INTERAÇÃO ENTRE OS MECANISMOS DE ENDURECIMENTO NOS AÇOS MICROLIGADOS *

Documentos relacionados
Estudo Quantitativo dos Mecanismos de Endurecimento em Aços Comerciais Microligados com Vanádio

CORRELAÇÃO LIMITE DE ESCOAMENTO: MICROESTRUTURA EM AÇO MICROLIGADO Nb-Ti-V 1

MECANISMOS DE ENDURECIMENTO EM AÇO MICROLIGADO Nb-Ti-V

Natal, 7 a 11 de agosto de 2000

PRECIPITAÇÃO DE CARBONITRETOS EM AÇO MICROLIGADO COM ELEVADO TEOR DE TITÂNIO. Sandro da Silva Campos e Hans-Jürgen Kestenbach

EFEITOS DA COMPOSIÇÃO QUÍMICA SOBRE A RESISTÊNCIA MECÂNICA DE AÇOS MICROLIGADOS COMERCIAIS PROCESSA...

FONTES DE ENDURECIMENTO POR PRECIPITAÇÃO EM AÇOS MICROLIGADOS PARA TIRAS A QUENTE

Universidade Estadual de Ponta Grossa/Departamento de Engenharia de Materiais/Ponta Grossa, PR. Engenharias, Engenharia de Materiais e Metalúrgica

Mecanismos de endurecimento em aços [16]

EFEITOS DA COMPOSIÇÃO QUÍMICA E DA TEMPERATURA DE TRANSFORMAÇÃO SOBRE O ENDURECIMENTO POR PRECIPITAÇÃO INTERFÁSICA EM AÇOS MICROLIGADOS (1)

Tabela 4. Composição química dos aços API5LX80 (% em peso).

EFEITO DAS TEMPERATURAS DE BOBINAMENTO E ENCHARQUE NAS PROPRIEDADES MECÂNICAS DE UM AÇO LAMINADO A FRIO MICROLIGADO AO NIÓBIO*

3 Material e Procedimento Experimental

RELAÇÃO DE HALL-PETCH EM AÇOS MICROLIGADOS PRODUZIDOS COMO TIRAS A QUENTE

PRECIPITAÇÃO DE CARBONITRETOS EM AÇO DE MÉDIO TEOR DE CARBONO MICROLIGADO AO VANÁDIO

4 Resultados (Parte 01)

ESTUDO DAS PROPRIEDADES MECÂNICAS DO AÇO API X70 PRODUZIDO POR LAMINAÇÃO CONTROLADA

DISPERSÃO DA CEMENTITA EM AÇO COM GRÃOS FERRÍTICOS ULTRAFINOS.

Transformações de fase em aços [15]

INFLUÊNCIAS DE PROCESSO NO LIMITE DE ESCOAMENTO DE CANTONEIRA NA ESPECIFICAÇÃO NBR 7007 AR 415*

EFEITO DA ADIÇÃO DE MICROLIGAS NA LAMINAÇÃO DE BOBINAS A QUENTE*

8 Resultados (Parte 05)

Engenheiro Metalurgista, Mestrando em Engenharia Metalúrgica, Assistência Técnica, Usiminas, Ipatinga, MG, Brasil. 2

Eng. Materiais, Mestrando, Instituto de Pesquisas Tecnológicas, São Paulo-SP, Brasil 3

EFEITO DO TEMPO ENTRE DEFORMAÇÕES NA INTERAÇÃO RECRISTALIZAÇÃO: PRECIPITAÇÃO DE UM AÇO INOXIDÁVEL AUSTENÍTICO COM ALTO TEOR DE NIÓBIO E NITROGÊNIO

EFEITO DO TEMPO ENTRE PASSES NA INTERAÇÃO RECRISTALIZAÇÃO- PRECIPITAÇÃO DE UM AÇO INO- XIDÁVEL AUSTENÍTICO COM ALTO TEOR DE NIÓBIO E NITROGÊNIO*

EFEITO DA TEMPERATURA DE RECOZIMENTO SOBRE A MICROESTRUTURA E AS PROPRIEDADES MECÂNICAS DO AÇO ARBL MICROLIGADO NBR 6656 LNE 380

Estudo traça relações entre microestrutura e propriedades mecânicas em aços estruturais

Estereologia e Materialografia Quantitativa [8]

Bs ( C) = %C - 90%Mn - 37%Ni - 70%Cr -83%Mo. %C %Si %Mn %Ni %Cr Ms Q 1 0,4 1,6 1,5 1,4 0, Q 2 0,2 1,6 1,5 1,4 0,

INFLUÊNCIA DA MICROESTRUTURA NAS PROPRIEDADES ELÉTRICAS DE LIGAS Al-Mg-Th E Al-Mg-Nb

MODELO MATEMÁTICO DE PREVISÃO DE PROPRIEDADES MECÂNICAS NA ARCELORMITTAL CARIACICA*

INFLUÊNCIA DOS PARÂMETROS DE SOLUBILIZAÇÃO TEMPERATURA E TEMPO DE ENCHARQUE NA T NR DE UM AÇO MICROLIGADO AO NB, V, E TI

SOLDAGEM TIG. Prof. Dr. Hugo Z. Sandim. Marcus Vinicius da Silva Salgado Natália Maia Sesma William Santos Magalhães

Avaliação Microestrutural de Aços da Classe API5LX80 Submetidos a Diferentes Ciclos Térmicos

ENSAIOS ISOTERMICOS COM DUPLA DEFORMAÇAO DO AÇO IF POR TORÇAO A QUENTE*

LAMINAÇÃO TERMOMECÂNICA DE UM AÇO MICROLIGADO AO NIÓBIO EM UM LAMINADOR DE TIRAS A QUENTE, COM CADEIRA STECKEL*

EFEITO DA TÊMPERA E REVENIMENTO EM AÇOS MICROLIGADOS CONTENDO BORO E TITANIO

ESTUDO AVALIATIVO DA TENACIDADE AO IMPACTO DE UM AÇO SAE 1644 SUBMETIDO A TRATAMENTO TERMOQUÍMICO DE CEMENTAÇÃO.

