TRANSFORMAÇÃO DO NÃOTECIDO: O DESIGN TÊXTIL EM PRODUTOS DE MODA NONWOVEN TRANSFORMATION: TEXTILE DESIGN FOR FASHION PRODUCTS
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- Victor Gabriel Alencastre Sequeira
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1 TRANSFORMAÇÃO DO NÃOTECIDO: O DESIGN TÊXTIL EM PRODUTOS DE MODA NONWOVEN TRANSFORMATION: TEXTILE DESIGN FOR FASHION PRODUCTS Maria Izabel Costa RESUMO Este texto sintetiza a pesquisa Nãotecido: elaboração têxtil em moda, realizada no Departamento de Moda do Centro de Artes da Universidade do Estado de Santa Catarina que propôs processos de transformação no nãotecido visando sua utilização intencional no vestuário de moda. Apresenta uma sistematização própria para obter a transformação têxtil através dos Procedimentos Estrutural, Construtivo, Colorístico e Combinado empregando técnicas de criatividade como Listagem de Atributos e Sinética. Como resultado, apresentou 36 novos tecidos com diferencial técnico/estético, alguns deles apresentados em Feira Internacional de Têxteis e empregados em coleções de moda apresentadas em eventos do setor. Palavras-chave: nãotecidos, moda, vestuário. ABSTRACT This text is a synthesis of the research work entitled Nonwoven: textile creation for fashion, carried out at the Fashion Department of the Arts Center of the Santa Catarina State University. It is a proposal for the use of transformation processes on nonwoven with view to their use in fashionable garments. It presents a proper systematization to obtain the textile transformation through the Structural, Constructive, Colorful and Combined Procedures, using creativity techniques such as Attribute List and Kinetics. As a result, 36 new types of fabrics were created with a technical/ aesthetic differential, some of them exhibited at International Textile Fair and used for fashion collection exhibited at some events of this sector. Keywords: nonwovens, fashion, clothing. 1. INTRODUÇÃO A busca de materiais diversificados, a pesquisa de texturas e a utilização de um substrato de baixo custo para a transformação em um produto diferenciado, com valor agregado, têm se mostrado como desafio ao design têxtil, pois vêm ao encontro de aspirações contemporâneas do homem e das exigências da moda (COSTA, 2002, p.40). Mesmo estando em expansão em várias áreas, o mercado de nãotecidos para o segmento de moda, é um tema que carece de estudo e pesquisa, quer em nível da estrutura têxtil, quer em nível da criação do design de superfície, pois a falta de dedicação da indústria de nãotecido à aplicação nesta área é visível nas feiras nacionais e internacionais. 1
2 Trabalhar com moda, hoje, significa exercitar a criatividade também na busca de novos substratos têxteis. Esses substratos podem ter seu início a partir do redesenho ou transformação de produtos bem como em experiências artesanais, gerando futura possibilidade de emprego industrial. E é o que se pretende apresentar. Se o nãotecido tem aplicação no vestuário como entretela, por que não agregar valor e utilizálo como tecido principal em coleções de moda? 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1. Moda_ em busca de um novo conceito A moda pode ser empregada em categorias diferentes. Ela pode estar significando a dinâmica social, o processo sobre o qual a moda se estrutura e age como sistema organizado (Sistema de Moda); ela pode estar se referindo ao signo deste sistema (Moda como produto); e pode estar se referindo à legenda deste produto (Moda publicidade). Souza (1987, p.19) diz que o conceito de moda é empregado pelos diversos estudiosos em dois sentidos. Um mais vasto, que abrange as transformações periódicas efetuadas nos diversos setores da atividade social, na política, na ciência, na estética, e outro, mais restrito, reservado às mudanças periódicas nos estilos de vestimenta.pessoal. Este último é muitas vezes empregado erroneamente, como uma única definição de moda. Mas o fenômeno moda é algo mais complexo. A moda é diferente de roupa (um signo) ou de uma coleção. Conforme Lipovetsky (1991, p.23), é uma formação essencialmente sócio-histórica, circunscrita à sociedade ocidental moderna. Assim: [...] moda é a dinâmica sócio-histórica na qual a aparência constitui a forma base de articulação entre os sujeitos (consigo