AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DE UMA ETE TIPO AERAÇÃO PROLONGADA COM BASE EM TRÊS ANOS DE MONITORAMENTO INTENSIVO



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Transcrição:

AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DE UMA ETE TIPO AERAÇÃO PROLONGADA COM BASE EM TRÊS ANOS DE MONITORAMENTO INTENSIVO Marcos von Sperling (*) Carla Maria Vasconcellos Fróes Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental Universidade Federal de Minas Gerais Av. Contorno 842-7 o andar 30110-060 - Belo Horizonte - BRASIL Tel: 55 (0) 238-1935; Fax: 55 (0) 31-238-1879 e-mail: marcos@desa.ufmg.br PALAVRAS-CHAVE: Esgotos domésticos; lodos ativados; aeração prolongada; avaliação de desempenho

INTRODUÇÃO E OBJETIVOS A Estação de Tratamento de Esgotos de Morro Alto trata os despejos predominantemente domésticos (aproximadamente 10.000 habitantes) gerados pelo conjunto habitacional de mesmo nome, localizado na Região Metropolitana de Belo Horizonte. A estação entrou em carga em 1985, sendo operada pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (COPASA-MG). O processo de tratamento é o de lodos ativados, modalidade aeração prolongada. A estação de tratamento é composta pelas unidades listadas no Quadro 1. Quadro 1. Unidades componentes da ETE - Morro Alto Unidade Dados Grade Limpeza manual Caixa de areia Retangular Reator Número de unidades = 1 Formato = retangular Comprimento = 35,50 (fundo) e 43,30 m (superfície) Largura = 17,00 m (fundo) e 24,80 (superfície) Profundidade útil = 2,50 Aeração = 2 aeradores mecânicos (25 CV cada) Decantador secundário Número de unidades = 2 (apenas 1 em operação) Formato = retangular tipo Dortmund (tronco-piramidal) Comprimento = 15,00 m Largura = 5,00 m Profundidade = 4,58 m Leitos de secagem Número de unidades = 10 Comprimento = 10,00 m Largura = 5,00 m Lagoas de lodo Número de unidades = 2 Comprimento = 7,70 m (fundo) e 9,50 m (superfície) Largura = 5,90 m (fundo) e 9,50 m (superfície) Profundidade útil = 1,35 m O presente trabalho objetiva analisar indicadores do desempenho da ETE-Morro Alto, tendo por base dados operacionais bastante completos levantados pela COPASA-MG, e selecionados para efeito deste trabalho em três anos de operação (1991, 1992 e 1993). Os dados foram trabalhados por Fróes (1996). Um elemento motivador do trabalho é a baixa disponibilidade operacionais de estações de tratamento de esgotos em escala plena pelo processo de aeração prolongada. A literatura especializada, principalmente a norte-americana e a européia, centra-se mais na modalidade de lodos ativados convencional. METODOLOGIA O trabalho investiga dados do afluente e do efluente, bem como índices e parâmetros de controle operacional. Os dados do afluente e do efluente analisados no trabalho são: vazão, sólidos em suspensão totais (SS), sólidos em suspensão voláteis (SSV), DBO 5, DQO, nitrogênio e fósforo. Os índices e parâmetros de controle operacional da estação analisados no trabalho são: SSTA, F/M, idade do lodo, OD, ph, sólidos decantáveis, Índice Volumétrico do Lodo (IVL) e razão de recirculação (Q r /Q). As freqüências de coleta variaram, desde horária (vazão afluente) a quinzenal. O número de amostras ao longo do período investigado é, portanto, bastante elevado, dando consistência às análises efetuadas no presente trabalho.

