Educação Inclusiva sob o Enfoque da Legislação Brasileira



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Transcrição:

Educação Inclusiva sob o Enfoque da Legislação Brasileira ILDA SADI MAKSUD Assessora Jurídica Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência e Idosos O direito surgiu na vida social desde a pré-história das civilizações, sendo que os direitos fundamentais, inerentes aos seres humanos, transcendem o direito positivado nas constituições e na legislação infraconstitucional. Destarte, o significado jurídico das garantias fundamentais assegurados aos portadores de deficiência, por meio de leis ou outros meios, passam, necessariamente, pelas garantias de oportunidades e facilidades, estruturantes da preservação de seu aperfeiçoamento moral, intelectual e educacional, espiritual e social. Nesta ordem de idéia, não se defende que o direito da pessoa portadora de deficiência seja superior ao dos demais, porém observada a proporcionalidade dentro do critério de igualdade, o direito da pessoa portadora de deficiência adequar-se a uma categoria diferenciada e diversificada, exige a efetiva tutela do Estado no desempenho de políticas públicas, notadamente com a adoção de diretrizes para a educação inclusiva de pessoas com deficiência nos Sistemas Estaduais e Municipais de Ensino, diante, de suas características diferenciadas objetivando-se, desta forma, a promoção da inclusão social ensejadora da plenitude da cidadania. Lembrando lição do eminente Professor Kildare Gonçalves Carvalho acerca do tema igualdade constitucional, acentuou: No exame do princípio da igualdade, deve-se se levar em conta, ainda, que, embora sejam iguais em dignidade, os homens são profundamente desiguais em capacidade, circunstância que, ao lado de outros fatores, como compleição física e estrutura psicológica, dificulta a efetivação do princípio. 1 Continuando na dicção do ilustre Professor, observa que na Constituição os direitos sociais, para se tornarem operativos e efetivos, dependem de prestações 1 CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito constitucional didático. 7. ed. rev. ampl. e atual, Belo Horizonte: Del Rey, 2001. Pag. 281 e 318. 1

positivas do Estado. Em sua maioria, vêm enumerados em normas constitucionais não auto-aplicáveis. Nesse sentido, a legislação brasileira orientadora e garantidora dos direitos das pessoas portadoras de deficiência por uma escola comum incondicional, tem na LEI de Diretrizes e Bases da Educação LDB todo o embasamento jurídico para a elaboração de políticas públicas necessárias que possibilitam a efetiva consecução final de todo o aparato educacional. Para tanto, os Órgão Públicos responsáveis pela educação, quer seja nas esferas estaduais e municipais, deverão disponibilizar os recursos financeiros necessários para viabilizar o atendimento aos sujeitos de direito, proporcionando a adequação nos espaços físicos das escolas, recursos materiais e humanos, revisão de convênios, dentre outros. Importante salientar que a escolarização do aluno com deficiência nas escolas comuns e sua permanência durante o ensino fundamental é um direito indisponível, não se permitindo olvidar que as escolas especiais sempre deverão fazer o papel de atendimento especializado, quando se fizer necessário para o atendimento complementar à educação do aluno, nunca porém, substituí-la. Entretanto, entendemos que cabe também à sociedade, que respeita as diferenças, a busca por uma escola integradora, reconhecendo a necessidade de se refletir sobre novos paradigmas, novos mecanismos, que a escola reveja suas práticas em todos os níveis, concepções, aperfeiçoando seu projeto pedagógico, considerando sempre a diversidade do aluno, pois como é cediço, segundo o postulamento global não basta para mudar, a edição de normas legais se não mudar posturas de preconceito e discriminação. A propósito, acentua Miguel Arroyo: A escola somente se constituirá em fronteira avançada dos direitos se ela, como instituição social, tiver coragem de se redefinir um sua estrutura rígida e seletiva, ser democrática não apenas em sua gestão, mas em seus processos, na organização de seus tempos e espaços. É preciso superar a cultura seletiva que ainda legitima essa estrutura excludente. Essa é a Escola Possível. Ela já está acontecendo no profissionalismo e na dedicação de inúmeros coletivos de professores que transgridem a escola peneradora e antipopular. A Escola Possível está se formando possível, na medida em que continuar sendo fronteira avançada dos direitos. 2 O ordenamento jurídico brasileiro embasa, a regulamentação legal no que concerne as diretrizes educacionais para a construção de um sistema inclusivo. 2 ARROYO, Miguel. Escola: fronteira avançada dos direitos.. Belo Horizonte: Secretaria de Educação, 1996. 2