mesmo e com os outros). Através do consumo das diferentes concepções plásticas massificadas os sujeitos constituem seus processos de identidade e identificação. (SANT ANNA, 1998, p.79). A aparência deve ser entendida, conforme a autora, como dimensão da experiência social que mediatiza a apreensão das representações construídas, como substância, que delimita, condiciona e significa a mensagem. A articulação entre os sujeitos e com o mundo, através da aparência, deu-se de forma diferenciada no decorrer da história. Porém o novo é um termo que acompanha tudo o que se refere à moda. Assim, o nãotecido aplicado à moda é compreendido como um produto pós-moderno na medida em que, não sendo um tecido convencional (formado por laçadas ou tramas), constitui-se como um material marginal. Trazido para o âmbito da moda como algo inusitado, atraente, ainda não explorado, apresenta em seu significado, a concepção de algo 2
3 diferente, irreverente, simulante e simples, mas que desperta a atenção, enquadrando-se perfeitamente neste mundo pós-moderno Nãotecido: conhecendo a matéria-prima Não há uma data precisa para o surgimento do nãotecido. Alguns especialistas como Rewald (1999) e Maroni (1998), bem como a Associação Brasileira das Indústrias de Nãotecidos e Tecidos Técnicos (ABINT), comparam o nãotecido com o papirus e reportam seu aparecimento à Idade Antiga. Os estudos realizados nesta pesquisa levaram a acreditar, contudo, que o nãotecido possa ter surgido já na pré-história. Verificou-se que as primeiras estruturas utilizadas pelo homem da Pré-História, após a utilização da pele animal, constituíam em camadas sobrepostas e perpendiculares, primeiro de fibras animais, depois vegetais, consolidadas com substâncias naturais (LAVER,1989). O resultado aproxima-se da técnica, mesmo que primitiva, de produção de nãotecido. No histórico do processo de desenvolvimento industrial do nãotecido, encontram-se, com freqüência, anotações relativas ao início do desenvolvimento da indústria de papel (MARONI, 1998). Segundo a ABINT, a invenção para a obtenção do nãotecido pode ser conferida à Carta Britânica n o 114 de 1853, concedida a Belford aplicado à indústria de estofamento. Contudo, as primeiras patentes para a produção do nãotecido datam de 1937, conferidos às empresas Chicopee (USA) e Freudenberg (Alemanha). Na década de cinqüenta surgem as primeiras grandes fábricas de nãotecido da América do Norte e da Europa. No início de 1960, surgiu o nãotecido por via úmida. A década de sessenta marca também, o aparecimento da tecnologia de fabricação do nãotecido de filamento contínuo, através de fiação por fusão, pelas firma Du Pont de Nemours (EUA), Freudenberg (Alemanha), Rhône- Poulenc (França) e ICI (Inglaterra). A partir de 1980, surge a tecnologia de ponta, como ressonância e ultra-som (REWALD,1999). No ano de 2000, grupos como P.G.I, Freudenberg e a brasileira Fitesa lançaram o Miratech, o Evolon e o Differenza, respectivamente, para o uso em aplicações finais em que os nãotecidos ainda não tinham alcançado, entre eles, o vestuário. Hoje, a busca por novos mercados e mais oportunidades para competir com os têxteis convencionais é constante. Tanto é, que fica evidenciado pelo tema suas idéias, nossos materiais da edição de 2002 da Index (Exibição internacional de nãotecidos realizada pela Edana), que propõe uma busca constante por áreas de aplicação que ainda têm um considerável potencial de desenvolvimento. Foram muitas as definições dadas ao termo nãotecido. Estas estavam, contudo, associadas ao seu estágio de desenvolvimento tecnológico no decorrer dos anos. 1 Pós-modernismo é um termo aplicado às mudanças que ocorreram a partir de 1950 (data que por convenção se encerra o modernismo) nas ciências, artes e nas sociedades avançadas. Ele nasce com a crítica ao funcionalismo racional da Bauhaus e seu dogma modernista a forma segue a função e na computação, nos anos 50. O mundo torna-se uma sociedade da comunicação generalizada e da pluralidade de culturas. (SANTOS,1995,p.37). 3