EFEITO DOS TEORES DE Nb E Mn NA PRECIPITAÇÃO DE CARBONETOS E NITRETOS EM AÇO MICROLIGADO AO Nb E Ti.

RELAÇÃO ENTRE A ENERGIA CHARPY E A DUTILIDADE ATRAVÉS DA ESPESSURA DO AÇO API 5L X80

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS. Curso de Pós-Graduação em Engenharia Metalúrgica, Materiais e de Minas. Dissertação de mestrado

ESTUDO DAS PROPRIEDADES MECÂNICAS DO AÇO API X70 PRODUZIDOS ATRAVÉS DE LAMINAÇÃO CONTROLADA 1

PROCESSAMENTO TERMOMECÂNICO DE LAMINAÇÃO A MORNO PARA REFINO DE GRÃO EM UM AÇO 0,16%C1

INFLUÊNCIA DO CAMINHO DE AQUECIMENTO NAS PROPRIEDADES MECÂNICAS DE UM AÇO 1020 TEMPERADO A PARTIR DE TEMPERATURAS INTERCRÍTICAS

INFLUÊNCIA DA TEMPERATURA DE REAQUECIMENTO E DO TEMPO ENTRE PASSES NA EVOLUÇÃO MICRO- ESTRUTURAL DE AÇOS INOXIDÁVEIS AUSTENÍTICOS*

Abstract. Meire Guimarães Lage 1 Carlos Salaroli de Araújo 2

TRANSFORMAÇÃO DA AUSTENITA EM AÇOS MICROLIGADOS COM MICROESTRUTURA FERRÍTICA-BAINÍTICA 1 Antonio Augusto Gorni 2

INVESTIGAÇÃO COMPUTACIONAL DO IMPACTO DOS PARÂMETROS TERMOMECÂNICOS NA MICROESTRUTURA DE UM AÇO MICROLIGADO AO NIÓBIO DURANTE A LTQ *

AVALIAÇÃO DA MICROESTRUTURA DOS AÇOS SAE J , SAE J E DIN100CrV2 APÓS TRATAMENTOS TÉRMICOS*

5 Resultados (Parte 02)

3URFHGLPHQWR([SHULPHQWDO

ANÁLISE DO COMPORTAMENTO MECÂNICO A ALTAS TEMPERATURAS DOS AÇOS SAE 1518 E MICROLIGADO AO NIOBIO POR ENSAIOS DE TORÇÃO A QUENTE*

longitudinal para refrigeração, limpeza e remoção de fragmentos de solos provenientes da perfuração, Figura 10.

ESTUDO DO EFEITO DO MOLIBDÊNIO EM AÇO DUAL PHASE TRATADO TERMICAMENTE NO CAMPO BIFÁSICO*

11 Resultados (Parte 08)

DEFEITOS CRISTALINOS E DEFORMAÇÃO PLÁSTICA

COMPORTAMENTO MECÂNICO DOS MATERIAIS: DEFEITOS CRISTALINOS E DEFORMAÇÃO PLÁSTICA

4 Resultados e Discussão

8º CONGRESSO IBEROAMERICANO DE ENGENHARIA MECANICA Cusco, 23 a 25 de Outubro de 2007

12, foram calculados a partir das equações mostradas seguir, com base nas análises químicas apresentadas na Tabela 8.

Microestrutura dos aços [5] Ferro δ (CCC) Ferro γ (CFC) Ferro α (CCC)

PRECIPITAÇÃO DA AUSTENITA SECUNDÁRIA DURANTE A SOLDAGEM DO AÇO INOXIDÁVEL DUPLEX S. A. Pires, M. Flavio, C. R. Xavier, C. J.

3. Procedimento Experimental

Tabela 4.1: Relação entre carga aplicada, dureza e módulo de elasticidade em uma amostra Q4.

Figura 49 Dispositivo utilizado no ensaio Jominy e detalhe do corpo-de-prova (adaptado de Reed-Hill, 1991).

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Evolução dos aços ARBL

Microestrutura de Fe-6,5%Si e de aços microligados: metalografia qualitativa e quantitativa

ESTUDO DA RELAÇÃO ENTRE A VARIAÇÃO MICROESTRUTURAL E AS PROPRIEDADES MECÂNICAS DE UM AÇO SAE 1045 ESFEROIDIZADO

Aula 15 Solubilização e Precipitação. Mecanismos de Endurecimentos por:

5.1. Morfologia da Microestrutura Austenítica durante a Laminação a Quente

EFEITO DOS PARÂMETROS DA LAMINAÇÃO CONTROLADA SOBRE A PRECIPITAÇÃO DO COBRE EM AÇO HSLA-80 1 Antonio Augusto Gorni 2

INFLUENCE OF THE NORMALIZING ROLLING PARAMETERS ON THE TOUGHNESS OF ANB, V AND TIMICROALLOYED STEEL PROCESSED IN THE GERDAU PLATE MILL

Determinação experimental da temperatura ideal de laminação a quente para aço baixo carbono, microligado ao vanádio e manganês 1

23º CBECiMat - Congresso Brasileiro de Engenharia e Ciência dos Materiais 04 a 08 de Novembro de 2018, Foz do Iguaçu, PR, Brasil

Microestrutura. Fernando JG Landgraf

CÁLCULO DA TEMPERATURA DE NÃO-RECRISTALIZAÇÃO PARA AÇOS MICROLIGADOS, EM FUNÇÃO DA INTERAÇÃO ENTRE A PRECIPITAÇÃO E RECRISTALIZAÇÃO DA AUSTENITA 1

INFLUÊNCIA DA TEMPERATURA DE RECOZIMENTO NA MICROESTRUTURA DO AÇO INOXIDÁVEL FERRÍTICO DURANTE A RECRISTALIZAÇÃO*

DIAGRAMAS TTT DIAGRAMAS TTT

5RGROIRÃ/LEDUGL Universidade Metodista de Piracicaba. Faculdade de Engenharia Mecânica e Produção. Santa Bárbara D Oeste, SP, Brasil.

