GEOMORFOGÊNESE DA BORDA DE UMA FAIXA MÓVEL NEOPROTEROZÓICA: o atual Planalto do Espinho Meridional

Documentos relacionados
DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DE FORMAÇÕES SUPERFICIAIS EM UM TRECHO DA BORDA OESTE DO PLANALTO DO ESPINHAÇO MERIDIONAL / MG

DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DE FORMAÇÕES SUPERFICIAIS GENETICAMENTE ASSOCIADAS A ROCHAS SILICICLÁSTICAS PLANALTO DO ESPINHAÇO MERIDIONAL (MG) - BRASIL

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS DEPARTAMENTO DE GEOLOGIA SEDIMENTAR E AMBIENTAL GEOMORFOLOGIA E FOTOGEOLOGIA FORMAS DE RELEVO

MAPEAMENTO DE UNIDADES GEOMORFOLÓGICAS NA BORDA NORDESTE DO QUADRILÁTERO FERRÍFERO MG

A TECTÔNICA CENOZÓICA E A EVOLUÇÃO DO RELEVO NO NORDESTE DE MINAS GERAIS E SUL DA BAHIA: uma reinterpretação preliminar

ESTUDO DAS ANOMALIAS DE DRENAGEM COMO INDICADOR DE NEOTECTÔNICA NA BACIA DO RIO DOURADINHO, MUNICÍPIO DE LAGOA DA CONFUSÃO TO.

ANALISE DA REDE DE DRENAGEM NA BACIA DO RIO MACAÉ (RJ) A PARTIR DA ABORDAGEM MORFOESTRUTURAL

DISSECAÇÃO DO RELEVO NA ÁREA DE TERESINA E NAZÁRIA, PI

DISCIPLINA: GEOMORFOLOGIA ESCULTURAL E APLICADA - GB 060. PROF. DR. LEONARDO JOSÉ CORDEIRO SANTOS

ANÁLISE MORFOESTRUTURAL E DO CONDICIONAMENTO DA COMPARTIMENTAÇÃO GEOMORFOLÓGICA NA BACIA DO RIBEIRÃO CABREÚVA - SP

MAPEAMENTO GEOMORFOLÓGICO DO MUNICÍPIO DE ARAXÁ MG, UTILIZANDO TÉCNICAS DE GEOPROCESSAMENTO ROCHA, M. B. B. 1 ROSA, R. 2

3. ARCABOUÇO TECTÔNICO

Geografia. Estrutura Geológica do Brasil. Professor Luciano Teixeira.

Relevo da Bacia do Rio das Antas (GO): Revisão Bibliográfica

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE CIÊNCIAS DA TERRA DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA GEOMORFOLOGIA BÁSICA E ESTRUTURAL - GB 128 TEMA 1

Caracterização da Ecorregião do Planalto Central

CABECEIRAS DE DRENAGEM DO RIBEIRÃO DA MATA (MG) E SUAS RELAÇÕES COM AS SUPERFÍCIES DE APLANAMENTO DE KING (1956).

Revista de Geografia (Recife) V. 35, No. 4 (especial XII SINAGEO), REVISTA DE GEOGRAFIA (RECIFE)

ELABORAÇÃO DE MAPA GEOMORFOLÓGICO DO MUNICÍPIO DE PRESIDENTE PRUDENTE SP.

Análise de perfis longitudinais de bacia hidrográfica desenvolvida em litologias de rochas siliciclásticas

Morfodinâmica fluvial no baixo curso do Rio das Velhas: registros de uma mega-calha pleistocênica

Geologia e relevo. Bases geológicas e Classificação do relevo

Feições Morfoestratigráficas Indicativas de Movimentos Neotectônicos na Região do Médio Vale do Rio Paraíba do Sul

Conceito de Relevo. Internas ou endógenas: constroem o relevo. Externas ou exógenas: desgastam, modificam e modelam o relevo.

Atividade 14 Exercícios Complementares de Revisão sobre Geologia Brasileira

UNIDADES ECODINÂMICAS DA PAISAGEM DO MUNICÍPIO DE JEREMOABO- BA.