RESULTADOS E DISCUSSÃO Características do afluente As estatísticas básicas das variáveis analisadas no afluente encontram-se no Quadro 2. Quadro 2. Estatísticas básicas das principais características do afluente à ETE-Morro Alto Vazão l/s 1090 0 23,7 11,1 2,5 SST mg/l 158 79 773 340 107 SSV mg/l 158 62 563 249 92 SSV/SST - 158 0,30 0,99 0,73 0,11 DBO mg/l 138 85 740 409 119 DQO mg/l 148 427 1570 969 233 DBO/DQO - 138 0,1 0,8 0,4 0,1 N total mg/l 45 13 123 65 24 P total mg/l 45 1,4 12,2 7,3 2,4 A Figura 1 apresenta o histograma de freqüência da DBO afluente. Pode-se notar a ampla predominância (82,6%) de valores superiores a 300 mg/l, tradicionalmente adotados como valores típicos de projeto, inclusive na referida estação. A ocorrência de valores elevados de DBO, ocasionados pelo baixo consumo de água da população contribuinte à ETE, deve ser considerado como a situação mais predominante em nosso meio. DBO5 do esgoto bruto (mg/l) 32,6 29,0 36,0 15,2 15,2 0,7 1,5 2,2 100 200 300 400 500 600 700 800 Fig. 1. Histograma de freqüência relativa (%) da concentração de DBO 5 do esgoto bruto. São analisadas também as principais relações ocorridas no esgoto bruto, e de interesse para projeto, tais como relação SSV/SS e relação DBO 5 /DQO. A Figura 2 apresenta os histogramas de freqüência destas relações. Observa-se que ambas as relações situam-se dentro de faixas usuais da literatura, embora a relação DBO 5 /DQO esteja próxima ao limiar inferior, caracterizando um esgoto com matéria orgânica de menor biodegradabilidade. Relação SSV/SS Relação DBO5/DQO 45,0 36,2 31,9 0,6 0,0 0,6 11,4 25,3 12,7 4,4 1,4 8,0 16,7 5,0 0,7 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 Fig. 2. Histogramas de freqüência relativa (%) das relações SSV/SS e DBO 5 /DQO do esgoto bruto.

As concentrações de N e P no esgoto bruto são analisadas em termos dos requisitos de nutrientes para o metabolismo bacteriano. Estações por aeração prolongada, diferentemente dos lodos ativados convencionais, possuem requisitos da relação de DBO 5 :N:P da ordem de 100 : 3 : 0,5 (Eckenfelder, 1989). Os valores médios encontrados no esgoto bruto da ETE Morro Alto são 100 : 15,9 : 1,8, indicando a suficiente disponibilidade de N e P para os processos biológicos. Avaliação do desempenho da estação As estatísticas básicas das variáveis analisadas no efluente encontram-se no Quadro 3, ao passo que as eficiências de remoção de DBO, NTK e P encontram-se no Quadro 4. Quadro 3. Estatísticas básicas das principais características do efluente da ETE-Morro Alto DBO mg/l 132 2 198 16 119 DQO mg/l 147 5 1136 75 136 SST mg/l 159 2 710 48 91 N amoniacal mg/l 45 0,2 50 10 11 P total mg/l 45 0,5 6,8 2,7 1,5 Quadro 4. Eficiências de remoção de poluentes na ETE- Morro Alto DBO % 132 61,1 99,6 95,9 5,2 NTK % 45-7,5 97,2 72,0 24,6 P total % 45-21,4 92,9 60,0 26,6 A observação geral é de um desempenho bastante satisfatório. Deve-se destacar a elevada eficiência média na remoção de DBO (96%), a qual gerou uma concentração efluente média de 16 mg/l. Em termos de distribuição de freqüência, 96% das amostras apresentaram uma eficiência superior a 85%, mínimo exigido pela legislação estadual. A estação não foi projetada para remover nutrientes. Mesmo assim, a eficiência na remoção de fósforo, através de incorporação à biomassa presente nos sólidos descartados do sistema é relativamente alta (60%). A eficiência da nitrificação é de 72%, no período de análise, devido a possíveis problemas de abaixamento do ph ou de valores de OD inferiores a um mínimo em torno de 1,5 mg/l. Posteriormente ao período de estudo, o ph da mistura líquida passou a ser corrigido com