MECANISMOS DE ENDURECIMENTO DE METAIS

EVOLUÇÂO MICROESTRUTURAL DE UM AÇO BAIXO CARBONO (C-Mn) E UM AÇO MICROLIGADO SUBMETIDOS A UM TRATAMENTO TERMOMECANICO A MORNO

# passe A.1 A.2 A.3 B.1 B.2 B.3. t [ C] [ C] [ C] [s]

MATERIAIS PARA ENGENHARIA DE PETRÓLEO - EPET069 - Propriedades Mecânicas dos Materiais

CARACTERIZAÇÃO POR MICROSCOPIA ELETRÔNICA DO AÇO SAE1141 MICROLIGADO AO Nb. CESAR AFONSO WEIS OLEA Engenheiro Mecânico

DESENVOLVIMENTO DO AÇO LAMINADO A QUENTE PARA ATENDER AOS REQUISITOS GRAU S700 DA NORMA EN10149 NA ARCELORMITTAL TUBARÃO*

ANÁLISE MECÂNICA E MICROESTRUTURAL DE UM AÇO BAIXO CARBONO (ABNT 1015), SUBMETIDO À RECRISTALIZAÇÃO TÉRMICA PÓS-DOBRAMENTO.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS ESTUDO DA DEFORMAÇÃO DE UM AÇO MICROLIGADO AO VANÁDIO NA REGIÃO DE TRANSIÇÃO DE FASE

CAPÍTULO V CARACTERIZAÇÃO MICROESTRUTURAL E DE MICRODUREZA

CARACTERIZAÇÃO MICROESTRUTURAL DO AÇO INOXIDÁVEL DUPLEX UNS S32101: INVESTIGAÇÃO DE REAGENTES 1

CARACTERIZAÇÃO MICROESTRUTURAL E MECÂNICA DO AÇO API 5L X80 COM DISTINTOS PROJETOS DE LIGA*

PRODUÇÃO DE AÇOS DAS CLASSES DE RESISTÊNCIA DE 80 E 90 KSI VIA TMCP NO LAMINADOR DE CHAPAS GROSSAS DA GERDAU OURO BRANCO *

Aspectos Metalúrgicos na Produção de Trefilados em Ligas de Alumínio

UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO CENTRO TECNOLÓGICO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA ELÉTRICA MARCELO LUCAS PEREIRA MACHADO

A composição química das amostras de metal solda, soldadas a 10 m de profundidade, está listada na Tabela 2.

D.Sc. em Ciências dos Materiais, Eng. Metalurgista, Professora Adjunta, IME, Rio de Janeiro, RJ, Brasil; e PPGEM/UFF, Volta Redonda, RJ, Brasil.

AVALIAÇÃO ESTATÍSTICA DA COMPOSIÇÃO QUÍMICA DOS AÇOS DE VARÕES PARA BETÃO ARMADO

4 Apresentação e discussão dos resultados

Gilmar Zacca Batista. Curvamento por Indução de Tubo da Classe API 5L X80. Dissertação de Mestrado

Transcrição:

INTERAÇÃO ENTRE OS MECANISMOS DE ENDURECIMENTO NOS AÇOS MICROLIGADOS * Juno Gallego e Hans-Jürgen Kestenbach * Departamento de Engenharia Mecânica, UNESP-Ilha Solteira C. P. 31 - Ilha Solteira-SP, CEP 15.385-000, Brasil gallego@dem.feis.unesp.br * Departamento de Engenharia de Materiais, DEMa-UFSCar, São Carlos-SP, Brasil RESUMO As propriedades mecânicas dos aços microligados são provenientes do efeito combinado entre a adição de pequenas quantidades de elementos formadores de carbonitretos, como nióbio, titânio e vanádio, com o processamento termomecânico controlado desses materiais. Deste modo o limite de escoamento, por exemplo, pode ser interpretado como o resultado da ação de diversos mecanismos de endurecimento como discordâncias, solução sólida, refino de grão ferrítico e precipitação de carbonitretos. Embora existam modelos que expressem quantitativamente o efeito de cada mecanismo, a dificuldade em se obter os parâmetros metalúrgicos necessários para a sua determinação torna escassa a disponibilidade de dados experimentais na literatura. Neste trabalho realizou-se a caracterização microestrutural de dois aços comerciais microligados ao vanádio, utilizando-se microscopia eletrônica de transmissão como principal técnica de análise. Foi determinada a densidade de discordâncias, assim como a fração volumétrica e o tamanho dos carbonitretos, cuja origem foi identificada por difração de elétrons. Comparando-se os parâmetros microestruturais obtidos neste estudo com outros resultados extraídos da literatura, pôde-se também discutir a interação entre as contribuições dadas pelos diversos mecanismos de endurecimento e como estas podem se relacionar com o limite de escoamento obtido experimentalmente. Os resultados obtidos mostraram que a precipitação de carbonitretos em diferentes estágios do processamento contribuiu efetivamente para incrementar o limite de escoamento, uma propriedade mecânica que mostrou poder ser expressa quantitativamente pelo efeito cumulativo entre os mecanismos de endurecimento investigados. Palavras-chave: aços microligados, mecanismos de endurecimento, precipitação de carbonitretos, microscopia eletrônica de transmissão. INTRODUÇÃO As propriedades mecânicas dos aços microligados são resultantes da interação entre os diferentes mecanismos de endurecimento envolvidos. O refino de grão ferrítico é favorecido pela precipitação de carbonitretos durante o processamento termomecânico industrial (DeArdo, 2001). O endurecimento por precipitação é um mecanismo extensivamente explorado nesses materiais, no qual as partículas bloqueiam, total ou parcialmente, a movimentação de discordâncias em seus planos de deslizamento. Deste modo, esperam-se significativos aumentos de resistência mecânica

