Efeito da farinha de trigo ozonizada sobre Sitophilus zeamais Motschulsky (Coleoptera: Curculionidae)

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1 Efeito da farinha de trigo ozonizada sobre Sitophilus zeamais Motschulsky (Coleoptera: Curculionidae) Rita Cristina Pereira de Freitas 1, Lêda Rita D Antonino Faroni 2, Juliana Lobo Paes 2, Yenis del Carmen Correa Gonzalez 1, Rodrigo de Oliveira Simões Departamento de Biologia Animal/Entomologia, Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG. 2 Departamento de Engenharia Agrícola, Universidade Federal de Viçosa, MG. Resumo O objetivo neste trabalho foi avaliar o efeito da farinha de trigo ozonizada sobre Sitophilus zeamais. Utilizou-se uma arena formada por cinco placas, na qual em duas placas foi colocada farinha de trigo ozonizada a ppm e nas outras duas placas farinha de trigo sem tratamento. Na placa central foram liberados 20 insetos e após 24h contado os insetos por placa. Os Índices de Repelência para o S. zeamais foram 0,58; 0,82 e 0,61 para as exposições 50, 90 e 150 min, respectivamente. A partir destes resultados, conclui-se que a farinha ozonizada apresenta potencial de repelência para S. zeamais. Palavras-chaves: Farináceos armazenados, efeito repelente, manejo integrado de pragas. Introdução A farinha de trigo infestada por insetos-praga apresenta mudanças em algumas de suas propriedades tecnológicas, tais como estabilidade da massa e da mistura, absorção de água e tempo de desenvolvimento. Além disso, produtos derivados da farinha apresentam características negativas como coloração escura, redução do volume e forte odor (SANCHEZ-MARINEZ et al., 1997). Dentre as pragas existentes em grãos e subprodutos armazenados, o Sitophilus zeamais Motschulsky (Coleoptera: Curculionidae) é uma praga destrutiva, com importância econômica reconhecida em regiões tropicais. Com relação à farinha de trigo, o aumento da infestação de S. zeamais em grãos de trigo reduz a sua qualidade tecnológica (PINTO et al., 2002). O controle de insetos pragas de grãos armazenados e seus subprodutos pode ser realizado por meio da aplicação do inseticida fumigante fosfeto de alumínio e dos principais inseticidas protetores organofosforados, piretróides. Entretanto, o uso contínuo destes inseticidas durante muito tempo juntamente com as técnicas de aplicação inadequadas vem acarretando no surgimento de popu- 615

2 lações de insetos-praga resistentes à fosfina (CHAMP & DYTE, 1976; PACHECO et al., 1990a; CHAUDHRY, 2000, PIMENTEL et al., 2007) e aos inseticidas organofosforados e piretróides (PACHECO et al., 1990b; GUEDES et al., 1995; RIBEIRO et al., 2003). Este fato, aliado aos riscos oferecidos pelos inseticidas à saúde humana, ao meio ambiente e a preocupação dos consumidores com a qualidade dos alimentos, têm motivado o desenvolvimento de novas alternativas de controle de insetos-praga que não interfiram na sua qualidade. Dentre as novas tecnologias visando a desinfecção de insetos pragas nos grãos e subprodutos, o gás ozônio pode se tornar uma alternativa economicamente viável no âmbito da manutenção e preservação da qualidade dos produtos de origem vegetal (KELLS et al., 2001; MENDEZ et al., 2003; SOUSA et al., 2008). O ozônio apresenta elevada toxicidade para insetos pragas de produtos armazenados (KELLS et al., 2001; MENDEZ et al., 2003), sendo eficaz como fumigante no controle de S. zeamais (ROZADO et al., 2008). No entanto, ainda não foram realizados estudos do efeito repelente do ozônio sobre S. zeamais. O estudo do efeito repelente de inseticidas