Inventário de mamíferos de médio e grande porte em três fragmentos de Cerrado na região sudeste de Goiás

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1 Inventário de mamíferos de médio e grande porte em três fragmentos de Cerrado na região sudeste de Goiás Marcos Paulo Brito Lopes de Sousa 1*, Paula Riselly Cândida de Oliveira 1, Pablo Timóteo da Silva 2, Ednaldo Cândido Rocha 2 1 * (IC) Graduando(a) em Engenharia Florestal, Universidade Estadual de Goiás, Câmpus Ipameri, Bolsista PBIC/UEG. marcospaulo1977@hotmail.com 2 (IC) Graduando em Engenharia Florestal, Universidade Estadual de Goiás, Câmpus Ipameri. 3 (PQ) Docente, Universidade Estadual de Goiás, Câmpus Ipameri. Resumo: Este estudo foi desenvolvido com o objetivo de inventariar, estimar e comparar a riqueza de espécies de mamíferos de médio e grande porte em três fragmentos de Cerrado na região sudeste de Goiás. Neste sentido, entre maio de 2015 e maio de 2016 foram amostradas três áreas com diferentes tamanhos (16 56 ha), localizadas nos municípios de Ipameri - GO (n = 2) e Catalão - GO (n = 1). Foram obtidos registros de 23 espécies de mamíferos silvestres, sendo que cinco delas estão listadas como ameaçadas de extinção em nível nacional. O três fragmentos estudados apresentaram riqueza e composição de espécies de mamíferos relativamente distintas, sendo notada uma tendência de aumento na riqueza de espécies com o aumento do tamanho do fragmento. Os resultados evidenciam a importância dos fragmentos remanescentes (como os estudados) para a conservação in situ da mastofauna, especialmente quando essas áreas estão inseridas numa matriz ambiental altamente fragmentada, onde não existem grandes áreas protegidas com vegetação nativa que possam servir de salvaguarda para a mastofauna. Palavras-chave: Conservação. Fragmentação. Mastofauna. Riqueza de espécies. Introdução O Cerrado tem enfrentado, principalmente nas três últimas décadas, rápida redução da sua cobertura vegetal original devido à expansão da fronteira agropecuária na região central do Brasil. Estimativas indicam que cerca de metade da cobertura original desse bioma já foi transformada em pastagens plantadas, culturas anuais e outros tipos de uso do solo (KLINK e MACHADO, 2005). A acentuada expansão das atividades socioeconômicas tem contribuído para a mudança na paisagem do Cerrado, de forma que em muitas regiões ele se

2 encontra altamente fragmentado. Neste sentido, o Cerrado foi considerado um dos 34 hotspots do planeta, por apresentar alto grau de endemismo e ser uma das regiões biologicamente mais ricas e ameaçadas em termos mundiais (MITTERMEIER et al., 2005). A fragmentação, que é considerada uma das principais ameaçadas à biodiversidade, pode ser definida como um processo no qual uma extensão de habitat é transformada em pequenos pedaços remanescentes, isolados uns dos outros e mergulhados em paisagens em mosaico alteradas pelo homem (PIRES et al., 2006; CARVALHO et al., 2009). O presente estudo objetivou inventariar, estimar e comparar a riqueza de espécies de mamíferos de médio e grande porte em três fragmentos de Cerrado na região sudeste de Goiás. Material e Métodos Foram amostrados três fragmentos de Cerrado na região sudeste de Goiás, sendo que dois estão localizados no município de Ipameri (F '54"S/48 8'28"O, com 56 ha; e F '23"S/48 10'50"O, com 16 ha) e um em Catalão (F2-18 6'51"S/47 41'16"O; com 26 ha). Os Fragmentos F1 e F2 constituem-se em áreas com vegetação nativa em propriedades privadas, sendo amostradas as áreas de preservação permanente nas margens de cursos d água, as reservas legais e áreas adjacentes. O Fragmento F3 constitui a Unidade de Conservação municipal denominada Área de Relevante Interesse Ecológico, criada em A coleta de dados ocorreu no período entre maio de 2015 e maio de 2016, quando cada fragmento foi amostrado quatro vezes. Mamíferos foram registrados utilizando métodos diretos (visuais) e indiretos (busca por pegadas, tocas e outros sinais). Além disto, foram instaladas duas armadilhas fotográficas para complementar o inventário das espécies. A cada visita, foram percorridas estradas e trilhas no interior e nas imediações dos fragmentos, além de buscas por vestígios nas margens de cursos d água.