com a formação de carbonitretos durante ou após a transformação da austenita para ferrita (Honeycombe, 1988). Há décadas, modelos matemáticos tem sido desenvolvidos com o propósito que quantificar o efeito causado por diversos parâmetros metalúrgicos sobre as propriedades mecânicas dos aços. Pickering (1978a) explorou a importância da adição dos elementos de liga e do tamanho de grão ferrítico d sobre o limite de escoamento básico ( σ o ) de aços com baixo-carbono, que poderia ser calculado por 1,13 σ o = 15,4 3,5 + 2,1 Mn + 5,4 Si + (1) d onde σ o é expresso em MPa; Mn e Si correspondem à % peso dos elementos e d deve ser usado em milímetros. Para aços com médio teor de carbono a equação mais adequada seria (Pickering, 1978b) 3 17,4 3 3,8 σ o = f Mn ( f ) 1/ 35,4 + 58,5 + + 1 1/ + α α 178,6 + 63, 1 Si (2) d S o onde f α corresponde a fração volumétrica de ferrita e S o é o espaçamento interlamelar, expresso em milímetros. O bloqueio à movimentação de discordâncias, causado por dispersões de partículas incoerentes e de tamanho médio D [nm], promove um incremento de resistência σ p que pode ser estimado quantitativamente pelo modelo de Orowan-Ashby (Gladman, 1997a) f σ p = 10800 ln(1,63 D) (3) D na qual f é a fração volumétrica dos carbonitretos. A contribuição das discordâncias σ d [MPa] ao endurecimento dos aços microligados pode ser calculado pelo modelo proposto por Keh (1965) 4 σ d = 8,1 10 ρ (4) onde a densidade de discordâncias ρ é expressa em cm -2. No presente trabalho fez-se a determinação quantitativa dos mecanismos de endurecimento em dois aços microligados comerciais, sendo um deles processado industrialmente como tira a quente e o outro fabricado como barras para peças forjadas da indústria automobilística. Para obtenção dos parâmetros microestruturais, técnicas de metalografia quantitativa foram empregadas em amostras observadas por microscopia ótica e eletrônica (MET). Deste modo aspectos metalúrgicos da estrutura ferrítico-perlítica, origem e tamanho dos carbonitretos identificados e densidade de discordâncias foram investigados e a influência que estes parâmetros mostraram sobre o limite de escoamento tem sido discutida neste texto.

MATERIAIS E MÉTODOS No desenvolvimento deste trabalho foram utilizados dois aços microligados produzidos em escala industrial, nos quais houve a adição de diferentes teores de vanádio. O aço identificado como NbTiV foi fabricado pelo processamento industrial empregado para as tiras a quente, produtos siderúrgicos que são comumente utilizados na manufatura de componentes estruturais que requerem elevados níveis de resistência mecânica e tenacidade. O aço V é usado na fabricação de componentes forjados para a indústria automobilística como, por exemplo, virabrequins. A composição química desses aços é apresentada na Tabela 1. Tabela 1: Composição química dos aços comerciais investigados (% peso). aço C Mn Si Nb Ti V N NbTiV 0,137 1,38 0,25 0,041 0,044 0,031 0,0080 V 0,370 1,39 0,62 0,005 0,004 0,092 0,0130 O processamento industrial do aço NbTiV consistiu na solubilização da placa a 1523K, seguindo-se uma seqüência de passes em laminador de desbaste. A laminação de acabamento foi realizada em um trem de laminação com seis cadeiras, cujos passes ocorreram entre 1293 e 1168K e resultaram em uma chapa com 3,2 milímetros de espessura. Após a saída do trem de acabamento a chapa foi resfriada com jatos de água numa taxa de 10 K.s -1 até a temperatura de bobinamento empregada (943K), seguindo-se o resfriamento da bobina ao ar. A solubilização do lingote do aço V ocorreu a 1553K durante 7 horas, vindo a seguir a laminação de desbaste que originou um bloco com seção quadrada de 180 milímetros. A laminação de acabamento, finalizada em temperatura próxima a 1273K, resultou na obtenção da forma final do produto. Após o processamento termomecânico as barras laminadas, cujas seções circulares possuíam diâmetro nominal de 89 milímetros, foram resfriadas ao ar. Os mecanismos de endurecimento atuantes nos aços NbTiV e V foram investigados na condição laminada, utilizando-se amostras que foram preparadas para a caracterização mecânica e microestrutural. As propriedades mecânicas foram estimadas por ensaios de tração e por medidas de dureza Vickers, no qual a carga padrão empregada nos ensaios foi de 196 N. A preparação de amostras para análise por microscopia ótica seguiu o procedimento tradicional, que consistiu no desbaste até a lixa #600 e polimento final com alumina 0,3 µm. Para revelação da microestrutura dos aços investigados empregou-se nital a 2%. Técnicas de metalografia quantitativa foram aplicadas para a determinação do tamanho de grão ferrítico e da fração volumétrica da perlita. Para as medidas do tamanho de grão usou-se o método do intercepto linear médio, no qual foram contadas as interseções de linhas-teste retilíneas com os contornos de grão da ferrita (ASTM, 1991a). A estimativa da fração volumétrica de perlita foi feita pela contagem de pontos de uma grade padrão, conforme procedimento estabelecido pela norma ASTM E562 (ASTM, 1991b). Para as medidas realizadas foi estipulado um limite de confiança estatístico de 95%.