cal. Uma análise mais aprofundada dos sólidos em suspensão é objetivo de um trabalho específico detalhado dos mesmos autores, enfocando a análise do fluxo de sólidos no decantador secundário (von Sperling & Fróes, no prelo). A DBO total efluente de sistemas de aeração prolongada é em sua maioria quase toda devida aos sólidos em suspensão efluentes do decantador secundário. A DBO solúvel pode ser considerada desprezível (von Sperling, 1993). Visando estabelecer este vínculo entre DBO e SS efluentes, efetuou-se uma análise da regressão, objetivando simplificar a operação na estimativa da DBO efluente do sistema. A equação de melhor ajuste encontrada foi: DBO5 efluente = 5,1 + 0,21 x SS efluente (R 2 = 0,749) (1) Desta forma, cada 1 mg/l de SS no efluente é responsável por uma DBO particulada de aproximadamente 0,21 mg/l. Tal valor aproxima-se do limite mínimo teórico para sistemas de aeração prolongada. Von Sperling (1990), em pesquisas em outro sistema de aeração prolongada, na Inglaterra, encontrou a relação de 0,24 mgdbo 5 /mgss. O dado obtido para Morro Alto pode ser utilizado para o controle operacional da estação, permitindo a rápida estimativa da DBO efluente, tendo por base apenas a determinação da concentração de SS no efluente final.

A estação não foi projetada para a desnitrificação, não possuindo, portanto, zonas anóxicas intencionais. No entanto, através dos dados de nitrato, observou-se uma elevada eficiência de desnitrificação, variando entre 50% e 99%. Esta desnitrificação ocorre provavelmente no decantador secundário, fato usual em sistemas de lodos ativados operando em clima tropical. A conseqüência é o desprendimento de gás nitrogênio e a ressuspensão do lodo sedimentado. A conclusão final sobre a estação de tratamento de esgotos de Morro Alto é, em termos gerais, de um desempenho bastante satisfatório ao longo dos três anos investigados. Índices e parâmetros de controle operacional As estatísticas básicas das variáveis analisadas encontram-se no Quadro 5. Quadro 5. Estatísticas básicas dos principais parâmetros de controle operacional da ETE-Morro Alto SSTA mg/l 374 377 8500 3997 1237 SSVTA/SSTA - 374 0,44 0,93 0,66 0,06 F/M kgdbo 5 /kgssv.d 96 0,02 0,96 0,09 0,10 Idade do lodo d 229 2,6 66,8 26,2 12,0 OD mg/l 1052 0,70 3,25 1,47 0,40 ph - 1067 5,5 7,9 7,0 0,4 Sólidos decantáveis ml/l 1070 90 1000 756 285 IVL ml/g 373 37 669 214 102 Q r l/s 1096 0,8 24,6 14,1 3,7 Q r /Q - 1074 0,33 8,76 1,34 0,44 A Figura 3 apresenta os histogramas da distribuição de freqüência das concentrações de SSTA e da relação SSVTA/SSTA. Observa-se o amplo espectro de variação da concentração de SSTA, variando desde 377 mg/l até 8500 mg/l (ver também Quadro 5). No entanto, em torno de 2/3 dos valores situam-se na faixa de 3000 mg/l a 5000 mg/l. É interessante enfatizar que, mesmo com esta ampla variação, o desempenho da estação manteve-se satisfatório, ressaltando a robustez característica dos sistemas de aeração prolongada. A relação SSV/SS no tanque de aeração, com valor médio de 0,66, é também característica de aeração prolongada. Quanto menor o valor da relação, mais estabilizado encontra-se o lodo, o que é um dos objetivos da aeração prolongada. Sistemas de aeração prolongada possuem relações SSVTA/SSTA entre 0,60 e 0,75, ao passo que sistemas de lodos ativados convencional possuem esta relação na faixa de 0,70 a 0,85 (von Sperling, 1997). SSTA (mg/l) Relação SSVTA/SSTA 34,5 30,0 67,7 16,3 0,3 2,7 8,3 5,6 1,1 0,8 0,8 10,4 19,5 1,1 0,5 1000 2000 3000 4000 5000 6000 7000 8000 9000 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1 Fig. 3. Histogramas de freqüência relativa (%) das concentrações