Off: - Elizabeth Teixeira tinha 37 anos, João Pedro morreu com 44.
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- William Carreira de Andrade
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1 Cartela: Em 1962, integrantes do Centro Popular de Cultura CPC da UNE, acompanha pelo cineasta Eduardo Coutinho, percorriam várias cidades do Brasil, registrando as lutas sociais e o cotidiano do povo. Legenda: Cabra Marcado Para Morrer (dir. Eduardo Coutinho, 1984) Diálogo: - E havia muitas injustiças por alí... - Que tipo de injustiça? - era assassinar do homem do campo, era jogado pra fora sem ter direito a nada... Off: - Elizabeth Teixeira tinha 37 anos, João Pedro morreu com 44. Cartela: Em 02 abril de 1962, João Pedro Teixeira, marido de Elizabeth, dirigente e fundador da Liga Camponesa de Sapé, foi assassinado. Dias depois, houve uma grande manifestação filmada por Eduardo Coutinho. Inspirado neste registro, nasceu a ideia da fazer o documentário Cabra Marcado Para Morrer, um dos filmes mais importantes da cinematografia brasileira. (Diálogo: do filme Cabra Marcado para Morrer) - Dona Elizabeth está aí? Vem aqui Dona Elizabeth, vem aqui um pouquinho. - Como é que está a aula? - a aula está aqui, nós estamos com os meninos... - Oi tudo bom, Coutinho, oi tudo bem para vocês, gente? - Tá boa a aula? - Tá. Hoje tem poucos alunos, é o primeiro dia e eles vão saber quem são as professoras. Quer dar uma entradinha? Legenda: Paraíba, 2011
2 Off: Numa época em que muitas ideologias se perderam no caminho, sempre me perguntei como andaria Dona Elizabeth Teixeira, para mim, a personagem mais contundente do documentário brasileiro. Depois de ficar viúva com onze filhos, perder dois deles assassinados, ser presa e passar 17 anos na clandestinidade, ela ainda teria mantido o vigor e a integridade de seu discurso? Viajamos por 2 mil quilômetros para reencontrá-la em Cruz das Armas, na Paraíba, onde mora com parte da sua família. Aqui ela passa a maior parte do tempo cuidando do seu jardim, recebendo homenagens vindas de todas as partes do mundo e revivendo suas memórias. Dona Elizabeth Texeira: Nada, nada de parar. Só não voltei mais para a Liga, em Sapé, para dar continuidade depois que vim do exílio, que não foi 1 ano, nem 2, nem 3, nem 4, nem 5, não é? Aí quando eu voltei e cheguei, o Eduardo terminou o filme Cabra marcado para Morrer, comprou esta casa e me deu. Eu vim morar aqui em João Pessoa e aqui eu estou ainda. E a luta no campo, eu continuo pedindo a Deus que seja implantada essa reforma agrária que o homem do campo precisa da terra, não é? Precisa de sobrevivência, ter condições de salário e de vida, não é? 5 o. Congresso do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra MST (Brasília, 2007) A luta continua, os sindicatos continuam. E nisso eu tenho tido a maior felicidade dentro de mim quando eu venho participar de um movimento desse com tantos companheiros que apóiam a reforma agrária em nosso país.
3 Eduardo Coutinho diretor Ela passa a ser simbolicamente uma pessoa inatingível. Porque Elizabeth se tornou uma pessoa nacional em 1985, 86, hoje ainda, sabe? Ela foi convidada para dezenas de eventos, que ela sabe muito mais que eu, porque alguns eu não soube, nem lembro. Eu sei que ela esteve na Amazônia. Ela deve ter feito várias viagens, depois não fez mais também porque a idade atrapalha. E tem milhões de pessoas no mundo que conhecem a história de João Pedro. Milhares de pessoas que lembram de João Pedro e dela, graças ao filme. Se tivesse tido uma reportagem, quem iria lembrar? Então acho que o papel mais importante do filme foi o de tornar ela uma pessoa visível, uma pessoa que influenciou outros, uma pessoa que fez chorar, que emocionou outros, entende? - Posso fechar agora aqui para ir? - Vou deixar a chave ali. - Cadê a cruz, não tem não? - E cadê o nome dele? - Está ali, embaixo das flores. - Não estou vendo não. Você está vendo? A sua vista dá? A minha não dá não. E tem a casa ali - A senhora sabe quem foi que construiu essa capela? - Não sei, não, minha filha. Sei não, acho que foi mesmo os sem terra, não é? O latifúndio foi quem não foi. Eu ficava muito nervosa, sei lá, para vim. - Aí vim hoje, graças a Deus, estou vendo a capela que foi construída depois do assassinato de João Pedro. A casinha que a gente morava. As portas e as janelinhas, está aí a casinha. A casinha que a gente morava. É, sei não como é que uma pessoa passa por tantos momentos difíceis como eu na minha vida. Não é toda mulher que enfrenta isso não.