3 A partir dos registros de cada espécie de mamífero de médio e grande porte obtidos, foi estimada a riqueza de espécies de cada fragmento, pelo estimador Jackknife 1, utilizando o Programa EstimateS versão 9.1 (COLWELL, 2013). Resultados e Discussão Foram obtidos registros de 23 espécies de mamíferos, pertencentes a oito ordens: Didelphimorphia (uma espécie), Pilosa (duas espécies), Cingulata (quatro espécies), Artiodactyla (duas espécies), Primates (duas espécie), Carnivora (oito espécies), Lagormorpha (uma espécie) e Rodentia (três espécies) (Tabela 1). As espécies foram identificadas principalmente por meio de pegadas, além de registros visuais e filmagens em armadilhas fotográficas. Em termos comparativos, Alves et al. (2014) registraram 18 espécies de mamíferos em três fragmentos em Uberlândia - MG; Estrela et al. (2015) registraram 25 espécies de mamíferos em um fragmento no município de Urutaí-GO; Rocha et al. (2015) registraram 23 espécies de mamíferos no Parque Estadual Mata Atlântica, em Água Limpa GO. A riqueza de espécies observada (Tabela 1), apesar de pouco expressiva quando comparada a encontrada em áreas extensas, mostra a importância desses fragmentos remanescentes para a conservação in situ da mastofauna da região. Pois, essas áreas estão inseridas numa matriz ambiental altamente fragmentada, onde não existem grandes áreas protegidas (Unidades de Conservação) com vegetação nativa que possam servir de salvaguarda para a fauna. Dentre as espécies registradas, cinco estão classificadas como ameaçadas de extinção no Brasil (MMA, 2014), sendo elas: tamanduá-bandeira Myrmecophaga tridactyla Linnaeus, 1758, tatu-canastra Priodontes maximus (Kerr, 1792), raposa-docampo Lycalopex vetulus (Lund, 1842), onça-parda Puma concolor concolor (Linnaeus, 1771) e jaguatirica Leopardus pardalis (Linnaeus, 1758). Tabela 1 Espécies de mamíferos de médio e grande porte registradas em três fragmentos de Cerrado no sudeste de Goiás. Taxon Nome comum F1 F2 F3 Didelphimorphia Didelphidae Didelphis albiventris Lund 1840 Gambá X X Pilosa

4 Myrmecophagidae Tamandua tetradactyla (Linnaeus, 1758) Tamaduá-mirim X X Myrmecophaga tridactyla Linnaeus, 1758* Tamanduá-bandeira X X X Cingulata Dasypodidae Cabassous unicinctus (Linnaeus, 1758) Tatu-de-rabo-mole X X Euphractus sexcinctus (Linnaeus, 1758) Tatu-peba X Dasypus novemcinctus Linnaeus, 1758 Tatu-galinha X X X Priodontes maximus (Kerr, 1792)* Tatu-canastra X Artiodactyla Cervidae Mazama gouazoubira (G. Fischer, 1814) Veado-catingueiro X X X Tayassuidae Pecari tajacu (Linnaeus, 1758) Caititu X Primates Cebidae Sapajus libidinosus (Spix, 1823) Macaco-prego X Callitrichidae Callithrix penicillata (É. Geoffroy, 1812) Sagui X Carnivora Canidae Lycalopex vetulus (Lund, 1842)* Raposa-do-campo X Cerdocyon thous (Linnaeus, 1766) Cachorro-do-mato X X Felidae Puma concolor concolor (Linnaeus, 1771)* Onça-parda X Leopardus pardalis (Linnaeus, 1758)* Jaguatirica X Felidae não identificado Gato-pequeno X X Mustelidae Eira barbara (Linnaeus, 1758) Irara X Procyonidae Nasua nasua (Linnaeus, 1766) Quati X X X Procyon cancrivorus (G. Cuvier, 1798) Mão-pelada X X X Lagomorpha Leporidae Sylvilagus brasiliensis (Linnaeus, 1758) Tapeti X Rodentia Caviidae Hydrochoerus hydrochaeris (Linnaeus, 1766) Capivara X Cuniculidae Cuniculus paca (Linnaeus, 1766) Paca X X Dasyproctidae Dasyprocta azarae (Lichtenstein, 1823) Cutia X * Espécies ameaçadas de extinção (MMA, 2014). O três fragmentos estudados apresentaram riqueza e composição de espécies de mamíferos relativamente distintas. O fragmento F1 se destacou apresentando maior riqueza, com 18 espécies registradas e 23 estimadas (intervalo