DEFORMAÇÃO NEOTECTÔNICA DOS TABULEIROS COSTEIROS DA FORMAÇÃO BARREIRAS ENTRE OS RIOS PARAÍBA DO SUL (RJ) E DOCE (ES), NA REGIÃO SUDESTE DO BRASIL

BRASIL: RELEVO, HIDROGRAFIA E LITORAL

UTILIZAÇÃO DO SIG NO CONTOLE DE EROSÃO EM ÁREAS SUCPTÍVEIS A INSTABILIDADE DE ENCOSTAS: BARRAGEM SERRO AZUL PALMARES (PE)

Compartimentação Geomorfológica

FATORES CONTROLADORES DOS PROCESSOS DESNUDACIONAIS GEOQUÍMICOS NO ESPINHAÇO MERIDIONAL (DEPRESSÃO DE GOUVEIA, MG)

RELEVO BRASILEIRO: Continental e submarino. Prof. Esp. Franciane Borges

MAPEAMENTO DE PLANÍCIES FLUVIAIS: contribuição metodológica a partir do caso do Rio Paraibuna em Juiz de Fora, MG.

Lista de exercícios Aluno (a):

Conceito de Relevo. Internas ou endógenas: constroem o relevo. Externas ou exógenas: desgastam, modificam e modelam o relevo.

GEOGRAFIA - 1 o ANO MÓDULO 07 ESTRUTURA GEOLÓGICA BRASILEIRA

Departamento de Geografia e Meio Ambiente

Universidade Metodista de Angola Faculdade de Engenharia Departamento de Construção Civil

COMPARTIMENTAÇÃO GEOMORFOLÓGICA DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO LAGO VERDE, MUNICÍPIO DE LAGOA DA CONFUSÃO, TO.

Estrutura Geológica do Planeta

CARACTERÍSTICAS CONSTRUTIVAS E HIDRÁULICAS DOS POÇOS TUBULARES DA APA CARSTE LAGOA SANTA E ENTORNO, MG

GEOMORFOLOGIA GERAL E DO BRASIL

9. Domínios de Dissecação

O relevo e suas formas MÓDULO 12

HIDROGRÁFICA DO MAUAZINHO, MANAUS-AM.

COMPARTIMENTAÇÃO MORFOLÓGICA DA BACIA DO RIO SÃO THOMÉ, MUNICÍPIOS DE ALFENAS, SERRANIA E MACHADO (MG)

ANÁLISE DOS FLUXOS HÍDRICOS SUBTERRÂNEOS NO ENTORNO DA LAGOA DA CONFUSÃO TO.

GEOLOGIA GERAL E DO BRASIL Profº Gustavo Silva de Souza

BRASIL: RELEVO, HIDROGRAFIA E LITORAL

ESTRUTURAS E FORMAS DE RELEVO

9º SINAGEO - Simpósio Nacional de Geomorfologia 21 à 24 de Outubro de 2012 RIO DE JANEIRO / RJ

Análise das condições geomorfológicas associadas à ocorrência de veredas no norte de Minas Gerais

CARACTERIZAÇÃO MORFOMÉTRICA DA BACIA DO RIO MAQUINÉ BORDA LESTE DO QUADRILÁTERO FERRÍFERO/MG

ESTUDO HIDROGEOLÓGICO E GEOFÍSICO NA BORDA DA BACIA POTIGUAR, FAZENDA MACACOS, LIMOEIRO DO NORTE/CE.

O SENSORIAMENTO REMOTO NA PESQUISA GEOMORFOLÓGICA: APLICAÇÕES NO MUNICÍPIO DE ANTONINA, PARANÁ

UNIDADES DE RELEVO DA BACIA DO RIO PEQUENO, ANTONINA/PR: MAPEAMENTO PRELIMINAR

Geologia do Brasil. Página 1 com Prof. Giba

PALEOCICLOS DEPOSICIONAIS E A MODERNA DINÂMICA FLUVIAL DO RIBEIRÃO DO CHIQUEIRO - DEPRESSÃO DE GOUVEIA/ESPINHAÇO MERIDIONAL - MG

ESTRUTURAS E FORMAS DE RELEVO

A CARTOGRAFIA GEOMORFOLÓGICA NO CONTEXTO DO SEMIÁRIDO: ESTUDO DE CASO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO BOM SUCESSO - BAHIA

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOLOGIA TESE DOUTORADO

Estrutura Geológica e o Relevo Brasileiro

Indicadores morfotectônicos de um Graben cenozóico intraplaca na Provincia Borborema, Nordeste do Brasil

