Variabilidade dos agregados graúdos de resíduos de construção e demolição reciclados
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- Teresa Lameira Antunes
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1 e-mat - Revista de Ciência e Tecnologia de Materiais de Construção Civil Vol. 1, n. 1, p , Maio 2004 Variabilidade dos agregados graúdos de resíduos de construção e demolição reciclados Variability of coarse recycled aggregates from construction and demolition waste Sérgio C. Angulo a,*, Vanderley Moacir John b a PCC, Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, sergio.angulo@poli.usp.br, São Paulo, Brasil b PCC, Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, vanderley.john@poli.usp.br, São Paulo, Brasil Recebido: 01/11/2002 Aceito: 11/12/2003 Resumo Este trabalho tem por objetivo caracterizar a variabilidade de agregados graúdos de resíduos de construção e demolição (RCD) reciclados provenientes de uma central de reciclagem brasileira quanto à composição de fases e as decorrências desta variabilidade em algumas propriedades físicas. A participação das diferentes fases na massa de agregado foi avaliada após separação por análise visual. As outras propriedades avaliadas foram teor de materiais pulverulentos, distribuição granulométrica, absorção de água e massa específica, empregando normas referentes a agregados naturais da Associação Brasileira de Normas Técnicas ABNT. O estudo indica que existe grande variabilidade na composição dos agregados reciclados na central analisada e, conseqüentemente, nas propriedades físicas analisadas. Tal variabilidade afeta o depenho de concretos. Apenas 50% das amostras coletadas atenderam as especificações internacionais para uso dos agregados na produção de concretos não-estruturais. A aplicação destes agregados em concretos irá depender de alterações no processo de reciclagem e de métodos de caracterização mais rápidos e confiáveis. As normas para caracterização de agregados naturais convencionais são insuficientes para este controle. Abstract This article presents a characterization of coarse recycled aggregates from construction and demolition waste (CDW) produced by a Brazilian recycling materials plant. The mineralogical composition and other physical properties of the coarse CDW recycled aggregates were obtained. The study indicates that there is a considerable variability for the analyzed properties of these aggregates, what greatly affects the performance of concrete made with these materials. Application of these aggregates in concrete is important for viability of private recycling plants in Brazil. However, only 50% of the samples allowed use for non-structural concrete applying international standardization. The use of CDW coarse recycled aggregates for concrete depends on new recycling processes and fast and reliable methods of characterization. Standards for characterization of natural aggregates are not suitable for the quality control of production of CDW coarse recycled aggregates intended for concrete application. Palavras-chave: resíduos de construção e demolição, reciclagem, desenvolvimento sustentável, agregados. Keywords: construction and demolition waste, recycling, sustainable development, aggregates. End.: Rua Prof. Almeida Prado, travessa 2, nº83, CEP , São Paulo, Brasil. Fone +55 (11) , +55 (11) e-mat ISSN ANTAC Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído
2 S. C. Angulo, V. M. John / e-mat, Vol. 1, n. 1, p , Maio Introdução A quantidade de RCD (resíduos de construção e demolição) gerada é significativa em muitos países do mundo, com estimativas variando de 136 kg/habitante a 3359 kg/habitante por ano [1-3]. Em diversos países, a geração dos RCD em relação ao total de resíduos sólidos urbanos (RSU) em massa é predominante, variando de 13 a 80% [4]. Estas variações se devem às diferenças nos critérios de classificação, no controle da geração dos resíduos, nas tecnologias disponíveis e nos materiais empregados em cada país. No Brasil, a cidade de São Paulo gera toneladas de RCD/dia [5]. A ausência ou ineficiência de políticas específicas para estes resíduos tem criado condições para que os mesmos apresentem atualmente efeitos ambientais significativos sobre a malha urbana, como surgimento de aterros clandestinos, entupimentos de sistemas de drenagens, assoreamento de rios e córregos, proliferação de insetos e roedores, esgotamento de aterros (inertes ou sanitários) e contaminação do lençol freático, contribuindo para um alto custo social e econômico assumido pelas prefeituras e pela população [1,4-7]. Conseqüentemente, o poder público municipal tem destinado um volume significativo de recursos para a remoção dos aterros irregulares. Do ponto de vista da sustentabilidade global da sociedade é importante observar que a construção civil chega a consumir de 15 a 50% dos recursos naturais do planeta [3]. Assim, é fundamental que a construção passe a consumir cada vez mais resíduos ao invés de matériasprimas naturais. A reciclagem de boa parte desses resíduos de construção e demolição como agregados é possível porque estes resíduos no Brasil são de composição predominante inorgânica [1,4,5,8,9]. O processo de beneficiamento é relativamente simples, requerendo de classificação e britagem. Centrais de reciclagem de RCD vêm ganhando espaço no Brasil e, quando inseridas em políticas públicas adequadas, têm contribuído decisivamente para a solução dos impactos urbanos e redução de custos gerados pela deposição irregular desses resíduos. Embora seja um passo importante do ponto de vista tecnológico e ambiental, a introdução de centrais de reciclagem não soluciona o problema de forma global. Um aspecto importante é que os resíduos não são constituídos somente de minerais não metálicos, adequados à produção de agregados, mas possuem outras frações: metais ferrosos e não ferrosos, plásticos, madeira e até mesmo gesso de construção [4]. Outro aspecto desses resíduos é que as centrais de reciclagem de resíduos de construção e demolição brasileira são plantas simples se comparadas com as centrais do exterior, possuindo apenas alimentador, britagem, transportador de correia e eletroímã e que os procedimentos e equipamentos empregados nas centrais afetam as características dos agregados reciclados como composição, teor de impurezas, granulometria, forma e resistência dos grãos [4,10]. Aspectos importantes como classificação dos agregados e garantia de qualidade ainda estão por serem desenvolvidos. Desta forma, o agregado gerado é utilizado quase que exclusivamente em base de pavimentação, cujo usuário tem sido unicamente o setor público. Uma das conseqüências desta limitação no mercado consumidor é que todas as centrais em operação no País são públicas, sujeitas à descontinuidade em razão de mudanças de governo. A base de pavimento é a utilização predominante para os agregados de RCD reciclados no Brasil e no exterior 1, pois são as aplicações que exigem dos agregados menor qualidade (exigências quanto a variabilidade, etc. Assim, poucas especificações para os agregados são necessárias, propiciando o emprego do material com segurança. O consumo médio de agregados em alguns municípios brasileiros representa tipicamente cerca de 63% da massa de RCD gerada (Tabela 1). Assim, a reciclagem integral do RCD depende da criação de mercados privados. Como empresas privadas consomem pouco material como base de pavimentação, a conquista do mercado privado vai exigir o desenvolvimento de outras aplicações economicamente eficientes. 1 Informação obtida com Prof. Dr. Enric Ramonich Vasquez, no IV Seminário de Desenvolvimento Sustentável e a Reciclagem na Construção Civil, promovido pelo CT-206 (IBRACON), em São Paulo, no ano 2001.
