Termos para indexação: minerais secundários, óxidos de Fe e Mn, lateritas, difração de raios-x, micromorfologia, Cerrado
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- Otávio de Oliveira Fidalgo
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1 O CASCALHO COMO INDICADOR DE POLIGÊNESE EM LATOSSOLOS NO CERRADO Yuri Lopes Zinn 1, Dimas Vital Siqueira Resck 2 ( 1 Eng. Florestal, Ph.D., Fundação Capes, Ministério da Educação, Cx. Postal 365, Brasília, DF. ylzinn@hotmail.com 2 Eng. Agrônomo, Ph.D., Embrapa Cerrados, Rod. BR 020, Cx. postal 08223, Planaltina,DF. dvsresck@cpac.embrapa.br) Termos para indexação: minerais secundários, óxidos de Fe e Mn, lateritas, difração de raios-x, micromorfologia, Cerrado Introdução A fração de tamanho cascalho (2-20 mm) é raramente considerada em estudos pedológicos, posto que é em muitos casos composta por minerais primários (i.e., remanescentes da rocha de origem) e a maioria das análises é feita em amostras de solo peneirado <2 mm. Contudo, em solos altamente intemperizados, o cascalho é freqüentemente formado por minerais secundários, i.e., derivados da alteração de minerais primários durante o processo de pedogênese. Assim, o cascalho pode ser um indicador de condições ambientais prevalentes durante períodos passados de formação do solo, com evidente importância para a interpretação de condições atuais. No entanto, a despeito da ocorrência comum de cascalho em Latossolos do Cerrado, há poucos estudos sobre o assunto, que em geral versam sobre nódulos magnéticos ou lateritas. Este trabalho objetivou caracterizar diferentes tipos de cascalho encontrados em um Latossolo representativo do Cerrado, com vistas a um melhor entendimento dos processos de formação destas frações e do solo em geral. Material e Métodos Amostras deformadas de solo até 1 m de profundidade foram obtidas de um Latossolo argiloso, localizado no topo do interflúvio e ligeiramente mal-drenado, a 50 km N de Paracatu-MG, como parte de um estudo sobre C orgânico sob Cerrado nativo e plantio de eucalipto (Zinn, 2005). As amostras foram passadas em peneiras < 8 mm para análise de distribuição de agregados estáveis em água, quando nas frações 2-8 mm foram observadas abundantes e variadas partículas de cascalho, que segundo F.S.B. Ladeira (informação pessoal, 2008) refletem processos do Terciário inferior a médio. O cascalho foi inicialmente pré-classificado em 6 tipos morfológicos, em ordem decrescente de ocorrência: 1) nódulos
2 magnéticos, de cor negra e forte atração ao ímã; 2) nódulos não-magnéticos, visualmente iguais aos anteriores mas não atraídos pelo ímã; 3) partículas vermelhas interna e externamente, de forma variada; 4) partículas platiformes, de cor amarelada a ocre; 5) partículas brancas, com superfície às vezes vermelha a ocre, de forma variada; 6) quartzo conchoidal. Amostras representativas de cada tipo, exceto o 6, e de outros cascalhos atípicos, foram analisadas por: a) difração de raios-x (CuKα) de amostras moídas; b) susceptibilidade magnética; c) micromorfologia em seção delgada, após impregnação em resina epóxi e montagem em lâmina, com uso de H 2 O 2 e ditionito para dissolução de óxidos opacos de Mn e Fe; d) microscopia de varredura de dispersão eletrônica, das amostras montadas nas lâminas. A hipótese formulada foi a de que cada tipo de cascalho deriva de processos genéticos diferentes, com conseqüente diferenciação em sua composição mineralógica e química. Resultados e Discussão A Tabela 1 sintetiza os resultados da difratometria de raios-x do cascalho moído e da argila (segundo Zinn, 2005, Fig. 4.2f) como referência, bem como da susceptibilidade magnética. Conforme esperado, a cada tipo morfológico visualmente definido correspondeu efetivamente uma diferente mineralogia, o que reforça a hipótese de processos genéticos específicos. Cada tipo morfogenético será discutido em separado a seguir. Tabela 1. Mineralogia e susceptibilidade magnética (χ) da argila do solo e tipos de cascalho, provenientes do horizonte B na profundidade de cm. Material Mineralogia (ordem de intensidade de picos de difração) χ, BF 2 (10-8 kg) χ, AF (10-8 kg) Argila C, i, he, go,gi,v 57,3 45,2 Nódulos magnéticos Q, he, mh 817,2 882,6 Nódulos não-magnéticos HE, q, bi 11,5 10,9 Partículas vermelhas HE, q, c, go, gi 4,0 3,7 Partículas platiformes Q, i=c, go, he, a 4,1 3,1 Partículas brancas Q, exclusivamente 8,7 28,4 1 Letra maiúscula indica o pico principal; letras minúsculas são picos secundários em ordem decrescente de intensidade. q=quartzo; c=caulinita; i-ilita; go=goethita; he=hematita; v=vermiculita aluminosa; mh=maghemita; gi=gibbsita; bi=birnessita; a=anatásio. 