BIOESTRATIGRAFIA (FORAMINIFERIDA) DO MIOCENO-PLIOCENO DA PLATAFORMA DE FLORIANÓPOLIS, PORÇÃO SETENTRIONAL DA BACIA DE PELOTAS



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Transcrição:

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOCIÊNCIAS BIOESTRATIGRAFIA (FORAMINIFERIDA) DO MIOCENO-PLIOCENO DA PLATAFORMA DE FLORIANÓPOLIS, PORÇÃO SETENTRIONAL DA BACIA DE PELOTAS GEISE DE SANTANA DOS ANJOS ORIENTADOR: Dr. João Carlos Coimbra (UFRGS) CO-ORIENTADORA: Dra. Ana Luisa Carreño (UNAM) COMISSÃO EXAMINADORA: Prof.Dr. Jorge Alberto Villwock (PUCRS) Profa. Dra. Maria Antonieta da Conceição Rodrigues (UERJ) Prof. Dr. Paulo Alves de Sousa (UFRGS) Dissertação de Mestrado apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Ciências Porto Alegre 2004

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOCIÊNCIAS ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ESTRATIGRAFIA CONVÊNIO UFRGS/ANP AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO Programa de Recursos Humanos da ANP para o setor de petróleo e gás PRH ANP/MME/MCT nº12 BIOESTRATIGRAFIA (FORAMINIFERIDA) DO MIOCENO- PLIOCENO DA PLATAFORMA DE FLORIANÓPOLIS, PORÇÃO SETENTRIONAL DA BACIA DE PELOTAS RELATÓRIO FINAL DE PESQUISA Mestranda: Geise de Santana dos Anjos Orientador: Prof. Dr. João Carlos Coimbra (UFRGS) Co-Orientadora: Profa. Dra. Ana Luisa Carreño (UNAM) Mestrado em Evolução de Bacias e Reservatórios Petrolíferos Comissão Gestora: Claiton Marlon Scherer Luiz Fernando De Ros Luiz José Tomazelli Michael Holz 1

SUMÁRIO Agradecimentos...3 Resumo...4 Abstract...5 1 Introdução...6 2 Material e Métodos...7 3 - Repositório...8 4 Localização da Área...9 5 Trabalhos Anteriores...10 6 Geologia...15 6.1 Breve Histórico da Evolução dos Conhecimentos...15 6.2. Contexto Geológico...19 7 A Microfauna de Foraminíferos Planctônicos...24 7.1 Características Gerais...24 7.2 Considerações Taxonômicas...32 7.3 Considerações Paleoceanográficas...37 8 Bioestratigrafia...41 8.1 Esquemas Zonais para Baixas Latitudes...41 8.2 Zoneamento Bioestratigráfico Local...46 8.2.1 Sondagem 1-SCS-2...48 8.2.2 Sondagem 1-SCS-3B...52 9 Discussão...61 10 Conclusões...68 11 Referências Bibliográficas...69 12 Estampas...80 2

AGRADECIMENTOS Gostaria de agradecer a todas as pessoas e instituições envolvidas direta ou indiretamente na realização deste trabalho, principalmente as abaixo citadas: A Universidade Federal do Rio Grande do Sul pela infra-estrutura do Programa de Pós-graduação em Geociências. A Agência Nacional do Petróleo (ANP) pela concessão da bolsa de estudos e pelo financiamento da pesquisa. Ao Prof. João Carlos Coimbra pela dedicada orientação e pela confiança e amizade a mim ofertadas. A Profa. Ana Luisa Carreño (Analuisita) pela paciência e infinita boa vontade ao transmitir conhecimentos e pelo tratamento carinhoso, mesmo à distância. Ao Dr. Henrique Zerfass (CPRM) pelas excelentes sugestões e pela indicação e empréstimo de referências bibliográficas. Ao Prof. Luiz Fernando De Ros (UFRGS) pelas proveitosas discussões acerca de processos diagenéticos e pela indicação de bibliografias concernentes ao tema. Aos Engenheiros Francis Farret Darsie e Luciano Vieceli Taviera pelo auxílio na realização das fotografias em microscópio eletrônico de varredura. A Dra. Karen Badaraco Costa (UFRGS) pelo auxílio na aquisição de fotografias do material em lupa binocular. Aos colegas do Curso de Pós-graduação em Geociências: Cristianini, Claúdia e Vladimir pelo auxílio na etapa de laboratório. Aos colegas da área da Estratigrafia Anderson Maraschim, Camila Braga Barreiro, Carla Klein, Luciane Fontana e Maria Rosilene Menezes pelo auxílio em diversas questões logísticas e pelo companheirismo. Aos funcionários Roberto, Paulo, Lisandro e Carlos pela colaboração e pela solicitude com que sempre me atenderam. À minha família, meu agradecimento especial pela resignada paciência e pelo incentivo que tornaram possível a conclusão deste trabalho. À família Zerfass, que se tornou minha segunda e também muito querida família, pelo apoio, e principalmente por acreditar. 3

RESUMO A análise dos foraminíferos planctônicos ao longo das sondagens 1-SCS-2 e 1-SCS-3B, efetuadas pela PETROBRAS na Plataforma de Florianópolis, revelou uma microfauna pobre, porém, bastante diversificada. O material estudado apresentou diferentes formas de preservação, atribuídas a processos eodiagenéticos e não a redeposição de material antigo. Foram identificados 85 táxons, pertencentes a 15 gêneros e cinco famílias, cuja distribuição ao longo das sondagens indica idade neogênica para a sucessão sedimentar estudada. O estudo desta assembléia possibilitou o reconhecimento de nove zonas de intervalo com base no emprego dos critérios estabelecidos no esquema bioestratigráfico de Bolli & Saunders (1985). No poço 1-SCS-2, foram identificadas quatro zonas na seção miocência (Catapsydrax dissimilis, Catapsydrax stainforthi, Globorotalia fohsi robusta e Globorotalia mayeri) e duas subzonas na seção pliocênica (Globorotalia margaritae evoluta e Globigerinoides trilobus fistulosus). Na seção miocênica do poço 1-SCS-3B foram reconhecidas seis zonas (Catapsydrax dissimilis, Catapsydrax stainforthi, Globorotalia fohsi fohsi, Globigerinoides ruber, Globorotalia mayeri e Globorotalia acostaensis/globorotalia menardii), e na seção pliocênica, duas subzona (Globorotalia margaritae evoluta e Globigerinoides trilobus fistulosus). Foram identificados quatro hiatos importantes situados no limite Mioceno- Oligoceno, no Mioceno inferior, no limite Mioceno inferior-mioceno médio e aquele que marca o limite Mioceno-Plioceno. Correlações com os zoneamentos prévios apresentados em Koutskoukos (1982) e Gomide (1989) evidenciaram que o esquema bioestratigráfico aqui estabelecido implica na redução da seção sedimentar neogênica nas referidas sondagens. A aplicabilidade do esquema zonal de Bolli & Saunders (1985) para as sondagens estudadas foi comprovada através da identificação de diversas espécies de interesse estratigráfico, as quais permitiram a obtenção de uma boa resolução bioestratigráfica para o Neogeno. A análise da distribuição de foraminíferos planctônicos presentes ao longo de outros poços efetuados na porção offshore permitirá estabelecer com um maior grau de confiança a aplicação do esquema bioestratigráfico dos autores supracitados e, portanto, propor a sua extensão para toda a bacia. 4