3 S. C. Angulo, V. M. John / e-mat, Vol. 1, n. 1, p , Maio Tabela 1 Consumo público de agregados e geração de RCD em alguns municípios brasileiros [1] Dados Geração total de RCD (t/dia) Santo André (1996) S. J. Rio Preto (1996) Municípios S. J. Campos (1995) Ribeirão Preto (1995) Jundiaí (1996) Aquisição de agregados (t/dia) A/G (1) (%) (1) A/G significa a relação entre aquisição de agregados e geração total de RCD Estas novas aplicações, tipicamente relacionadas aos componentes de concreto, por um lado vão exigir o cumprimento de requisitos de qualidade mais elevados, mas por outro lado vão permitir a valorização do produto. Para facilitar a inserção dos produtos contendo reciclados no mercado, além de custo competitivo, é necessário desenvolver tecnologias para que os produtos contendo resíduos apresentem características de depenho elhantes ou melhores que componentes tradicionais, obtidos de recursos naturais [3]. Um dos problemas a serem enfrentados no desenvolvimento destas novas tecnologias é a variabilidade dos agregados reciclados produzidos, que vai afetar as propriedades dos componentes de concreto conforme demonstrado por [7]. Este autor produziu concretos com traços 1:3, 1:5 e 1:7 empregando quatro composições diferentes de agregados reciclados e agregado convencional e avaliou a resistência à compressão dos concretos. A consistência foi mantida constante igual a um abatimento de 30 mm para concretos com agregados de RCD reciclados e 50 mm para concretos com agregados convencionais. A variação da composição dos agregados reciclados (em massa), segundo as fases presentes, foi: a) concretos: de 19,80 a 21,70%, b) argamassas: de 35,70 a 39,40%, c)rochas: de 12,40 a 27,40% e d) cerâmicas: de 15,80 a 28,50%. A Tabela 2 resume os resultados deste autor. A variação da composição dos agregados reciclados causou uma diferença entre a resistência mínima e a máxima de 30,00% para o traço 1:3; 19,90% para o traço 1:5; e 13,20% para o traço 1:7. Apesar da opção por uma menor consistência nos concretos produzidos com reciclados, estes concretos apresentaram em todos os casos resistências inferiores a dos concretos com agregados naturais, sendo que esta perda de resistência também dependeu do traço e da composição do agregado reciclado. 2 Materiais e programa experimental O estudo experimental pode ser dividido em duas etapas: a) coleta das amostras de agregados graúdos de RCD reciclados e b) caracterização desses agregados quanto ao teor de materiais pulverulentos, granulometria, composição, absorção de água e massa específica. 2.1 Coleta das amostras As amostras de agregados de RCD reciclados foram coletadas de uma central de reciclagem piloto da cidade de Santo André no Estado de São Paulo durante 12 dias, espaçados dentro de um período de um mês. Esta central possuía alimentador, britador de impacto, transportador de correia e uma peneira de abertura de malha de 12,5 mm. Somente o material passante nesta peneira foi coletado e dividido em agregados graúdos e miúdos, conforme a Fig. 1. A caracterização restringiu-se aos agregados graúdos. Nesta amostragem não se avaliou a sazonalidade dos RCD e nem amostras provenientes de diferentes regiões de uma mesma cidade. Três amostras foram coletadas a cada dia, totalizando de 36 amostras.
4 S. C. Angulo, V. M. John / e-mat, Vol. 1, n. 1, p , Maio Tabela 2 Influência da composição dos agregados de RCD reciclados na resistência à compressão [7]. A relação a/c foi a necessária para um abatimento de 30 mm para agregados reciclados e 50 mm para os naturais Composição (% massa) Traço Relação RC 28 dias CV (3) RC (4) RC min C (1) A (2) R (2) c (1) a+c (1:m) a/c (MPa) (%) (% da referência) (% do máximo) ,32 49,8-100, ,51 30,30 3,27 60, :3 0,55 23,60 1,43 47,40 70, ,63 21,10 2,19 42, ,64 23,50 1,49 47, ,56 29,9 0,47 100, ,71 20,60 4,39 68, :5 0,79 18,20 1,58 60,87 80, ,82 16,50 0,58 55, ,82 18,60 7,94 62, ,77 15,1 1,40 100, ,95 15,20 3,01 100, :7 1,09 14,00 1,79 92,71 86, ,04 13,20 2,95 87, ,02 13,70 14,81 90,72 (1) C representa a fase concreto e c representa a fase cerâmica. (2) R representa a fase rocha e a representa