Morfoanatomia de folhas de Himatanthus sucuuba (Spruce) Woodson, Apocynaceae
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- Maria da Assunção Sequeira Canela
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1 Acta Farm. Bonaerense 24 (2): (2005) Recibido el 6 de septiembre de 2004 Aceptado el 19 de diciembre de 2004 Trabajos originales Morfoanatomia de folhas de Himatanthus sucuuba (Spruce) Woodson, Apocynaceae Carina Rau Rivas LARROSA * 1 e Márcia do Rocio DUARTE 2 1 Pós-graduanda do Departamento de Farmácia, Universidade Federal do Paraná (UFPR) 2 Departamento de Farmácia, UFPR; Rua Pref. Lothário Meissner, Curitiba, PR, Brasil RESUMO. Himatanthus sucuuba (Spruce) Woodson é uma planta amazônica conhecida popularmente como sucuuba. É uma árvore latescente de tronco ereto e casca rugosa. A população utiliza o látex topicamente contra afecções de pele e a decocção das folhas contra constipação, dores e irritação do estômago. O presente trabalho teve como objetivo realizar estudo morfoanatômico foliar dessa planta medicinal, a fim de contribuir na sua identificação morfológica e na caracterização da droga vegetal. As folhas são simples, glabras, obovado-lanceoladas, de ápice e base agudos. A epiderme é uniestratificada, revestida por cutícula estriada e espessada, e com estômatos anomocíticos na face abaxial. O mesofilo é dorsiventral. A nervura central é biconvexa e o pecíolo é plano-convexo, sendo que ambos possuem feixes vasculares bicolaterais, em arranjo triangular. Estão presentes laticíferos ramificados e idioblastos com conteúdo fenólico e com cristais de oxalato de cálcio. SUMMARY. Leaf morpho-anatomy of Himatanthus sucuuba (Spruce) Woodson, Apocynaceae. Himatanthus sucuuba (Spruce) Woodson is an Amazonian plant commonly called sucuuba. It is a latescent tree with an upright stem and rugous bark. The population uses the latex topically for skin diseases and the leaf decoction for constipation, pain and stomachic disorders. The aim of this work is to study the leaf morpho-anatomy of the medicinal plant, in order to contribute to its identification and the vegetal drug characterization. The leaves are simple, glabrous, obovate-lanceolate, with acute apex and base. The epidermis is uniseriate, coated by a thick and striate cuticle, and with anomocytic stomata on the abaxial surface. The mesophyll is dorsiventral. The midrib is biconvex and the petiole is plain-convex, both presenting bicollateral bundles as a triangular arrangement. Branched laticifers and idioblasts containing phenolic compounds and calcium oxalate crystals are seen. INTRODUÇÃO Himatanthus sucuuba (Spruce) Woodson, da família Apocynaceae, é uma árvore de grande porte conhecida como sucuuba e nativa da região Amazônica 1. Anteriormente pertenceu ao gênero Plumeria 2 e é confundida pela população com a espécie próxima Himatanthus lancifolius (Müll. Arg) Woodson. É uma espécie latescente, de tronco ereto e casca rugosa. Possui folhas glabras, coriáceas e de margens inteiras. As inflorescências estão dispostas em cimeiras terminais com poucas flores, grandes e brancas. As folhas são utilizadas popularmente na forma de decocto contra constipação, dores e irritação do estômago, enquanto o látex é empregado topicamente contra afecções de pele 3, 4. Os compostos químicos freqüentemente isolados dessa planta são iridóides, como fulvoplumierina, plumericina 5, isoplumericina 6,7, ácido confluêntico e ácido metilparlatólico 8. Estudos farmacológicos evidenciaram atividade antiinflamatória e analgésica dos iridóides presentes na casca de caule e no látex 9,10, atividade citotóxica seletiva do látex 11, efeito cicatrizante 12, atividade antibacteriana para Clostridium histolyticum e Bacteroides fragilis 13 e baixa toxicidade reprodutiva e teratogênica em ratas no decocto de cascas de caule, indicando que seu consumo é seguro na espécie humana 14. A fim de contribuir com a identificação morfológica da espécie medicinal e fornecer subsídios para a caracterização da droga vegetal, este PALAVRAS-CHAVE: Feixes bicolaterais, Himatanthus sucuuba, Laticíferos, Morfoanatomia. KEY WORDS: Bicollateral bundles, Himatanthus sucuuba, Laticifers, Morpho-anatomy. * Autor a quem dirigir a correspondência: carinarau@yahoo.com ISSN