ABSTRACT The analysis of the planktonic foraminifers recovered from 1-SCS-2 and 1-SCS-3B drill-holes, Florianópolis Platform, State of Santa Catarina, Brazil, revealed a diversified, although poor, microfauna. The tests presented different preservational states, whose were attributed to early diagenetic process. It were identified 85 species and subspecies belonging to 15 genera, whose stratigraphical range indicates a Neogene age for the sediments herein studied. The analysis of this assemblage allowed the recognition of nine interval zones based on the zonal criteria established in Bolli & Saunders (1985). In the 1-SCS-2 drill-hole, it were identified four zones in the Miocene section (in stratigraphic order: Catapsydrax dissimilis, Catapsydrax stainforthi, Globorotalia fohsi robusta e Globorotalia mayeri) and two subzones in the Pliocene section (Globorotalia margaritae evoluta and Globigerinoides trilobus fistulosus). In the 1-SCS-3B drill-hole, it were identified six zones in the Miocene section (in stratigraphic order: Catapsydrax dissimilis, Catapsydrax stainforthi, Globorotalia fohsi fohsi, Globigerinoides ruber, Globorotalia mayeri and Globorotalia acostaensis/globorotalia menardii) and two subzones in the Pliocene (in stratigraphic order: Globorotalia margaritae evoluta and Globigerinoides trilobus fistulosus,). Four important hiatuses were observed, whose are situated at Oligocene-Miocene boundary, Early Miocene, Early Miocene-Middle Miocene and Miocene-Pliocene boundary. Correlations with previous zonations presented in Koutsoukos (1982) and Gomide (1989) in the area shown that the zonal scheme here proposed implies in reduction of the neogenic sedimentary section in the studied drill-holes. The applicability of the Bolli & Saunders (1985) zonal scheme to the studied drill-hole were proved by the recognition of various index species, whose allowed a good bioestratigraphic resolution to the Neogene period. Analysis of the planktic foraminifers from others offshore drill-holes can establish, with a better confidence degree, the application of this zonal scheme to the whole basin 5

1 INTRODUÇÃO Os foraminíferos planctônicos representam um dos grupos de microfósseis mais estudados nas seções sedimentares marinhas do Cenozóico. Devido à sua abundância, ampla distribuição geográfica e alta taxa de evolução e por serem facilmente recuperáveis de amostras de calha e testemunhos, são aplicados em correlações biocronoestratigráficas, estudos paleoceanográficos e paleobiogeográficos. A utilização destas formas na indústria do petróleo como ferramenta de correlação de precisão e datação relativa revolucionou o conhecimento da bioestratigrafia do Cenozóico. Historicamente, o suporte da indústria do petróleo aos estudos micropaleontológicos tem sido de fundamental importância no desenvolvimento da bioestratigrafia que, acompanhando as novas tecnologias implementadas pelas empresas, vem sendo aperfeiçoada para a integração com novas ferramentas como a estratigrafia de seqüências e a sísmica 3-D na análise de bacias sedimentares. No contexto da prospecção de petróleo, a importância do estudo bioestratigráfico detalhado da seção terciária das bacias marginais brasileiras se justifica pela ocorrência de grandes acumulações em reservatórios do Oligo-Mioceno, como os turbiditos das bacias de Campos e Santos. A Bacia de Pelotas, que até então tem sua prospectividade pouco avaliada, teria como possíveis prospectos os turbiditos cretácicos e terciários. Desde o início do século passado, a Bacia de Pelotas tem sido alvo de estudos bioestratigráficos, paleoecológicos e de cunho taxonômico baseados em vários grupos de microfósseis. A partir 1958, com a realização de sondagens exploratórias pela PETROBRAS, houve um incremento nos estudos utilizando microfósseis. Contudo, a bioestratigrafia do Terciário da Bacia de Pelotas não pode ser considerada suficientemente estudada, visto que a maioria dos autores se deteve na análise das assembléias de microfósseis recuperadas de material proveniente da seção pósoligocênica em sondagens onshore. A intensa diversificação da microfauna de foraminíferos planctônicos nas bacias marginais brasileiras durante o Terciário, pode proporcionar a caracterização bioestratigráfica refinada deste intervalo (Nogutti & Santos, 1972). Deste modo, estudos bioestratigráficos detalhados com base em foraminíferos planctônicos se constituem em uma poderosa ferramenta para o conhecimento da seção neocenozóica da Bacia de Pelotas. Partindo desta premissa, a Plataforma de Florianópolis foi escolhida para a 6

execução do presente trabalho tendo em vista a escassez de estudos bioestratigráficos na região que, por ser uma área pouco favorável à prospecção de petróleo, tem sido tradicionalmente pouco estudada. Através da análise da microfauna de foraminíferos planctônicos recuperados de duas sondagens offshore, objetiva-se a proposição de um zoneamento bioestratigráfico para a seção do Mioceno-Plioceno da Plataforma de Florianópolis, porção setentrional da Bacia de Pelotas. Também é objetivo deste trabalho a discussão de zoneamentos prévios realizados com base em foraminíferos planctônicos e nanofósseis calcários. Visando uma abordagem mais aprofundada pertinente ao tema, são objetivos específicos desta pesquisa: Caracterizar o estado de preservação dos espécimes ao longo das sondagens estudadas, tendo em vista a importância da correta distinção entre formas retrabalhadas e formas in situ na análise bioestratigráfica da sucessão sedimentar em questão; Identificar a microfauna de foraminíferos planctônicos do intervalo Mioceno-Plioceno nos poços analisados e ilustrar em microscopia eletrônica de varredura as espécies de interesse estratigráfico reconhecidas; Testar a viabilidade da utilização do esquema zonal para baixas latitudes de Bolli & Saunders (1985) na Bacia de Pelotas. 2 MATERIAL E MÉTODOS Foram analisadas 71 amostras de calha provenientes dos poços 1-SCS-2 e 1- SCS-3B perfurados na porção offshore da Bacia de Pelotas, os quais atingiram profundidades de 4.611 m e 4.737 m respectivamente (Figura 1). As amostras foram coletadas sistematicamente a cada 15 m nos intervalos localizados entre 270 m e 1.350 m no poço 1-SCS-2 e de 360 m a 1.320 m no poço 1-SCS-3B. O processo de preparação das amostras consistiu das seguintes etapas: (1) separação de 40 g de sedimento seco de cada amostra; (2) adição de peróxido de hidrogênio (H 2 O 2 ) 34 volumes por cerca de 20 minutos, em quantidade suficiente para cobrir totalmente a amostra, com o objetivo de desagregar os grãos através da queima da matéria orgânica; 7

