimar o teor do nutriente no solo que seja necessário para obtenção da produção de máxima eficiência econômica (PMEE) e para gerar uma recomendação de adubação próxima da dose de máxima eficiência econômica (DMEE). Caso contrário, o produtor estará perdendo dinheiro pela insuficiência ou pelo excesso de P aplicado ao solo. A maioria dos solos da região dos cerrados contém baixos teores de P total e disponível e apresentam altas capacidades de retenção do fosfato aplicado. Em conseqüência, doses elevadas de
fertilizantes são necessárias para se obter produções econômicas, a partir do primeiro ano de cultivo. Há a necessidade de se construir sua fertilidade, elevando o seu nível e a mantendo. Os altos investimentos necessários mostram a importância de se ter um extrator que permita acompanhar a mudança na disponibilidade de P e de uma estratégia de recomendação eficiente para que os custos de produção não sejam continuamente aumentados. Este trabalho objetivou calibrar os extratores de P disponível Mehlich-1, Mehlich-3, Bray-1, Olsen e Resina e determinar as mudanças nos níveis críticos de P disponível, em função da capacidade tampão de fosfato, em solos de MT, com vista à futuras calibrações em ensaios de campo. MATERIAL E MÉTODOS O trabalho foi conduzido em casa de vegetação, de novembro de 2001 a setembro de 2002, nas dependências da Embrapa Algodão, Campina Grande-PB. Foram utilizados solos de nove municípios de Mato Grosso, cujas amostras foram selecionadas de modo que cada três delas estivessem com teores de argila + silte dentro das seguintes classes: > 400, 200-400 e < 200 g/kg, representando solos com alta, média e baixa capacidade tampão de fosfato (CTP), respectivamente. As amostras foram coletadas na camada de 0-20 cm, destorroadas, peneiradas e caracterizadas química e fisicamente, em sua fertilidade, corrigidas, incubadas com 0, 100 200, 300 mg/dm 3 de P e cultivadas por 70 dias com a variedade Aroeira, e o ensaio foi montado no arranjo fatorial 9 x 4, em delineamento inteiramente casualizado, com três repetições. Os dados das variáveis consideradas foram submetidas à análise de variância e regressão e as equações significativas geradas (Produção e P disponível pelos diferentes extratores em função de doses) foram utilizadas para confeccionar as tabelas de recomendação apresentadas. RESULTADO E DISCUSSÃO Os solos 3 e 4, de menor CTP, tiveram respostas do algodoeiro em produção de matéria seca lineares à aplicação de P (Tabela 1), demonstrando ter alta probabilidade de resposta a adubação, apesar de terem teores iniciais desse nutriente (9,3 e 22,9 mg/dm 3, respectivamente) considerados oficialmente, para o Mehlich-1, baixo (6 a 10 mg/dm 3 ) e alto (> 20 mg/dm 3 ) (EMPAER-MT, 1991). Os níveis críticos obtidos foram os mais altos em todos os extratores utilizados (Tabela 1). Contrariamente, o algodoeiro produziu uma resposta quadrática nos solos 1, 8 e 9, indicando que a amplitude das doses testadas abrangeu todo o espaço de resposta esperado, possivelmente, porque os solos tinham de média a baixa probabilidade de resposta e já tinham uma fertilidade razoável para a cultura utilizada, a exceção do solo 9. Seus teores iniciais eram de 16,8, 16,3 e 6,4 mg/dm 3 de P, respectivamente, pelo extrator Mehlich-1. Os demais solos, com teores considerados oficialmente médio (2, 5 e 6) e alto (solos 7), não responderam significativamente à adubação, como esperado. Esses resultados indicam que as Tabelas de Recomendações em uso não satisfazem a interpretação correta dos níveis de fertilidade dos solos estudados e devem ser melhoradas, pois tanto solos argilosos como arenosos, com semelhantes comportamento quanto à resposta à aplicação de P tem sido considerados como sendo de diferentes níveis de probabilidade de respostas. A calibração usando alguma estimativa do fator capacidade, provavelmente resolverá esse