No contexto legal, inicialmente cumpre registrar, que o Brasil é signatário da Declaração de Salamanca, promulgada na Conferência mundial sobre Necessidades Educativas Especiais, em 1994, reafirmando o direito ao acesso à educação na rede regular de ensino aos portadores de deficiência, conforme demonstra o item 3 da Linha de Ação a ser adotada pelos países que assinaram o documento: O princípio que orienta esta Estrutura é o de que escolas deveriam acomodar todas as crianças independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, lingüísticas ou outras. Aquelas deveriam incluir crianças deficientes e super-dotadas, crianças de rua e que trabalham, crianças de origem remota ou de população nômade, crianças pertencentes a minorias linguísticas, étnicas ou culturais, e crianças de outros grupos desavantajados ou marginalizados. Tais condições geram uma variedade de diferentes desafios aos sistemas escolares. No contexto desta Estrutura, o termo "necessidades educacionais especiais" refere-se a todas aquelas crianças ou jovens cujas necessidades educacionais especiais se originam em função de deficiências ou dificuldades de aprendizagem. Muitas crianças experimentam dificuldades de aprendizagem e portanto possuem necessidades educacionais especiais em algum ponto durante a sua escolarização. Escolas devem buscar formas de educar tais crianças bem-sucedidamente, incluindo aquelas que possuam desvantagens severas. Existe um consenso emergente de que crianças e jovens com necessidades educacionais especiais devam ser incluídas em arranjos educacionais feitos para a maioria das crianças. Isto levou ao conceito de escola inclusiva. O desafio que confronta a escola inclusiva é no que diz respeito ao desenvolvimento de uma pedagogia centrada na criança e capaz de bem-sucedidamente educar todas as crianças, incluindo aquelas que possuam desvantagens severas. O mérito de tais escolas não reside somente no fato de que elas sejam capazes de prover uma educação de alta qualidade a todas as crianças: o estabelecimento de tais escolas é um passo crucial no sentido de modificar atitudes discriminatórias, de criar comunidades acolhedoras e de desenvolver uma sociedade inclusiva. (Grifo nosso). Posteriormente, o Brasil mais uma vez reafirmou sua opção de construir um sistema educacional inclusivo, por ocasião da Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Pessoa Portadora de Deficiência, na Guatemala, em 28/05/1999, na qual, em linhas gerais, contém o significado do que seja o termo deficiência: uma restrição física, mental ou sensorial de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades essenciais da vida diária, causada ou agrava pelo ambiente econômico e social. 3

O legislador Constituinte de 1988 já estava sensível à questão da inclusão do aluno portador de deficiência na rede regular de ensino, conforme demonstrado no texto dos incisos III e V do caput e 1º do artigo 208 e do inciso II do 1º e o 2º do artigo 227, verbis: Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;. 1º - O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo. Art. 227 1º - O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança e do adolescente, admitida a participação de entidades não governamentais e obedecendo os seguintes preceitos: II - criação de programas de prevenção e atendimento especializado para os portadores de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de preconceitos e obstáculos arquitetônicos. 2º - A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência. Acatando a mesma orientação, a Constituição do Estado de Minas Gerais de 1989, no artigo 198, garante que a educação pelo Poder Público se dá, dentre outras garantias, mediante o disposto nos inciso III: Art. 198 - A garantia de educação pelo Poder Público se dá mediante: III - atendimento educacional especializado ao portador de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino, com garantia de recursos humanos capacitados e material e equipamento públicos adequados, e de vaga em escola próxima à sua residência; (Grifo nosso) O Estatuto da Criança e do Adolescente Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 prevê sanção para qualquer forma de desrespeito, comissiva ou omissiva, aos direitos da criança e do adolescente, inclusive o direito à educação em estabelecimento 4

regular de ensino, entendido como dever do Poder Público, consoante a redação do artigo 5º e do inciso III do artigo 54: Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. Art. 54. É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente: III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; (Grifo nosso) Por sua vez, a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dedicou seu Capítulo V do Título V à educação especial, transcrito a seguir: Art. 4º. O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de: III atendimento educacional especializado, gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino Art. 58. Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais. 1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de educação especial. 2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular. 3º A oferta de educação especial, dever constitucional do Estado, tem início na faixa etária de zero a seis anos, durante a educação infantil. Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais: I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades; II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados; III - professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns; IV - educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora; V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular. Art. 60. Os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabelecerão critérios de caracterização das instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação 5