(3) lavagem em água corrente sobre peneiras de malha 0,250 mm, 0,177 mm, e 0,062 mm. Após a lavagem de cada amostra as peneiras foram imersas em uma solução aquosa de azul de metileno com objetivo de colorir os microfósseis que eventualmente estivessem presos na malha, evitando assim a contaminação de outras amostras no processo de preparação; (4) secagem em estufa a 60ºC; (5) triagem de todos os exemplares de foraminíferos planctônicos das frações retidas nas peneiras de malha 0,177 mm e 0,062 mm. Posteriormente, os microfósseis foram colados em lâminas micropaleontológicas; (6) Identificação taxonômica das espécies com base em bibliografia especializada; (7) fotografia de exemplares representativos das espécies-índice e formas associadas de cada biozona em microscópio eletrônico de varredura, modelo JSM-5800, no Centro de Microscopia Eletrônica da UFRGS, com vistas à identificação e documentação dos táxons; (8) fotografia de espécimes em lupa binocular, modelo Olympus SZ-CTV com câmera acoplada Olympus DP11, no laboratório de Geologia Isotópica da UFRGS, e análises de espectrometria por dispersão de energia (EDS) no Centro de Microscopia Eletrônica da UFRGS, visando a documentação dos diferentes tipos de preservação do material estudado. 3 REPOSITÓRIO O material analisado está tombado no Museu de Paleontologia e Estratigrafia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul sob a denominação Foraminiferida (Bacia de Pelotas). Os microfósseis foram ordenados com base no número de tombamento da amostra de onde foram recuperados e os exemplares figurados receberam a numeração de MP-F-3085 a MP-F-3110.. 8

4 LOCALIZAÇÃO DA ÁREA A Bacia de Pelotas compreende o trecho da margem continental sul-brasileira localizada entre os paralelos 28ºS e 34ºS, sendo limitada ao norte pelo Alto de Florianópolis, e ao sul pela fronteira com o Uruguai (Kowsmann et al., 1974) (Figura 1). Sua continuidade em território uruguaio é conhecida como Bacia do Leste e se estende até o alto do embasamento de La Coronilla. A bacia ocupa uma área de cerca de 210.000 km 2 até a isóbata de 2.000 m e sua porção emersa, que constitui a planície costeira do Rio Grande do Sul, cobre cerca de 40.000 km 2 (Dias et al., 1994a). Figura 1 Mapa de localização da Bacia de Pelotas e situação dos poços perfurados pela PETROBRAS. Os poços analisados neste trabalho estão destacados em amarelo. 9

5 - TRABALHOS ANTERIORES Desde a publicação do trabalho de Carvalho (1932), no qual o autor reporta a ocorrência de fósseis na sondagem anteriormente estudada por White (1908), diversos autores estudaram os fósseis cenozóicos, inicialmente moluscos, em sondagens efetuadas na Bacia de Pelotas. Com a realização das primeiras perfurações pela PETROBRAS entre 1958 e 1964, iniciou-se a publicação de uma série de trabalhos baseados em foraminíferos, ostracodes, nanofósseis calcários e palinomorfos, dos quais destacam-se os abaixo relacionados. Closs (1966a) discutiu a importância da ocorrência da linhagem evolutiva Globigerinoides bispherica Orbulina suturalis em oito poços exploratórios perfurados na Bacia de Pelotas. Segundo o autor, a associação observada no intervalo estudado seria equivalente ao limite entre as zonas Globigerinatella insueta e Globorotalia fohsi barisanensis (atualmente, Zona Globorotalia fohsi peripheroronda) de Bolli (1957). Analisando cinco poços perfurados na planície costeira do Rio Grande do Sul, Closs (1966b) identificou as zonas Globorotalia fohsi barisanensis (atualmente, Zona Globorotalia fohsi peripheroronda) e Globorotalia fohsi fohsi, definidas por Bolli (1957). O autor assinalou a ausência da maioria das espécies de Globorotalia e a predominância de espécies do gênero Globigerinoides nos estratos miocênicos da Bacia de Pelotas. Posteriormente, Closs (1967) analisou assembléias de foraminíferos recuperados de poços efetuados na porção onshore da bacia, tendo identificado uma associação bastante similar àquelas encontradas no Caribe e na Venezuela. Closs & Madeira (1968), analisaram amostras provenientes de quatro perfurações onshore efetuadas na região nordeste do Uruguai, porção sul da Bacia de Pelotas. Apenas a sondagem efetuada na localidade de Chuy apresentou fósseis, não tendo sido, entretanto, encontrados foraminíferos planctônicos. Os autores inferiram idade mio-pleistocência para os depósitos estudados com base na correlação dos foraminíferos bentônicos, briozoários e braquiópodos com aqueles encontrados nas perfurações efetuadas na porção brasileira da bacia. 10