2 LARROSA C.R.R. & DUARTE M. do R. trabalho teve como objetivo analisar a morfologia externa e a anatomia de folhas de Himatanthus sucuuba (Spruce) Woodson, Apocynaceae. MATERIAL E MÉTODOS Material vegetal O material vegetal foi coletado nas reservas do Instituto Nacional de Pesquisas Amazônicas (INPA), em Manaus, no Estado do Amazonas, coordenadas S e W e altitude de 80 m, em julho de A amostra coincide com exsicata registrada no herbário do INPA sob o número Metodologia Para o estudo da morfologia externa foi adotada a classificação proposta por Hickey 15. Folhas adultas foram fixadas em FAA e conservadas em etanol a 70% 17, sendo analisados o terço inferior da lâmina e o pecíolo. Lâminas semipermanentes foram preparadas com material seccionado à mão livre nos sentidos transversal e longitudinal. O material fixado foi emblocado em historresina e seccionado em micrótomo rotatório para a obtenção de lâminas permanentes. Os corantes empregados foram azul de toluidina 18 e azul de astra e fucsina básica 19. Os resultados foram registrados por meio de fotomicrografias em microscópio fotônico Olympus BX 40, acoplado à unidade de controle PM-20. Foram realizados testes microquímicos, utilizando-se floroglucina clorídrica para verificação de lignina 20, Sudam III para substâncias lipofílicas 21, cloreto férrico para compostos fenólicos 16, lugol para amido 17 e ácido sulfúrico para cristais de oxalato de cálcio 22. Para o estudo da ultra-estrutura da superfície foliar 23 foi realizada microscopia eletrônica de Figura 1. Aspecto morfológico das folhas, faces adaxial (ad) e abaxial (ab). varredura (MEV), utilizando material fixado em FAA 70, desidratado em série etanólica crescente e pela técnica do ponto crítico de CO 2 em equipamento Bal Tec CPD-030, aderido a suporte metálico e submetido à metalização em equipamento Balzers SCD-030 para recobrimento do material com ouro. As eletromicrografias foram realizadas em microscópio eletrônico de varredura Jeol JSM-6360LV. RESULTADOS Morfologia externa As folhas de Himatanthus sucuuba (Spruce) Woodson, Apocynaceae (Fig. 1), são simples e alternas, curtamente pecioladas, com aproximadamente 20 cm de comprimento e 7 cm de largura. São simétricas, de forma obovado-lanceolada, com ápice agudo a acuminado, base aguda a decurrente e margem inteira. A face adaxial apresenta coloração verde escura, enquanto a abaxial é verde amarelada. A nervação é pinada, camptódroma do tipo broquidódromo. Anatomia Na lâmina, em vista frontal de ambas as faces, as células da epiderme apresentam formato levemente ondulado (Figs. 2, 3). Os estômatos são do tipo anomocítico (Fig. 3) e estão inseridos no mesmo nível em relação às demais células epidérmicas (Fig. 6), sendo encontrados somente na face abaxial (Figs. 3, 4). Ocorre uma elevação cuticular, formando uma borda peries- Figura 2. Vista frontal da epiderme foliar, face adaxial, evidenciando contorno ondulado das células. Figura 3. Vista frontal da epiderme foliar, face abaxial, evidenciando os estômatos (es). 166
3 acta farmacéutica bonaerense - vol. 24 n 2 - año 2005 Figura 7. Mesofilo dorsiventral com parênquima paliçádico (pp) e parênquima esponjoso (pe). Figura 4. Face epidérmica abaxial, mostrando os estômatos (es) com borda periestomática (MEV). Figura 8. Detalhe da figura anterior, onde se notam cutícula espessada (cu), epiderme uniestratificada (ep), parênquima paliçádico (pp) e parênquima esponjoso (pe). Figura 5. Pormenor de um estômato, indicando a borda periestomática (bp) (MEV). Figura 9. Nervura central em secção transversal, evidenciando o sistema vascular (sv) e o parênquima fundamental (pf). Figura 6. Secção transversal do limbo, face abaxial, evidenciando a borda periestomática (bp) dos estômatos (MEV). tomática evidente (Figs. 4-6). A epiderme é uniestratificada, com células alongadas no sentido periclinal (Fig. 8) e é revestida por uma cutícula estriada e comparativamente mais espessa na face adaxial. O mesofilo é dorsiventral, composto de uma ou duas camadas de parênquima paliçádico e de parênquima esponjoso multiestratificado, correspondendo a 60-70% do mesofilo (Fig. 7). Os feixes vasculares de pequeno porte são colaterais, envoltos por bainha parenquimática. A região da nervura central apresenta secção biconvexa (Fig. 9). A epiderme é uniestratificada, revestida por cutícula estriada e espessada, formando flanges cuticulares (Fig. 10). Segue-se 167
