OS COMPONENTES ORACIONAIS DO SISTEMA DE TRANSITIVIDADE (GSF) REPRESENTANDO A MUDANÇA EM CRÔNICA DE LYA LUFT
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1 OS COMPONENTES ORACIONAIS DO SISTEMA DE TRANSITIVIDADE (GSF) REPRESENTANDO A MUDANÇA EM CRÔNICA DE LYA LUFT BECKER, Lucélia Paz; BORTOLUZZI, Valeria Iensen Artigo realizado, a partir do trabalho de conclusão do curso de Especialização em Representação e Linguagem: ênfase em Linguística, do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA). Graduada em Letras-Português pela UFSM lupbeck@hotmail.com Profa. Dr. Do Curso de Letras da Unifra valeria.bortoluzzi@gmail.com RESUMO As importantes considerações de Halliday & Matthiessen (2004) sobre a Linguística Sistêmico- Funcional (LSF) nos indicam que estudar os usos da língua não basta para conhecermos melhor o seu funcionamento e a sua estrutura global, pois é essencial investigarmos as formas sociais subjacentes à língua. Nessa perspectiva, buscamos interpretar o como os componentes oracionais do Sistema de Transitividade (GSF) representam a mudança na crônica Entrando no ano novo, de Lya Luft. Em princípio, manualmente, encontramos as ocorrências de seus processos, participantes e circunstâncias. Após, considerando os estudos funcionais de Halliday & Matthiessen (2004) e Ghio e Fernández (2008), realizamos uma análise do significado desses elementos no texto citado. Os resultados indicam uma quantidade significativa de processos realizados por seres humanos ou personificados. Assim, acabamos obtendo as diferentes maneiras pelas quais a materialidade linguística identifica a transformação na referida crônica. Palavras-chave: Gramática Sistêmico-Funcional; crônica de Lya Luft; representação da mudança. INTRODUÇÃO Com a crescente demanda de estudos investigativos na área da Linguística Sistêmico- Funcional (LSF), há uma intensa busca por um maior detalhamento dos elementos constituintes de uma oração. Esse fato nos levou a observar a representação linguística da mudança dada pelos componentes oracionais que formam o Sistema de Transitividade da Gramática Sistêmico-Funcional (GSF), na crônica Entrando no ano novo, da autora Lya Luft. A escolha por essa temática advém da recorrência desse tipo de representação nas crônicas de Luft, pois a autora, muitas vezes, parece valorizar o tema transformação, através do seu breve relato e/ou de sua reflexão a respeito de um tema polêmico da nossa sociedade. Dessa maneira, tal seleção nos fez atentar para a forma como os elementos
2 oracionais formadores do Sistema de Transitividade constituem a experiência pela Metafunção Ideacional. Essa metafunção da GSF, ou seja, essa construção gramatical determinada em texto para desempenhar função experiencial da linguagem nos possibilita estruturar os elementos linguísticos relacionados à mudança em termos de processos, participantes e circunstâncias. Tal manifestação linguística juntamente com duas outras: a interpessoal e a textual determinam a Gramática Sistêmico-Funcional (GSF). Portanto, conseguimos ter uma boa ideia do como os componentes oracionais determinados pela GSF são utilizados para representar a mudança na crônica de Lya Luft. Isso que decorre não só da identificação e da classificação desses elementos ideacionais como também da discussão dos efeitos de sentido gerados por esses elementos na construção do contexto social. A LSF E A REPRESENTAÇÃO DE MUDANÇA A linguagem é a forma que utilizamos para interagir na sociedade, pois buscamos a troca de informações, ou seja, procuramos nos comunicar. Essa interação é analisada pela GSF, a partir do momento em que acabam sendo observadas as relações existentes entre o significado (teoria semântica) e a utilização social (funcionalidade) de uma língua. O modelo delimitado por Halliday (a GSF) prevê a estratificação das unidades linguísticas, através de uma organização dessas estruturas em unidades de classes. Nele, apresenta-se como a mais alta classe (estrato), a Semântica, após a Léxico-gramática e a Grafologia/Fonologia. A partir disso, a linguagem se constitui como uma rede sistemática de significados, a qual não abarca apenas um sistema linguístico, mas também uma estrutura que contém informações do contexto social. Quanto ao sistema linguístico, percebemos que possui três subníveis organizados sistematicamente: o semântico, o léxico-gramatical e o fonológico. Os estratos semântico e léxico-gramatical são interdependentes, pois na perspectiva sistêmico-funcional, o primeiro (nível da significação) existe por meio das formas linguísticas (nível da estruturação) que o realizam. Dessa relação, pode se constatar que o significado linguístico não consegue representar a realidade fielmente, mas faz uma importante ponte entre o contexto e a estrutura de uma língua. A estrutura semântica existe em três planos distintos, segundo a relação que a oração estabelece com seus falantes e/ou ouvintes: o plano da Metafunção Ideacional (ou Representativa), o plano da Metafunção Interpessoal e o plano da Metafunção Textual. Cada uma dessas formas de significação se realiza diferentemente, ao possuir uma característica peculiar na oração, isto é, no estrato gerador dos constituintes léxicogramaticais da língua. Dessa divisão, destacamos a Metafunção Ideacional, que é representada pelo Sistema de Transitividade.