RESUMO. Rafael Carvalho Santos

ANÁLISE MORFOESTRUTURAL NA BACIA DO RIO IPANEMA, REGIÃO DE SOROCABA SP

1. (UEL) De acordo com a classificação do relevo brasileiro proposta por Jurandyr Ross, o estado do Paraná apresenta, grosso modo, três unidades de

CENÁRIO GEOMORFOLÓGICO DE CONTRASTES DO LITORAL SUL FLUMINENSE COM BASE NA ANÁLISE DA CONFIGURAÇÃO DA REDE DE DRENAGEM

CARACTERIZAÇÃO DE PERFIS TRANSVERSAIS NO SEGMENTO ENTRE A VOLTA DO ANGICAL À CONFLUÊNCIA COM O SEPOTUBA, NO RIO PARAGUAI MATO GROSSO

IMPACTOS AMBIENTAIS DECORRENTES DA EXTRAÇÃO DE AREIA, CACHOEIRA DA PRATA MG

Relevo e Geologia do Brasil. Willen Ferreira Lobato

DINÂMICA FLUVIAL QUATERNÁRIA DO ALTO CURSO DO CÓRREGO TROMBADOR, GOUVEIA MG

GEOMORFOLOGIA E NEOTECTÔNICA NA BACIA HIDROGRÁFICA DO ALTO TAPEROÁ, PARAÍBA, BRASIL

3 Professor Adjunto II do Departamento de Geografia da Universidade Federal de Minas Gerais Belo

Geomorfologia do relevo brasileiro. Prof. Vanessa Cristina de Sousa

ÁREAS DE RISCO AO USO/OCUPAÇÃO DO SOLO NA SUB-BACIA DO CÓRREGO DO SEMINÁRIO, MUNICÍPIO DE MARIANA MG. COSTA, R. F. 1 PAULO J. R. 2

ASSIMETRIA EM BACIAS DE DRENAGEM NO SUDESTE DE MINAS GERAIS: VARIABILIDADE ESPACIAL DE CONDICIONANTES GEOTECTÔNICOS

Parâmetros morfométricos e evidências de controle estruturais na história evolutiva da bacia do rio Guapi-Açu (Cachoeiras de Macacu, RJ)

DELIMITAÇÃO DE MICROBACIAS HIDROGRÁFICAS COM BASE EM MODELO DIGITAL DE ELEVAÇÃO

Decifrar as formas. Nesta aula, vamos acompanhar o trabalho

ANÁLISE DE PERFIS LONGITUDINAIS NA BACIA HIDROGRÁFICA DO ALTO JEQUITINHONHA SERRA DO ESPINHAÇO MERIDIONAL/MG

MAPEAMENTO DE PLANÍCIES FLUVIAIS: contribuição metodológica a partir do caso do Rio Paraibuna em Juiz de Fora, MG

BARREIRAS: FORMAÇÃO OU GRUPO? (CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE GEOMORFOLÓGICA DO LITORAL SUL DA BAHIA E DAS CHAPADAS DO JEQUITINHONHA)

Estruturas geológicas e formas do relevo Brasileiro. Professora: Jordana Costa

FATORES CONTROLADORES

A TECTÔNICA CENOZÓICA E A EVOLUÇÃO DO RELEVO: DAS CHAPADAS DO JEQUITINHONHA À PLANÍCIE COSTEIRA DO SUL DA BAHIA FERRAZ, C.M.L. 1 VALADÃO, R.C.

MODELO EMPÍRICO DE DESENVOLVIMENTO DO RELEVO NO NORDESTE DO PLANALTO MERIDIONAL/RS.

Geografia de Santa Catarina

MAPEAMENTO GEOMORFOLÓGICO DO PLANALTO DA IBIAPABA: ENFOQUE NAS FEIÇÕES MORFOESCULTURAIS DOS MUNICÍPIOS DE TIANGUÁ E UBAJARA CE

Geologia e Geomorfologia na Gestão Ambiental. Aula 2. Organização da Aula. Dinâmica Interna da Terra. Contextualização. Margens Continentais

APRESENTAÇÃO E OBJETIVOS

7ºs anos Professor Daniel Fonseca

MAPEAMENTO GEOMORFOLÓGICO NO MUNICÍPIO DE PRESIDENTE PRUDENTE SP, BRASIL.

