EFEITOS ALELOPÁTICOS DE FOLHAS INTEIRAS E TRITURADAS DE STRYPHNODENDRON ADSTRINGENS

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1 EFEITOS ALELOPÁTICOS DE FOLHAS INTEIRAS E TRITURADAS DE STRYPHNODENDRON ADSTRINGENS (MART.) COVILLE E POUTERIA TORTA (MART.) RADLK SOBRE O DESENVOLVIMENTO INICIAL DE SESAMUM INDICUM L. Layse E. dos S. Guimarães, Fabrícia C. M. Mota, Fabian Borghetti (Depart. de Botânica, Universidade de Brasilia, , Brasilia, DF, Brasil. borghetao@yahoo.com.br). Termos para indexação: Alelopatia, Cerrado, lixiviação, plantas nativas do Cerrado Introdução Alelopatia é definida como o efeito direto ou indireto, benéfico ou maléfico de uma planta sobre outra através da produção de compostos químicos que são liberados no meio ambiente. Esses agentes alelopáticos são geralmente compostos secundários produzidos pelas plantas e liberados por lixiviação, volatilização, decomposição e exudados da raiz (Ferreira, 2004). Compostos secundários com propriedades alelopáticas são chamados aleloquímicos. Estudos têm mostrado propriedades alelopáticas em diversas espécies do Cerrado, tais como tais como Eugenia dysenterica DC., Qualea parviflora Mart., Campomanesia adamantinum Cambess., Trembleya parviflora (D. Don) Cogn. (Borghetti, 2005), Solanum lycocarpum St. Hil. (Oliveira et al 2004), Andira humilis Mart. ex Benth. (Periotto et al, 2004), Aristolochia esperanzae O. Kuntze (Gatti et al, 2004), entre outras. Boa parte dos estudos conduzidos em laboratório visam determinar o potencial alelopático de tecidos vegetais, seus efeitos no crescimento e metabolismo de espécies alvo e, sempre que possível, identificar as moléculas envolvidas (Macías et al, 2004). Entretanto, na maioria das vezes se questiona se os efeitos observados em laboratório poderiam ser observados também em condições naturais, como foi o caso descrito da invasora Centaurea maculosa (Bais et al, 2003). Quanto ao Cerrado, embora diversas plantas apresentem propriedades alelopáticas, até o momento não existem estudos comprovando a participação da alelopatia nas interações entre as espécies nativas. Por outro lado, para extrapolar estudos de laboratório ao campo deve-se, primeiramente, realizar em laboratório formas de extração que sejam possíveis de ocorrer em campo, como a

2 extração aquosa, simulando a ação da chuva (Ferreira, 2004), quantidades de folhas e concentrações compatíveis ao que possa ser encontrado no solo, entre outros cuidados preliminares. É também desejável que os experimentos conduzidos em laboratório busquem reproduzir na medida do possível condições climáticas encontradas na região, como temperatura e fotoperíodo. Em vista das considerações acima, o propósito do presente trabalho foi 1) caracterizar em laboratório propriedades alelopáticas de folhas de Stryphnodendron adstringens e Pouteria torta, duas espécies de ampla distribuição no Cerrado, 2) verificar se folhas intactas liberam substâncias alelopáticas quando em meio aquoso, buscando simular efeitos da chuva na lixiviação de compostos alelopáticos, 3) verificar se a secagem das folhas comprometem suas propriedades alelopáticas, simulando uma situação de dessecamento das folhas no solo. Material e Métodos O trabalho foi conduzido no Laboratório de Termobiologia, UnB Campus Universitário Darcy Ribeiro, 15º, 46, 11 S - 47º, 52, 6 W, altitude 1038 m. As arbóreas selecionadas foram: Stryphnodendron adstringens (Mart.) Coville, o conhecido barbatimão, e Pouteria torta (Mart.) Radlk, conhecido por alguns como pêssego-do-cerrado. Ambas são de ocorrência comum no Cerrado. Preparo dos extratos: Folhas maduras foram coletadas de indivíduos ocorrentes no referido campus. Estas foram separadas em três tratamentos, para cada espécie: Folhas frescas inteiras, folhas frescas trituradas e folhas secas em estufa (50 C/24h) e trituradas. A trituração foi feita em pequenos pulsos, no liquidificador, obtendo-se folhas em fragmentos, mas sem pulverizá-las. Para cada tratamento, foram preparadas soluções aquosas na proporção de 5g de material vegetal para um volume final de 100 ml, obtendo assim soluções 5% (p/v). As soluções foram mantidas refrigeradas (10ºC) por 24h para extração aquosa com mínimo perigo de infestação por fungos (Ferreira e Áquila, 2000). Após, as soluções foram filtradas em papel de filtro Reagem qualitativo e, a partir da solução obtida (5% p/v), preparou-se também soluções de concentrações 3% e 1% por diluição. Assim, para cada tratamento, foram testadas três concentrações. Água destilada foi o controle.