pode contribuir para a redução do nível de aplicação de inseticidas, reduzindo os resíduos químicos em grãos e subprodutos e os custos do controle, bem como inibir infestações posteriores (COLLINS et al., 1988). Dessa forma, objetivou-se neste trabalho avaliar o efeito da farinha de trigo ozonizada sobre S. zeamais. Material e métodos Os experimentos foram conduzidos no Laboratório Manejo Integrados de Pragas (MIP - Grãos) do Departamento de Engenharia Agrícola (DEA) da Universidade Federal de Viçosa (UFV) a temperatura de 25 ± 2 ºC, umidade relativa do ar de 60 ± 10% e fotofase de 12 horas, com S. zeamais em farinha de trigo. Os insetos adultos de S. zeamais utilizados nos testes de repelência foram obtidos de criações mantidas em laboratório. As criações foram mantidas em recipientes de vidro (1,5 L), contendo grãos de milho com 13% umidade base úmidas (b.u.), sob as mesmas condições controladas de temperatura e umidade relativa, descritas anteriormente. Os insetos utilizados foram separados ao acaso e deixados em jejum por 24 horas, conforme metodologia descrita por Prates & Santos (2002). A ozonização da farinha de trigo (3,3 kg), na temperatura de 25 ºC, foi realizada em um protótipo composto por um tambor cilíndrico, em aço inoxidável, posicionado horizontalmente, com dimensões de 0,20 m de diâmetro e 0,30 m de comprimento. O protótipo foi projetado com sistema de hélice dupla que permite o tratamento da farinha em movimento, com a finalidade de proporcionar uma mistura homogênea da farinha com o gás. Nos lados opostos de cada extremidade do cilindro foram instaladas conexões para injeção, a um fluxo de 4,0 L min -1, e exaustão do ozônio. Submeteu-se a farinha de trigo a processo de ozonização a concentração de mg L -1 e em três períodos de exposição 50, 90 e 150 minutos. 616

3 A farinha de trigo ozonizada foi testada, utilizando-se uma arena (Figura 1) formada por cinco placas plásticas circulares (9,0 cm de diâmetro e 3,0 de altura), sendo a placa central interligada simetricamente às demais por tubos plásticos, dispostos diagonalmente (PROCÓPIO et al., 2003; TAVARES e VENDRAMIM, 2005). Figura 1. Arena utilizada nos testes de repelência. Amostras de farinha de trigo ozonizada (5 g), logo após tratamento de ozonização, foram colocadas em duas placas plásticas. Nas duas placas plásticas simetricamente opostas foram colocadas apenas amostra de farinha de trigo (5 g) sem tratamento (testemunha). Na placa plástica central foram liberados 20 adultos de S. zeamais, não sexados, e após 24 horas contou-se o número de insetos por placa. Para cada período de exposição da farinha de trigo ao gás ozônio foram utilizadas sete repetições. Para comparação dos tratamentos entre si, foi utilizado o Índice de Repelência (IR) (adaptado de LIE et al., 1990), calculado pela equação abaixo (Equação 1): (1) onde, G = % de insetos na farinha ozonizada, P = % de insetos na testemunha. Os valores de IR variam entre zero e dois, indicando: IR = 1, farinha de trigo ozonizada neutra; IR > 1, farinha de trigo ozonizada atraente e IR < 1, farinha de trigo ozonizada repelente. Como margem de segurança para essa classificação, o desvio padrão (DP) de cada tratamento foi adicionado/subtraído do valor 1,00 (indicativo de neutralidade). Assim, cada tratamento só foi considerado repelente ou atraente quando IR estava fora do intervalo de 1,00 ± DP. Os dados experimentais foram submetidos à análise de variância (ANOVA), sendo as diferenças entre as médias comparadas pelo teste Tukey, ao nível de 5% de probabilidade através do programa Saeg (Sistema de Análises Estatísticas), versão