exclusiva em educação especial, para fins de apoio técnico e financeiro pelo Poder Público. Parágrafo único. O Poder Público adotará, como alternativa preferencial, a ampliação do atendimento aos educandos com necessidades especiais na própria rede pública regular de ensino, independentemente do apoio às instituições previstas neste artigo. (Grifos nossos) Nesse diapasão, a garantia da inclusão do portador de deficiência na rede regular de ensino também se consubstancia nos incisos I, IV e VI e 1º, 2º e 3º do artigo 24 do Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999 que regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências : Art. 24. Os órgãos e as entidades da Administração Pública Federal direta e indireta responsáveis pela educação dispensarão tratamento prioritário e adequado aos assuntos objeto deste Decreto, viabilizando, sem prejuízo de outras, as seguintes medidas: I - a matrícula compulsória em cursos regulares de estabelecimentos públicos e particulares de pessoa portadora de deficiência capazes de se integrar na rede regular de ensino; IV - a oferta, obrigatória e gratuita, da educação especial em estabelecimentos públicos de ensino; VI - o acesso de aluno portador de deficiência aos benefícios conferidos aos demais educandos, inclusive material escolar, transporte, merenda escolar e bolsas de estudo. 1o Entende-se por educação especial, para os efeitos deste Decreto, a modalidade de educação escolar oferecida preferencialmente na rede regular de ensino para educando com necessidades educacionais especiais, entre eles o portador de deficiência. 2o A educação especial caracteriza-se por constituir processo flexível, dinâmico e individualizado, oferecido principalmente nos níveis de ensino considerados obrigatórios. 3o A educação do aluno com deficiência deverá iniciar-se na educação infantil, a partir de zero ano. (Grifos nossos) A Lei Federal nº 10.172 de 9 de janeiro de 2001, que aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras providências, estabelece vinte e sete objetivos e metas para a educação das pessoas com necessidades educacionais especiais, resumidamente assim dispostas: o desenvolvimento de programas educacionais em todos os municípios em parceria com as áreas de saúde e assistência social, visando à ampliação da oferta de atendimento desde a educação infantil até a qualificação profissional dos alunos; as ações preventivas nas áreas visual e auditiva até a generalização do atendimento aos alunos na educação infantil e no ensino fundamental; o atendimento preferencial na rede regular de ensino ao atendimento extraordinário em classes e escolas especiais e 6

a preferência pela educação continuada dos professores que estão em exercício para formação em instituições de ensino superior. Seguindo o entendimento legal, o Conselho Nacional de Educação, em conjunto com a Câmara de Educação Básica, instituiu as diretrizes nacionais para a Educação Especial na Educação Básica mediante a publicação da Resolução CNE/CEB nº 2, de 11 de setembro de 2001, enfatizando a universalidade do acesso da criança deficiente ao sistema regular de ensino, por intermédio da adequação deste para o pleno exercício do direito à educação, conforme se depreende dos artigos 2º e 7º, quais sejam: Art 2º Os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas organizar-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para uma educação de qualidade para todos. Art. 4º Como modalidade da Educação Básica, a educação especial considerará as situações singulares, os perfis dos estudantes, as características bio-psicossociais dos alunos e suas faixas etárias e se pautará em princípios éticos, políticos e estéticos de modo a assegurar: I - a dignidade humana e a observância do direito de cada aluno de realizar seus projetos de estudo, de trabalho e de inserção na vida social; II - a busca da identidade própria de cada educando, o reconhecimento e a valorização das suas diferenças e potencialidades, bem como de suas necessidades educacionais especiais no processo de ensino e ampliação de valores, atitudes, conhecimentos, habilidades e competências; III - o desenvolvimento para o exercício da cidadania, da capacidade de participação social, política e econômica e sua ampliação, mediante o cumprimento de seus deveres e o usufruto de seus direitos. Art. 7º O atendimento aos alunos com necessidades educacionais especiais deve ser realizado em classes comuns do ensino regular, em qualquer etapa ou modalidade da Educação Básica. (Grifos nossos). Assevera-se que é condição indispensável à inclusão do aluno a acessibilidade deste às instituições educacionais, bem como a toda infra-estrutura destas. Neste sentido, o Decreto nº 5.296, de 2 de dezembro de 2004, que regulamenta as Leis nº 10.048, de 8 de novembro de 2000, que dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica, e 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências no caput do artigo 24, e seu 2º, prescreve que tal acessibilidade deverá ser garantida nas escolas da rede regular de ensino, como se segue: Art. 24. Os estabelecimentos de ensino de qualquer nível, etapa ou modalidade, públicos ou privados, proporcionarão condições de acesso e utilização de todos os seus ambientes ou compartimentos para pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, 7