3 Bioensaios de crescimento: A espécie alvo utilizada como bioensaio foi o gergelim (Sesanum indicum L.), cujas sementes foram obtidas por plantio nos canteiros do laboratório. Em testes de laboratório as sementes apresentaram viabilidade entre 80 a 90%. Sementes de gergelim foram germinadas em água, a 30ºC, para obtenção de material para os bioensaios de crescimento. Para estes, foram selecionadas sementes por uniformidade de tamanho da radícula, e transferidas para placas de petri 15cm revestidas com folha de papel filtro e umedecidas com 10 ml de cada extrato (tratamento), para cada concentração, para cada espécie. As placas foram colocadas em câmara de germinação a 30 C, sob fotoperíodo de 12h (luz branca, 4 W.m -2.s -1 ), e o crescimento foi acompanhado diariamente por cinco dias. Após, as plântulas foram retiradas e as seguintes características morfológicas foram avaliadas: presença de pêlos radiculares, raizes laterais, necroses e escurecimento; comprimento médio das partes aéreas e radiculares (com auxilio de um paquímetro digital Mitutoyo). Analise estatística: Para cada tratamento (condição da folha) e para cada concentração (1, 3, 5%) foram feitas 3 replicatas de 10 sementes, para cada espécie investigada. O controle foi triplicata em água destilada. Os comprimentos médios das partes aéreas e radiculares foram comparados através do teste do Mann-Whitney, para um p<0.05), através do pacote estatístico Biostat 2.0 (Ayres et al 2000). Resultados e discussão Extratos foliares de Pouteria torta: Foram preparados extratos aquosos foliares a partir de folhas frescas intactas, folhas frescas, porém trituradas, e folhas secas e trituradas. Observa-se que extratos aquosos obtidos a partir de folhas inteiras não interferem significativamente no crescimento inicial do gergelim, em nenhuma das concentrações testadas (figura 1). Morfologicamente as plântulas se apresentaram similares ao controle, com raizes longas e claras, com pêlos radiculares e raízes laterais, e desenvolvimento normal da parte aérea, exceto a 5%, onde as raízes apresentaram-se um pouco amareladas e menores comparadas ao controle. Plântulas crescidas nos extratos aquosos de folhas frescas trituradas apresentaram a parte aérea desenvolvida e semelhante às plântulas do controle, porém, as raizes apresentaram

4 redução significativa no comprimento médio (figura 1). Nos extratos a 3% e 5% as raízes se tornaram escurecidas, houve redução de pêlos radiculares, e indução de raízes laterais pequenas e claras. Na concentração de 5% observou-se, também, tombamento de plântulas causado devido à falta de estrutura radicular de suporte ao crescimento em altura das plântulas, provavelmente em decorrência do reduzido desenvolvimento radicular (figura 1). A secagem das folhas antes do preparo dos extratos não interferiu nas propriedades alelopáticas de Pouteria torta (figura 1). Embora a parte aérea não tenha sido significativamente afetada, a redução do crescimento radicular foi evidente, inclusive, foi o tratamento que apresentou os efeitos morfológicos mais nítidos. As raizes a 1% já apresentaram leve escurecimento e pêlos radiculares. Nas concentrações de 3% e 5% as raízes tiveram um aumento do diâmetro e redução do comprimento. Isto já havia sido verificado por Oliveira et al (2004) em raízes de plântulas de gergelim submetidas à extratos aquosos de Solanum lycocarpum St. Hil.. Os tecidos radiculares apresentaram-se escurecidos, não houve presença dos pêlos radiculares e suas raízes laterais eram pequenas e claras. 4 2 comprimento (cm) % 3% 5% 1% 3% 5% 1% 3% 5% FFI FFT FST CTR Figura 1: Comprimento médio de raizes e partes aéreas de plântulas de Sesamum indicum crescidas em extratos aquosos de folhas de Pouteria torta sob diferentes formas de preparo: FFI Folhas frescas inteiras; FFT Folhas frescas trituradas; FST Folhas secas trituradas. CTR Controle. O

5 experimento foi conduzido à 30ºC, sob fotoperíodo de 12 h, por cinco dias. Parte superior: Crescimento aéreo; Parte inferior: Crescimento radicular. Barras representam os desvios padrões. Extratos foliares de Stryphnodendron adstringens: Extratos preparados a partir de folhas frrescas inteiras não afetaram significativamente o crescimento de plântulas de gergelim, quando comparadas ao controle (figura 2). Morfologicamente as plântulas se apresentaram similares ao controle, com bom desenvolvimento radicular e produção de pêlos radiculares, exceto a 5%, cujo crescimento radicular apresentou uma pequena redução (figura 2). Extratos aquosos obtidos a partir de folhas frescas trituradas, embora não tenham afetado o crescimento aéreo, inibiram significativamente o crescimento radicular em todas as concentrações testadas (figura 2). Nas concentrações de 3% e 5% ocorreu um aumento do diâmetro e redução do comprimento radicular, tombamento de algumas plântulas, presença de pêlos radiculares também nas raízes laterais, mas raros ou ausentes na raiz principal. O escurecimento das raizes pôde ser também observado. Similar ao observado com folhas de Pouteria torta, a secagem das folhas de Stryphnodendron adstringens antes do preparo dos extratos não comprometeu as propriedades alelopáticas dos tecidos foliares (figura 2). Na maioria das plântulas ocorreu escurecimento das raízes primárias, aumento de diâmetro e diminuição do comprimento destas, indução de pêlos radiculares nas raízes laterais, mas uma diminuição destes nas raízes primárias, e muitas plântulas tombaram em concentrações de 3% e 5%.