2 BF e AF = baixa e alta freqüências de medição, respectivamente 465 e Hz. 2
3 Nódulos magnéticos. A presença de maghemita, mineral comumente formado pela desidratação térmica da goethita em presença de matéria orgânica (Bigham et. al; 2002; Viana et al., 2007), confirma a origem pedogênica e natureza secundária deste material. Nota-se, contudo, a predominância do quartzo, que em seção delgada mostra-se como uma matriz densa de grãos de areia intensamente impregnada por óxidos de ferro (Fig. 1a). O mecanismo mais plausível para sua gênese seriam múltiplos ciclos de translocação de Fe 2+, dissolvido em outro ambiente ou sítio anaeróbico, para camadas deposicionais arenosas, conforme revisto por Thomas (1994). Com a aeração neste material poroso, haveria a oxidação e precipitação de espécies como goethita e ferridrita. A desidratação térmica e síntese de hematita e maghemita pode ter ocorrido após a fragmentação da camada que Thomas (1994) denomina ferricrete (conceito diferente de laterita), resultando em nódulos ou pisolitos. Contudo, alguns nódulos não mostram grãos discretos de quartzo e parecem resultar da impregnação de matrizes microcristalinas ou argilosas. Os altos valores da susceptibilidade magnética (Tab.1) devem-se ao comportamento ferrimagnético da maghemita. Nódulos não-magnéticos. A olho nu, estes nódulos são indistintos dos anteriores (para ilustração, ver Viana et al. 2006, fig.3), de cor negra pronunciada devida à dominância da hematita. O aporte de Fe à matriz de quartzo microcristalino (Fig. 1b, visível após a remoção do Fe com ditionito) provavelmente ocorreu em processo similar ao dos nódulos magnéticos, sem contudo ocorrer transformação posterior a maghemita. A presença do óxido de Mn birnessita sugere mecanismos cíclicos de dissolução anóxica/deposição aeróbica, similares e talvez simultâneos aos ocorridos para os óxidos de Fe, durante a formação destes nódulos. Partículas vermelhas. Mineralogicamente, este material se assemelha ao solo circundante, o que o diferencia dos outros tipos de cascalho. Em seção delgada (Fig. 1c), apresenta-se como uma matriz provavelmente microcristalina, onde a impregnação de óxidos de Fe ocorre em padrão reticulado interno, ou como deposição estratificada em macroporos internos e na superfície. Em relação aos nódulos magnéticos e não-magnéticos, pode representar um estádio menos avançado de impregnação e posterior evolução de óxidos de Fe, e é o material que mais se assemelha ao conceito de laterita, neste caso fragmentária. 3
4 Partículas platiformes. Além da dominância do pico de quartzo devido ao maior tamanho dos cristais, a presença importante de caulinita e ilita (mica do solo) sugere a existência de ambiente de deposição siliciclástica: em seção delgada (Fig. 2a), algumas amostras mostravam extinção paralela, sugerindo a orientação pronunciada destes filossilicatos, que poderia ocorrer em um ambiente lacustre. Uma eventual secagem permanente deste ambiente levaria a formação de solos com agregados laminares, que mediante a cimentação posterior por óxidos de Fe, se transformariam em cascalho platiforme (de fato, muitos mostram-se opacos em seção delgada). É interessante notar que a importância similar da ilita e caulinita, em relação à dominância da caulinita na argila do solo atual, sugere um ambiente pretérito de menor intemperização ou dessilicação limitada. A intensa distribuição de potássio, mostrada pela dispersão de elétrons (Fig 2b) confirma a importância da ilita (que contém cerca de 10% de K) no material. Partículas