inclusive salas de aula, bibliotecas, auditórios, ginásios e instalações desportivas, laboratórios, áreas de lazer e sanitários. 2o As edificações de uso público e de uso coletivo referidas no caput, já existentes, têm, respectivamente, prazo de trinta e quarenta e oito meses, a contar da data de publicação deste Decreto, para garantir a acessibilidade de que trata este artigo. Trata do mesmo assunto a Portaria nº 3.284, de 7 de novembro de 2003, do Ministério da Educação, qual seja: Dispõe sobre requisitos de acessibilidade de Pessoas Portadoras de Deficiência, para instruir os processos de autorização e de reconhecimento de cursos, e de credenciamento de instituições. No âmbito do Estado de Minas Gerais, a Lei nº 9.684, de 12 de outubro de 1988, que dispõe sobre a matrícula de deficiente físico em escola pública estadual, garantiu ao portador de deficiência a prerrogativa da inscrição na escola estadual mais próxima a sua casa, conforme seu artigo 1º: Art. 1º - Fica assegurada ao deficiente físico portador de doença que dificulte a locomoção matrícula automática na escola pública estadual de 1º e 2º graus mais próxima de sua residência. Ainda no contexto do Estado de Minas Gerais, a Resolução nº 451, de 27 de maio de 2003, do Conselho Estadual de Educação, que fixa normas para a Educação Especial no Sistema Estadual de Ensino, garante, notadamente, no Parágrafo Único do artigo 1º o acesso da pessoa portadora de deficiência à Educação Especial na rede regular de ensino: Art. 1º - Parágrafo único A Educação Especial será oferecida, preferencialmente, na rede regular de ensino. A Lei Orgânica do Município de Belo Horizonte, de 21 de março de 1990, enfatizou o direito do portador de deficiência ao acesso à rede regular de ensino, haja vista o texto do inciso VIII do 1º: Art. 157 - A educação, direito de todos, dever do Poder Público e da sociedade, tem como objetivo o pleno desenvolvimento do cidadão, tornando-o capaz de refletir sobre a realidade e visando à qualificação para o trabalho. 1º - O dever do Município com a educação implica a garantia de: VIII - atendimento educacional especializado ao portador de deficiência, sem limite de idade, na rede regular de ensino, bem como vaga em escola próxima a sua residência; (Grifo nosso) 8

Seguindo igual orientação, a recém editada Lei nº 9.078, de 19 de janeiro de 2005, que estabelece a política da pessoa com deficiência para o Município de Belo Horizonte e dá outras providências, assegura a inclusão do portador de deficiência em todas as modalidades de ensino, possibilitando que estes possam estudar em estabelecimentos de ensino próximos as suas residências, consoante a redação do artigo 50, que dispõe: Art. 50 - Fica assegurada, no Sistema Municipal de Ensino, a inclusão escolar de crianças, jovens e adultos em todos os níveis e modalidades de ensino, garantindo-lhes o acesso, a permanência e uma educação de qualidade. Parágrafo único - A matrícula desses educandos será efetivada de acordo com a região de moradia, observando-se os parâmetros e critérios do cadastro geral do Estado e do Município. Além do mais, conforme o disposto no 2º do artigo 24 do Decreto Federal nº 5.296/04, o Ministério da Educação, no que concerne às instituições de nível superior públicas e privadas e demais instituições de nível federal situadas em Minas Gerais, a Secretaria Estadual de Educação de Minas Gerais, no que concerne aos estabelecimentos de ensino estaduais sob sua fiscalização e a Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte, no que concerne aos estabelecimentos de ensino municipais, deverão estar atentas para efetuarem as modificações previstas nos prazos contidos no dispositivo acima aludido. Para isto, as instituições de ensino federais, estaduais e municipais deverão prover aos alunos com necessidades especiais as condições para que seu aprendizado se dê em um contexto integrado ao dos demais alunos, como forma de reconhecimento e valorização da diversidade e respeito à dignidade das pessoas portadoras de deficiência. Vê-se, pois, na legislação pertinente à matéria, que a inclusão do aluno portador de deficiência na rede regular de ensino é direito líquido e certo, cabendo ao Poder Público proporcionar sua efetiva concretização. Juntando-se a tudo que foi exposto, entendemos que a Educação Especial é modalidade de ensino na Educação Básica, apresentando os mesmos objetivos, princípios e diretrizes das etapas da mesma, devendo, portanto, proporcionar aos alunos que apresentam necessidades especiais as condições necessárias para acesso, percurso e permanência na escola regular, desenvolvendo, para tanto, suas potencialidades em escolas e serviços educacionais competentes para tal finalidade. Na trajetória histórica da educação brasileira, vislumbramos um novo cenário de consciência em que a inclusão social e educacional é tarefa que se espera de todos. 9