Formas de relevo. Professora: Jordana Costa

Geografia Ensino Médio, 2º Série A estrutura geológica do Brasil e sua relação com a formação do relevo

INFLUÊNCIA ESTRUTURAL NA COMPARTIMENTAÇÃO DO RELEVO NA BACIA DO RIO JUNDIUVIRA SP

Compartimentação morfológica do município de Ituiutaba, estado de Minas Gerais, Brasil

MAPEAMENTO DAS UNIDADES DE RELEVO EM MUNICÍPIOS DA QUARTA COLÔNIA: AGUDO, DONA FRANCISCA, FAXINAL DO SOTURNO, NOVA PALMA, PINHAL GRANDE - RS

CARACTERIZAÇÃO GEOMORFOLÓGICA DA CARTA TOPOGRÁFICA DE RIO TINTO NA ESCALA DE 1:25.000, BORDA ORIENTAL DO ESTADO DA PARAÍBA

MAPA GEOMORFOLÓGICO PRELIMINAR DA PORÇÃO SUDOESTE DE ANÁPOLIS- GO EM ESCALA 1/ Frederico Fernandes de Ávila 1,3 ;Homero Lacerda 2,3 RESUMO

Transcrição:

GEOMORFOGÊNESE DA BORDA DE UMA FAIXA MÓVEL NEOPROTEROZÓICA: o atual Planalto do Espinho Meridional Valadão, R.C. (INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS / UFMG) ; Silveira, J.S. (CENTRO UNIVERSITÁRIO DE SETE LAGOAS / UNIFEMM) ; Simões, P.M.L. (PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA / UFMG) ; Santos, P.R.O. (GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA / IGC UFMG) ; Oliveira, C.V. (INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS / UFMG) ; Carvalho, V.L.M. (INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS / UFMG) ; Augustin, C.H.R.R. (INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS / UFMG) RESUMO Este trabalho trata da evolução geomorfogenética de trecho da borda oeste do Planalto do Espinhaço Meridional, em Minas Gerais. Essa borda constitui registro típico de um front de cavalgamento, no qual foram reconhecidas três unidades geomorfológicas principais, organizadas espacial e altimetricamente em configuração envelope. Análises de campo e laboratório apontam para a supremacia da desnudação geoquímica conjugada à dissecação e recuo à montante da rede hidrográfica regional. PALAVRAS CHAVES Geomorfogênese; Planalto do Espinhaço; Processos Desnudacionais ABSTRACT The present work deals with the geomorphogenetic evolution of the west stretch edge in the Espinhaço Meridional Plateau, in Minas Gerais. This edge consists in typical registry of thrust fault front, in which are recognized three main geomorphologic units organized in envelope configuration. Field and laboratory analyzes point to the supremacy of geochemical denudation associated with dissection and backwearing of the regional hydrographic net. KEYWORDS Geomorphogenesis; Espinhaço Plateau; Denudation Processes INTRODUÇÃO O Planalto do Espinhaço Meridional desempenha, em Minas Gerais, importante funcionalidade na organização da rede hidrográfica ao constituir o divisor hidrográfico entre a bacia do Rio São Francisco e aquelas do leste do estado. Sua gênese geotectônica remonta aos episódios colisionais neoproterozóicos, quando extensas faixas móveis ocuparam as bordas do Cráton do São Francisco (ALKMIM, 2004). É vasta a contribuição dos estudos geológicos quanto às etapas geodinâmicas que, ao alvorecer do fanerozóico, teriam edificado um sistema de dobramentos de marcante orientação norte-sul que, hoje, se estende para além do território mineiro (ALKMIM et al., 1993; CHEMALE et al., 2011; PEDROSA-SOARES et al., 1992). Todavia, desde que o fragmento litosférico no qual essa faixa móvel foi estruturada alcançou estabilidade, tendo em vista ter passado a ocupar posicionamento intra-placa, a reconstrução de sua evolução se desloca do campo da geologia para aquele da geomorfologia. Essa longa trajetória do Espinhaço Meridional, notadamente aquela iniciada após os processos orogenéticos no Cambriano, é de resgate difícil ou quase impossível. Não há registro sedimentar algum, na região atualmente ocupada pelo Planalto do Espinhaço Meridional, datado do paleozóico tardio e mesmo do mesozóico; ao Cenozóico são atribuídas raras e fragmentadas coberturas eluviais, coluviais e aluviais de pequena expressão regional, todas elas atreladas ao Quaternário (AUGUSTIN et al., 2011; SAADI e VALADÃO, 1987 a,b). Esse fato aponta para uma forte desnudação da faixa móvel ao longo do fanerozóico, por período não inferior a 400 milhões de anos. É nesse contexto que se insere este trabalho, cujo objetivo está voltado para o uso de registros de natureza geomorfológica, não-estratigráfica, com vistas a contribuir com elementos que possam auxiliar na compreensão da geomorfogênese do Planalto do Espinhaço Mineiro, notadamente em sua borda oeste voltada para a bacia hidrográfica do rio São Franciscisco. página 1 / 5