brancas. A cor deste material sugeriu inicialmente nódulos bauxíticos, mas a presença exclusiva de quartzo, que no microscópio petrológico (Fig. 1d) mostra ausência ou pobreza de grãos discretos, indica que este material é quartzo micro- ou criptocristalino, ou ainda cimentado por SiO 2 amorfo. Conforme revisto por Thomas (1994), este material pode ser formado a partir de quartzitos ou sob extrema evaporação, na presença de SiO 2 provindo da caulinização de feldspatos em meio ácido. Em seção delgada (Fig. 1d), algumas amostras mostraram-se impregnadas por óxidos de Fe e Mn, que só pode ter ocorrido após a formação do nódulo, conferindo aspecto e cor atípicos. Conclusões Além dos cascalhos descritos acima, o quartzo conchoidal grosseiro sugere a ocorrência de veios intrusivos. Este material apresenta-se pouco alterado, mas ao mesmo tempo, também ocorrem no perfil nódulos de quartzo extremamente intemperizado, cimentados por óxidos de Mn e Fe (Fig. 3a). A coexistência de todos estes tipos de cascalho, formados por processos tão diversos, indica distintos períodos e microsítios pedológicos, e quase certamente a inversão de relevo. Neste processo, as baixas posições na paisagem, que outrora acumulavam solutos e sedimentos clásticos, após sofrerem os processos de cimentação por óxidos, hoje ocupam o topo da paisagem, por terem se tornado muito mais 4
5 resistentes à erosão que as antigas encostas de contribuição. Embora atualmente no topo da paisagem, a textura muito argilosa do solo contribui para uma drenagem lenta, restringindo a lixiviação de Si e de Mn (este tendendo a acumular-se em macroporos do solo, Fig. 3b) e também resultando em relativamente alta fertilidade do solo (Zinn, 2005). Sabe-se que, diferente de solos derivados de rochas primárias sob climas temperados, muitos Latossolos têm como verdadeiro material de origem substratos já bastante intemperizados. Neste sentido, os resultados mostrados sugerem ainda que a variedade dos ciclos e materiais pedogenéticos pode ser maior do que o sugerido por análises de solo ou pelos mapas geológicos. Em micromorfologia tradicional, tanto o cascalho como o solo circundante é amostrado e estudado a partir de amostras indeformadas e de orientação conhecida. Neste trabalho, a amostragem de cascalhos individualizados a partir de amostras deformadas implica em perda de detalhamento da inserção deste material no solo, mas por outro lado permite muito maior controle e representatividade dos diferentes tipos de cascalho. Pesquisas futuras deveriam incluir os dois enfoques, bem como datações radiométricas, para melhor compreensão dos processos e produtos da gênese destes solos. Agradecimentos: Capes, Ohio State University, Embrapa Cerrados e V&M Tubes S.A. pelo apoio financeiro, de campo e laboratorial, e ao Dr. J.M. Bigham pela orientação nas análises. Referências bibliográficas BIGHAM, J.M.; FITZPATRICK, R.W.; SCHULZE, D.G Iron oxides. In: DIXON, J.B.; SCHULZE, D.G. (eds.). Soil Mineralogy with environmental applications. Madison, Soil Sci. Soc. Am p THOMAS, M.F. Geomorphology in the tropics. Chichester, John Wiley & Sons, p. VIANA, J.H.M.; COUCEIRO, P.R.C.; PEREIRA, M.C.; FABRIS, J.D.; FERNANDES FILHO, E.I.; SCHAEFER, C.E.G.R.; RECHENBERG, H.R.; MANTOVANI, E.C. Occurrence of magnetite in the sand fraction of an Oxisol in the Brazilian savanna ecosystem, developed from a magnetite-free lithology. Australian Journal of Soil Research, v. 44, p. 1-13, ZINN, Y.L. Textural, mineralogical and structural controls on soil organic carbon retention in the Brazilian Cerrados. Ph.D. diss., The Ohio State University, Columbus, Acesso livre em at 5
6 a b Figura 1. a) nódulos magnéticos em nicóis cruzados; b) nódulos não-magnéticos, nicol simples. c d Figura 1 (cont.). c) partículas vermelhas; d) partículas brancas, nicol simples. a b Figura 2. Partícula platiforme em: a) nicóis cruzados; b) dispersão de elétrons, espectro de K. 6
7 a b Figura 3. Óxidos de Mn em a) nódulo de quartzo corroído; b) poros na matriz do solo, nicóis cruzados. 7
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