Amostras de lâmina fina, empregadas para observação no microscópio eletrônico de transmissão, foram elaboradas a partir de discos finos cortados de cilindros usinados com 3 mm de diâmetro. A seguir os discos foram cuidadosamente lixados até se conseguir espessuras próximas a 50 µm. Para a obtenção de áreas finas foi realizado o polimento eletrolítico dos discos, no qual empregou-se um equipamento adequado (Struers, modelo Tenupol 3). Bons resultados foram verificados quando foi usado um eletrólito a base de ácido crômico resfriado a 288K, sob tensão de 50 volts para o aço NbTiV e 25 volts para o aço microligado V (Gallego, 2003). A precipitação de carbonitretos foi caracterizada por difração de elétrons, técnica que permitiu determinar se as partículas observadas haviam sido nucleadas na austenita ou durante a transformação de fase γ - α. Com as micrografias conseguidas a partir das lâminas finas foi também possível determinar a parâmetros como o tamanho e a fração volumétrica dos carbonitretos, a densidade de discordâncias e o espaçamento interlamelar da perlita do aço V. A espessura das amostras foi estimada pela técnica de contagem de franjas de espessura (Kestenbach e Morales, 1998), sendo a densidade de partículas por unidade de volume N v calculada por N N = v A ( D + (5) t) onde N é o número de partículas, cujo diâmetro médio é D, que foram observadas sobre a área projetada A da amostra com espessura t. A fração volumétrica dos carbonitretos f v foi determinada pela expressão f v 3 = π v (6) 6 N D RESULTADOS O limite de escoamento é uma das principais propriedades mecânicas utilizadas na engenharia. Nos aços microligados investigados esta propriedade mostrou ser o resultado da interação entre diversos mecanismos de endurecimento, promovidos pelos variados fatores metalúrgicos que serão apresentados a seguir. CONTRIBUIÇÃO DA COMPOSIÇÃO QUÍMICA E DA MICROESTRUTURA A microestrutura dos aços microligados NbTiV e V após o processamento industrial mostrou ser constituída de ferrita e perlita, como pode ser constatado pelas micrografias apresentadas na Figura 1. Em ambos os casos a morfologia da ferrita pró-eutetóide foi poligonal. Na Tabela 2 estão indicados os valores experimentais de alguns parâmetros metalúrgicos, como o tamanho de grão ferrítico (d), a fração volumétrica de perlita (f p ) e o espaçamento interlamelar da perlita (λ), este último estimado após a análise no microscópio eletrônico de transmissão. Ainda na mesma tabela estão os valores do limite de escoamento (L.E.) e dureza Vickers (HV) medidos nas amostras preparadas. Como foi destacado na introdução, equações empíricas tem sido desenvolvidas para expressar o limite de escoamento básico σ o de aços comerciais. Aplicando os dados da tira a quente apresentados nas Tabelas 1 e 2 na expressão (1) foi estimado em 402 MPa a resistência atribuída ao

tamanho de grão da ferrita e a composição química do aço NbTiV, valor correspondente a 67% do limite de escoamento experimental. Analogamente o uso da expressão (2) permitiu avaliar em 426 MPa o valor de σ o para o aço V, cerca de 69% do valor experimental da propriedade mecânica. Figura 1: Micrografias óticas apresentando a microestrutura ferrítico-perlítica observada nos aços NbTiV (a) e V (b), revelada pelo ataque da superfície polida com nital a 2%. Aumento: 500 X. Tabela 2: Parâmetros microestruturais e propriedades mecânicas dos aços investigados. aço d [µm] f p λ [nm] L.E. [MPa] HV [MPa] NbTiV 3,8 ± 1,0 0,125 ± 0,025 n.d. 600 2293 V 5,5 ± 1,2 0,602 ± 0,030 170 ± 25 620 2685 PRECIPITAÇÃO DE CARBONITRETOS NOS AÇOS MICROLIGADOS A caracterização da precipitação de carbonitretos nos aços NbTiV e V só foi possível com um extensivo trabalho de observação no microscópio eletrônico de transmissão. As análises realizadas tanto na tira a quente quanto no aço para forjamento comprovaram que os carbonitretos foram precipitados na austenita ou formados durante a transformação da austenita para a ferrita (precipitação interfásica). Não foi observada a presença de partículas que poderiam ter sido nucleadas devido à supersaturação da ferrita, o que seria confirmado se os carbonitretos apresentassem as três variantes de Baker-Nutting na área analisada por difração de elétrons (Baker e Nutting, 1959). Semelhantes resultados também foram observados em um trabalho congênere (Jian et al, 1990). A formação de carbonitretos na austenita do aço NbTiV mostrou ter ocorrido sobre sítios preferenciais. Partículas mais grosseiras e esparsas, cujos tamanhos variavam entre 8 a 12 nm, provavelmente tenham sido nucleadas em temperaturas elevadas durante a laminação de desbaste. A laminação de acabamento promoveu uma intensa precipitação de carbonitretos, favorecendo a nucleação devido à formação da subestrutura austenítica mas não o crescimento das partículas, limitado pela menor temperatura. A grande concentração de partículas irregularmente dispersas

delineou o que seriam os antigos subcontornos de grão da austenita, como mostram os exemplos da Figura 2. Os subgrãos não apresentam precipitação em seu interior, uma evidência da notória falta de substratos (discordâncias) nessa região. A deformação da subestrutura austenítica durante os passes de acabamento implicou no freqüente achatamento dos subgrãos, muitos dos quais mostraram orientação com a direção de laminação (pancaking). A Tabela 3 sintetiza os aspectos quantitativos relacionados à presença da precipitação na austenita observados nos aços sob investigação. Figura 2: Micrografias em campo escuro geradas por feixes de elétrons difratados por carbonitretos formados na austenita do aço NbTiV em (a) e do aço V em (b). Aumento: 100.000 X. Tabela 3: Precipitação de carbonitretos na austenita. Parâmetro NbTiV Aço V Campos analisados (n) 14 10 Partículas observadas (N) 6486 2295 Diâmetro médio das partículas (D) [nm] 5,6 7,8 Densidade de partículas por unidade de volume (N v ) [µm -3 ] 7114 2308 Fração volumétrica das partículas (f v ) 5,45 10-4 5,34 10-4 A observação de partículas distribuídas em fileiras regulares facilitou a identificação da precipitação interfásica, devidamente comprovada por difração de elétrons os carbonitretos estavam orientados de acordo com apenas uma das variantes de Baker-Nutting (Davenport e Honeycombe, 1971). Em alguns casos foi possível identificar uma outra forma de dispersão das partículas, que apresentavam uma distribuição aleatória. A Figura 3 apresenta um interessante exemplo onde é possível visualizar, em um mesmo grão ferrítico, ambas as formas de dispersão