4 Hoje a definição normatizada, conforme NBR13370 pela ABNT (2002, p. 4) é: Nãotecido é uma estrutura plana, flexível e porosa constituída de véu ou manta de fibras ou filamentos orientados direcionalmente ou ao acaso, consolidadas por processo mecânico (fricção) e/ou químico (adesão) e/ou térmico (coesão) ou combinação destes. Desta definição, exclui-se o papel, os feltros por feltragem (agulhados ou não adicionalmente) os produtos obtidos por tecelagem, malharia e tufting, bem como os transformados através de costuras com fios incorporantes ou filamentos de ligação/reforço. Para a fabricação de um nãotecido podem ser utilizados diversos métodos. De modo geral, as tecnologias usadas nas três indústrias de manufatura têxteis, papel, e plástico e várias combinações dos processos estabelecidos a partir de uma ou mais dessas indústrias formam a base para os processos de fabricação dos tecidos nãotecidos (MARONI,1998). Os nãotecidos podem ser agrupados em uma das quatro tecnologias básicas: Têxtil; papel; plástico (extrusão de filamentos contínuos e sopro) ou ainda, híbrido (combinação de diversas tecnologias). Segundo Rewald (2000), comum a cada uma das tecnologias acima apontadas, existem quatro principais elementos ou fases de fabricação: seleção e preparação da fibra, formação do véu, consolidação do véu e acabamento. Para a produção de nãotecido, podem ser empregadas fibras (naturais ou químicas), filamentos contínuos ou serem formados in situ 2. Além destas matérias-primas citadas acima, que chamamos de primaria, podem ser também empregadas as chamadas matériasprimas secundárias (resíduos e sobras têxteis provenientes das indústrias de confecções, fiações, tecelagens, malharias, tapetes, outros). Dada a extensão do tema, eliminou-se deste artigo o estudo sobre as características e propriedades das principais fibras têxteis bem como os diversos critérios de classificação dos nãotecidos que serviram de base para obter-se informações no decorrer deste trabalho. Mas cabe apontar, ainda, algumas considerações acerca das matérias-primas utilizadas nos nãotecidos para aplicação em moda. Enquanto que num tecido técnico a matéria-prima é selecionada por sua performance e propriedades relacionadas à resistência, impermeabilidade à água, durabilidade, etc., para aplicação em moda, ela é projetada visando principalmente o conforto e características estéticas. Segundo Silva (2002), o Conforto Total engloba o conforto psicológico, que está associado à sensação de bem-estar individual, decorrente de fatores culturais, status, estar na moda; o conforto sensorial, que está associado às sensações como toque, olfato e o conforto termofisiológico que está associado às propriedades de calor e umidade (absorção). 2 grupo de tecnologias especializadas, onde a produção da fibra, formação e consolidação do véu ocorrem geralmente ao mesmo tempo e no mesmo local. Exemplo: rede extrudada 4
5 Na composição de um nãotecido para aplicação em vestuário são importantes as fibras que absorvem umidade como algodão, viscose, entre outras, pelo fato de possibilitarem conforto termofisiológico. Mas, as fibras sintéticas (hidrófobas) que apresentam menor preço e são as mais utilizadas na produção de nãotecidos, podem ser produzidas com titulações abaixo de 1dtex microfibras - e apresentar, por isto, características intrínsecas que proporcionam a construção de novos materiais têxteis com uma sensação de conforto totalmente diferenciado. Outras fibras químicas, mais ecologicamente corretas (por serem biodegradáveis e nãopoluentes) como a Liocel e Ingeo, poderiam ser empregadas para a produção de nãotecidos a serem utilizadas em vestuário. São fibras novas, mas ainda de preço elevado. A partir do exposto, poder-se-ia adiantar, dizendo que se aumentaria o conforto, das peças de vestuário confeccionadas a partir de nãotecidos através: da sua transformação em outras estruturas mais porosas como as malhas em tricô, redes, vazados; através da mistura de fibras (naturais e químicas) viabilizando-as economicamente; através da reciclagem e utilização de matéria-prima secundária cuja composição apresente também fibras naturais. 