Bianchi (1969), descreveu os bancos de ostreídeos fósseis localizados na planície costeira do Rio Grande do Sul. O autor inferiu, para estes depósitos, um ambiente de deposição estuarino de idade pleistocênica, correlacionável com a transgressão belgranense da Argentina. Daemon (1969), apresentou dados taxonômicos e bioestratigráficos baseados em palinomorfos recuperados de quatro perfurações onshore na Bacia de Pelotas, tendo estabelecido quatro biozonas. Forti (1969), estudou assembléias de moluscos cenozóicos na planície costeira do Rio Grande do Sul, em duas perfurações onshore, tendo efetuado uma correlação preliminar desta fauna com a encontrada no Quaternário do Uruguai e norte da Argentina. Com base no estudo de foraminíferos bentônicos do Mioceno em oito perfurações onshore na Bacia de Pelotas, Closs (1970) propôs quatro biozonas para o intervalo. Entretanto, não foi possível estabelecer uma correlação através de toda a bacia, já que as biozonas identificadas não ocorreram em todos os poços estudados. Analisando assembléias de moluscos fósseis do Cenozóico da planície costeira do Rio Grande do Sul, Forti (1971) inferiu a ocorrência de níveis de idade holocência para as perfurações efetuadas em Cassino e Palmares do Sul. Thiesen (1975) estabeleceu três biozonas informais com base na distribuição vertical das espécies de foraminíferos bentônicos das famílias Bolivinitidae e Caucasinidae em duas sondagens efetuadas pela PETROBRAS na porção onshore da Bacia de Pelotas, tendo sugerido a ocorrência de estratos do mesomioceno ao Pleistoceno nestes poços. Com base na distribuição das espécies de foraminíferos bentônicos do gênero Uvigerina nos mesmos poços analisados por Thiesen (1975), Fernandes (1975) estabeleceu quatro biozonas informais (U. subperegrina, U. acuminata, U. hosiusi e U. gallowayi) para o intervalo do mesomioceno ao Pleistoceno. Bertels & Madeira-Falcetta (1977) realizaram uma revisão dos conhecimentos acerca das assembléias de foraminíferos dos depósitos do Mioceno-Plioceno do Atlântico Sul. Segundo as autoras, as associações de foraminíferos planctônicos de baixas latitudes seriam comparáveis àquelas da região do Caribe, enquanto as da Bacia de Pelotas teriam mais afinidade com as de clima temperado. 11

Através do estudo de assembléias de foraminíferos bentônicos e moluscos em perfurações e afloramentos ao longo da planície costeira do Uruguai, Sprechmann (1978) analisou a evolução geológica do Mioceno-Plioceno na porção sul da Bacia de Pelotas. Com base na distribuição das espécies, o autor propôs um modelo paleogeográfico para a margem atlântica da América do Sul durante o Mioceno, no qual posicionou a Bacia de Pelotas na Sub-província Norte-brasileira, caracterizada por águas tropicais, sem a influência da Corrente das Malvinas. Visando a reconstrução paleogeográfica e o reconhecimento das províncias faunísticas que prevaleceram do Cretáceo ao Terciário no continente sul-americano, Bertels (1979) realizou uma síntese dos dados obtidos acerca das assembléias de foraminíferos bentônicos e planctônicos. A autora inferiu que do eomioceno ao Pleistoceno a Bacia de Pelotas estava inserida no contexto da Geobioprovíncia Sulbrasileira. Boltovskoy (1979) efetuou um estudo acerca da paleoceanografia do Atlântico Sul Ocidental do Mioceno ao Plioceno com base na análise de foraminíferos bentônicos e planctônicos, tendo incluído a Bacia de Pelotas na Provínc ia Paleobiogeográfica Sulbrasileira. Sanguinetti (1979, 1980) realizou a análise da distribuição dos ostracodes em oito sondagens onshore, tendo estabelecido um zoneamento bioestratigráfico preliminar para o Mioceno da Bacia de Pelotas. A fauna de ostracodes miocênicos representaria uma associação de ambiente nerítico. Com base na distribuição das espécies de foraminíferos e radiolários recuperados de 15 testemunhos efetuados na plataforma continental do Rio Grande do Sul, Madeira-Falcetta et al. (1980) inferiram que do Plioceno ao Pleistoceno a Bacia de Pelotas teria sofrido maior influência das correntes frias austrais, enquanto que durante o Holoceno teria ocorrido uma maior influência da Corrente do Brasil. Visando o estabelecimento de curvas paleoclimáticas, Rodrigues & Carvalho (1980) analisaram assembléias de foraminíferos provenientes de 15 testemunhos efetuados na porção offshore da Bacia de Pelotas no âmbito das Operações GEOMAR IV e VI. Com base na análise das formas planctônicas, as autoras inferiram idades do Pleistoceno ao Holoceno para os sedimentos estudados e, através da distribuição vertical dos foraminíferos bentônicos, verificaram a ocorrência de ciclos transgressivos durante o período em questão. 12

Bertels et al. (1982) analisaram assembléias de foraminíferos bentônicos e ostracodes da Formação Chui, na porção sul da Bacia de Pelotas, tendo registrado a ocorrrência de eventos transgressivos-regressivos durante o Pleistoceno-Holoceno inferior. Boltovskoy et al. (1982) estudaram a microfauna de foraminíferos bentônicos e planctônicos da seção sedimentar do Pleistoceno-Holoceno, recuperados de um testemunho de sondagem perfurado no talude em frente à costa do Estado do Rio Grande do Sul, à altura da Laguna dos Patos. A assembléia identificada apresentou espécies de águas subtropicais e subantárticas, com o predomínio das primeiras. Koutsoukos (1982) estudou preliminarmente a Plataforma de Florianópolis e a Bacia de Santos com ênfase em biocronoestratigrafia, paleoecologia e geohistória, tendo por base a análise de foraminíferos e microfósseis associados. O autor subdividiu a coluna sedimentar da Plataforma de Florianópolis em duas seqüências deposicionais que englobam sedimentos do Albiano ao Holoceno, concluindo que as seqüências e descontinuidades cronoestratigráficas seriam controladas principalmente por variações eustáticas globais e secundariamente pela tectônica local. Com base no estudo da microfauna de foraminíferos provenientes de quatro perfurações efetuadas pela Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) na planície costeira do Rio Grande do sul, Boltovskoy et al. (1983a,b) inferiram que a temperatura das águas no eomioceno era superior à atual e, portanto, a Corrente do Brasil teria exercido uma influência mais efetiva na região à época. Segundo os autores, durante o eomioceno esta região se constituía num ambiente de plataforma continental de clima quente, e do mesomioceno ao Plioceno a área em apreço representava um ambiente continental. Devido a uma forte transgressão, no Pleistoceno a região passou a ser um ambiente francamente marinho. Thiesen & Madeira-Falcetta (1984) apresentaram uma análise paleoecológica da porção norte da província costeira do Rio Grande do Sul, com base no estudo da microfauna de foraminíferos de 11 sondagens. Segundo as autoras, os depósitos marinhos mais antigos desta região seriam do eomioceno, depositados em ambiente nerítico médio/inferior. Sobreposto a estes foi identificado um intervalo com características de ambiente nerítico superior de idade mesomioceno-plioceno, seguido por um intervalo pliocênico com características continentais. 13