4 LARROSA C.R.R. & DUARTE M. do R. Figura 10. Detalhe da nervura central, junto à face adaxial, onde são observados cutícula (cu) formando flanges cuticulares, epiderme (ep), camada subepidérmica (cs), parênquima paliçádico (pp) e colênquima anelar (co). Figura 13. Face abaxial da nervura central, na qual se observam epiderme (ep), camada subepidérmica (cs), colênquima anelar (co), idioblastos fenólicos (id) e la- Figura 11. Secção transversal da nervura central, mostrando parênquima paliçádico (pp), laticíferos (la), parênquima fundamental (pf) e feixes vasculares (fx). Figura 12. Detalhe do feixe vascular, evidenciando floemas externo (fle) e interno (fli), xilema (xi) e idioblastos (id) com conteúdo fenólico. a ambas as faces, uma camada subepidérmica (Figs. 10, 13) de células com conteúdo alaranjado, que apresenta afinidade pela fucsina básica, se cora de verde com azul de toluidina e reage positivamente ao teste de compostos fenólicos. O parênquima paliçádico gradualmente se interrompe e observa-se o colênquima do tipo anelar composto de três ou quatro camadas nas faces adaxial (Fig. 10) e abaxial (Fig. 13). Existe um feixe de grande porte do tipo bicolateral (Figs. 9, 12), em formato de V percorrendo o parênquima fundamental. Em direção à superfície adaxial, observam-se numerosos feixes vasculares bicolaterais de pequeno porte, que formam com o feixe maior um arranjo triangular (Fig. 9). O xilema é completamente lignificado e os elementos traqueais se dispõem de modo enfileirado. Existem algumas fibras não lignificadas nas proximidades do floema externo. Este se constitui de uma faixa contínua e relativamente estreita em comparação ao floema interno, no qual os elementos crivados situam-se em pequenos grupos em meio a células parenquimáticas, ocupando toda a região central. Uma bainha amilífera envolve o sistema vascular. O pecíolo, seccionado transversalmente, possui formato plano-convexo, com duas pequenas 168
5 acta farmacéutica bonaerense - vol. 24 n 2 - año 2005 Figura 14. Pecíolo, em secção transversal, indicando uma das projeções laterais com feixe vascular acessório (fx), parênquima fundamental (pf), sistema vascular (sv) e laticíferos (la). Figura 16. Pormenor do feixe vascular acessório anficrival do pecíolo, onde se indicam xilema (xi), floema (fl) e idioblastos fenólicos (id). Figura 15. Arranjo triangular do sistema vascular do pecíolo (sv) e parênquima fundamental (pf). projeções nas extremidades laterais da face adaxial (Fig. 14). O sistema de revestimento é semelhante ao da nervura central e, adjacente a este, é observada uma faixa colenquimática contínua, formada de três a cinco camadas de células com espessamento anelar. Um feixe vascular bicolateral em formato de U e numerosos feixes bicolaterais dispostos lado a lado junto à face adaxial estão mergulhados no parênquima fundamental, e assumem um arranjo praticamente triangular (Fig. 15). O xilema e os floe- mas externo e interno dispõem-se de modo semelhante ao descrito para a nervura central. Próximo a cada projeção lateral, observa-se um feixe acessório do tipo anficrival (Fig. 16). Idioblastos cristalíferos, apresentando prismas e freqüentemente drusas de oxalato de cálcio, são encontrados na bainha parenquimática dos feixes vasculares do limbo, no parênquima fundamental e no floema da nervura central e do pecíolo. Idioblastos (Figs. 12, 13, 16), com conteúdo alaranjado no material fixado, com afinidade pela fucsina básica, que se cora de verde com azul de toluidina e reage positivamente ao teste para compostos fenólicos, são observados no mesofilo, no parênquima fundamental e no floema da nervura central e do pecíolo. Laticíferos ramificados (Figs. 11, 13, 14), com secção circular, paredes espessadas, citoplasma denso e conteúdo lipofílico e fenólico, localizam-se próximo aos feixes vasculares do limbo, no parênquima fundamental e no floema da nervura central e do pecíolo. DISCUSSÃO A morfologia foliar externa de Himatanthus sucuuba (Spruce) Woodson coincide com a 169