de SSTA e das relações SSVTA/SSTA. Os histogramas de freqüência dos importantes parâmetros de projeto e operação, relação F/M e idade do lodo, encontram-se na Figura 4. Mais uma vez, pode-se notar a grande amplitude de variação dos dados. No entanto, pode-se dizer que a maioria dos valores situa-se dentro da faixa típica de aeração prolongada (F/M < 0,10 kgdbo/kgssv.d e idade do lodo > 18 d). Os valores médios (Quadro 5) são também típicos (F/M = 0,09 kgdbo/kgssv.d e idade do lodo = 26,2 d. Em virtude de eventuais dificuldades no sistema de secagem de lodo para receber a descarga de lodo excedente, a idade do lodo (calculada pelo descarte) tornou-se bastante elevada, atingindo até 67 dias. Por outro lado, caso houvesse sido calculada a idade do

lodo tendo por base o crescimento bacteriano, e não o descarte, os valores encontrados teriam sido totalmente diferentes, já que o crescimento independe da freqüência de descarte. Esta diferença ocorre quando se analisa o sistema no estado dinâmico, o qual realmente predomina na estação. Esta é uma das limitações do controle do sistema de lodos ativados pela idade do lodo (von Sperling, 1994). Relação F/M (kgdbo5/kgssv.d) Idade do lodo (d) 28,5 29,5 17,5 14,0 18,8 15,3 2,1 8,4 12,7 9,5 2,1 4,2 1,0 1,0 0,0 1,0 0,9 2,2 10,0 7,4 7,4 3,9 0,9 0,9 0,4 0,4 0,02 0,04 0,06 0,08 0,10 0,12 0,14 0,16 0,18 0,20 0,22 0,24 5 10 15 20 5 30 35 40 45 50 55 60 65 70 Fig. 4. Histogramas de freqüência relativa (%) da relação F/M e da idade do lodo. Os histogramas de distribuição de freqüência de oxigênio dissolvido e o ph no tanque de aeração estão apresentados na Figura 5. A observação de ambos os histogramas sugere as possíveis causas da não ocorrência de uma nitrificação total, como seria de se esperar em sistemas de aeração prolongada. Há uma freqüência relativamente elevada de valores de OD inferiores a 1,5 e de ph inferiores a 7,0, que poderiam ser considerados como valores mínimos recomendados para se obter uma nitrificação consistente. A nitrificação pode ocorrer com valores inferiores a estes mencionados, mas em taxas mais lentas, e a interação simultânea dos dois fatores limitantes pode contribuir ainda mais para a redução da eficiência da nitrificação. Von Sperling & Lumbers (1989) e von Sperling (1990, 1993) identificaram em vários sistemas de aeração prolongada na Inglaterra, os baixos valores de OD causados pela elevada concentração de SSTA como a principal causa da redução na eficiência de nitrificação. OD no reator (mg/l) ph no reator 25,8 31,9 26,2 19,1 21,8 0,2 8,1 15,6 10,0 3,3 2,2 1,6 0,8 0,5 0,3 0,7 1,4 2,5 12,0 11,8 3,3 0,1 0,75 1,00 1,25 1,50 1,75 2,00 2,25 2,50 2,75 3,00 3,25 5,5 5,75 6 6,25 6,5 6,75 7 7,25 7,5 7,75 8 Fig. 5. Histogramas de freqüência relativa (%) da concentração de OD e do ph no tanque de aeração. A Figura 6 apresenta o histograma de distribuição de freqüência do Índice Volumétrico do Lodo (IVL) e da razão de recirculação (R = Q r /Q). Os elevados valores de IVL retratam o principal problema operacional vivenciado na ETE - Morro Alto no período de estudo, relacionado ao intumescimento do lodo. Valores de IVL característicos de uma sedimentabilidade ruim a péssima podem ser encontrados. Em virtude disto, a razão de recirculação necessitava ser mantida constantemente elevada, como pode ser visto no histograma, onde a maioria dos valores de R (79,6%) situa-se acima de 1,0, valor usual em sistemas de aeração prolongada. Os aspectos da sedimentabilidade do lodo e do gerenciamento dos sólidos no sistema, tendo por base a teoria do fluxo limite para os decantadores secundários são descritos em von Sperling & Fróes (no prelo).