Kotzian & Eilert (1985) analisaram a ostracofauna de dois intervalos da perfuração Chuy nº 364 efetuada pelo Instituto Geológico del Uruguay na porção onshore da Bacia de Pelotas. Com base na distribuição das espécies, as autoras atribuíram idade miocênica e ambiente de deposição marinho de águas rasas ao intervalo mais inferior da sondagem, enquanto que os sedimentos do intervalo superior teriam idade pleistocênica, tendo sido depositados em ambiente transicional (lagunar ou estuarino). Com base na distribuição dos foraminíferos, Madeira-Falcetta & Thiesen (1988) caracterizaram os depósitos da perfuração 1-GAst-1A-RS, efetuada pela PETROBRAS na planície costeira do Rio Grande do Sul, quanto aos aspectos bioestratigráficos e paleoambientais. Segundo as autoras o pacote estudado corresponderia a uma seqüência transgressivo-regressiva composta por sedimentos do mesomioceno ao neomioceno e depósitos pleistocênicos. O Mioceno marinho seria a Época melhor representada na bacia, apresentando foraminíferos em excelente estado de preservação. Já o Plioceno, apresentando conteúdo microfossilífero escasso, seria caracterizado por depósitos continentais ou costeiros. Gomide (1989) estabeleceu a biocronoestratigrafia da seção marinha da Bacia de Pelotas com base na análise de nanofósseis calcários recuperados de sete poços onshore e cinco offshore. Nos poços da porção emersa a idade mais antiga identificada foi o intervalo superior do eomioceno, enquanto que nos poços da parte submersa os sedimentos mais antigos identificados datam do Albiano-Cenomaniano. A seção do Mioceno-Plioceno foi considerada bem representada na bacia, sendo que o Mioceno apresentou todas as biozonas estabelecidas em outras bacias da margem continental brasileira. Este trabalho se constitui num dos mais importantes acerca da bioestratratigrafia da Bacia de Pelotas. Sanguinetti et al. (1991, 1992) realizaram estudos taxonômicos de ostracodes pós-miocênicos provenientes de sete perfurações efetuadas na porção emersa da bacia em apreço. Boltovskoy & Watanabe (1993) estudaram assembléias de foraminíferos bentônicos uniloculares do Cenozóico recuperados de testemunhos efetuados na Bacia de Pelotas, no âmbito do Deep Sea Drilling Project (DSDP) site 525 (Cordilheira de Walvis, zona batial e Atlântico Sul). Os autores identificaram uma microfauna 14

qualitativamente rica, porém pouco numerosa, onde a maioria das espécies apresenta pouca aplicação bioestratigráfica. Baseando-se na distribuição dos ostracodes recuperados de cinco sondagens onshore realizadas pela PETROBRAS, Carreño et al. (1997) propuseram um fatiamento bioestratigráfico para o plio-pleistoceno da Bacia de Pelotas. Os autores reconheceram cinco zonas de associação, onde mudanças na composição e abundância da assembléia de ostracodes indicariam ao menos três ciclos regressivo-transgressivos. Carreño et al. (1999) estudaram as ostracofaunas do Neocenozóico da Bacia de Pelotas com vistas à identificação de variações do nível relativo do mar. Os autores identificaram diversas mudanças ambientais no intervalo estudado e caracterizaram quatro breves ciclos transgressivo-regressivos, com base na distribuição das espécies ao longo das seqüências sedimentares do neomioceno ao eopleistoceno. Com base na análise da microfauna de ostracodes recuperados de poços exploratórios, Carmo & Sanguinetti (1999) inferiram condições paleoambientais de baixas temperaturas em ambiente de plataforma continental, para a seção neocenozóica da Bacia de Pelotas. Considerando o cenário paleoecológico, os autores sugeriram que a Corrente das Malvinas já havia se estabelecido no Mioceno. Gonçalves & Dehnhardt (1999) analisaram os nanofósseis calcários do testemunho T-01, efetuado no cone do Rio Grande durante a campanha ocenográfica GEOMAR VII. As autoras identificaram um nível de retrabalhamento na base do testemunho onde foi verificada mistura de espécies do Plioceno e Pleistoceno. O intervalo de topo foi datado como eopleistocênico, e a assembléia identificada neste período indicou temperaturas mais altas do que as atuais. 6 GEOLOGIA 6.1 Breve Histórico da Evolução dos Conhecimentos Desde o final do século XIX a planície costeira do Rio Grande do Sul vem sendo alvo de estudos por parte de pesquisadores de diversas áreas do conhecimento. Entretanto, apenas nas primeiras décadas do século XX os esforços empreendidos nos estudos geológicos tornaram-se mais freqüentes. O termo Bacia de Pelotas foi cunhado no âmbito da PETROBRAS ao final da década de 50, quando a empresa realizou sua primeira campanha de reconhecimento na 15

área, sendo utilizado em caráter informal até a publicação do trabalho de Ghignone (1960). A evolução dos conhecimentos geológicos na Bacia de Pelotas pode ser considerada em duas fases distintas: (1) geologia da porção onshore e (2) geologia da porção offshore. Na primeira, foram realizados concomitantemente trabalhos de reconhecimento da geomorfologia e geologia de superfície e estudos de sondagens na porção emersa da bacia. Na segunda, tiveram lugar o reconhecimento e o detalhamento da porção submersa através de sondagens e métodos geofísicos. Efetuados em sua maioria por naturalistas e geógrafos, os estudos da geologia de superfície enfocaram principalmente os aspectos geomorfológicos e sedimentológicos dos depósitos quaternários, dentre os quais destacam-se os trabalhos de Rambo (1954), Delaney (1961, 1965, 1966), Andrade et al. (1963) e Bigarella & Andrade (1965). Até o início da década de 40 os dados de subsuperfície eram escassos e consistiam em material proveniente de perfurações para água, com raras exceções como as sondagens visando carvão mineral, efetuadas entre 1856 e 1862 e estudadas por White (1908), Carvalho (1932) e Martins (1952). Com o início das pesquisas para petróleo, iniciadas em 1939, houve um incremento no volume de material. A primeira sondagem com esta finalidade foi realizada no município de Arroio Grande tendo sido detalhada por Targa (1943). Posteriormente, Rheingantz (1955) relatou as atividades exploratórias realizadas nesta área, de concessão do próprio autor. Entre 1958 e 1964 foram perfurados os primeiros poços estratigráficos da PETROBRAS, a partir dos quais, com o auxílio de dados geofísicos, foi possível o estabelecimento de um arcabouço geológico para a porção emersa da Bacia de Pelotas. Com o advento da prospecção geofísica em offshore na plataforma continental do Rio Grande do Sul, teve início a fase de estudo da geologia da porção submersa da bacia. Com a publicação do trabalho de Butler (1970), no qual através da análise de perfis de refração sísmica o autor identificou a continuidade da bacia na plataforma continental, se iniciaram os estudos geológicos e geofísicos nesta porção da Bacia de Pelotas. No mesmo ano, Miranda (1970) apresentou o resultado de investigações geofísicas realizadas em 1968 e 1969, indicando a continuidade da bacia para offshore e caracterizando a Falha de Rio Grande, que se constitui numa de suas principais feições estruturais. 16