5 de confiança IC = 8,2). O fragmento que apresentou a menor riqueza foi F1, no qual a riqueza observada foi de 7 espécies e a estimada de 8 espécies (IC = 2,40). Por sua vez, o fragmento F2 apresentou riqueza intermediária, com 14 espécies observadas e 15 estimadas (IC = 2,4). Nota-se, portanto, uma tendência de aumento na riqueza de espécies de mamíferos de médio e grande porte com o aumento do tamanho do fragmento (Figura 1). Essa tendência já foi encontrada e relatada em estudos com mamíferos de médio e grande porte em áreas de Floresta Atlântica no Espírito Santo (CHIARELLO, 1999) e na Amazônia Meridional brasileira (MICHALSKI e PERES, 2007). Figura 1 Riqueza de espécies de mamíferos estimada para três fragmentos de Cerrado no sudeste de Goiás. A proteção aos recursos naturais dos fragmentos estudados é baixa e algumas ameaças à conservação da mastofauna foram observadas em campo, principalmente: indícios de caça em um dos fragmentos (F1) e a presença de animais de criação (bovinos, equinos e canídeos) no interior de todos os fragmentos. Por isto, ações de educação ambiental e de fiscalização são desejáveis visando minimizar as fontes de ameaça à mastofauna e aos recursos naturais de forma geral.

6 Considerações Finais Registros de 23 espécies de mamíferos foram obtidos, das quais cinco estão ameaçadas de extinção em nível nacional, mostrando a importância desses fragmentos remanescentes para a conservação da mastofauna da região. Foi notada uma tendência de aumento na riqueza de espécies de mamíferos de médio e grande porte com o aumento do tamanho do fragmento. É notória a importância dos fragmentos remanescentes (como os amostrados neste estudo) para a conservação in situ da mastofauna, mas os recursos naturais desses locais carecem de maior proteção. Agradecimentos Somos gratos aos proprietários por autorizarem a coleta de dados em seus imóveis rurais e à Universidade Estadual de Goiás (UEG): pela Bolsa de Iniciação Científica ao M.P.B.L.S. e à P.R.C.O.; e pela bolsa do Programa de Incentivo à Pesquisa e Produção Científica (PROBIP) concedida a E.C.R. Referências ALVES, G.B.; MARÇAL-JUNIOR, O; BRITES, V.L.C. Medium and large-sized mammals of a fragment of Cerrado in the Triângulo Mineiro region, Southeastern Brazil. Bioscience Journal, v. 30, n. 3, p , CARVALHO, F.M.V.; DE MARCO JR, P.; FERREIRA, L.G. The Cerrado into-pieces: habitat fragmentation as a function of landscape use in the savannas of central Brazil. Biological Conservation, v. 142, p , CHIARELLO, A.G. Effects of fragmentation of the Atlantic forest on mammal communities in south-eastern Brazil. Biological Conservation, v. 89, p , 1999.

7 COLWELL, R.K. EstimateS: Statistical Estimation of Species Richness and Shared Species from Samples. Version Disponível em: < Acesso em: 24 mar ESTRELA, D.C.; SOUZA, D.C.; SOUZA, J.M.; CASTRO, A.L.S. Medium and largesized mammals in a Cerrado área of the state of Goiás, Brazil. Check List, v. 11, n. 4, artigo 1690, FAHRIG, L. Effects of habitat fragmentation on biodiversity. Annual Review of Ecology and Systematics, v. 34, p , KLINK, C.A.; MACHADO, R.B. A conservação do Cerrado brasileiro. Megadiversidade, v. 1, n. 1, p , MICHALSKI, F.; PERES, C.A. Disturbance-mediated mammal persistence and abundance-area relationships in Amazonian forest fragments. Conservation Biology, v. 21, p , MITTERMEIER, R.A. et al. Hotspots Revisited: Earth s Biologically Richest and Most Endangered Terrestrial Ecoregions. Mexico City: CEMEX, 2005, 392p. MMA Ministério do Meio Ambiente Lista Nacional Oficial de Espécies da Fauna Ameaçadas de Extinção, Portaria MMA nº 444, de 17 de dezembro de PIRES, A.S.; FERNANDEZ, F.A.S.; BARROS, C.S. Vivendo em um mundo em pedaços: efeitos da fragmentação florestal sobre comunidades e populações animais. In: ROCHA, C.F.D.; BERGALLO, H.G.; SLUYS, M.V.; ALVES, M.A.S. (Eds.). Biologia da Conservação: essências. São Carlos: Rima Editora. p , ROCHA, E.C.; SOARES, K.L.; PEREIRA, I.M. Medium- and large-sized mammals in Mata Atlântica State Park, southeastern Goiás, Brazil. Check List, v. 11, n. 6, artigo 1801, 2015.

8 SANTOS-FILHO, M.; PERES, C.A.; SILVA, D.J.; SANAIOTTI, T.M. Habitat patch and matrix effects on small-mammal persistence in Amazonian Forest fragments. Biodiversity and Conservation, v. 21, p , WOLFF, J.O.; SCHAUBER, E.M.; EDGE, W.D. Effects of habitat loss and fragmentation on the behavior and demography of Gray-tailed voles. Conservation Biology, v. 11, p , 1997.