4 Quantos anos eu passei naquele Rio Grande do Norte com o nome de Marta Maria da Costa sem ninguém me conhecer como Elizabeth Teixeira. Legenda: Depoimento de João Pedro Stédile (Líder do MST) Ela é uma das nossas ícones para toda luta camponesa no Brasil e na America Latina. Essa mulher é de uma tenacidade, de uma coragem e de uma persistência na luta pela democratização da terra impressionante. Ela alimentou a toda nossa militância. Dona Elizabeth: Eu assumi a liderança da Liga Camponesa, eu enfrentava o latifundiário, enfrentava a polícia. Eu tinha uma coragem, eu acho que era dada por Deus. Aí Fidel disse: olha companheira, eu estou lhe fazendo um convite para que você venha morar aqui em Cuba. Eu disse: Fidel, eu tenho um compromisso com a luta de João Pedro no meu país, o Brasil, e não posso vir morar aqui. Fidel disse: está certo. Aí todos me abraçaram, fui abraçada por todos os companheiros, Che Guevara, todos os companheiros. E ele, no dia seguinte, mandou me trazer de volta à Paraíba. (Off João Pedro Stedile) Então não foi em vão a luta dela. Eu acho que milhares de famílias camponesas paraibanas devem à Dona Elizabeth terem conquistado esse direito, que um direito para eles se transformarem em cidadãos. Coutinho: Eu acho que a Dona Elizabeth, quem viu o filme, quem sabe da história, foi importante para manter acesa uma luta que pode ser por terra. Tem aquele negócio, terra, pão e liberdade, continua existindo.
5 João Pedro Stedile Líder Nacional do MST Quando a gente desanima frente a alguma adversidade. Quando a gente acha que está sendo derrotado, a gente apela para esses exemplos como o da Dona Elizabeth Teixeira, que passou uma vida inteira lutando, e não desanimou. Cabra Marcado Para Morrer (dir. Eduardo Coutinho, 1984) - Até logo, Dona Elizabeth. - Vocês já vão partir mesmo. - Vamos partir. - Vocês desculpem, alguma coisa. - Boa viagem. - A luta que não para, a mesma necessidade de 1964 está plantada. Ela não fugiu um milímetro. - A mesma necessidade do operário, do homem do campo e do estudante. - A luta que não pode parar. Enquanto se tem fome e salário de miséria o povo tem que lutar! - Quem é que não luta por melhoras? Tem que lutar! - Quem tem condições, tiver sua boa vida, que fique aí. - Eu tenho que lutar, até hoje. - É preciso mudar o regime. É preciso que o povo lute. - Porque enquanto tiver esse regimezinho aí, essa democraciazinha aí... Como é que hoje eu estou viva, filhinha. 85 anos eu já vou fazer e para mim e ia morrer tão logo. Nunca pensei em desistir da luta. E hoje eu ainda estou aqui e imagino assim: cadê a reforma agrária? UMA VISITA PARA ELIZABETH TEIXEIRA Eu lutei, valeu a pena, eu estou aqui, ainda, contando a história, não é? Não estou arrependida da minha luta não. Dedicado a Eduardo Coutinho.
6 Musica: Uma voz se levanta e fala por seu irmão ela vibra, ela canta aquela canção Sua mão estendida aponta a direção é o braço, é o abraço contra o laço, a prisão Quanta gente atravessa sobre o verde bandeira e a luta não cessa, oh gente guerreira! Minha amiga não cansa, ela canta, ela dança, ela fez, ela faz o seu nome Teixeira, trincheira jamais Minha companheira, flor dos carrascais mulher brasileira, amante da paz
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