Com uma maior quantidade de dados disponíveis, foram propostos e aperfeiçoados modelos de evolução geológica para a bacia como um todo, nas porção onshore e offshore. Dentre os trabalhos produzidos nesta fase destacam-se: Kowsmann et al. (1974, 1977), Rabinowitz & La Brecque (1979), Gonçalves et al. (1979), Gamboa & Rabinowitz (1981), Asmus (1983), Fontana (1987, 1990a, b, 1994, 1996), Dias et al. (1994 a,b) e Davison (1999). Em termos de litoestratigrafia a proposta mais atual foi apresentada por Dias et al. (1994a). A terminologia destes autores é amplamente aceita, tendo sido adotada no presente trabalho (Figura 2). Em relação à evolução geotectônica, o modelo mais atual é aquele proposto por Fontana (1996), que também aplicou a estratigrafia de seqüências, principalmente a sismoestratigrafia, na análise arquitetural da bacia. No atual estágio de conhecimentos ainda há muito a ser estudado, principalmente porque são poucas as sondagens disponíveis na porção offshore da bacia. Como a quase totalidade dos trabalhos realizados até então teve caráter regional, também se fazem necessários trabalhos de estratigrafia de seqüências e bioestratigrafia de alta resolução. 17

Figura 2 - Carta cronoestratigráfica da Bacia de Pelotas (modificado de Dias et al., 1994a). 18

6.2 Contexo Geológico A Bacia de Pelotas teve origem com a fragmentação do continente Gondwana e o conseqüente desenvolvimento do Oceano Atlântico Sul, sendo considerada a precursora das bacias brasileiras de margem passiva (Gonçalves et al., 1979; Asmus, 1983). O primeiro ciclo de rifteamento no Gondwana, que ocasionou a abertura da porção meridional do continente, o chamado Evento Sul-Atlantiano Precoce, teria se propagado de sul para norte desde o platô das Malvinas até a Bacia de Pelotas (Conceição et al., 1988). Em relação à margem sul-brasileira, Mizusaki et al. (1998), com base na análise de dados de datação K/Ar em rochas vulcânicas pós-paleozóicas, sugerem que o rifteamento da margem sul-brasileira se propagou em direção ao norte, da Bacia de Pelotas até a Bacia do Espírito Santo. A principal fase de rifteamento ao longo da margem sul-brasileira teria ocorrido entre 120 Ma e 135 Ma, ao norte da cadeia Rio Grande-Walvis (Davison, 1999). Como nas demais bacias da margem continental do Brasil, a evolução tectônica da Bacia de Pelotas se deu em duas fases distintas: fase rifte e fase pós-rifte. O rifteamento teve início com a instalação de um processo de estiramento crustal no Gondwana que evoluiu até a separação dos continentes sul-americano e africano. Durante o rifteamento foram gerados grábens e meio-grábens, os quais foram preenchidos por rochas vulcânicas e clásticos finos a grossos (Fontana, 1996). Ainda não são conhecidos os depósitos da fase de lago profundo nesta bacia, já que todos os poços perfurados na seção rifte estão localizados na porção proximal (Davison, 1999). A fase pós-rifte teve início com o processo de subsidência térmica. Segundo Fontana (1996), a partir do início da deriva continental iniciou-se a fase de colapso da margem, ocasionando a deposição de cunhas clásticas com padrão transgressivo entre o Neocomiano e o Paleoceno/Eoceno. A partir do Eoceno uma significativa queda do nível relativo do mar e o aumento da taxa de aporte sedimentar causaram uma mudança no padrão para regressivo, culminando no Mioceno com a deposição de espessas cunhas progradantes. Por fim, a acentuação do processo de subsidência termal proporcionou a deposição de um espesso pacote de sedimentos do Mioceno ao Recente (Fontana, 1996). A figura 3 mostra o modelo de arquitetura estratigráfica proposto por Fontana (1996) para a margem continental da Bacia de Pelotas. 19

A espessura da coluna de sedimentos que preenche a bacia alcança 12.000 m no seu depocentro (Fontana, 1996). Estes sedimentos assentam-se parte sobre crosta continental e rochas basálticas extrudidas no início da fase rifte e parte sobre assoalho oceânico na sua porção mais distal (Fontana, 1990a) (Figura 3). Segundo Villwock & Tomazelli, (1995) a porção que repousa sobre crosta continental tem como embasamento as rochas do Escudo Sul-rio-grandense e Uruguaio e, ao norte da cidade de Porto Alegre, rochas paleozóicas e mesozóicas da Bacia do Paraná (Figura 4). De acordo com Leyden et al. (1971) a transição entre crosta continental e crosta oceânica ocorre provavelmente sob o talude. (km). + + + + + 5 V + + + + + + + + + V 10+ + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + 15 + + + + + + + + + + + + + + + V V MIO EOC V OLIGO V K INF + + + + + + + + + V + + V V PALEOC V ALB + + + + MAAST TUR/CONIAC ALB V Escala horizontal aproximada 0 100 km V V V V Figura 3 Modelo de arquitetura estratigráfica da Bacia de Pelotas. Em rosa está representado o embasamento cristalino (crosta continental); em verde as rochas vulcânicas e hipoabissais da Bacia do Paraná (Formação Serra Geral) e a crosta oceânica, indiferenciados; e em laranja os clásticos da Bacia do Paraná (modificado de Fontana, 1996). Em relação ao arcabouço estrutural, a Bacia de Pelotas pode ser considerada monótona. Os estratos mergulham suavemente seaward formando uma cunha que recobre o embasamento aplainado e cortado por falhas antitéticas (Fontana, 1987). A estruturação da seção pós-rifte da bacia é incipiente, o que pode estar relacionado com a ausência de evaporitos albianos (Chang et al., 1992). Constituem-se em exceções as grandes estruturas de escorregamento associadas a falhas lístricas que afetam a seção pós-oligocênica na região do Cone do Rio Grande (Fontana, 1990a). A porção setentrional da Bacia de Pelotas foi individualizada por Gonçalves et al. (1979), tendo sido denominada Plataforma de Florianópolis. Esta plataforma teria se 20

desenvolvido sobre uma antiga zona de fraqueza, provavelmente uma ramificação da Zona de Fratura de Rio Grande (Gamboa & Rabinowitz, 1981), onde o intenso vulcanismo formou uma barreira de rochas ígneas que isolou a Bacia de Pelotas das bacias evaporíticas ao norte da Plataforma de Florianópolis, ao menos no Aptiano. Até o Aptiano a Plataforma de Florianópolis se comportou como um alto, recebendo pouca sedimentação. Com a comunicação entre as bacias de Santos e Pelotas estabelecida no Albiano Inferior, o registro sedimentar da Plataforma de Florianópolis passou a ser mais expressivo (Gonçalves et al., 1979). Figura 4 Mapa geológico simplificado situando a Bacia de Pelotas em relação às bacias adjacentes (modificado de Fontana, 1996). 21