a fase argamassa. (3) CV significa coeficiente de variação. (4) RC significa resistência à compressão. Britagem dos RCD Depósito homogeneizado Coleta de 10% do lote Restante do quarto Material Contra Amostra usado para a pilha prova 1 quarto Laboratório massa 5 kg Quarteamento até 2 quartos cheios Homogeneização Material usado para a pilha Restante do quarto Contra prova 1 quarto Amostra Laboratório massa 7 kg Quarteamento até 2 quartos cheios Homogeneização Material coletado Peneiramento # 4,8 mm Depósito agregados graúdos Depósito agregados miúdos Figura 1. Procedimento de coleta de amostras dos agregados de RCD reciclados
5 S. C. Angulo, V. M. John / e-mat, Vol. 1, n. 1, p , Maio Caracterização das amostras A caracterização desses agregados foi realizada com base em normas brasileiras de agregados convencionais. Os ensaios realizados estão resumidos na Tabela 3. A separação manual de fases da composição desses agregados consistiu em separar fases (concreto/argamassa, cerâmica, materiais betuminosos, vidros e outros) por observação visual dos grãos e expressar o resultado de cada fase em percentual. A porcentagem era obtida em relação à massa, sendo a massa total igual a 100%. As fases definidas previamente no estudo foram: a) concreto/argamassa: toda fase que contenha material aglutinante (cimento, cal) com a presença de areia ou brita na maior parte do grão (a separação por observação visual dos grãos não possibilitou a seleção entre as fases concreto e argamassa). b) rochas: toda fase que contenha fragmentos de rochas naturais na maior parte do grão. c) cerâmica: toda fase que contenha material cerâmico, com superfície polida ou não na maior parte do grão. d) materiais betuminosos: toda fase que contenha material betuminoso na maior parte do grão. e) outros: toda fase que não se ajuste às classificações anteriores. Em seguida, a fase concreto/argamassa foi estimada em fases individuais pelos resultados das propriedades absorção de água e massa específica da fase conjunta, aplicando o seguinte sistema de duas equações. Α t = c Αc + a Αa (1) em que: - At é a absorção de água das fases misturadas de concreto e argamassa na composição. - c é a porcentagem de concreto na composição (em massa). - a é a porcentagem de argamassa na composição (em massa). - Ac é a absorção de água média da fase concreto. - Aa é a absorção de água média da fase argamassa. δt = c δc + a δa (2) em que: δt é massa específica das fases misturadas de concreto e argamassa na composição. δc é a massa específica média da fase concreto. δa é a absorção de água média da fase argamassa. Os resultados de absorção de água e massa específica média para as fases concreto e argamassa foram obtidos por levantamento bibliográfico [4]. Os valores médios de massa específica foram 2,5 kg/dm³ para agregados graúdos reciclados de concreto³ e 1,75 kg/dm³ de agregados graúdos reciclados de argamassa. Os valores de absorção de água médios foram 3,25% e 15%, respectivamente. Os resultados do sistema de equações indicam os percentuais em massa das fases e foi validado através de experimento [4]. 3 Resultados e discussões A Fig. 2 mostra o teor (%) médio diário aproximado de agregados graúdos e miúdos de RCD reciclados. Percebe-se que a geração de agregados miúdos, para este lote analisado e caso específico, chega a ser duas a três vezes maior que a geração de agregados graúdos e apresenta valores variáveis ao longo dos dias. Estes elevados teores de agregado miúdo podem estar relacionados com a natureza do resíduo (de demolição), regulagem e tipo do equipamento de britagem. Isto pode complicar o processo de reciclagem, uma vez que a utilização dos agregados miúdos de RCD reciclados ainda não ganhou aceitação para uso no meio técnico nacional e internacional em razão de poder conter os maiores índices de contaminação (compostos Tabela 3 Resumo das caracterizações dos agregados graúdos de RCD reciclados Ensaios realizados Teor de Materiais pulverulentos Composição granulométrica Separação manual das fases Normas utilizadas NBR 7219 NBR 7217 procedimento adaptado de ZORDAN [7] Absorção de água NBR 9937 Massa específica NBR 9937