problema. Os extratores utilizados foram todos sensíveis à mudança no fator capacidade tampão, gerando níveis críticos diferentes à medida que essa CTP variava ( tabela 1). Os extratores ácidos foram os que mostraram as maiores diferenças nos níveis críticos estimados, sendo provavelmente mais sensíveis à CTP. Eles agem por dissolução ácida e complexação de Fe, Ca e Al e atacam as principais formas de P no solo (P-Al, P-Fe e P-Ca, essa praticamente inexistente em solos ácidos), porém sofrem desgastes à medida que reagem com o solo. O Olsen foi ligeiramente mais discriminador e gerou doses com maiores diferenças para solos com CTP diversas do que a resina, a qual é reconhecidamente a menos sensível à CTP do solo. O Olsen age por dissolução alcalina das formas de
P-Al e P-Fe, extraindo ainda algum P-orgânico e não atacando o P-Ca, geralmente indisponível à maioria das plantas. Já a Resina tem excesso de pontos de trocas em sua superfície e alta capacidade de reduzir a atividade do P da solução do solo e deslocar o equilíbrio P-solução P-adsorvido para a esquerda, estimando o P disponível sem desgaste do extrator. Essa capacidade lhe tira grande parte da sensibilidade à CTP do solo e isso explica a menor amplitude dos valores de níveis críticos estimados, como discutido por Novais & Smith (1999). No conjunto de solos estudados, as doses recomendadas podem ser, tentativamente, estimadas a partir do seu teor de argila ou argila + silte segundo as equações: Dose Recomendada de P (mg/dm 3 ) = (NC Ext - Teor de P na análise de rotina)/b1 Onde NC Ext é o nível critico de P para o extrator usado conforme relação da Tabela 2. b 1 é a taxa de recuperação para o extrator usado conforme relação da Tabela 2. O uso dos teores de argila e silte não é prática e tem sido abandonada em Minas Gerais em favor do uso do P remanescente (Alvarez et al., 1999; 2000). Nesse trabalho utilizou-se de modo tentativo em uma primeira aproximação para a calibração da recomendação de doses para os solos estudados em casa de vegetação. Esse modelo de recomendação mostra claramente que as doses de P recomendadas variam de solo para solo na dependência do seu teor de P extraído e da sua CTP. CONCLUSÕES Os níveis de interpretação dos teores de P devem ser refeitos nas Tabelas Oficiais de Recomendação de Adubação do estado de Mato Grosso para contemplarem a variação do fator capacidade tampão de fosfato (CTP) e assim determinarem melhor a probabilidade ( baixa, média e alta) de resposta à adubação fosfatada. Os extratores ácidos são os mais apropriados para a estimativa da disponibilidade de P para o algodoeiro, pois melhor discriminam os níveis críticos para solos com diferentes CTP. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS ALVAREZ V., V.H.; NOVAIS, R.F.; BARROS, N.F.; CANTARUTTI, R.B. & LOPES, A.S. Interpretação dos resultados das análises de solos. In: RIBEIRO, A.C.; GUIMARÃES, P.T.G & ALVAREZ V., V.H., eds. Recomendações para o uso de corretivos e fertilizantes em Minas Gerais: 5 a aproximação. Viçosa, Comissão de Fertilidade do Solo do Estado de Minas Gerais, 1999. p. 25-32. ALVAREZ V., V.H.; NOVAIS, R.F.; DIAS, L.E. & OLIVEIRA, J.A. Determinação e uso do fósforo remanescente. B. Inf. Soc. Bras. Ci. Solo, 25:21-32, 2000 GRESPAN, S. L., ZANCANARO, L. Nutrição e adubação do algodoeiro no Mato Grosso. Fundação MT, Boletim técnico 03, cap.5. 1999. MALAVOLTA, E. ABC da adubação. São Paulo: Ed. Agronômica Ceres, 1989. 292p. MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO MAPA. Companhia Nacional de Abastecimento CONAB. Previsão e acompanhamento da safra 2002/2003. 4 o levantamento, abril/2003. 17p. NOVAIS, R.F., SMYTH, T.J. Fósforo em solo e planta em condições tropicais. Viçosa: Universidade Federal de Viçosa, 1999. 399p.
SILVA, N. M. da., Nutrição e adubação do algodoeiro no Brasil. Cultura do algodoeiro, Potafos.1999, 286p: il 6.