2.3 Design têxtil e criatividade O design têxtil coloca-se como uma especialização do design de produto. A linguagem do design de produto, se exprime, segundo Scorel (2000, p.66) através do projeto. Como atividade projetual requer capacidade de abrangência e de coordenação dos diferentes aspectos implicados no processo de que resulta o produto. Nesta perspectiva, há uma atuação do designer tanto no planejamento e na programação do projeto quanto na concepção do produto propriamente dito. Neste último, as atividades estariam voltadas aos processos criativos, aos métodos e às técnicas de desenvolvimento de produto. Na área têxtil, o design deve ser perspicaz e inteligente para buscar estratégias de liderança através do menor custo e da diferenciação. O produto deve apresentar um valor suplementar criativo e original, tratado e desenvolvido no mais alto nível de qualidade técnica/estética. No sistema de moda, o design têxtil se consolida com o Prêt-à-porter, na década de 60. A indústria têxtil, agora com maiores possibilidades de criação de produtos através do surgimento das fibras químicas e de tecnologia avançada, busca integração dos diversos elos de sua cadeia (matéria-prima, fiação, tecelagem, beneficiamento) e passa a criar seus tecidos a partir da definição dos grandes temas de moda sob orientação dos bureaux de style (VINCENT-RICARD, 1989, p.129). Contudo, segundo Seeling (2000, p.105) somente nas duas últimas décadas é que os designers têxteis e estilistas vêm trabalhando juntos. O processo de criação têxtil passa, então, a constituir-se num projeto cujo problema é a produção de tecidos segundo a solicitação do mercado consumidor (que busca não mais o 5
6 produto em si, mas os valores agregados ao mesmo) e segundo as possibilidades e limites da indústria. Excetuando-se os tecidos técnicos, a criação de tecidos não pode ser vista indissociável à moda. Para tanto, há necessidade de uma grande dose de ousadia na associação de técnicas, muita pesquisa de materiais, trabalho em equipe interdisciplinar e muita criatividade. Criatividade é compreendida, neste trabalho, como um potencial inerente ao homem (ser consciente, sensível, cultural), cuja expressão acontece num contexto determinado (OSTROWER,1989, p.5-30), sendo que este potencial ou habilidades criativas podem ser desenvolvidas e aprimoradas (ALENCAR,1995, p.61). Na atividade do profissional, a criatividade deve ultrapassar os níveis básicos/individual (aquelas soluções bem-sucedidas dos problemas do cotidiano, que respondem às necessidades mais do plano particular que da sociedade) e desenvolver-se de forma sistemática, estabelecendo critérios, seqüência inteligível e algumas metódicas criativas para solucionar o problema. O designer têxtil, deve dominar os conhecimentos técnicos específicos da sua atividade bem como conhecer e saber aplicar técnicas criativas. Estes são meios que promovem e oportunizam a criação. Não solucionam problemas, mas auxiliam na solução, despertam, incitam, inicializam o processo criativo. A Listagem de Atributos é uma técnica que leva a analisar aspectos de um problema ou produto, que normalmente passariam despercebidos, através dos seguintes passos: (1)separar as partes do objeto ou problema nos seus menores componentes;(2)listar atributos, características ou limitações do objeto ou do problema em consideração;(3) desenvolver uma lista de modificações que poderiam ser feitas para cada um dos componentes do objeto ou do problema e para cada um dos seus atributos. (WECHSLER, 1998, p. 274) No design têxtil, esta técnica pode ser utilizada partindo-se de um determinado tecido onde se procuraria analisar os componentes do mesmo (tipo de fibra, fio, padronagem, textura, gramatura, acabamento, etc.) visando transformá-los ou propor melhorias para estes elementos. Ao favorecer o conhecimento do produto, através da listagem de atributos dos componentes do tecido, a técnica contribui para o conhecimento das propriedades e características da matéria-prima com a qual se trabalha. Com isto, favorece também o conhecimento das possibilidades e limites de sua transformação. (COSTA, 2003,p.56). Para favorecer o desenvolvimento de idéias, pode-se utilizar uma lista de verbos propostas em Alencar 3 (1995,p.124) como: modificar, substituir, adaptar, descobrir, aumentar, 3 Esta listagem de verbos advém de uma série de questões desenvolvidas por Osborn(1963) em seu livro Imaginação Aplicada, para tornar mais fácil às pessoas visualizarem e rearranjarem aspectos de um problema. 6