6 S. C. Angulo, V. M. John / e-mat, Vol. 1, n. 1, p , Maio Agregados graúdos e miúdos Acumulado (%) 100% 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% miúdos graúdos Dias Figura 2. Proporção aproximada entre agregados graúdos e miúdos de RCD reciclados orgânicos voláteis, metais pesados, etc [4,11,12]. A composição acumulada dos agregados graúdos de RCD reciclados (% em massa) é bastante variável conforme a Fig. 3. Esta variabilidade da composição influencia as 9 propriedades absorção de água e massa específica dos agregados, principalmente na presença das fases concreto e rochas. A Fig. 4 mostra uma relação entre os teores de concreto e de rocha da composição e os valores (médias ponderadas) de absorção de água das amostras, obtida por ajuste dos pontos pelo método dos mínimos quadrados. A Fig. 5 mostra uma relação entre os valores de massa específica (médias ponderadas) e os valores de absorção de água das amostras, obtida por ajuste dos pontos pelo método dos mínimos quadrados. 100% Composição acumulada (% massa) 80% 60% 40% 20% 0% cerâmica rochas argamassa concreto Amostras horárias Figura 3. Composição acumulada (% em massa) dos agregados graúdos de RCD reciclados
7 S. C. Angulo, V. M. John / e-mat, Vol. 1, n. 1, p , Maio Absorção de água - 24 h (%) y = -0,13x + 15,56 10 R 2 = 0, Concreto + rocha (%) Absorção de água - 24 h (%) y = -13,96x + 37,47 5 R 2 = 0, ,7 1,8 1,9 2,0 2,1 2,2 2,3 2,4 2,5 Massa específica (kg/dm³) Figura 4. Relação entre os teores de concretos e rochas da composição e os valores de absorção de água média das amostras Figura 5. Relação entre os valores de massa específica média e absorção de água média das amostras A Tabela 4 sintetiza a variabilidade encontrada para as médias das propriedades absorção de água e massa específica das amostras e para a propriedade materiais pulverulentos. Tais variações de absorção de água e de teor de materiais pulverulentos afetariam as propriedades de componentes reciclados no estado fresco como concretos e argamassas [13]. A variação dos valores médios de massa específica das amostras poderia afetar o controle de massa de blocos de concreto reciclados. Outra propriedade que pode afetar os componentes reciclados é a variabilidade das curvas granulométricas apresentadas pelas amostras, por interferirem nas propriedades do concreto no estado fresco e no estado endurecido. A Fig. 6 confirma a variabilidade encontrada através de curvas limites que definem a variação das curvas de todas as amostras. A Tabela 5 apresenta algumas recomendações nacionais e internacionais para o uso desses agregados para concretos [10,14-16]. Percebe-se que a partir dos dados da Tabela 4, a variabilidade encontrada impede o uso desses agregados em concretos estruturais (Tabela 5). Apenas 50% das amostras atenderam às exigências relativas às propriedades absorção de água, massa específica e materiais pulverulentos. O grande limitador encontra-se no teor de argamassa (ver Fig. 3), presentes em casos em que não se tem preocupação com processos de demolição seletiva ou coleta de forma adequada dos RCD em canteiros de obras. Entretanto, segundo as normas Holandesa e da RILEM, seria possível o emprego de 50% das amostras de agregado reciclado na produção de concretos não estruturais. No entanto, a elevada variabilidade medida certamente iria afetar negativamente o processo de produção de concreto. A recomendação proposta por LIMA [10] não limita os teores de materiais pulverulentos, o que parece discutível em razão da interferência destes no consumo de água e na trabalhabilidade; entretanto, limita a presença de outras fases como, por exemplo, 50% para os teores de argamassa (agregados provenientes de alvenaria) e 5% para os teores de cerâmica na composição (agregados provenientes de concreto), gerando a não aceitação do emprego de alguns lotes de agregados em função dos resultados obtidos nas amostras. Destaca-se ainda que a recomendação apresentada por LIMA [10] e de alguns países limitam os teores de concreto e argamassa da composição. Entretanto, a determinação exata por inspeção visual dos grãos dos agregados graúdos é extremamente difícil. Métodos com certa margem de erro podem ser empregados para diferenciar estes teores [4], mas seu custo e tempo de execução podem ser limitantes. Os valores de massa específica de cada fase, separadas por processo visual e manual, foram avaliados durante a realização do programa experimental, conforme a Fig. 7. Constatou-se novamente variabilidade, inclusive nas fases