O Alto de Florianópolis, que separa as bacias de Santos e Pelotas, se constitui num paleoalto do embasamento de direção E-W, soterrado sob a margem continental, o qual segundo Gamboa & Rabinowitz (1981) faz parte do trend tectônico que caracteriza a Zona de Fratura de Rio Grande. A figura 5 mostra as principais feições estruturais da margem sul-brasileira. A sucessão sedimentar correspondente ao Mioceno-Plioceno da Plataforma de Florianópolis tem caráter regressivo, tendo sido dividida em cinco seqüências deposicionais limitadas por superfícies erosivas (Koutsoukos, 1982; Fontana, 1996). Fontana (1996) propôs cartas cronoestratigráficas distintas para a Bacia de Pelotas e a Plataforma de Florianópolis. Entretanto, a arquitetura estratigráfica para as seções do Mioceno-Plioceno nas duas cartas apresenta forte similaridade, de modo que se considera neste trabalho as mesmas unidades estratigráficas para ambas as províncias. O intervalo aqui estudado engloba as formações Cidreira e Imbé. A primeira corresponde a clásticos finos a grossos com idades entre o Turoniano e o Holoceno, provavelmente associados a ambientes transicionais. A Formação Imbé é constituída por depósitos pelíticos com raras intercalações de areias turbidíticas, depositados em ambiente marinho profundo, com idades entre o Turoniano e o Recente (Dias et al. 1994a) (Figura 2). 22

Figura 5 Principais feições geológicas da margem continental sul-brasileira (modificado de Gamboa & Rabinowitz, 1981) 23

7 A MICROFAUNA DE FORAMINÍFEROS PLANCTÔNICOS 7.1 Características Gerais Em ambas as sondagens estudadas a seção do Mioceno-Plioceno apresentou um escasso conteúdo microfossilífero, tendo sido identificados, no total, 4.763 espécimes de foraminíferos planctônicos. Destes, 2.670 exemplares constituem a microfauna mio-pliocênica do poço 1-SCS-2 e 2.093 a do poço 1-SCS-3B. Apenas na sondagem 1-SCS-2 verificou-se a ocorrência de amostras estéreis, as quais perfazem um total de seis e estão englobadas no intervalo localizado entre 270 m e 540 m de profundidade. O número de indivíduos de cada táxons por amostra é apresentado nas tabelas em anexo. Predominaram os indivíduos dos gêneros Globigerinoides e Globigerina, os quais correspondem, respectivamente, a 63,25% e 15,79%, na sondagem 1-SCS-2, e a 35,8% e 36,92%, na sondagem 1-SCS-3B do total de exemplares identificados (Figura 6). Este fato foi anteriormente constatado por Closs (1966b), que analisando poços perfurados na porção emersa da bacia assinalou a predominância de espécimes do gênero Globigerinoides na seção miocênica. Figura 6 - Representação percentual dos gêneros mais abundantes nas sondagens estudadas (número total de espécimes). 24

Na sondagem 1-SCS-2, as amostras entre 285 e 390 e 690 m e 930 m de profundidade apresentaram um baixo número de espécimes de foraminíferos planctônicos, os quais se encontravam preenchidos por pirita ou recobertos por óxido de ferro no intervalo mais superior, ou ainda recristalizados no intervalo abaixo de 600 m. Já nos intervalos de 345-360 m, 405-480 m, 525-540 m e 585-600 m de profundidade não foram encontrados foraminíferos planctônicos; nestas amostras verificou-se apenas a ocorrência de fragmentos de testas de foraminíferos bentônicos de impossível determinação (Figura 7). Foi observado um aumento do número de exemplares com a profundidade, tendo sido alcançado o máximo de 478 espécimes na amostra correspondente ao intervalo 1275-1290 m (Figura 7). A partir de 945 m intercalam-se intervalos em que a maioria dos exemplares está bem preservada, apenas recobertos por uma película de óxido, ou ainda recristalizados, alguns apresentando crescimentos de cristais de calcita. Em relação ao estado de preservação dos exemplares na sondagem 1-SCS-3B, do topo para a base, até a profundidade de 615 m as amostras apresentaram um conteúdo microfossilífero muito pobre. De modo geral, estas testas se encontravam em precário estado de preservação, sendo marcante a ocorrência de níveis de testas oxidadas (Figura 8). Abaixo de 615 m de profundidade aumentou o número de foraminíferos planctônicos. Observou-se a ocorrência de níveis com carapaças em bom estado de preservação, porém, recobertas por uma película de óxido de ferro facilmente removível. Nas demais amostras abaixo de 870 m de profundidade os espécimes estavam bem preservados, ainda que na sua maioria preenchidos por sedimentos recristalizados. A figura 9 ilustra exemplares representativos de dois diferentes estados de conservação da microfauna no poço 1-SCS-3B. 25

Figura 7 Características gerais da microfauna de foraminíferos planctônicos da sondagem 1-SCS- 2. A litologia foi compilada de Fontana (1996). 26

Figura 8 Características gerais da microfauna de foraminíferos planctônicos da sondagem 1-SCS-3B. A litologia foi compilada de Fontana (1996). 27

Figura 9 Exemplares representativos de diferentes estados de preservação dos microfósseis na sondagem 1-SCS-3B. Fotos A e B Espécimes recristalizados, apresentando crescimento de cristais de calcita (amostra 1215-1230 m, poço 1-SCS-3B). Foto C Espécimes recobertos por uma película de óxido de ferro (amostra 735-750 m, poço 1-SCS-3B). É importante ressaltar que em ambas as sondagens a maioria das testas apresentava a morfologia da parede em perfeito estado de conservação. Não foram observados sinais de abrasão que indicariam que estas testas foram redepositadas de seqüências sedimentares mais antigas expostas e erodidas. De um modo geral, as testas recobertas por óxido de ferro se encontravam em excelente estado de preservação e, nos sedimentos de onde foram recuperadas, os grãos estavam envoltos por películas de óxido. Muitas destas testas se encontravam recobertas por uma crosta de óxido de ferro, porém, a maioria apenas apresentava coloração avermelhada como aquelas ilustradas nas figura 9C e 10B. 28