7 diminuir, inverter e combinar. Outra técnica que também pode ser empregada no design têxtil é a Sinética, principalmente, porque leva a buscar soluções através de uma outra forma de raciocínio que não seja a lógica. A palavra sinética vem do grego e significa juntar elementos diferentes, aparentemente não relacionados entre si (BAXTER, 1998, p. 69). Em criatividade, este conceito (sinética) foi desenvolvido por Williams Gordon (WECHSLER, 1998, p. 303), como uma maneira de auxiliar a procura de soluções para um problema, apoiando-se, basicamente, em analogias e metáforas. Desta forma, a técnica possibilita, ao indivíduo ou grupo, perceber a realidade de forma não corriqueira. A sinética reconhece dois tipos de mecanismos mentais que levam a resultados criativos: tornar o estranho, familiar (onde se busca, ao defrontar com um problema, ver aspectos de problemas já conhecidos) e tornar o familiar, estranho (o que implica em distanciar-se do problema, distorcer ou modificar as formas de visualização ou de conceber a realidade). Para favorecer o uso destes dois mecanismos básicos, a sinética sugere, segundo Alencar (1995, p. 22), diversos tipos de analogias como: pessoal (o indivíduo se coloca mentalmente no lugar do objeto que pretende criar), por fantasia (envolve a criação de questões ou soluções ideais para o problema), e direta (que consiste na comparação de fotos, conhecimentos ou tecnologias paralelas buscadas em situações da natureza). 3. METODOLOGIA LABORATÓRIO EXPERIMENTAL A pesquisa foi realizada através dos seguintes passos metodológicos: 1º-Revisão bibliográfica: cujo resumo foi apresentado no item anterior; 2º- Caracterização da matéria-prima: a pesquisa parte do estudo de nove tipos de nãotecidos fornecidos pela Freudenberg, próprios para uso como entretela na confecção, de composições diversas, sendo que a maioria apresenta poliéster e poliamida; um nãotecido à base de 80% de viscose e 20% poliéster, da empresa Thalia Ind. Têxtil Ltda; e dois nãotecido 100% polipropileno, um da empresa Fitesa e outro da empresa Providência. Os substratos têxteis são de várias gramaturas e composições, que por suas características originais não apresentam (a maioria deles), compromisso com a resistência e nenhuma preocupação com a estética têxtil e sua conseqüente aplicação na moda. A identificação e características de cada um dos 12 nãotecidos foram registradas em tabelas, conforme exemplo do nãotecido nº1, abaixo: N o Nãotecido 1 REG Teciteca 401 Empresa Freudenberg n. AO-422 Peso 43g/m 2 (médio) Composição Processo de Formação da Manta Orientação das fibras no Véu Processo de Consolidação das fibras 100% Poliéster (fibra química sintética) Via a Seco Longitudinal Químico (Binderbonded) 7
8 Apresentação Cor Adesivo Condição de Termocolagem Campo de Aplicação Original Características Gerais 50 m X 90cm Branca Não se aplica Não se aplica Entretela para pequenas áreas em uma variedade de aplicações, inclusive como alternativa para utilização em bordados. Neste caso, após a utilização, a retirada da entretela deverá ser efetuada com tesoura. Nãotecido transparente, de aspecto fibroso e toque áspero. Apresenta fibras soltas em sua superfície. Não é propenso a amassar. Por apresentar as fibras na orientação longitudinal, apresenta resistência maior no sentido vertical e baixa resistência no sentido horizontal. Por ser de Poliéster, não absorve água. Não encolhe e é de fácil secagem. Pode ser cortado em todas as direções sem desfiar e enrrolar. Por se tratar de nãotecido para entretela, é classificado como um produto durável. 3º-Desenvolvimento de bandeiras através de Procedimentos de Transformação Têxtil: visando a organização da prática experimental e da documentação dos resultados, estes procedimentos foram construídos para esta pesquisa agrupando técnicas artesanais de desenvolvimento de tecidos, que apresentam afinidades entre si no seu processo de formação. São eles: Procedimento Estrutural que caracteriza-se pela mudança de estrutura têxtil. Consiste na utilização do nãotecido que será cortado em tiras, círculos, ou outras formas para ser utilizado como matéria-prima no emprego de técnicas artesanais como o tricô, tecelagem, malimo artesanal, macramé, fuxico, etc. A nova bandeira têxtil não apresentará mais a característica de um substrato nãotecido pois terá sua estrutura têxtil modificada, conforme figura 1, passando a constituir um tecido tricotado, tramado, amarrado,etc. Para a construção destas novas estruturas, deve-se cortar o nãotecido