FLUTUAÇÃO POPULACIONAL DE PERCEVEJO-CASTANHO (Scaptocoris castanea Perty) (Hemiptera: Scaptocorinae) EM MINEIROS GO. (*) Nilton Cezar Bellizzi (Universidade Estadual de Goiás, Unidade Universitária de Palmeiras de Goiás / nilton.cezar@ueg.br), Paulo Marçal Fernandes (Universidade Federal de Goiás, Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos), Giovani Donizete Bonela (UEG, UnU de Ipameri), Rafael Mendes da Silva (UEG, UnU de Ipameri), Fabrício de Carvalho Peixoto (UEG, UnU de Ipameri), Wilson Zorzetti Marques (UEG, UnU de Ipameri), Márcio Antonio de Oliveira e Silva (Fundação GO). RESUMO Este trabalho visou contribuir para o estabelecimento do manejo integrado do percevejocastanho (Scaptocoris castanea) na cultura do algodoeiro em duas fazendas em Mineiros GO. Nestas fazendas, foram realizadas contagens mensais de percevejos nas raízes e entre linhas do algodoeiro durante a safra /6. As amostras de solo, retiradas no trado, foram estratificadas em camadas de cm desde a superfície até 1, m de profundidade. No perfil superficial do solo ocorreu maior incidência de ninfas grandes, que se preparam para se transformar em adultos. Nos meses de junho a agosto de 6 são os meses de menor incidência de percevejos na superfície do solo, que coincidiu com o período sem chuvas. Quando a umidade do solo diminui, os percevejos permanecem no estágio de ninfa pequena ou média até que a umidade das primeiras chuvas estimulem a maturação e o desenvolvimento destas ninfas para o estágio de adultos entre outubro a maio. Palavras-chaves: Percevejo-castanho, flutuação populacional, algodoeiro Agencias financiadoras: CNPq, CTPA e UEG Instituições parceiras: Fundação GO e CTPA INTRODUÇÃO O algodoeiro herbáceo é um dos fitossistemas de maior complexidade que se encontra na natureza. Durante a maior parte do ciclo da cultura há diversos eventos ocorrendo ao mesmo tempo, como crescimento vegetativo, aparecimento de gemas reprodutivas, florescimento, crescimento e maturação dos frutos. Cada um destes eventos é importante para a produção final, mas é necessário que eles ocorram de modo balanceado (ROSOLEM, 1). Segundo Santos (1999), vários fatores contribuem para a queda de produtividade do algodoeiro em todas as regiões do mundo, sendo um dos agroecossistemas mais sujeitos ao ataque de artrópodes-praga, atraindo e hospedando um complexo significativo de insetos e ácaros, os quais atacam raízes, caules, folhas, botões florais, maças e capulhos. Os percevejos castanhos ou percevejos-castanhos-da-raiz são designações utilizadas para várias espécies, de coloração marrom, castanha ou âmbar, da família Cydnidae (Hemiptera: Cydnidae, Scaptocorinae) que habitam o solo e se alimentam de raiz. Estes insetos são subterrâneos, de tamanho médio (entre mm e 1 mm), coloração castanha, corpo fortemente convexo, tíbias desenvolvidas e adaptadas para cavar, tarsos anteriores e médios reduzidos ou ausentes e posteriores ausentes. As ninfas são de coloração branca e, especialmente, no último instar, os primórdios das asas, de coloração amarelada, são bem visíveis. A fase ninfal varia de 91 a 13 dias. Em lavouras, os percevejos castanhos ocorrem em manchas ou focos e nenhuma explicação tem sido apresentada para essa distribuição agregada no solo (OLIVEIRA ; MALAGUIDO, ).