BIBLIOGRAFIA 1. CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito constitucional didático. 7. ed. rev. ampl. e atual, Belo Horizonte: Del Rey, 2001. 2. ARROYO, Miguel. Escola: fronteira avançada dos direitos.. Belo Horizonte: Secretaria de Educação, 1996. ÍNDICE DA LEGISLAÇÃO CITADA 1. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 2. CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE MINAS GERAIS DE 1989 3. DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, PROMULGADA NA CONFERÊNCIA MUNDIAL SOBRE NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS DE 1994 4. LEI FEDERAL Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990 - ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE 5. LEI FEDERAL Nº 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996, QUE ESTABELECE AS DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL 6. DECRETO FEDERAL Nº 3.298, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1999, QUE REGULAMENTA A LEI Nº 7.853, DE 24 DE OUTUBRO DE 1989, DISPÕE SOBRE A POLÍTICA NACIONAL PARA A INTEGRAÇÃO DA PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA, CONSOLIDA AS NORMAS DE PROTEÇÃO, E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS 7. LEI FEDERAL Nº 10.172, DE 9 DE JANEIRO DE 2001, QUE APROVA O PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS 8. RESOLUÇÃO DO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO Nº 2, DE 11 DE SETEMBRO DE 2001, QUE INSTITUI DIRETRIZES NACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO ESPECIAL NA EDUCAÇÃO BÁSICA 10

9. DECRETO FEDERAL Nº 5.296, DE 2 DE DEZEMBRO DE 2004, QUE REGULAMENTA AS LEIS Nº 10.048, DE 8 DE NOVEMBRO DE 2000, QUE DÁ PRIORIDADE DE ATENDIMENTO ÀS PESSOAS QUE ESPECIFICA, E 10.098, DE 19 DE DEZEMBRO DE 2000, QUE ESTABELECE NORMAS GERAIS E CRITÉRIOS BÁSICOS PARA A PROMOÇÃO DA ACESSIBILIDADE DAS PESSOAS PORTADORAS DE DEFICIÊNCIA OU COM MOBILIDADE REDUZIDA, E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS 10. PORTARIA DO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO Nº 3.284, DE 7 DE NOVEMBRO DE 2003, QUE DISPÕE SOBRE REQUISITOS DE ACESSIBILIDADE DE PESSOAS PORTADORAS DE DEFICIENCIA, PARA INSTRUIR OS PROCESSOS DE AUTORIZAÇÃO E DE RECONHECIMENTO DE CURSOS, E DE CREDENCIAMENTO DE INSTITUIÇÕES 11. LEI ESTADUAL Nº 9.684, DE 12 DE OUTUBRO DE 1988, QUE DISPÕE SOBRE A MATRÍCULA DE DEFICIENTE FÍSICO EM ESCOLA PÚBLICA ESTADUAL 12. RESOLUÇÃO DO CONSELHO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO Nº 451, DE 27 DE MAIO DE 2003, QUE FIXA NORMAS PARA A EDUCAÇÃO ESPECIAL NO SISTEMA ESTADUAL DE ENSINO 13. LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE, DE 21 DE MARÇO DE 1990. 14. LEI MUNICIPAL Nº 9.078, DE 19 DE JANEIRO DE 2005, QUE ESTABELECE A POLÍTICA DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA PARA O MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS 11