observando o sentido de orientação da fibra no véu, visando proporcionar maior resistência às tiras cortadas para evitar o seu rompimento. - O Procedimento Construtivo utiliza a sobreposição entre nãotecidos, ou de nãotecidos sobre outros substratos têxteis ou modifica-se a superfície do nãotecido visando dar ênfase ao relevo, textura e reforço das mantas (nãotecidos) de baixas gramaturas, conforme exemplo figura 2. Constrói-se, então, novas estruturas têxteis com relevo pronunciado, a partir das seguintes técnicas: sobreposição/apliques, dublagem, matelassê, bordado, esculpimento; - O Procedimento Colorístico caracteriza-se pela transformação do nãotecido pela agregação de cor. Neste procedimento estão agrupadas as técnicas que objetivam colorir os nãotecidos através de tingimento (coloração total do tecido) ou aplicar desenhos através de estamparia (coloração parcial); 8
9 - O Procedimento Combinado, como o próprio nome indica, caracteriza-se pela utilização de mais que uma das técnicas descritas acima ou outras. A figura 3 apresenta bandeira que emprega tingimento, aplique e bordado.com este Procedimento, as possibilidades criativas se ampliam ao máximo através da interferência de uma técnica em outra. 4º- Expansão do processo criativo pela agregação de técnicas de criatividade: Com a Listagem de Atributos iniciou-se o trabalho, a partir de bandeiras já elaboradas (para efeito deste artigo, apresenta-se, como exemplo, a bandeira fuxico tradicional Figura 4), com os seguintes questionamentos: Que tipo de atributos determinados à bandeira já possui? Como e em que aspectos se poderia modificá-los? Desta forma, verificou-se que, de uma bandeira criada, conseguiu-se uma variedade de novas bandeiras, analisando-se os atributos de cada uma das partes (tipo de nãotecido empregado, tipo de linha utilizada, forma e tamanho das unidades fuxico), e a partir de então, empregou-se a listagem de verbos para propor modificações ou melhorias a cada uma delas, de forma mais ordenada e organizada, facilitando assim, o processo criativo e a geração de idéias. O verbo modificar sugeriu alterações qualitativas, tais como mudança de significados do fuxico tradicional para um fuxico novo. Modificou-se as diferentes maneiras de prender o fuxico. Em vez de unirem-se uns aos outros, foram presos em fios ou fitas. Com o verbo substituir, alterações na bandeira inicial foram realizadas, trocando-se o material de 41 g/m 2, por outra de gramatura mais pesada, 100g/m 2, a base de poliéster e espuma de poliuretano, formando um fuxico com aspecto mais lanoso, mais volumoso. Também se substituiu a linha de costura fina por outra bem mais grossa e colorida, que resultou num fuxico com diferencial no centro ocasionado pelo acúmulo de linhas e cores diversas. O verbo adaptar conduz a idéia da existência de outras coisas parecidas com o problema, realizando um paralelo ao produto a ser modificado. A adaptação do fuxico de nãotecido a novos materiais possibilitaria a formação de novas bandeiras, tantos quantos fossem os materiais diversificados. Adaptar o fuxico de nãotecido sobre uma outra superfície plana e não mais pregados uns aos outros pela lateral, foi outra idéia sugerida. A partir desta, surgiu o fuxico unido onde rodelas estão unidas umas as outras pelas costas e presas ao tecido plano, resultando uma amostra têxtil diferenciada pelo relevo em sua superfície. Com o verbo aumentar, fez-se alterações quantitativas. Pensou-se sobre o que poderia ser acrescentado, multiplicado ou ampliado. Foram construídas amostras onde se acrescentou pequenas plumas a partir do centro do fuxico. Cabe ressaltar que, uma infinidade de outros materiais poderiam ser utilizados (fio de nylon, lã, pedrarias, fio de seda etc.). O tamanho da circunferência do fuxico também pôde ser ampliado, onde bandeiras foram criadas com peças de tamanhos diferenciados, dos quais foram obtidos ótimos efeitos estéticos. 9