MATERIAL E MÉTODOS O trecho da borda oeste do Planalto do Espinhaço Meridional de interesse neste trabalho foi investigado a partir de procedimentos de gabinete, laboratório e de campo. Uma vez delimitada a área de estudo, mapas morfométricos e modelos digitais de terreno foram gerados utilizando-se técnicas de geoprocessamento. A base cartográfica foi elaborada a partir da Base GeoMinas e da Folha Diamantina (1:100.000, IBGE), tendo sido as informações cartográficas georeferenciadas em projeção UTM, datum horizontal SAD69. A espacialidade das informações geológico-estruturais foi obtida em mapeamentos de base do Projeto Espinhaço (COMIG, 1996). No mapeamento das unidades geomorfológicas e na geração de modelos de elevação digital foram empregados o software ArcGis 9.3 e o aplicativo de visualização tridimensional para aplicações especificas e locais (ArcScene). Esses modelos permitiram uma visão regional da configuração do relevo, realçando diferentes níveis topográficos e suas principais feições morfológicas, como também constituíram a base para a obtenção de parâmetros morfométricos. Seções topográficas e geológicas regionais foram traçadas com o objetivo de se reconhecer e caracterizar a organização geomorfológica em consonância com o arcabouço litoestrutural. As investigações de campo foram guiadas pela análise prévia daqueles produtos derivados da aplicação de técnicas de geoprocessamento. No campo, a zonalidade das unidades geomorfológicas indicadas nesses produtos foi checada e ajustada, na medida em que foram selecionadas áreas representativas de cada unidade geomorfológica com vistas à sua análise detalhada do ponto de vista morfométrico e das formações superficiais. Catenas abertas nessas áreas permitiram a investigação e reconhecimento das formações superficiais; amostras indeformadas foram coletadas com o objetivo de se proceder sua análise micromorfológica. Ensaios de lixiviação geoquímica foram efetivados em amostras deformadas coletadas nessas mesmas catenas. RESULTADOS E DISCUSSÃO A borda oeste do Planalto do Espinhaço Meridional é aquela drenada por rede hidrográfica cujas águas se dirigem para o rio São Francisco. Nesse trecho do planalto as bacias contribuintes desse rio têm suas cabeceiras situadas nas superfícies cimeiras do Espinhaço e, por meio de percurso entrecortado por fortes rupturas de seus perfis longitudinais na forma de rápidos e cachoeiras, se lançam em direção à Depressão Sanfranciscana. Nesse percurso, transpõem em média 500 metros de desnível ao longo de pouco mais de 30 quilômetros. Esse é o caso, por exemplo, dos rios Paraúna, Pardo Grande, Pardo Pequeno e Curumataí. As investigações conduzidas neste trabalho foram realizadas em região drenada pelos rios Paraúna e Pardo Pequeno, a qual guarda configuração geomorfológica que, sob análise, tem revelado aspectos significativos acerca da geomorfogênese do planalto. Nessa região o arcabouço geológico predominante é de uma espessa sequência de rochas siliciclásticas e vulcanoclásticas pertencentes ao Supergrupo Espinhaço (KNAUER, 2007), localmente entrecortada por densa e complexa rede de descontinuidades regionais derivadas de empurrões e dobras com vergências para oeste; é marcante, nessa borda do planalto, sua feição morfotectônica típica de front de cavalgamento (OLIVEIRA e ALKMIM, 1994; SAADI, 1995). Na região investigada foram reconhecidas, mapeadas e caracterizadas três unidades geomorfológicas principais (Figura 01). A Unidade I é aquela em que ocorrem os remanescentes das mais altas superfícies do planalto, cuja altitude está comumente acima dos 1300 metros. É notório o fato dessas superfícies cimeiras ainda conservarem, em extensões consideráveis, aplanamentos de baixo gradiente que truncam litologias diversas, sobretudo quartzitos cujo mergulho das camadas é variado, localmente com valores acima de 60º. O revestimento dessas superfícies é em grande parte de Neossolos Quartzarênicos, não tendo sido encontrados até o momento volumes sedimentares pré-quaternários. Altimetricamente acima dessas superfícies se elevam relevos residuais cristas monoclinais também modelados em rochas siliciclásticas (Figura 02). Alguns estudos já sugeriram que essas cristas constituem vestígios de aplanamentos pré-cenozóicos (ABREU, 1982; KING, 1956), o que não se confirma tanto do ponto de vista morfológico como da assinatura das formações superficiais que as revestem; são sustentadas, mais das vezes, por afloramentos e Neossolos Litólicos. Na Unidade II o caráter geomorfológico mais significativo é a ocorrência de rampas de gradiente significativamente mais elevado que na unidade anterior, as quais convergem para vão central ocupado pela drenagem, numa comprovação clara de que esses vales vêm sendo escavados por vigorosa incisão vertical da rede hidrográfica conjugada ao recuo à montante. É comum, nessa página 2 / 5