Fernandes et al. (1999) comentaram que o conhecimento do comportamento e flutuação populacional anual do percevejo no solo é importante para o estabelecimento de estratégias para seu manejo. As revoadas de adultos, observadas ao entardecer desde novembro até abril, foram mais freqüentes e intensas de fevereiro a março, coincidindo com o período no qual o número de adultos no solo diminuiu. MATERIAL E MÉTODOS 1. Caracterização das fazendas. O trabalho foi desenvolvido em duas fazendas em Mineiros GO. Nestas fazendas, foram realizados contagens mensais de percevejos nas raízes e entre linhas do algodoeiro durante a safra /6. 1.1. Fazenda Flores em Mineiros - GO Na fazenda Flores, localizada entre Mineiros e Portelândia, a cotonicultura é uma das atividades mais antigas, os técnicos realizam rotação de cultura com soja ou milho e embora tenham todo um desenvolvimento, neste sistema muitos insetos-pragas permanecem de uma safra para outra, como o percevejo castanho. Nesta fazenda na safra /6 as chuvas apresentaram uma distribuição entre novembro e maio durante, apenas nos meses de junho e julho (meses da colheita) que não ocorreram chuvas. O plantio foi realizado sob o sistema de plantio direto há mais de oito anos e a análise do solo apresentou os seguintes níveis: PH (CaCl) =,; Ca+Mg = 3,9 cmolc/dm 3 ; Ca = 3, cmolc/dm 3 ; Mg =,9 cmolc/dm 3 ; Al =, cmolc/dm 3 ; H + Al = 3,3 cmolc/dm 3 ; K = 7 mg/dm 3 ; P (Mel.) = 1,7 mg/dm 3 ; M.O. =,%, CTC = 7, cmolc/dm 3 ; V =,%. A análise física mostrou 9% de areia; 11% de silte e 6% de argila. O cultivar escolhido foi o FMX 966, cujo inicio do plantio foi em 18 de dezembro de. Como esta área possui um histórico de infestação do percevejo castanho e através de experiência anterior da equipe técnica, foram aplicados 1 kg/ha de MAP em pré-plantio e a adubação foi a mais alta desta pesquisa, pois no plantio foi utilizado 3 kg/ha da fórmula --1 +,% de B. Aos 1 dias foi aplicado 1 kg/ha de Sulfato de Amônio e 1 kg/ha de KCl. Aos dias, foi aplicado ka/ha da fórmula 3-- +,% de B e,3% de Zn. No plantio foi aplicado 8 kg/ha de Temik 1. 1.. Fazenda Santa Terezinha em Mineiros - GO A fazenda Santa Terezinha foi escolhida por ter características próprias, tais como: solo arenoso, sistema de plantio direto, alta infestação de percevejo castanho e outras pragas que são comuns ao algodão, soja e milho. O plantio foi realizado sob o sistema de plantio direto e a análise do solo apresentou os seguintes níveis: PH (CaCl) =,1; Ca+Mg =,9 cmolc/dm 3 ; Ca = 1,9 cmolc/dm 3 ; Mg = 1, cmolc/dm 3 ; Al =, cmolc/dm 3 ; H + Al = 3, cmolc/dm 3 ; K = 8 mg/dm 3 ; P (Mel.) = 1, mg/dm 3 ; M.O. = 1,9%, CTC = 6,1 cmolc/dm 3 ; V =,8%. A análise física mostrou 9% de areia; 11% de silte e 3% de argila. As chuvas nesta fazenda também foram distribuídas como na fazenda Flores, onde nos meses de junho e julho não ocorreram chuvas Nos 3 ha avaliados desta fazenda, o cultivar escolhido foi o Delta Opal, com o plantio iniciando em 13 de janeiro de 6. A adubação de plantio foi de kg/ha da fórmula --1 +,% de B. Aos 3 e 6 dias foram aplicados kg/ha de Sulfato de Amônio e 3 kg/ha da fórmula -- +,% de B e,3% de Zn, respectivamente. O inseticida aplicado no plantio foi o Furadan 3 TS na dose de, l/1 kg de semente.. Levantamento de percevejos nas raízes de algodoeiro (Scaptocoris spp).