características da precipitação interfásica (fileiras e aleatória). Os resultados da caracterização da precipitação interfásica em grãos de ferrita são apresentados na Tabela 4 a seguir. Figura 3: (a) Micrografia em campo claro mostrando grão ferrítico do aço NbTiV com precipitação interfásica, cujas partículas estão dispersas tanto em fileiras (região superior à esquerda) como aleatoriamente (região inferior à direita). As setas indicam a região de transição entre os arranjos. O campo escuro em (b) apresenta o típico aspecto da precipitação interfásica em fileiras visto no aço V. Aumentos de 125.000 vezes em (a) e 200.000 vezes em (b). Tabela 4: Precipitação interfásica de carbonitretos. Parâmetro NbTiV Aço V Campos analisados (n) 12 17 Partículas observadas (N) 4882 10674 Diâmetro médio das partículas (D) [nm] 3,9 4,3 Densidade de partículas por unidade de volume (N v ) [µm -3 ] 17824 20270 Fração volumétrica das partículas (f v ) 5,17 10-4 7,28 10-4 As contribuições da precipitação de carbonitretos ao endurecimento dos aços microligados pode ser determinado pelo modelo de Orowan-Ashby, descrito pela equação (3). Considerando-se os valores determinados para o tamanho e a fração volumétrica das partículas formadas pela precipitação na austenita e interfásica (Tabelas 3 e 4, respectivamente) pôde-se estimar as parcelas de endurecimento da ferrita para cada modo de precipitação, como mostra a Tabela 5. Embora não tenha sido feito um estudo mais detalhado espera-se que um efeito semelhante seja esperado na perlita, pois a precipitação de carbonitretos nas lamelas de ferrita da perlita foi identificada tanto no aço NbTiV quanto no aço V (Gallego, 2003).

Tabela 5: Endurecimento por precipitação de carbonitretos, segundo Orowan-Ashby. Aço Endurecimento por precipitação [MPa] Austenita ( σ γ ) Interfásica ( σ IF ) NbTiV 100 116 V 80 130 EFEITO DAS DISCORDÂNCIAS SOBRE O LIMITE DE ESCOAMENTO A densidade de discordâncias (ρ) na ferrita foi determinada pela técnica descrita por Ham (1961), na qual era necessária a contagem do número de interseções entre linhas-teste paralelas e as discordâncias. Deste modo foram utilizados para a análise 20 grãos ferríticos do aço NbTiV e 13 para o aço com médio carbono microligado ao vanádio. Para a tira a quente os valores de ρ variaram entre 1,2 a 9,7 10 9 cm -2, sendo a densidade média estabelecida em 5 10 9 cm -2. Para o aço V as estimativas realizadas estavam compreendidas entre 1,1 a 5,4 10 9 cm -2, com valor médio calculado em 3 10 9 cm -2. A aplicação dos resultados acima ao modelo de endurecimento proposto por Keh (1965), equação (4), permitiu estimar em 55 e 44 MPa o acréscimo σ d que seria proporcionado pelas discordâncias ao limite de escoamento dos aços NbTiV e V, respectivamente. DISCUSSÃO A PRECIPITAÇÃO DE CARBONITRETOS APÓS O PROCESSAMENTO INDUSTRIAL O processamento termomecânico aplicado ao aço NbTiV promoveu a precipitação de carbonitretos na austenita. Embora a análise por difração de elétrons não tenha possibilitado verificar a composição das partículas, é bem provável que os carbonitretos tenham sido constituídos principalmente por nióbio, considerando-se a solubilidade do vanádio e a extensiva quantidade de titânio (cerca de 60%) consumida na formação de eutéticos. A favor dessa suposição pode-se ainda destacar que a precipitação de Nb(C,N) induzida por deformação ocorre intensamente no intervalo de temperaturas onde os tratamentos termomecânicos são normalmente realizados (Hong et al, 2002). A presença da precipitação de carbonitretos na austenita indicou que não houve recristalização na etapa de acabamento da tira a quente, o que contribuiu eficazmente para o refino de grão ferrítico observado e está em conformidade com o prognóstico dado por Boratto e colaboradores (1988). Devido a sua maior solubilidade em relação ao titânio e ao nióbio, o vanádio possivelmente teve um papel de destaque na precipitação interfásica observada no aço NbTiV, quando a nucleação das partículas ocorreu na interface da ferrita recém transformada e o crescimento subseqüente tenha se dado durante o longo resfriamento após o bobinamento a 943K. Neste caso haveria um crescimento competitivo entre os carbonitretos formados anteriormente na austenita com aqueles nucleados durante a transformação de fase. Tal comportamento, aliado a uma baixa quantidade de sítios preferenciais para nucleação, daria uma explicação plausível para explicar a ausência da precipitação de carbonitretos na ferrita supersaturada. Verificou-se também que o crescimento

competitivo não inviabilizou a ocorrência dos dois modos de precipitação dos carbonitretos (austenita/interfásica) em um mesmo grão de ferrita (Gallego, 2003). A precipitação de carbonitretos na austenita do aço V mostrou ser, qualitativamente, mais grosseira e irregularmente dispersa que a correspondente encontrada na tira a quente, cuja causa estaria associada à eliminação dos sítios para nucleação (subcontornos) pela recristalização da austenita. O elevado teor de nitrogênio (130 ppm) na composição química do aço V promoveria a formação de nitretos de vanádio, cuja solubilidade é inferior à do carboneto nas temperaturas típicas de processamento termomecânico. Estima-se que aproximadamente 52% do total de vanádio adicionado ao aço para forjamento tenha sido consumido na formação de VN, o que resultaria numa fração volumétrica máxima de 7,9 10-4. Há muito tempo vincula-se a adição de microligantes aos aços comerciais com a precipitação de carbonitretos coerentes na ferrita, que causariam um significativo o aumento de resistência mecânica desses materiais (Morrison, 1963). Para este fim o vanádio seria o microligante mais indicado para a formação de partículas coerentes, pois o desajuste cristalográfico (lattice mismatch) destas com a matriz seria mínimo se comparado com os carbonitretos de nióbio ou titânio. Considerando-se que a precipitação na austenita é reconhecidamente incoerente (DeArdo, 1998), a investigação da coerência dos carbonitretos foi realizada sobre as partículas formadas pela precipitação interfásica. Através da análise do contraste gerado pelas partículas no microscópio eletrônico de transmissão, verificou-se que não haviam campos de deformação elástica associados aos carbonitretos ou seja, o tamanho das partículas em campo claro e escuro eram os mesmos e que a precipitação interfásica era, também, incoerente com a ferrita (Morales et al, 2003). O EFEITO COMBINADO DA PRECIPITAÇÃO NA AUSTENITA E INTERFÁSICA SOBRE O ENDURECIMENTO Os cálculos do endurecimento por precipitação, estimados pelo modelo de Orowan-Ashby, mostraram que a formação de carbonitretos na austenita e durante a transformação de fase γ - α teve efeito significativo nos aços analisados. Entretanto pôde-se constatar que a utilização destes resultados não deve ser feita diretamente sobre o limite de escoamento, que neste caso se tornaria superestimado como mostra a Tabela 6. Como destacado anteriormente, ambos os modos de precipitação mostraram ser incoerentes com a matriz ferrítica. Neste caso seria descabido imaginar que uma discordância, movimentando-se em seu respectivo plano de deslizamento, sofreria apenas o bloqueio causado pela precipitação interfásica. Caberia aqui enfatizar que o acréscimo de resistência dado pelo mecanismo de Orowan- Ashby considera apenas o espaçamento entre as partículas medido no plano de deslizamento, em geral muito maior que a distância aparente mostradas geralmente nas precipitações interfásica e na austenita. Na Figura 4 são mostradas indícios da interação entre os carbonitretos e discordâncias (bowing), onde é possível verificar que a distância aparente (projetada) entre as partículas é menor que o afastamento entre os pontos da discordância que foram ancorados pelos carbonitretos.