6 LARROSA C.R.R. & DUARTE M. do R. descrição de espécies próximas como Himatanthus lancifolius (Müll. Arg.) Woodson 24 e Himatanthus drasticus (Martius) Plumel 4. A espécie investigada, do mesmo modo que H. lancifolius 24, apresenta venação camptódroma pinada com ramificações broquidódromas secundárias, seguindo o padrão geral para a família 25. As Apocynaceae possuem estômatos paracíticos ou anomocíticos 26, sendo esse último tipo encontrado na espécie em estudo, exclusivamente na face abaxial. Comparativamente, em H. lancifolius ocorrem estômatos ciclocíticos, adicionalmente aos mencionados comumente para o táxon 24, e em Plumeria rubra L. var. alba, representante de gênero considerado próximo a Himatanthus, a folha é anfiestomática e os estômatos são paracíticos e anomocíticos 27. Estrias cuticulares estão presentes na maioria das Apocynaceae estudadas por Kapoor e colaboradores 28 e foram relatadas em outras espécies da família, como em Allamanda neriifolia Hook., Thevetia peruviana (Pers.) K. Schum. 29, P. rubra 27 e em H. lancifolius 24. Na espécie em questão, as estrias são evidentes e a cutícula mostra-se espessada. Na família, o mesofilo é geralmente dorsiventral 30, observado assim em H. sucuuba. Hipoderme de uma ou mais camadas, algumas em ambas as faces da folha, foi observada por Metcalfe & Chalk 30 em vários gêneros. A mesma pode ser considerada equivalente à camada subepidérmica da nervura central descrita no presente trabalho, que foi dessa maneira denominada já que estudos ontogenéticos não foram realizados. Contrariamente, em H. lancifolius, hipoderme ou camada subepidérmica não foram citadas por Barros 24, embora um estrato entre a epiderme adaxial e o parênquima paliçádico tenha sido ilustrado no trabalho da referida autora. Folhas contendo cutícula espessada, hipoderme e grande densidade estomática são freqüentemente assinaladas em plantas xerófitas 31,32, ocorrendo geralmente em órgãos coriáceos e esclerificados 33, o que não condiz com a espécie em estudo, originária do Amazonas, onde há grande disponibilidade de água. Cristais são mencionados na nervura central e no pecíolo de H. lancifolius 24, sendo também referidos em outras espécies de Apocynaceae, tais como A. neriifolia e T. peruviana 29. Coincidentemente, foram evidenciados em H. sucuuba, podendo ocorrer também na bainha que envolve os feixes vasculares de pequeno porte no mesofilo. De um modo geral, aos cristais são atribuídas diversas funções, como suporte estrutural, proteção contra animais e manutenção do balanço iônico, pelo armazenamento de oxalato e cálcio nos idioblastos 34. O feixe vascular da folha é tipicamente bicolateral em Apocynaceae 30, em concordância com o evidenciado em H. sucuuba, onde assume um arranjo triangular. É comum a presença de feixes colaterais de pequeno porte em espécies que exibem organização bicolateral, assim como a de feixes anficrivais, principalmente no pecíolo 33. Na espécie em questão, o floema externo se apresenta como uma estreita faixa, enquanto o interno é visto como pequenos grupos em meio a células parenquimáticas. Essa disposição floemática foi mencionada para a família por Cronquist 26 e Metcalfe & Chalk 30, e foi descrita por Barros 24 para H. lancifolius e por Araújo et al. 27 para P. rubra. CONCLUSÕES A observação de laticíferos ramificados nas proximidades dos feixes vasculares, camada subepidérmica na nervura central, feixes vasculares bicolaterais em arranjo triangular na nervura central e no pecíolo, idioblastos com cristais de oxalato de cálcio e com compostos fenólicos, e estômatos anomocíticos com bordas periestomáticas na face abaxial contribuem na identificação dessa planta medicinal e fornecem subsídios que podem ser aplicados na análise da droga vegetal. Agradecimentos. Ao Prof. Dr. William Rodrigues do Departamento de Botânica (UFPR) pela coleta do material vegetal, ao Centro de Microscopia Eletrônica (UFPR) pela análise ultra-estrutural da superfície e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa concedida à pós-graduanda. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Corrêa, M.P. (1984) Dicionário de plantas úteis do Brasil e das exóticas cultivadas, Imprensa Nacional, Rio de Janeiro, Vol. 6, págs Argoviensis, J.M. (1860) Apocynaceae: Plumeria In: Martius, C.P.F. Flora Brasiliensis, Verlag von J. Cramer, Lehre, Vol. 6, págs Di Stasi, L.C. & A.C. Hiruma-Lima (2002) Plantas medicinais na Amazônia e na Mata Atlântica, 2. ed., UNESP, São Paulo, págs
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