Este levantamento foi realizado mensalmente entre dezembro de até dezembro de 6 contando-se ninfas e adultos de percevejos em amostras de solo com trado tipo caneca com cm de diâmetro. As amostras de solo, retiradas no trado, foram estratificadas em camadas de cm desde a superfície até 1, m de profundidade. Em cada unidade amostral foram retiradas amostras no caminhamento em zigue-zague, com uma distância de 3 metros entre uma e outra. Em cada camada, o solo foi cuidadosamente inspecionado e os percevejos separados e contados. Durante a contagem, os percevejos foram classificados em adultos; ninfas grandes (> mm com presença de tecas alares); ninfas médias (entre 3 mm e 6 mm, sem tecas alares) ou ninfas pequenas (< 3 mm). Os parâmetros avaliados foram o número de ninfas e adultos de Scaptocoris castanea por amostra. Os dados originais relativos aos insetos foram transformados em (x+,). RESULTADOS E DISCUSSÃO 1. Fazenda Flores. Esta é uma das fazendas com maiores infestações de percevejo castanho, conforme podem ser observados nas figuras 1 a 3. No perfil do solo de a cm de profundidade, maior incidência é de ninfas grandes, que se preparam para se transformar em adultos. Nos meses de junho a agosto de 6 são os meses de menor incidência de percevejos na superfície do solo, que coincide com o período sem chuvas. Estas observações também foram encontradas por Oliveira e Malaguido (). O período de maior infestação de adultos e ninfas grandes (período chuvoso) também foi o período de plantio do algodoeiro, contudo a adubação pré-plantio e as coberturas proporcionaram um desenvolvimento mais rápido das raízes do algodoeiro, não ocorrendo redução visível no stand do algodoeiro na safra /6 nesta fazenda. Figura 1. Número médio de percevejo castanho/trado de a cm de profundidade em algodoeiro na fazenda Flores. Safra /6. 3 3 1 1 O número de percevejo castanho/trado de 1 a cm está demonstrado na Figura. Nesta profundidade, o número de percevejos diminuiu, mas podemos observar o aumento do número de ninfas pequenas que possivelmente são resultado da oviposição dos adultos que iniciaram a revoada em outubro, novembro e dezembro de, concordando com os trabalhos de Fernandes et al (1999) que relataram que as revoadas de adultos S. castanea ocorreram de novembro a março.
Figura. Número médio de percevejo castanho/trado de 1 a cm de profundidade em algodoeiro na fazenda Flores. Safra /6. 1 9 8 7 6 3 1 O número de percevejo castanho/trado de 1 a 6 cm está demonstrado na Figura 3. Figura 3. Número médio de percevejo castanho/trado de 1 a 6 cm de profundidade em algodoeiro na fazenda Flores. Safra /6. Númeromédiodepercevejos/trado, 3, 3, 1, 1, Em pesquisa desenvolvida por Oliveira & Malaguido (), os adultos foram mais abundantes em dezembro a janeiro, representando % e 9% da população de percevejos no solo, respectivamente. As ninfas predominaram em novembro (6%), dezembro (%) e março (69%). A partir da profundidade de 61 cm, a infestação foi muito baixa, ocorrendo menos de insetos por trado, contudo, podemos verificar que as ninfas pequenas estão presentes durante quase todo o ano, inclusive nos meses sem chuva. O percevejo castanho, embora com um grande número de indivíduos nas plantas, na safra /6 não afetou o stand de plantas como ocorreu em safras anteriores. O motivo principal foi o nível de adubação aplicada ao algodoeiro, demonstrando que o algodoeiro resiste e convive com o ataque do percevejo castanho se a planta tiver bem nutrida. Como o stand não foi afetado, o algodoeiro produziu 6@/ha de algodão em caroço que está dentro da média brasileira de produtividade. 3.. Fazenda Santa Terezinha. O algodoeiro da fazenda Santa Terezinha apresentou alguns problemas fitossanitários, principalmente com percevejos castanhos, lagartas, pulgões e ácaros, além de algumas doenças, contudo foi o que obteve maior produtividade. Nas Figuras a 6 poderemos observar o número médio de percevejo/trado na fazenda Santa Terezinha.
Figura. Número médio de percevejos castanhos/trado de a cm de profundidade em algodoeiro na fazenda Santa Terezinha. Safra /6. 3 3 1 1 Nesta fazenda, a presença de adultos seguiu o mesmo comportamento de precipitação mensal de /6, demonstrando o que autores como Oliveira e Malaguido (); Fernandes et al () e outros já haviam citado em suas pesquisas. Na Figura são observados o número de percevejos castanhos/trado na profundidade de 1 a cm de solo, na fazenda Santa Terezinha. Figura. Número médio de percevejos castanhos/trado de 1 a cm de profundidade em algodoeiro na fazenda Santa Terezinha. Safra /6. 1 1 8 6 O comportamento dos percevejos na camada de 1 a cm de solo foi muito mais evidente e coincidente com as observações realizadas por Medeiros () quando comenta que os percevejos castanhos deslocam-se no perfil do solo, aprofundando-se nas épocas mais secas e voltando à superfície no período chuvoso. Na Figura 6 são apresentados o número de percevejos castanhos/trado na profundidade de 1 a 6 cm de solo, na fazenda Santa Terezinha.