Tabela 6: Contribuições ao aumento do limite de escoamento dos aços NbTiV e V, calculadas para os diferentes mecanismos de endurecimento. Mecanismo de Endurecimento Incremento [MPa] Aço NbTiV Aço V Contribuição dada pelo endurecimento básico ( σ o ) 402 426 Contribuição dada pela precipitação interfásica ( σ IF ) 116 130 Contribuição dada pela precipitação na austenita ( σ γ ) 100 80 Contribuição dada pelas discordâncias ( σ d ) 55 44 Efeito acumulado sobre o limite de escoamento (Σ σ i ) 673 680 Limite de escoamento experimental 600 620 Figura 4: Micrografias em campo claro que mostram evidências da interação entre os carbonitretos e discordâncias existentes na ferrita. Os aumento usados foram 300.000 vezes em (a) e 125.000 vezes em (b). Deste modo, as discordâncias têm grande probabilidade de interagir efetivamente com uma distribuição global de carbonitretos, que seria constituída pela reunião dos dois grupos de partículas (austenita e interfásica). Esta consideração levaria a uma diminuição no espaçamento médio entre os carbonitretos, que poderia ser calculada seria expresso por (Lapointe e Baker, 1982) L 1 1 = + L 1 2 2 2 g γ L IF (7) onde L g, L γ e L IF são as distâncias entre carbonitretos média (ou global), na austenita e interfásica, respectivamente. Se for multiplicado ambos os membros da equação (7) pelo produto (G b) 2, sendo G o módulo de cisalhamento da matriz e b o vetor de Burgers, não será alterada a igualdade

( G b) L 2 ( G b) = L 2 2 2 g γ L IF 2 ( G b) + 2 (8) A expressão (8) acima significa que o efeito global da precipitação de carbonitretos seria resultante de uma interação entre os modos de precipitação observados (austenita e interfásica), ou seja, σ = σ γ + (9) 2 2 g σ IF Aplicando os resultados da Tabela 5 na equação (9) pôde-se estimar que a precipitação global σ g tenha contribuído com o aumento de 153 MPa no limite de escoamento de ambos os aços investigados. A INTERAÇÃO ENTRE OS MECANISMOS DE ENDURECIMENTO A Tabela 6 apresentou sumariamente as contribuições atribuídas a cada um dos mecanismos de endurecimento envolvidos com os aços microligados. Através dela constatou-se que o limite de escoamento do aço NbTiV estaria superestimado em 73 MPa (12%) se fosse considerado o efeito acumulativo da precipitação na austenita com a interfásica, enquanto no aço V esta consideração traria conseqüências semelhantes (limite de escoamento 60 MPa superior ao valor determinado experimentalmente). Entretanto, verifica-se um excelente ajuste entre os limites de escoamento calculado e medido se as parcelas da Tabela 6 referentes ao endurecimento por precipitação (austenita e interfásica) forem substituídas pela contribuição dada pela precipitação global. Neste caso o limite de escoamento calculado pelo efeito cumulativo seria 610 MPa para o aço NbTiV, enquanto para o aço V o valor estimado para a propriedade mecânica seria 623 MPa cálculos cujas diferenças seriam inferiores a 2% do valor experimental do limite de escoamento. Visando comparar os resultados conseguidos na análise dos mecanismos de endurecimento atuantes nos aços NbTiV e V com outros aços microligados, efetuou-se uma busca de resultados experimentais na literatura (Campos et al, 2001; Jian et al, 1990; Lapointe & Baker, 1982; Baker, 1983). São relativamente poucos os trabalhos que exploraram detalhadamente o assunto, considerando as dificuldades experimentais envolvidas. A Figura 5 foi construída com base em alguns dos dados coletados, sobre os quais foi considerado que o efeito de cada mecanismo de endurecimento seria cumulativo e linear. A análise por regressão linear mostrou que a conformidade entre os valores calculados e medidos do limite de escoamento foi muito satisfatória, considerando o coeficiente de correlação estimado (0,91), de maneira que a propriedade mecânica analisada pode ser fisicamente interpretada pela totalização dos mecanismos de endurecimento envolvidos.

Limite de escoamento calculado [MPa] 700 600 500 400 300 200 100 Referências (Jian et al, 1990) (Lapointe & Baker, 1982) (Campos et al, 2001) (Baker, 1983) aço NbTiV aço V 100 200 300 400 500 600 700 Limite de escoamento medido [MPa] Figura 5: Compilação de resultados que mostram a boa conformidade entre o efeito da interação cumulativo entre os mecanismos de endurecimento, que constituem o limite de escoamento calculado, e o limite de escoamento medido em diversos aços microligados. CONCLUSÕES A análise dos diversos mecanismos de endurecimento envolvidos com o limite de escoamento dos aços NbTiV e V levou às seguintes conclusões: Somente dois modos de precipitação de carbonitretos, na austenita e interfásica, foram identificados nas lâminas finas observadas por microscopia eletrônica de transmissão. Carbonitretos formados na austenita e pela precipitação interfásica podem estar presentes em um mesmo grão de ferrita, seja na tira a quente NbTiV ou no aço V. A presença de vanádio, por si só, não determinou que com o processamento industrial fosse obtida a formação de carbonitretos coerentes com a ferrita, apesar deste microligante possuir o menor desajuste cristalográfico em relação ao nióbio e titânio. O endurecimento por precipitação mostrou ser resultante de um efeito combinado entre a formação de carbonitretos na austenita e a precipitação interfásica, o qual pode ser determinado matematicamente pela equação (9). O cálculo do limite de escoamento pode ser expresso pelo efeito cumulativo das contribuições de cada um dos mecanismos de endurecimento, cujo resultado mostrou boa conformidade com o limite de escoamento medido experimentalmente. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem a FAPESP, ao CNPq e a FUNDUNESP pelos apoios financeiros concedidos e também as siderúrgicas COSIPA e VILLARES, que gentilmente cederam as amostras dos aços microligados utilizados neste estudo.