unidade, a presença de rápidos e cachoeiras, denotando perfis longitudinais desajustados e estruturalmente fortemente controlados, altimetricamente situados entre 1100 a 1300 metros. As superfícies geomorfológicas de morfologia aplanada reaparecem em cotas altimétricas mais baixas, entre 1050 a 1100 metros, circunscritas à Unidade Geomorfológica III; os perfis longitudinais já se encontram mais ajustados e ocupam comumente o médio curso dos rios. Essa unidade configura o piso de depressões que se estendem ao longo do médio e baixo vale dos principais canais fluviais da região. A organização espacial e altimétrica das unidades I, II e III sugerem uma relação geomorfogenética entre as mesmas. As análises conduzidas em campo e gabinete revelam que essas unidades se justapõem por meio do embutimento daquelas formas de pequena escala as macroformas, estando essas articuladas em planta e perfil. Esse embutimento, cuja organização espacial é semelhante a uma escadaria, assume configuração de superfícies do terreno denominadas envelope e subenvelope (FISCHER, 1963; GOMEZ et al., 2006). página 3 / 5

CONSIDERAÇÕES FINAIS O longo processo desnudacional ao qual a borda oeste do Planalto do Espinhaço vem sendo submetida, há não menos que 400 milhões de anos, resultou na configuração hoje vigente na região: uma sucessão espacial e altimétrica de superfícies envelope e subenvelope. As mais altas superfícies (Unidade I) vêm sendo submetidas desde o Mesozóico terminal ao desmantelamento guiado pelos processos que vigoram nas unidades II e III (VALADÃO, 1996, 1998, 1999). Todavia, esses processos são, na atualidade, fortemente guiados pela desnudação geoquímica em detrimento daquela de natureza mecânica (ROCHA et al., 2010). Além de raros, os registros sedimentares derivados dessa última são de marcada fragmentação espacial. A análise litoquímica de rochas siliciclásticas, a investigação de formações superficiais em tradagens e catenas e a descrição de lâminas de solo indeformado têm revelado o quão relevante são os processos epidérmicos, subsuperficiais, com ressonância na morfogênese regional. AGRADECIMENTOS Agradecimentos à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais FAPEMIG, que viabilizou as atividades de pesquisa mediante auxílio financeiro e concessão de bolsas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA ABREU, A.A. de. Análise geomorfológica: reflexão e aplicação (uma contribuição ao conhecimento das formas de relevo do Planalto de Diamantina - MG). Tese (Tese de Livre Docência) Universidade de São Paulo, São Paulo, 1982. ALKMIM, F.F. O que faz de um cráton um cráton? O Cráton do São Francisco e as revelações almeidianas ao delimitá-lo. In: MANTESSO-NETO, V.; BARTORELLI, A.; DAL RÉ CARNEIRO, C.; BRITO NEVES, B.B. de. (Org.). Geologia do Continente Sul Americano. Evolução da obra de Fernando Marques de Almeida. São Paulo: Beca, 2004. p. 17-35. ALKMIM, F.F.; NEVES, B. B. B.; ALVES, J. A. C. Arcabouço Tectônico do Cráton do São Francisco: uma revisão. In: Dominguez, J.M.L.; MISI, A. (Org.) O Cráton do São Francisco. Salvador: SBG, Núcelo BA/SE, 1993. 215p. página 4 / 5