6 4 2 comprimento (cm) % 3% 5% 1% 3% 5% 1% 3% 5% FFI FFT FST CTR Figura 2: Comprimento médio de raizes e partes aéreas de plântulas de Sesamum indicum crescidas em extratos aquosos de folhas de Stryphnodendron adstringens sob diferentes formas de preparo: FFI Folhas frescas inteiras; FFT Folhas frescas trituradas; FST Folhas secas trituradas. CTR Controle. O experimento foi conduzido à 30ºC, sob fotoperíodo de 12 h, por cinco dias. Parte superior: Crescimento aéreo; Parte inferior: Crescimento radicular. Barras representam os desvios padrões. As raizes se apresentaram mais afetadas pelos extratos, corroborando que raizes são de fato mais sensíveis a agentes alelopáticos que as partes aéreas (Ferreira 2004). Pires e colaboradores (2001) atribuem o menor efeito dos aleloquímicos na parte aérea ao fato do crescimento inicial desta ser auxiliado por reservas contidas nas sementes. Entretanto, não se pode descartar a possibilidade dos aleloquímicos não serem transportados em quantidade significativa a ponto de exercer efeitos na parte aérea. Os pequenos desvios verificados para as médias de crescimento das plântulas tratadas, comparados ao controle, sugerem que plântulas crescidas nos extratos apresentaram um padrão de resposta mais uniforme (figuras 1 e 2). Isto implica que a ação dos extratos no crescimento inicial não são casuais sobre alguns indivíduos, o que reduziria a média do crescimento e aumentaria o desvio padrão. Ao contrário, os efeitos são gerais, isto é, virtualmente todas as plântulas crescidas nos extratos apresentam alguma restrição ao desenvolvimento. Se fôssemos especular sobre efeitos das folhas de ambas as espécies sobre o crescimento de espécies no Cerrado, poderíamos dizer que lixiviados de folhas inteiras

7 aparentemente não comprometeriam o crescimento de espécies próximas. Entretanto, algum processo inicial de degradação da estrutura foliar poderia contribuir na liberação de aleloquímicos, de maneira que efeitos sobre o crescimento de espécies próximas poderiam ocorrer. O dessecamento das folhas não comprometeria, a princípio, tais efeitos. Conclusões Extratos obtidos de folhas inteiras de Pouteria torta e Stryphnodendron adstringens não apresentaram ação alelopática contra o desenvolvimento de Sesamum indicum. A trituração das folhas permitiu a liberação de solutos com potencial alelopático para as duas espécies testadas. Os efeitos alelopáticos são mais evidentes nas raízes que nas partes aéreas. Referências Bibliográficas AYRES, M.; AYRES, M.J.; AYRES, D.L. & DOS SANTOS, A.S. Bioestat 2.0: Aplicações estatísticas nas áreas das ciências biológicas e médicas. Sociedade Civil Mamirauá. CNPq/MCT p. BAIS, H.P.; VEPACHEDU, R.; GILROY, S.; CALLAWAY, R.M. & VIVANCO, J.M. Allelopathy and Exotic Plant Invasion: From Molecules and Genes to Species Interactions. Science 301: ,2003. BORGHETTI, F; SILVA, L.C.R.; PINHEIRO, J.D.; VARELLA, B.B.; FERREIRA, A.G. Aqueous leaf extract properties of Cerrado species in Central Brazil. Fourth World Congress on Allelopathy, Wagga Wagga, Austrália, FERREIRA, A. G. Interferência: competição e alelopatia. In: FERREIRA, A.G. & BORGHETTI, F. (orgs.). Germinação Do básico ao aplicado. Porto Alegre: Artmed, p GATTI, A.B; PEREZ, S.C.J.G.A. & LIMA, M.I.S. Atividade alelopática dos extratos de Aristolochia esperanzae O. Kuntze na germinação e crescimento de Lactuca sativa L. Acta Botanica Brasílica,v. 18(3), p

8 OLIVEIRA, S.C.C; FERREIRA, A.G. & BORGHETTI, F. Efeito alelopático de folhas de Solanum lycocarpum St. Hil. (Solanaceae) na germinação e crescimento de Sesamum indicum L. (Pedaliaceae) sob diferentes temperaturas. Acta Botanica Brasílica, v. 18(3), p , PERIOTTO F, PEREZ SCJGA, LIMA MIS. Efeito alelopático de Andira humilis Mart. ex. Benth na germinação e crescimento de Lactuca sativa e Raphanus sativus L. Acta Botanica Brasilica 18(3): , PIRES, N.M.; PRATES, H.T.; PEREIRA FILHO, I.A.; OLIVEIRA, J.R. & FARIA, T.C.L. Atividade alelopatia de leucena sobre espécies de plantas daninhas. Scientia Agricola 58(1):61-65, 2001.