3 Segundo Ghio & Fernández (2008, p.93), o Sistema de Transitividade pode ser definido tanto como um recurso gramatical formador do fluxo de experiência, quanto como um processo realizado gramaticalmente pela oração. Graças às opções selecionadas por esse sistema no conjunto linguístico (léxico-gramatical), a função experiencial consegue fazer a representação dos elementos naturais e socioculturais (discursivos) presentes em nossa sociedade, apresentando a maneira pela qual a experiência real (concreta e simbólica) de uma pessoa constitui-se em seus discursos. A partir disso, há seis tipos de processos na GSF: o, o Mental, o Relacional, o Existencial, o Verbal e o Comportamental. Os três primeiros são os principais e os outros três, intermediários, pois estes compartilham algumas características com aqueles. O Processo, geralmente, envolve ações e eventos (acontecimentos) concretos. Os principais constituintes desse processo são o Ator, a Meta e a Circunstância, conforme Ghio & Fernández (2008, p. 101). O primeiro elemento está sempre presente na oração material, tanto explícito como implícito. O segundo refere-se àquilo que determina a extensão do processo. O terceiro delimita algo, especialmente, no tempo e no espaço, podendo se relacionar a outros dois elementos: o Beneficiário (recebedor do produto da ação) e o Escopo (objetivo tencionado pelo Ator). O Processo Mental refere-se à observação da mente pela experiência de mundo da nossa própria consciência. Ele possui uma estrutura fixa: o Experienciador (o participante que experiencia por possuir consciência) e o Fenômeno (o componente percebido, produto da imaginação do Experienciador). Quanto ao último, é importante citar que o mesmo pode ser tanto um objeto (o carro), uma instituição (a escola), um ato (a dança) quanto uma oração dentro do processo, como em Paulo pensou: Sou um gênio. Nesse exemplo, a segunda oração representa um pensamento projetado por um processo mental. A partir disso, os Processos Mentais podem ser classificados como Perceptivos (formação das percepções, pelos 5 sentidos), Cognitivos (identificação do que é pensado à mente), os Desiderativos (expressão do próprio desejo de obter algo) e Emotivos ou Afetivos (demonstração dos graus de afeição). Já, segundo Ghio & Fernández (2008), o Processo Relacional irá fazer a relação entre os diferentes constituintes oracionais. Seus participantes principais são o Portador e o Atributo ou o Identificador e o Identificado. Ainda há Processo Comportamental. Ele possui características dos Processos Mentais e dos Verbais, ao se situar entre eles, referindo-se aos s de comportamento fisiológico instintivamente humanos, como respirar, chorar e sonhar. Seu principal componente é o Comportante. Outro processo funcional é o relacionado à existência, o Existencial. Seu participante é descrito como o representante daquilo que existe/acontece, geralmente, em um determinado
4 lugar. Com a sua oração não tendo sujeito, seu verbo principal é o haver. Mesmo que a oração existencial seja realizada por processo do ser, distingue-se da relacional, por constituir-se de um elemento, o Existente. Além desse tipo de processo, há o Processo Verbal. Ele é a conjunção das formas mentais com as relacionais, ou seja, é o verbo dizer. Essa estrutura possui aquilo que é verdadeiramente dito: a locução e quatro participantes: o (falante), a (o dito e representado), o Receptor (ouvinte) e o Alvo (entidade atingida). Portanto, esse escopo teórico da Linguística Sistêmico-Funcional (LSF) nos fornece os subsídios necessários para realizarmos uma criteriosa observação a respeito dos diversos componentes linguísticos que representam a mudança na crônica Entrando no ano novo, de Lya Luft, ao nos permitir fazer duas importantes análises com relação à ocorrência dos processos, dos participantes e das circunstâncias: a quantitativa e a qualitativa. METODOLOGIA Para a realização deste trabalho, foi selecionado o exemplar de uma crônica que trata da representação da mudança. Esse texto intitulado Entrando no ano novo foi escrito por Lya Luft, na seção Ponto de vista, da revista Veja, com