4 Resultados e discussão Em todos os tratamentos com a farinha de trigo ozonizada, as porcentagens de insetos atraídos foram menores do que nas respectivas testemunhas, podendo, os mesmos serem considerados repelentes com base nesse critério. Dentre estes, destacaram-se como mais efetivos, os tratamentos com períodos de ozonização de 50 e 150 minutos, nos quais menos de 62% do IR dos adultos foram encontrados nas placas contendo farinha ozonizada (Tabela 1). O IR não apresentou comportamento linear em função do aumento do período de exposição da farinha de trigo ao ozônio. Após aumento de 40 minutos no período de exposição da farinha de trigo ao ozônio, do tratamento 1 para o tratamento 2, o IR aumentou, estando mais próximo de um efeito de neutralidade (IR=1), do que de repelência. E após um incremento de 100 minutos, do tratamento 1 para o tratamento 3, não houve mudança observada para este índice. No entanto, para todos os tratamentos, observaram-se potencial de repelência da farinha ozonizada; os índices variaram de 0,58 a 0,82 (Tabela 1). Tabela 1. Repelência de farinha ozonizada, [O 3 ]=2.000 mg L -1, sobre adultos de S. zemais. Temperatura de 25 ± 2 ºC, umidade relativa do ar de 60±10% e fotofase de 12 horas. Tratamentos Adultos atraídos (%) 1 IR 2 (M ± DP) Classificação 1) 50 minutos 28,8 a 0,58 ± 0,34 Repelente Testemunha 71,2 b 2) 90 minutos 40,9 a 0,82 ± 0,23 Repelente Testemunha 59,1 a 3) 150 minutos 30,6 a 0,61 ± 0,26 Repelente Testemunha 69,4 a 1 Médias seguidas de mesma letra na coluna não diferem entre si ao nível de 5% de probabilidade pelo teste Tukey. 2 IR = Índice de Repelência. Segundo alguns pesquisadores (PEREIRA et al., 2008; ROZADO et al., 2008), a eficácia do gás ozônio é influenciada pelo período de exposição, pela distribuição dos insetos-praga no produto e pela temperatura do meio durante o tratamento. Estes autores relataram que o aumento no período de exposição, elevou a mortalidade, a qual é mais evidenciada nas proximidades da injeção do gás ozônio, corroborando com os resultados encontrados por Kells et al. (2001). Deste modo, os resultados encontrados no presente trabalho indicam que o tratamento da farinha de trigo com ozônio pode ser considerado relevante no controle de insetos-praga de grãos armazenados, especialmente as pragas de trigo e de seus subprodutos armazenados, podendo ser incluído em estratégias que visam minimizarem a probabilidade da evolução da resistência à outros agentes de controle químicos, além de contribuírem também para redução dos níveis de aplicação destes produtos, diminuindo, consequentemente, a presença de resíduos químicos nos grãos e também em seus subprodutos. Os dados apresentados podem ainda servir como parâmetro de comparação para trabalhos futuros de repelência destas mesmas pragas, podendo também contribuir para aplicação desta informação nas decisões com relação ao manejo integrado de pragas. Diante do exposto, pode-se concluir que a farinha de trigo ozonizada apresenta 618