10 Ao contrário, o verbo diminuir sugere pensar no que se pode eliminar, condensar, reduzir. Alterações, então, foram realizadas no tamanho das peças. Com o intuito de reduzir ainda mais, surgiu a idéia de cortar o fundo das peças de fuxico que passa a apresentar agora a forma de rodelas de laranja. O verbo inverter significa buscar opostos, de trás para frente, às avessas. Foram sugeridos opostos como claro-escuro, redondo-quadrado, liso-áspero, sem aroma e com aroma, leve - pesado, grosso - fino etc. Elaborou-se o fuxico casulo, com peças onde a costura franzida desloca-se do centro para a ponta. Por fim, o emprego do verbo combinar significa associar, ao mesmo tempo, cores, materiais, formas etc., possibilitando a criação de uma variedade de produtos a partir da junção ou combinação de bandeiras já criadas. Com a técnica sinética, partiu-se para a utilização de analogia direta com a natureza. Para tanto, realizaram-se os seguintes passos: a) Definição do problema: como deixar o nãotecido resistente à tração e com expressão estética para aplicação em moda? b) Definição da função principal do tecido: maior resistência na parte funcional e melhoria na parte estética para aplicação em moda. c) Pesquisa de sistemas naturais portadores de funções e aparências análogas e buscar idéias promissoras. Para realizar a pesquisa, buscou-se responder as seguintes questões: De que forma o reino animal e vegetal utiliza-se para reforçarem as suas estruturas? De que forma se encontra na natureza exemplos ou modelos de beleza para dar como característica ao nãotecido? Empregou-se a estrutura da teia de aranha para reforçar o nãotecido, previamente dublado, utilizando a costura helicoidal, tendo em vista a flexibilidade, elasticidade e, principalmente, a resistência em todos os sentidos. Para exemplificar como a analogia direta com a natureza oferece propostas estéticas, destaca-se a bandeira (Figura 5) criada a partir da aproximação visual de gotas de orvalho sobre a folha de um vegetal (Figura 6). 5º - Teste e Registro das Bandeiras: cada bandeira ou amostra criada passou por teste de imersão em água e lavagem em máquina doméstica, a fim de verificar a resistência e o comportamento das mesmas, sendo eliminadas as que sofreram alterações visíveis. As amostras aprovadas foram catalogadas em fichas de registro têxtil com o registro da matéria-prima, a metragem utilizada para a confecção de uma bandeira de 30 x 40cm, o tempo realizado para a sua confecção, descrição do procedimento e técnica empregados e imagem do produto acabado. 6º- Aplicação mercadológica: As bandeiras criadas nesta pesquisa são produtos de especialidade e de moda. Para o desenvolvimento das coleções de moda, realizou-se o estudo da relação tecido/modelo/tema coleção. A figura 7 apresenta um exemplo desta relação: a bandeira com acentuado relevo desenvolvida para o casaco de forma simples e assimétrica. Tendo em vista que a comercialização das peças produzidas fugia do escopo 10
11 deste trabalho, a análise da aplicação mercadológica foi realizada pela aceitação das coleções em concursos, desfiles e eventos de moda. 4. RESULTADOS OBTIDOS -Criação de 36 novas bandeiras de 30 x 40cm; - Participação na Techtêxtil Fint Souht América 2001; -Aplicação das bandeiras em peças de coleção de moda: uma apresentada na 49 a FENIT em julho 2000; outra na II SCFW (Santa Catarina Fashion Week) em março de (Figura 8). - Incorporação das bandeiras criadas na Teciteca do Centro de Artes e das peças confeccionadas na Modateca do Departamento de Moda da UDESC; -Envolvimento da comunidade na pesquisa através de Oficina de Criação/Transformação de nãotecidos, viabilizando, a relação pesquisa-ensino-extensão. 5. CONCLUSÃO Além da criação de 36 novos têxteis, esta pesquisa possibilitou o conhecimento de um novo material para a moda, o nãotecido, e de uma metodologia de transformação do mesmo. A agregação de valor ao nãotecido próprio para o emprego em entretelas se deu, principalmente, pela variação ou modificação de características estruturais e pelo design de superfície. Para ser aplicado em peças de vestuário de moda, o nãotecido deve atender tanto a requisitos técnicos quanto estéticos.assim, a questão de absorção de umidade e respirabilidade foram trabalhadas. Verificou-se que há uma tendência no procedimento Estrutural de atender à moda de verão. Ao contrário, no procedimento Construtivo, o de atender a moda de inverno, tendo em vista que as bandeiras, criadas com este procedimento, apresentam maior volume tornando-se mais pesadas e com menos possibilidade de entrada de ar. O número maior de bandeiras realizadas com a técnica de sobreposição/aplique no procedimento