8 C. T. A. Oliveira et al / e-mat, Vol. 1, nº 1, pp , fev 2004 que se julgaria obter maior homogeneidade, podendo indicar composições químicas e mineralógicas diferentes. JONES [17] mostra um exemplo que em que a variabilidade da composição causou grandes alterações nos valores de massa específica das partículas minerais, entendida aqui como fragmentos de rochas polifásicas. Tabela 4 Valores extremos e médios, desvio-padrões e coeficientes de variação para as amostras Composição (%) Absorção de Água Massa Específica. Material Pulverulento Concretos Argamassas Rochas Cerâmicas (%) (kg/dm³) (%) Máximo 62,00 61,00 50,00 13,00 11,28 2,39 7,36 Mínimo 23,00 10,00 3,00 0,10 3,92 1,95 0,00 Média 43,75 28,18 22,95 3,89 6,80 2,20 1,69 Desvio Padrão 9,24 10,99 11,34 3,76 1,67 0,11 1,49 Coef. Var. (%) 21,12 39,00 49,41 96,53 25,00 5,00 87,73 Passante acumulado (%) ,0 5,0 6,0 7,0 8,0 9,0 10,0 11,0 12,0 13,0 Abertura da malha (em mm) Figura 6. Curvas granulométricas limites encontradas no estudo (% passante acumulada em massa) Massa específica (kg/dm³) 2,8 2,6 2,4 2,2 2,0 1,8 1,6 1,4 1,2 1, Amostras rocha cerâmica concreto/argamassa Figura 7. Massa específica dos agregados graúdos de RCD reciclados, por fase da composição
9 S. C. Angulo, V. M. John / e-mat, Vol. 1, n. 1, p , Maio Tabela 5 Exigências para o uso de agregados graúdos de RCD reciclados em concreto Exigências Japão Holanda RILEM LIMA (1999) Natureza do concreto (2) concreto alvenaria (2) concreto alvenaria concreto alvenaria resíduo Max RC (5) (MPa) 18 nd nd 50 a a Condições de Exposição Aplicação Massa específica (kg/m³) Absorção (% em massa) Passante # 0,075 mm (% em massa) Teores de fases < (em massa) Máximo de contaminantes (1) (em massa) Teor de sulfatos (% em massa) Expansão por reação álcaliagregado nd (6) fundações edifícios comerciais térreos nd restrição pouca umidade restrição Classes de exposição (ENV 206) 2, 3 e 4 1 restrição restrição umidade contrapiso bases vergas blocos umidade contrapiso bases vergas blocos nd nd nd <7 nd nd <10 <20 <7 <12 <1 <0,1 <2 <2 <3 nd nd 10 kg/m³ ou 0,77% argamassa e revestimento (4) (d <1,95 kg/dm³) 5% de outras 2 kg/m³ ou 1% (4) 1% betume 0,5% outros nd nd argamassa (25%) cerâmica (20%) (3) nd nd nd 10% d< 2,2 kg/dm³. 1 de outras 10% d<1,8 kg/dm³ (NEN ) (8) (BS 812) reg. nacionais (7) argamassa (10%) cerâmica (5%) 1 solo (5%) argamassa (50%) cerâmica (50%) 1 solo (5%) 1 (BS 812) (8) nd nd reg. nacionais (7) nd nd cloretos deicing salt Outros nd nd (NEN nd nd nd 5921) (8) test (1) Contaminantes são materiais betuminosos, madeira, vidro e outros que não fases como concretos, argamassas e cerâmicas. (2) Resíduo proveniente da demolição de concretos ou alvenarias. É possível que a alvenaria demolida seja com blocos de concreto e não com blocos de cerâmica. (3) Uma razão para a limitação pode ser ciclos de gelo-degelo em materiais cerâmicos conforme contato pessoal com o pesquisador Johan Put da Universidade de Delft, Holanda. (4) Cálculo realizado considerando-se a massa unitária dos agregados graúdos de RCD reciclados como kg/m³. (5) RC significa resistência à compressão aos 28 dias. (6) nd significa indefinido. (7) o ensaio de expansão álcali-agregado deve seguir as regulamentações de cada país. (8) NEN significa norma holandesa e BS significa norma inglesa. 4 Conclusões Os agregados produzidos pela central de reciclagem analisada apresentaram grande variabilidade de composição e de propriedades físicas, com coeficientes de variação entre 5 e 87%. A absorção de água, por exemplo, apresentou grande variabilidade, explicada em sua quase totalidade pelo somatório do teor de concreto e rochas. Esta variabilidade traz conseqüências importantes para o processo de reciclagem. Os dados de ZORDAN [7] mostram que uma variação na composição do agregado inferior a medida neste estudo leva a uma variação de até