Além disso, as espécies identificadas que apresentaram este tipo de preservação estão distribuídas de forma coerente dentro da seqüência bioestratigráfica, como será mostrado adiante ao se tratar da distribuição dos microfósseis ao longo das sondagens, o que se constitui em mais um forte indício da sua condição de material in situ. Foram efetuadas análises pontuais de espectrometria por dispersão de energia (EDS) em alguns exemplares recobertos por óxido, tanto na crosta quanto na testa, em local onde a crosta foi removida (Figura 10). As análises evidenciaram composições marcadamente distintas (Figura 11). Na crosta de óxido predomina o ferro e, subordinadamente, ocorrem sílica, alumínio, oxigênio e cálcio. Na testa, predomina o cálcio e secundariamente ocorrem alumínio e sílica, sendo observada também a presença de ferro, em pequena quantidade, que certamente deve-se à presença de fragmentos da crosta oxidada no ponto analisado. Os picos de ouro observados em ambos os gráficos são resultantes do processo de metalização ao qual os exemplares foram submetidos antes da análise. Figura 10 Espécimes de Globigerinoides trilobus recobertos por óxido de ferro (amostra 735-750 m, poço 1-SCS-3B). A Exemplar com crosta de óxido parcialmente removida. As setas indicam os pontos onde foi realizada análise de EDS. B Espécime recoberto por uma película de óxido. Observar o excelente estado de preservação da parede da testa. A atuação de processos diagenéticos na sucessão sedimentar estudada pode explicar a ocorrência destes intervalos oxidados. Uma hipótese que deve ser aventada e futuramente testada através de estudos paleoambientais com base em foraminíferos bentônicos e estudos de fóssil-diagênese, é o controle dos eventos de transgressãoregressão nestes processos diagenéticos. 29

(A) (B) Figura 11 Análise de elementos por espectrometria de dispersão de energia (amostra 735-750, poço 1-SCS-3B). A composição da crosta de óxido; B composição da testa. Para mais informações ver figura 10A. De acordo com Morad et al. (2000), os eventos de transgressão-regressão controlam a posição e a dinâmica das zonas de mistura de água intersticial meteórica e marinha, sendo que as mudanças na composição da água intersticial promovem diversas reações diagenéticas. Eventos regressivos podem expor extensas áreas da plataforma, aumentado a zona de recarga e conseqüentemente promover a incursão de águas meteóricas em direção à bacia. Associados a este processo ocorrem dissolução de cimentos dolomíticos e precipitação de caolinita e óxidos e oxi-hidróxidos de ferro. Assim como as testas oxidadas, aquelas preenchidas por pirita apresentaram a morfologia da parede bem preservada e distribuição bioestratigráfica coerente ao longo da sucessão sedimentar, sendo aqui consideradas como formas in situ (Figura 12). 30

Figura 12 Exemplares preenchidos por pirita, apresentando a parede em excelente estado de preservação (amostra 795-810 m, poço 1-SCS-2). A- espécime do gênero Orbulina quebrado, exibindo preenchimento de pirita. B exemplar do gênero Globorotalia preenchido por pirita.. Segundo Berner (1981, 1984), a pirita se forma durante o início do soterramento da coluna sedimentar através da reação de minerais detríticos de ferro com H 2 S em ambientes anóxicos. Por sua vez, o H 2 S é produzido pela redução do sulfato (SO -2 4 ) dissolvido na água intersticial por bactérias que utilizam a matéria orgânica como agente redutor e fonte de energia. O produto inicial desta reação são monossulfetos que durante a eodiagênese se transformam em pirita (Figura 13). A formação de pirita é controlada também pela quantidade de minerais detríticos de ferro, o quais na sucessão sedimentar aqui estudada (composta quase que exclusivamente por folhelhos) estão representados por minerais de argila. Em relação às testas recristalizadas, os cristais de calcita alongados como aqueles ilustrados na figura 9B podem ter sido precipitados em zonas geoquímicas eodiagenéticas de oxidação ou de fermentação bacteriana (De Ros, 2004, com. verbal). 31

Figura 13 Representação esquemática do processo de formação de pirita sedimentar (modificado de Berner, 1984). 7.2 Considerações Taxonômicas A classificação sistemática adotada neste trabalho segue a apresentada por Loeblich & Tappan (1964, 1988) até o nível genérico. Em nível específico e subespecífico, a classificação foi baseada em Bolli & Saunders (1985), com o auxílio de bibliografia complementar (Blow, 1969; Bolli & Premoli Silva, 1973; Rögl & Bolli, 1973; Stainforth et al., 1975; Björn & Kennett, 1981; Bolli & Saunders, 1981, 1982; Kennett & Srinisvasan, 1983; Berggren, 1993; Ellis & Messina, 1995). O estudo da microfauna de foraminíferos planctônicos do Mioceno-Plioceno nas sondagens 1-SCS-2 e 1-SCS-3B permitiu o reconhecimento de 86 táxons entre espécies e subespécies e uma forma, distribuídos em 15 gêneros e cinco famílias. Na sondagem 1- SCS-2 foram identificados 68 táxons entre espécies e subespécies e uma forma, e na sondagem 1-SCS-3B foram reconhecidas 61 espécies e subespécies e uma forma. O gênero com maior número de espécies foi Globorotalia (28 espécies) seguido de Globigerinoides (16 espécies) e Globigerina (17 espécies) (Figura 14). 32

30 25 n. de espécies 20 15 10 5 0 Globorotalia Globigerina Globigerinoides Sphaeroidinellopsis Praeorbulina Outros Figura 14 Número de espécies por gênero nas sondagens estudadas Dos exemplares encontrados, 636 foram identificados apenas em nível genérico. Destes, 610 espécimes pertencem ao gênero Globigerina, sendo que 298 foram identificados no poço 1-SCS-2 e 312 no poço 1-SCS-3B, enquanto que 26 espécimes recuperados do poço 1-SCS-2 pertencem ao gênero Globigerinoides. Em trabalhos futuros serão necessários estudos taxonômicos mais detalhados nestes exemplares, que não foram aqui efetuados por se tratarem de espécies que não apresentam aplicação bioestratigráfica. Os táxons identificadas nas sondagens aqui estudadas são relacionados a seguir: Filo PROTOZOA Subfilo SARCODINA Schmarda, 1871 Classe RHIZOPODA von Siebold, 1845 Ordem FORAMINIFERIDA Eichwald, 1830 Superfamília GLOBIGERINACEA Carpenter, Parker & Jones, 1862 Família GLOBIGERINIDAE Carpenter, Parker & Jones, 1862 Subfamília GLOBIGERININAE Carpenter, Parker & Jones, 1862 33