Figura 6. Número médio de percevejos castanhos/trado de 1 a 6 cm de profundidade em algodoeiro na fazenda Santa Terezinha. Safra /6., Númeromédiodepercevejos/trado 3, 3, 1, 1, Na profundidade de 1 a 6 cm, com a umidade apresentada nesta fazenda durante a safra /6, as ninfas foram as que mais se destacaram, embora tenham alguns adultos no período chuvoso, mostrando que apesar dos tratos culturais, dos inseticidas e da adubação realizada, o percevejo castanho está estabelecido nesta propriedade. Nas profundidades de 61 a 8 cm de solo, mais uma vez, as ninfas pequenas predominam neste perfil do solo, mostrando o potencial de sobrevivência desta praga em solos do cerrado. Na profundidade de 81 a 1 cm em algodoeiro na fazenda Santa Terezinha foi encontrado a média de 1 percevejo castanho/trado em junho e em julho, possivelmente como resultado do desenvolvimento das ninfas pequenas que ocorreram nos meses anteriores. Nesta fazenda, mesmo com as medidas de controle como adubação, inseticidas e outras medidas, o percevejo esteve presente no sistema durante o ano todo e mostrou-se adaptado ao local. Esta presença durante o ano talvez tenha sido promovido pelo tipo de solo que é arenoso, pelas ervas daninhas e as culturas para produção de matéria orgânica. Mesmo com toda a infestação, o algodoeiro nesta área não apresentou redução na produtividade, que foi a mais alta deste trabalho (7@/ha). CONCLUSÕES O percevejo castanho apresentou, nas duas fazendas avaliadas o comportamento de acompanhar a umidade do solo permanecendo em profundidades maiores até um novo período de chuvas. Quando a umidade do solo diminui, os percevejos permanecem no estágio de ninfa pequena ou média até que a umidade das primeiras chuvas estimulem a maturação e o desenvolvimento destas ninfas para o estágio de adultos. Nas propriedades onde o percevejo castanho está estabelecido, as medidas de controle como inseticidas, adubação ou preparo do solo podem auxiliar no desenvolvimento mais rápido das raízes do algodoeiro, mas não exerce eficiente redução na população do percevejo. Nestas propriedades, devese estimular medidas que promovam a produção de raízes para que a planta possa suportar o ataque dos percevejos, principalmente no início da germinação. CONTRIBUIÇÃO PRÁTICA E CIENTÍFICA DO TRABALHO Este trabalho contribuiu para conhecer o comportamento do percevejo-castanho em relação à umidade e ao manejo da cultura do algodão em Mineiros, além de fazer parte do Relatório de Pósdoutorado do primeiro autor.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FERNANDES, P. M., CRUVINEL, I. R. O.; KOBUS, K.C.; CZEPAK C.; VELOSO V.R.S. O percevejo castanho em áreas agrícolas do bioma cerrado. In: REUNIÃO SUL-BRASILEIRA SOBRE PRAGAS DO SOLO, 8., 1999, Piracicaba. Anais...Piracicaba: ESALQ, 1999. p.9-6. FERNANDES, P. M.; OLIVEIRA, L. J.; SOUSA, C. R.; CZEPAK, C.; BARROS, R. G. Percevejoscastanhos. In SALVADORI, J. R.; ÁVILA, C. J.; SILVA, M. T. B. Pragas de solo no Brasil. Passo Fundo: Embrapa Trigo; Dourados: Embrapa Agropecuária Oeste; Cruz Alta: Fundacep Fecotrigo,, p. MEDEIROS, M. O. Influência dos fatores climáticos na dinâmica populacional do percevejo castanho Atarsocoris brachiariae.. 97f. Dissertação ( Mestrado) - UFMT/ FAMEV, Cuiabá, GO. OLIVEIRA, L. J.; MALAGUIDO, A. B. Flutuação e distribuição da população e percevejo castanho da raiz, Scaptocoris castanea Perty (Hemiptera: Cydnidae), no perfil do solo em áreas produtoras de soja nas regiões centro-oeste e sudeste do Brasil. Neotropical Entomology, v.33, n.3, p.83-91,. ROSOLEM, A.C. Ecofisiologia e manejo da cultura do algodoeiro. Informações Agronômicas, n.9, p.1-9, set. 1. SANTOS, W. J. Monitoramento e controle de pragas do algodoeiro. In CIA E.; FREIRE, E. C.; SANTOS, W. J. Cultura do algodoeiro. Piracicaba: Potafós, 1999. p. 133-179.