Powered by TCPDF (www.tcpdf.org) 9º SINAGEO - Simpósio Nacional de Geomorfologia AUGUSTIN, C.H.R.R.; FONSECA, B.M.; ROCHA, L.C. Mapeamento Geomorfológico da Serra do Espinhaço Meridional: primeira aproximação. Geonomos, 19(2):50-69, 2011. CHEMALE, F.; DUSSIN, I.A.; ALKMIM, F.F.; MARTINS, M.S.; QUEIROGA, G.; ARMSTRONG, R.; SANTOS, M.N. Unravelling a Proterozoic basin history through detrital zircon geochronology: the case of the Espinhaço Supergroup, Minas Gerais, Brazil. Gondwana Research, 22:200-206, 2011. FISCHER, K. Hullflache und Sockelflache des Reliefs (envelope surfaces and streamline surfaces of relief; in German). Bayerischen Akademie der Wissenschaften, Math.-Nat. Kl. Abh., N.F., 113, 1963. 38p. GOMEZ, F.; KHAWLIE, M.; TABET, C.; DARKAL, A.; KHAIR, K.; BARAZANGI, M. Late Cenozoic uplift along the northern Dead Sea transform in Lebanon and Syria. Earth Planet. Sci. Lett., 241:913-931, 2006. KING, L.C. Geomorfologia do Brasil Oriental. Rev. Bras. Geog., 18(2):1-147, 1956. KNAUER, L.G. O Supergrupo Espinhaço em Minas Gerais: considerações sobre sua estratigrafia e seu arranjo estrutural. Geonomos, 15(1): 81-90, 2007. OLIVEIRA, F.V.C.; ALKMIM, F.F. Estilo estrutural e curvatura da porção sul do front do Espinhaço. In: CONG. BRAS. GEOL., 38, Camboriú-SC, 1994. Anais..., SBG, 1994, (2)259-260, 1994. PEDROSA-SOARES, A.C.; NOCE, C.M.; VIDAL, P.; MONTEIRO, R.L.B.P.; LEONARDOS, O.H. Toward a new tectonic model for the Late Proterozoic Araçuaí (SE Brazil) - West Congolian (SW Africa) belts. J. South Amer. Earth Sci., 6:33-47, 1992. ROCHA, L.C.; AUGUSTIN, C.H.R.R. Desnudação geoquímica e seu papel na modelagem do relevo da Serra do Espinhaço Meridional. In: SIMP. NAC. GEOMORFOLOGIA, 8, Recife, 2010. Anais..., UGB, 2010. SAADI, A. A geomorfologia da Serra do Espinhaço em Minas Gerais e de suas margens. Geonomos, 3(1):41-63, 1995. SAADI, A. & VALADÃO, R.C. O cenozóico da porção mediana-central do Espinhaço Meridional, primeira síntese. In: CONG. ABEQUA, 1, Porto Alegre-RS, 1987. Anais..., ABEQUA/UFRGS, p:393-407, 1987a. SAADI, A. & VALADÃO, R.C. Evolução geomorfológica quaternária da região de Gouveia, Serra do Espinhaço. In: SIMP. GEOL. MG, 4, Belo Horizonte-MG, 1987. Anais..., SBG/MG, 1987. Bol. SBG-MG, (7):434-448, 1987b. VALADÃO, R.C. King e a Geomorfologia do Brasil Oriental: uma reavaliação. In: CONG. BRAS. GEOL., 39, Salvador, 1996. Anais, SBG, vol.2, p:511-513, 1996. VALADÃO, R.C. Evolução de longo termo do relevo do Brasil Oriental: desnudação, superfícies de aplanamento e soerguimentos crustais. Tese (Doutorado em Geologia) Universidade Federal da Bahia, Salvador, 1998. 243p. VALADÃO, R.C. Superfícies de aplanamento do Brasil Oriental: mapeamento, caracterização e geodinâmica. In: SIMP. GEOL. CENTRO-OESTE; SIMP. GEOL. MINAS GERAIS, 7/10, Brasília-DF, 1999. Anais..., SBG, p:107-108, 1999. página 5 / 5