publicação impressa e on-line (nosso dispositivo) no ano de Essa revista da Editora Abril é a revista semanal brasileira de maior circulação nacional, pois tem um forte caráter investigativo e esclarecedor, na abordagem de temas do cotidiano da sociedade. A nossa base teórico-metodológica é a Linguística Sistêmico-Funcional (LSF), em especial, o estudo de Halliday & Matthiessen (2004) e Ghio e Fernández (2008). Esse escopo nos possibilitou a análise da língua por um novo viés, o do contexto social. Assim, primeiramente, decompusemos a referida crônica em orações, as quais foram fragmentadas em processos, participantes e circunstâncias, quando essas construções remetiam à mudança. Após, essas ocorrências foram quantificadas e classificadas, de acordo com o Sistema de Transitividade. Por fim, realizamos uma discussão sobre as ocorrências predominantes, observando como foi representada a mudança, pelos componentes oracionais do Sistema de Transitividade (Metafunção Ideacional GSF). RESULTADOS E DISCUSSÃO A crônica intitulada Entrando no ano novo, da autora Lya Luft, foi veiculada no dia 11 de janeiro de 2006, na seção Ponto de vista da revista Veja. Esse texto busca fazer uma reflexão a respeito da forma como começamos o ano. A importância de repensar uma nova era é apresentada, através de exemplos do nosso dia a dia, que demonstram a inevitável mudança pela qual devemos passar, eliminando tanto os nossos hábitos quanto as nossas crenças ultrapassadas.
5 Ao analisar essa crônica, encontramos 22 orações referentes à mudança. Elas são representadas pelos processos formadores do Sistema de Transitividade (GSF) presentes no quadro abaixo. Dos seis diferentes s de representar as nossas experiências, ocorreram quatro: 08 Processos Materiais, 07 Processos Verbais, 05 Processos Relacionais e 02 Processos Mentais. Essa escala quantitativa em ordem decrescente nos permite ver a grande quantidade de processos realizados por seres humanos ou personificados (processos materiais e verbais). Graças à atuação de cada um de nós em determinado contexto de cultura ou de situação, há o constante desenvolvimento e/ou a transformação da sociedade. Isso pode ser observado na própria designação do rito de passagem de ano, pois no texto, ele parece ser apresentado de duas formas distintas. Observemos: 1ª Oração: Entrando no ano novo (título) 2ª Oração: Falo de uma entrada em um novo ano (l.1 do lead) Na primeira oração, conseguimos perceber que o verbo entrar no gerúndio demonstra o início de uma contínua mudança a ser exercida pelo homem. Com sua relevância visivelmente destacada no texto, esse verbo denominador de processo material não sinaliza explicitamente seu agente, pois já se sabe quem fará essa ação: todos nós que seguimos o calendário ocidental e que reconhecemos o dia 01 de janeiro como o começo de ano referido no texto. Porém, na segunda oração, a autora apresenta-se como o do processo verbal representado pelo verbo falar, pois, ao usar esse verbo em primeira pessoa, deixa transparecer que o eu representa aqueles que realizarão o ato de passagem de ano inscrito na oração, através de uma nominalização do verbo entrar, a entrada, a qual é seguida de uma locução adverbial formada pela construção atípica relacionada à virada de ano: em um novo ano. Tal estrutura concretizada pelo deslocamento da palavra novo para frente da palavra ano tem o intuito de evidenciar como devemos receber a mudança temporal. Além desses exemplos relativos à mudança, é fundamental citarmos aquele que mantém a sintonia dos outros citados, o verbo abrir. Esse verbo no gerúndio acaba fazendo alusão ao presente e marcando infinitude, como podemos ver: 3ª Oração:... abrindo as portas e as janelas da casa e da alma. (l. 2 do lead) Já essa terceira oração possui outro verbo indicador de processo material no gerúndio, o abrir.o uso desse verbo remete à passagem de ano, a qual representa a mudança como associada à concretude, sendo casa e alma os espaços a sofrerem a transformação, o primeiro referindo-se a uma habitação do mundo externo (o bem imóvel) e o segundo referindo-se a uma construção interna (o coração).