REFERÊNCIAS 1. American Society for Testing and Materials. Standard test methods for determining average grain size - ASTM E112-88. V. 3.01, pp. 280-305, 1991a. 2. American Society for Testing and Materials. Standard test methods for determining volume fraction by sistematic manual point count - ASTM E562-89. V. 3.01, pp. 574-579, 1991b. 3. Baker, T. N. Determination of the Friction Stress from Microstructural Measurements. Yield Flow and Fracture of Polycrystals. T. N. Baker, ed. Applied Sciences Publishers, pp. 235-273, 1983. 4. Baker, R. G. and Nutting, J. The Tempering of a Cr-Mo-V-W and a Mo-V Steel. Iron and Steel Institute Special Report n. 64, pp. 1-22, 1959. 5. Boratto, F., Barbosa, R., Yue, S. and Jonas, J.J. Effect of Chemical Composition on the Critical Temperatures of Microalloyed Steels. THERMEC '88, ISIJ, Tokyo, pp. 383-390, 1988. 6. Campos, S. S., Morales, E. V. and Kestenbach, H.-J. On Strengthening Mechanisms in Commercial Nb-Ti Hot Strip Steels. Metallurgical and Materials Transactions A, V. 32A, pp. 1245-1248, 2001. 7. Davenport, A. T. and Honeycombe, R. W. K. Precipitation of Carbides at gamma-alpha Boundaries in Alloy Steels. Proc. Roy. Soc. London, V. A322, pp. 191-205, 1971. 8. DeArdo, A. J. Microalloyed Strip Steels for the 21st. Century. Materials Science Forum, V. 284-286, pp. 15-26, 1998. 9. DeArdo, A. J. Metallurgical Basis for Thermomechanical Processing of Microalloyed Steels. Ironmaking and Steelmaking, V. 28, n. 2, pp. 138-144, 2001. 10. Gallego, J. Investigação por Microscopia Eletrônica de Transmissão do Endurecimento por Precipitação de Carbonitretos em Aços Comerciais Microligados ao Vanádio. Tese de Doutorado. UFSCar, São Carlos, 117p., 2003. 11. Gladman, T. The Physical Metallurgy of Microalloyed Steels. The Institute of Materials, London, 1997, pp. 47-56. 12. Ham, R. K. The Determination of Dislocation Densities in Thin Films. Philosophical Magazine, V. 6, n. 69, pp. 1183-1184, 1961. 13. Honeycombe, R. W. K. Carbide Precipitation in HSLA Steels. Proc. Microalloyed HSLA Steels (A. DeArdo, ed.), Chicago, 1988, pp. 1-13. 14. Hong, S. G., Kang, K. B. and Park, C. G. Strain-induced Precipitation of NbC in Nb and Ti-Nb Microalloyed HSLA Steels. Scripta Materialia, V. 46, pp. 163-168, 2002. 15. Jian, L., Fuyu, S. and WenChong, X. On The Evaluation Of Yield Strength For Microalloyed Steels. Scripta Metallurgica et Materialia, V. 24, n. 7, pp. 1393-1398, 1990. 16. Keh, A. S. Work Hardening and Deformation Sub-Structure in Iron Single Crystals in Tension at 298K. Philosophical Magazine, V. 12, n. 115, pp. 9-30, 1965. 17. Kestenbach, H.-J. and Morales, E. V. Transmission Electron Microscopy of Carbonitride Precipitation in Microalloyed Steels. Acta Microscopica, V. 7, n. 1, pp. 22-33, 1998. 18. Lapointe, A. J. and Baker, T. N. Analysis of Strengthening Contribution at Peak Hardening from Precipitation in Vanadium Continuosly Cooled from Austenite. Metal Science, V. 16, pp. 207-216, 1982.

19. Morales, E. V., Gallego, J. and Kestenbach, H.-J. On Coherent Carbonitride Precipitation in Commercial Microalloyed Steels. Philosophical Magazine Letters, V. 83, n. 2, pp. 79-87, 2003. 20. Morrison, W. B. The Influence of Small Niobium Additions on the Properties of Carbon- Manganese Steels. Journal of the Iron and Steel Institute, V. 201, pp. 317-325, 1963. 21. Pickering, F. B. Physical Metallurgy and The Design of Steels. Applied Science publishers Ltd., London, p. 63, 1978a. 22. Pickering, F. B. Physical Metallurgy and The Design of Steels. Applied Science publishers Ltd., London, pp. 90-91, 1978b. INTERACTIONS BETWEEN STRENGTHENING MECHANISMS IN MICROALLOYED STEELS ABSTRACT In present work a quantitative microstructural characterization in microalloyed steels was carried out. For that two commercial microalloyed steels were used, being one of them a Nb-Ti-V hot strip steel and the other was a medium-carbon V-microalloyed steel. Optical and Transmission Electron Microscopy were used to reveal the ferrite grain structure, fine carbonitride precipitation and dislocation substructures. Well-known microstructural models were employed to determine actual strength contributions, in an effort to understand the major strengthening mechanisms that explain the higher levels of yield strength. An important strengthening contribution was attributed to global carbonitride precipitation which was formed by austenite and interphase particle distribution. It was found that the cumulative effects of the calculations made from solid solution, grain size, dislocation and global precipitation hardening showed excelent agreement with tensile testing results. Key-words: microalloyed steels, strengthening mechanisms, carbonitride precipitation, transmission electron microscopy.