IVL (ml/l) Razão de recirculação R 28,1 22,6 16,4 20,6 22,5 18,0 16,1 2,7 8,3 11,8 9,7 2,9 1,3 2,1 1,7 0,3 4,0 6,3 2,5 1,1 0,6 0,3 0,1 50 100 150 200 250 300 350 400 450 500 550 0,5 0,75 1 1,25 1,5 1,75 2 2,25 2,5 2,75 3 3,25 Fig. 6. Histogramas de freqüência relativa (%) do IVL e da razão de recirculação R. CONSIDERAÇÕES FINAIS A presente análise permitiu o conhecimento mais aprofundado sobre o comportamento de uma estação de tratamento de esgotos em escala real pelo processo de lodos ativados, modalidade aeração prolongada, variante ainda pouco analisada no meio técnico. Como ressaltado no item anterior, o desempenho geral da estação no período de estudo foi, de maneira geral, bastante satisfatório. Os autores defendem a necessidade de uma visão sistêmica sobre o processo de lodos ativados. Apenas com a utilização plena do conhecimento integrado das diversas variáveis interagentes no sistema, uma estação de lodos ativados pode ser adequadamente controlada. AGRADECIMENTOS O presente trabalho é fruto de um convênio entre a COPASA-MG, a Fundação Christiano Ottoni e o Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG. Os autores agradecem a gentil cessão pela área de tratamento de esgotos da COPASA-MG dos dados operacionais da estação de tratamento de esgotos de Morro Alto. REFERÊNCIAS ECKENFELDER Jr., W.W. (1989). Industrial water pollution control. McGraw-Hill International Ed., 40 pp. FRÓES, C.M.V. (1996). Avaliação do desempenho da estação de tratamento de esgotos do Conjunto Habitacional de Morro Alto, com ênfase na teoria do fluxo de sólidos limite. Dissertação de Mestrado, UFMG, 13/12/96. VON SPERLING, M. (1990). Optimal management of the oxidation ditch process. PhD Thesis, Imperial College, University of London, 1990. 371 p. VON SPERLING, M. (1993). Características operacionais específicas de sistemas de aeração prolongada. In: Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental, 17, Natal, 19-23 Setembro 1993, Vol. 2, Tomo I, pp. 140-151. VON SPERLING, M. (1994). Solids management for the control of extended aeration systems. An analysis of classical and advanced strategies. Water SA, 20 (1). pp 49-60. VON SPERLING, M. (1997). Princípios do tratamento biológico de águas residuárias. Vol. 4. Lodos ativados. Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental - UFMG. 416 p. VON SPERLING, M., FRÓES, C.M.V. (no prelo). Dimensionamento e controle de decantadores secundários com base em uma abordagem integrada e simplificada da teoria do fluxo de sólidos. Revista Engenharia Sanitária e Ambiental, ABES, Rio de Janeiro. VON SPERLING, M., LUMBERS, J.P. (1989). Control objectives and the modelling of MLSS in oxidation ditches. Water Science and Technology, 21. pp 1173-1183.