Construtivo revela que o nãotecido pode ser cortado em todas as direções sem se desfiar e, portanto, facilmente de ser explorado esteticamente. Por outro lado, o procedimento Colorístico foi pouco explorado em termos de diversidade de técnicas neste trabalho. Mas este fato não significa que há dificuldades de se trabalhar o nãotecido com ele. Apenas considerou-se que estas técnicas já são exploradas industrialmente. O procedimento Combinado, pode ser explorado em inúmeras combinações entre as diversas técnicas. Bandeiras diferenciadas sempre irão surgir das associações. Na área do design têxtil, a bibliografia é escassa no que se refere à aplicação de técnicas de criatividade no processo de desenvolvimento do produto. Mesmo fazendo as adaptações necessárias, verificou-se que as técnicas de criatividade empregadas nesta pesquisa foram eficientes para a transformação têxtil. 11
12 A Listagem de Atributos revelou ser uma técnica mais racional e objetiva que a Sinética. Pode ser aplicada a partir de qualquer bandeira já produzida. O resultado vai ser sempre multiplicador e, praticamente, infinito. Ela pode ser empregada no design têxtil tanto em nível industrial quanto artesanal. A Sinética, por sua vez, é menos racional na sua concepção, mas também, eficiente em seus resultados criativos. Seguindo seus passos e orientações, se consegue resultados inesperados. Cabe ressaltar que foi empregada nesta pesquisa, apenas a analogia direta, ficando em aberto um grande espaço a ser explorado em termos de criatividade, ao se empregar outras analogias como a pessoal e por fantasia. O emprego do nãotecido em peças de confecção de moda, hoje, é ainda bastante restrito no Brasil. Acredita-se que, pela possibilidade de sua transformação em um produto com valor agregado, em um futuro breve, o nãotecido estará consumado na moda: seja pela iniciativa dos estilistas ou da indústria. Ou de ambos. 5. REFERÊNCIAS (1) ABINT- Associação Brasileira das Indústrias de Nãotecidos. A História dos Nãotecidos. Disponível em em 14/05/2002. (2) ABINT- Associação Brasileira das Indústrias de Nãotecidos. Classificação, Identificação e Aplicações de Nãotecidos. São Paulo: ABINT,1999. (3) ABNT- Associação Brasileira de Normas Técnicas.NBBR Coletânea de Normas Técnicas de Nãotecidos. Rio de Janeiro: ABNT, (4) E. S. Alencar, Criatividade. Brasília: Editora Universidade de Brasília, (5) M. Baxter. Projeto de produto. São Paulo: Editora Edgard Blucher Ltda., (6) M. I. Costa. Criatividade no design têxtil. In: ModaPalavra 1. Florianópolis: Udesc/Insular, (7). Design Têxtil em tempos pós-modernos. In: ModaPalavra. Florianópolis: Udesc/Insular, (8) J. Laver. A Roupa e a Moda uma história concisa. São Paulo: Companhia das Letras, 1989 (9) L. G. Maroni;, W. T. Publio Filho. Nãotecidos: tecnologias, mercados e aplicações. Nos anais do XVII Congresso Nacional de Técnicos Têxteis, Guarujá, São Paulo, (10) F. Ostrower. Criatividade e processos de criação. Petrópolis: Vozes, (11) G. Lipovetsky. O Império do Efêmero: a moda e o seu destino nas sociedades modernas. São Paulo: Companhia das Letras, (12) F. G. Rewald. Tecnologia dos Nãotecidos. Nãotecidos Consultoria e Assessoria S/C LTDA. São Paulo, (13) M. R. Sant anna, Curso de Pós Graduação em Moda, Centro de Artes, Universidade do Estado de Santa Catarina UDESC (14) J. F. Santos. O que é pós-moderno. São Paulo: Editora Brasiliense, (15) C. Seeling. Moda: o séculos dos estilistas Portugal: Könemann,
13 (16) M. E. Silva; A. C. Broega; A. A. Silva. Design do Conforto Total de Tecidos e Vestuário. ANAIS do XX Congresso Nacional de Técnicos Têxteis - Blumenau SC, 2002 (17) G. M. Souza. O Espírito das Roupas: a moda do século dezenove. São Paulo:Atlas,1987 (18) F. Vincent-Ricard. As Espirais da Moda. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989 (19) S. M. Wechsler. Criatividade: descobrindo e encorajando. Campinas: Editora Psy Ltda, ENDEREÇO / ADDRESS teciteca@udesc.br Fone: (0**48) Figura 1 Detalhe da bandeira de malimo Figura 2 Detalhe nãotecido esculpido Figura 3 Bandeira Procedimento Combinado Figura 4 fuxico tradicional 13
14 Figura 5 Estampada com gotas de silicone Figura 6 folha com gotas de orvalho Figura 7- Aplicação bandeira em moda Figura 8- Modelo conceitual SCFW 14
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