Tabela 1. Produção máxima ( Υˆ máx) e econômica (0,9 Υˆ máx) de matéria seca da parte aérea (PSPAT) e teores de P estimados pelos extratores Mehlich-1 e 3, Bray-1, Olsen e Resina em função das doses de máxima eficiência física e de máxima eficiência econômica (Nível Crítico) aplicadas nos solos (1) estudados Solo Dose de P PSPAT Mehlich-1 Mehlich-3 Bray-1 Olsen Resina Υˆ máx 0,9 Υˆ máx Υˆ máx 0,9 Υˆ máx Υˆ máx 0,9 Υˆ máx Υˆ máx 0,9 Υˆ máx Υˆ máx 0,9 Υˆ máx Υˆ máx 0,9 Υˆ máx Υˆ máx 0,9 Υˆ máx --------- mg/dm 3 --------- ---------- g/vaso ---------- ------------------------------------------------------------------------- mg/dm 3 -------------------------------------------------------------------------- 1 118,71 30,82 21,60 19,44 36 17 65 30 70 34 36 18 53 29 2 - - - - - - - - - - - - - - 3 300,00 (2) 202,00 27,44 24,70 87 62 184 131 190 134 73 52 79 57 4 300,00 (2) 273,30 32,74 29,47 101 73 188 135 204 146 66 48 70 51 5 - - - - - - - - - - - - - - 6 - - - - - - - - - - - - - - 7 - - - - - - - - - - - - - - 8 150,39 106,93 24,05 21,65 29 25 44 37 53 44 41 34 58 48 9 77,80 38,23 19,03 17,13 12 9 13 8 11 7 14 8 16 13 (1) Solo (Município): 1 Novo São Joaquim; 2 Itaquêre; 3 Rondonópolis; 4 Campo Verde; 5 Sapezal; 6 Ita Norte; 7 Petrolina; 8 Rio Verde; 9 Sorriso. (2) Calibração considerando que a produção máxima tenha sido alcançado com a maior dose de P usada ou esteja muito próximo dela. Os solos 2, 8 e 9 tinham argila + silte > 400 g/k; os solos 1, 6 e 7, 200 a 400 g/kg; e os solos 3, 4 e 7, < 200 g/kg. Tabela 2. Tentativa de calibração do nível crítico (mg/dm 3 ) de P disponível nos solos e da taxa de recuperação (b 1, mg/dm 3 de P recuperado para cada mg/dm 3 de P aplicado) pelos extratores utilizados em função de teores de argila e de silte + argila nos solos estudados. Campina Grande, PB, 2003 Estrator Variável independente Equações para estimativa dos níveis críticos (NC) Equações para estimativa da taxa de recuperação do P aplicado (b1) Mehlich-1 Argila+silte y = -0,1012x + 72,366 R 2 = 0,8364 y = -0,0004x + 0,3236 R 2 = 0,6981 (1) Argila y = -0,1294x + 61,947 R 2 = 0,7113 y = -0,0005x + 0,2816 R 2 = 0,5153 Mehlich-3 Argila+silte y = -0,2156x + 143,130 R 2 = 0,8531 y = -0,0008x + 0,6483 R 2 = 0,7667 Argila y = -0,2749x + 120,760 R 2 = 0,7208 y = -0,0009x + 0,5598 R 2 = 0,5479 Bray-1 Argila+silte y = -0,2279x + 152,230 R 2 = 0,8747 y = -0,0008x + 0,6575 R 2 = 0,8275 Argila y = -0,2925x + 128,930 R 2 = 0,7485 y = -0,0009x + 0,5743 R 2 = 0,6091 Olsen ph 8,5 Argila+silte y = -0,0691x + 56,036 R 2 = 0,8865 y = -0,0001x + 0,2407 R 2 = 0,5362 Argila y = -0,0968x + 50,501 R 2 = 0,902 y = -0,0002x + 0,2269 R 2 = 0,4231 Resina Argila+silte y = -0,0647x + 62,101 R 2 = 0,8408 y = -0,0002x + 0,2879 R 2 = 0,2951 Argila y = -0,0954x + 57,838 R 2 = 0,9485 y = -0,0002x + 0,2732 R 2 = 0,2512 (1) Utilizou-se os 9 solos para obter a relação linear estudada.