10 S. C.Angulo,V. M.John / e-mat, Vol. 1, n. 1, p , Maio % nos resultados de resistência à compressão. Como a resistência à compressão depende da relação a/c e da porosidade do sistema, espera-se significativa variabilidade em outras propriedades do concreto no estado endurecido. Considera-se que o desenvolvimento de tecnologia de aplicação dos agregados reciclados na fabricação de produtos de concreto é uma das condições para viabilizar a operação de centrais de reciclagem privadas. No entanto, nenhuma das amostras analisadas neste estudo atendeu a normalização internacional para emprego destes agregados para concretos estruturais. Apenas 50% das amostras com conformidade às exigências físicas da normalização do uso destes agregados para concretos não-estruturais. As exigências químicas não foram analisadas neste trabalho e poderiam alterar significativamente estes resultados. Para viabilizar a aplicação dos agregados em concreto serão necessárias: modificações no processo de reciclagem, e o desenvolvimento de métodos rápidos e confiáveis de caracterização dos agregados gerados. Apesar dos ensaios de caracterização dos agregados convencionais terem permitido medir a variabilidade dos agregados de RCD reciclados, estas normas brasileiras não são suficientes para caracterizar estes agregados. Alguns métodos normalizados para agregados naturais podem ser adaptados aos agregados de RCD reciclados. É, portanto, desejável a realização de pesquisas visando desenvolver textos-base para normas técnicas voltadas para estes agregados com técnicas de caracterização mais adequadas. Agradecimentos Este trabalho foi financiado pela FINEP Programa Habitare, CNPq e CAPES. Os autores agradecem a colaboração da equipe da PM Santo André (Arq. Gilson Lameira, Eng. Marcos Tamai e funcionários) e dos alunos de Iniciação Científica, Fabiana Negrini Suarez, Fabiana da Rocha Cleto e Mauricio Cruz Dainezi. Referências bibliográficas [1] PINTO, T. P. Metodologia para a gestão diferenciada de resíduos sólidos da construção urbana p. Tese (Doutorado) Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo. [2] PERA, J. State of the art report: use of waste materials in construction. In western Europe. In: SEMINÁRIO SOBRE RECICLAGEM E REUTILIZAÇÃO COMO MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO, 1996, São Paulo. Anais... São Paulo: PCC- EPUSP, p [3] JOHN, V. M. Reciclagem de resíduos na construção civil: contribuição à metodologia de pesquisa e desenvolvimento p. Tese (livre docência) Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo. [4] ANGULO, S. C. Variabilidade de agregados graúdos reciclados de resíduos de construção e demolição reciclados p. Dissertação (Mestrado) Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo. [5] BRITO, J. A. Cidade versus entulho. In: SEMINÁRIO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E A RECICLAGEM NA CONSTRUÇÃO CIVIL, 2., 1999, São Paulo, Anais... São Paulo: Comitê Técnico CT 206 Meio Ambiente (IBRACON), p [6] LEVY, S. M. Reciclagem do entulho da construção civil, para utilização com agregados para argamassas e concretos p. Dissertação (Mestrado) Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo. [7] ZORDAN, S. E. A utilização do entulho como agregado, na confecção do concreto. 1997, 140 p. Dissertação (Mestrado) Faculdade de Engenharia Civil, UNICAMP, Campinas. [8] CARNEIRO, A. P. et al. Caracterização do entulho de Salvador visando à produção de agregado reciclado. In: ENCONTRO NACIONAL DE TECNOLOGIA DO AMBIENTE CONSTRUÍDO, 7., 2000, Salvador. Anais... Salvador: ANTAC, [9] DORSTHORST, B. J. H; HENDRIKS, Ch. F. Re-use of construction and demolition waste in the EU. In: CIB SYMPOSIUM: CONSTRUCTION AND ENVIRONMENT THEORY INTO PRACTICE, 2000, São Paulo. Proceedings... São Paulo: Universidade de São Paulo Escola Politécnica, [10] LIMA, J. A. R. Proposição de diretrizes para a produção e normalização de
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