6 Mas a lógica desses processos serem reproduzidos pela sua própria constância ideativa não é interrompida e na oração seguinte podemos perceber essa ideia: 4ª Oração: (um novo ano que seja) Sem frescura, sem afetação, sem mau humor, sem pressão, nem formalidade (l.4) A partir da oração subentendida um novo ano que seja conseguimos evidenciar que o verbo ser no subjuntivo acaba demonstrando um processo relacional marcado por um provável futuro de alguns dos muitos comportamentos, especialmente, psicológicos: frescura, afetação, mau humor, pressão e formalidade. Na crônica, esse grupo possui seu nível de negatividade muito elevado, quando a autora apresenta novamente a expressão "novo ano, a fim de reforçar a ideia de essas formas impedirem o florescer da mudança, ao funcionarem como antíteses da transformação. Com isso, conseguimos perceber uma significativa quantidade de processos realizados pelo homem ou por uma personificação de homem. Esses Processos materiais e os verbais designam não só o tipo de participante a agir em prol da mudança como também identificam a passagem de ano como um elemento metafórico a ser visto em sua materialidade. CONSIDERAÇÕES FINAIS Graças à Linguística Sistêmico-Funcional (LSF), conseguimos observar que a quantidade de Processos Materiais e Verbais existentes na crônica citada é muito próxima (08 Processos Materiais e 07 Verbais). Isso, provavelmente, ocorre por esses dois tipos de processos existirem pela intervenção de uma entidade humana ou personificada, que associada à concretude dos componentes oracionais da LSF, nos permite evidenciar as diferentes significações relativas à mudança na crônica. Assim, destacamos a relevância dos elementos linguísticos do Sistema de Transitividade (GSF) na representação da mudança na crônica Entrando no ano novo. Esses constituintes oracionais denominados como processos, participantes e circunstâncias, pela Gramática Sistêmico-Funcional (GSF) nos possibilitaram realizar não só a identificação e a classificação de cada um desses elementos que representam a transformação no texto citado, mas também nos permitiram discutir o significado dessas estruturas na formação do contexto social.
7 REFERÊNCIAS FUZER, C.; CABRAL, S. Introdução à gramática sistêmico-funcional em língua portuguesa. Santa Maria: Universidade Federal de Santa Maria, Centro de Artes e Letras, Departamento de Letras Vernáculas, Núcleo de Estudos em Língua Portuguesa, GHIO, E. ; FERNÁNDEZ, M. D. Lingüística Sistémico Funcional. Aplicaciones a la lengua española. 1ª Ed.- Santa Fé: Universidad Nacional de llitoral, Waldhuter Editores, HALLIDAY, M.; MATTHIESSEN, C. An introduction to functional grammar. 3th. ed. London: Arnold, LUFT, L. Entrando no ano novo. [Crônica]. Veja, ed.1938, jan Disponível em: < Acesso em: 04 jun
8 Tabela 1 - Quadro com as orações referentes à mudança Or. 1º Processo 2º Participante 3º Participante Circunstância Participante 1ª Entrando 1- no ano novo tempo 2ª (Eu) Falo Verbal de uma entrada em um novo ano 3ª [[abrindo as portas e as 1- da casa janelas]] 2-da alma Meta 4ª (um novo ano que Portador 5ª (Eu) 6ª (Eu) 7ª eu 8ª (Eu) seja) Relacional Falarei Verbal Falarei Verbal fale Verbal Falo Verbal 9ª de recomeçar 10ª (Eu) Falo Verbal 11ª Abrindo 1- da virada de ano convencional 2- do tempo de festas [[em que...]] Verbiagens do começo de ano amargo de um começo de ano mais simples de uma tentativa real de uma entrada em um ano novo as portas e as janelas Meta lugar 1- Sem frescura 2- sem afetação 3- sem mau humor 4- sem pressão 5-nem formalidade Atributos 1- não 1- Não 1- Talvez 1-casa; 2-alma lugar
9 12ª (um ano novo que seja) Portador Relacional 13ª Pensando Mental 14ª a gente poderia ser Portador Relacional (verbo ser ) 15ª Ser Relacional 16ª Fazer 17ª Inventando 18ª querer Mental 19ª [[entrar 20ª [[começar 21ª (Eu) falarei Verbal feliz Meta novos s Meta o novo ano Meta de festas de passagem de ano 1- mais irmão 2- e mais amigo, 3- mais filho e 4- mais pai ou mãe, 5- mais humano, 6- mais simples, 7- mais desejoso de Atributos feliz Atributo a si mesmo Experienciador 1- Sem frescura 2- sem afetação, 3- sem mau humor 4- sem pressão 5- nem formalidade Atributos 1- bem; 2- sobretudo 1- sem nostalgia melancólica; 2- sem suspiros patéticos; 3- sem lamentações inoportunas...]] num clima positivo]] lugar 1-Não; 2-nunca e de frequência
10 22ª a gente Portador sendo Relacional 1- menos arrogante 2- menos fria, 3- menos desinteressante4- mais... gente. Atributos 1- Com um pouco mais de aproximação, de reflexão, de algum otimismo
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