5 potencial de repelência para a espécie de insetos-praga avaliada. Referências bibliográficas CHAMP, B.R.; DYTE, C.E. Informe de la prospección mundial de la FAO sobre susceptibilidad a los insecticidas de las plagas de granos almacenados. Roma: FAO, 356p, CHAUDHRY, M.Q. Phosphine resistance: a growing threat to an ideal fumigant. Pesticide Outlook, 88-91, COLLINS, P.J.; SINCLAIR, E.R.; HOWITT, C.J.; HADDRELL, R.L. Dispersion of grain beetles (Coleoptera) in grain partially treated with insecticide. Journal of Economic Entomology 81: , GUEDES, R.N.C.; LIMA, J.O.G.; SANTOS, J.P.; CRUZ, C.D. Resistance to DDT and pyrethroids in Brazilian populations of Sitophilus zeamais Motsch. (Coleoptera: Curculionidae). Journal of Stored Product Research, v.31, p , KELLS, S.A.; MASON, L.J.; MAIER, D.E.; WOLOSHUK, C.P. Efficacy and fumigation characteristics of ozone in stored maize. Journal of Stored Products Research, v.37, p , LIE, H.; KOGAN, M.; FISCHER, D. Induced resistance in soybean to the Mexican bean beetle (Coleoptera: Coccinellidae): comparisons of inducing factors. Environmental Entomology, v.19, p , MENDEZ, F.; MAIER, D.E.; MASON, L.J.; WOLOSHUK, C.P. Penetration of ozone into columns of stored grains and effects on chemical composition and performance. Journal of Stored Products Research, v.39, n.1, p.33-44, PACHECO, I.A.; SARTORI, M.R.; TAYLOR, R.W.D. Levantamento de resistência de insetos-praga de grãos armazenados à fosfina no estado de São Paulo. Coletânea do ITAL, Campinas, v.20, n.2, p , 1990 a. PACHECO, I.A.; SARTORI, M.R.; BOLONHEZI, S. Resistance to malathion, pirimiphos-methyly and fenitrithion in Coleoptera from stored grains. In: Fifth International Working Conference on Stored-Products Protection, Bordeaux. Proceeding. Bordeaux, p , 1990 b. PEREIRA, A.M.; FARONI, L.R.A.; SOUSA, A.H.; URRUCHI, W.M.I.; PAES, J.L. Influência da temperatura da massa de grãos sobre a toxicidade do ozônio a Tribolium castaneum. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, v.12, n.5, p , PIMENTEL, M.A.G.; FARONI, L.R.A.; TÓTOLA, M.R.; GUEDES, R.N.C. Phosphine resistance, respiration rate and fitness consequences in stored-product insects. Pest Management Science, v. 63, n. 9, p , PINTO, U.M.; FARONI, L.R.D A.; ALVES, W.M.; SILVA, A.A.L. Influência da densidade populacional de Sitophilus zeamais (Motsch.) sobre a qualidade do trigo destinado à panificação. Acta Scientiarum, Maringá, v. 24, n. 5, p ,

6 PRATES, H.T.; SANTOS, J.P. dos. Óleos essenciais no controle de pragas de grãos armazenados. In: LORINI, I.; MIIKE, L.H.; SCUSSEL, V.M. (Org.). Armazenagem de grãos. Campinas: IBG, p , PROCÓPIO, S.O.; VENDRAMIM J.D.; RIBEIRO JR., J.I.; SANTOS, J.B. Bioatividade de diversos pós de origem vegetal em relação à Sitophilus zeamais Mots. (Coleoptera: Curculionidae). Ciência e Agrotecnologia, v.27, p , RIBEIRO, B.M.; GUEDES, R.N.C.; OLIVEIRA, E.E.; SANTOS, J.P. Insecticide resistance and synergism in Brazilian populations of Sitophilus zeamais (Coleoptera: Curculionidae). Journal of Stored Products Research, v.39, n.1, p.21-31, ROZADO, A.F.; FARONI, L.R.A.; URRUCHI, W.M.I.; GUEDES, R.N.C.; PAES, J.L. Aplicação de ozônio contra Sitophilus zeamais e Tribolium castaneum em milho armazenado. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, v.12, n.3, p , SANCHEZ-MARINEZ, R.I.; CORTEZ-ROCHA, M.O.; ORTEGA-DORAME, F.; MORALES-VALDES, M.; SILVEIRA, M.I. End-use quality of flour from Rhyzopertha dominica infested wheat. Cereal Chem. St. Paul, v.74, n.4, p , SOUSA, A.H. ; FARONI, L.R.D A. ; GUEDES, R.N.C. ; TÓTOLA, M.R.; URRUCHI, W.I. Ozone as a management alternative against phosphine-resistant insect-pests of stored products. Journal of Stored Products Research, v.44, p , TAVARES, M.A.G.C.; VENDRAMIM, J.D. Bioatividade da Ervade-Santa-Maria, Chenopodium ambrosioides L., sobre Sitophilus zeamais Mots. (Coleoptera: Curculionidae). Neotropical Entomology, v.34, p , UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA. SAEG: sistema para análises estatísticas e genéticas. Versão 9.1. Viçosa: Fundação Arthur Bernardes,