MONITORAMENTO ELETRÔNICO COMO DISPOSITIVO DE CONTROLE NO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO Janaína Rodrigues Geraldini Universidade Federal de Santa Catarina jgeraldini@yahoo.com.br XIV Encontro Nacional da Abrapso Tema: Política Resumo No dia 25 de abril de 2007, foi aprovado pelo Senado através da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Governo Federal Brasileiro um projeto de lei que prevê o monitoramento eletrônico em presos que cumprem regime semi-aberto, tenham direito a saídas temporárias, ou liberdade condicional. O monitoramento é viabilizado através de equipamento eletrônico que detecta e controla movimentos à distância, enviando informações via satélite para um banco de dados com a exata localização do interno fora do presídio. O acesso às informações é feito via internet pelo sistema judiciário dos estados, e pode ser acompanhado inclusive pelo telefone celular. O equipamento consiste em pulseiras, tornozeleiras ou cintos de material plástico ou emborrachado com eletrodos na sua parte interna funcionando como transmissores, e ainda uma unidade portátil de rastreamento (tipo radinho de pilha). Esses dois equipamentos interligam-se através de transmissão de rádio. O projeto de lei está em pauta no congresso Nacional, dependendo agora da aprovação da Câmara dos Deputados. Ele faz parte de uma proposta chamada pacote antiviolência que integra oito medidas de combate à violência. Entre tais medidas encontram-se a polêmica redução da maioridade penal, o afastamento e a suspensão do pagamento de salário de funcionários públicos sob suspeita de corrupção, a produção de alimentos pelos próprios internos, entre outras. Embora ainda esteja tramitando, o monitoramento eletrônico já está em vias de comercialização no estado do Paraná, e em caráter de experimentação no estado de Minas Gerais. A implantação deste tipo de vigilância no Brasil não é novidade para outros países onde este sistema está em plena atividade. O monitoramento eletrônico já existe nos Estados Unidos, França, Inglaterra, Espanha, Portugal e Austrália. Os fundadores da Igreja Renascer em Cristo, detidos em Miami sob acusação de sonegação fiscal no início deste ano, por exemplo, foram monitorados por chips presos a duas tornozeleiras enquanto aguardavam o julgamento em liberdade. 1
No Brasil, o interno terá o direito de optar ou não pelo uso do equipamento, mas a concessão à saída será suspensa caso ele se recuse a usar o monitoramento. Alguns discursos veiculados na mídia com relação à implantação desta vigilância podem ser citados. São discursos de senadores, deputados, governadores, advogados, pessoas diretamente ligadas à administração de presídios: o monitoramento permite que as regras determinadas pela Justiça sejam cumpridas, facilidade no trabalho da segurança, utilização da tecnologia em benefício às pessoas desde que isso não se torne humilhação ou forma de exclusão, estigmatização dos presos, reduzir as chances dos internos cometerem outros crimes, monitoramento da reinserção do interno na sociedade, monitoramento de reincidência no mundo criminal, alternativa para o problema da superlotação carcerária, possibilidade de redução de gastos, atentado contra a ressocialização, agravamento para além da pena, invasão aos princípios de intimidade e privacidade. O Brasil não possui um único sistema penal. Prisões, cadeias e centros de detenção são administrados pelos governos estaduais. Cada um dos vinte e seis governos estaduais, assim como o governo do Distrito Federal, administra um conjunto separado de estabelecimentos penais com uma estrutura organizacional distinta, polícias independentes e, em alguns casos, leis de execução penal suplementares. Apesar de haver a possibilidade de certa variedade na administração dos presídios brasileiros (permitida por lei), encontramos a respeito das práticas prisionais críticas que acabam caracterizando estes sistemas como uma unidade: as prisões brasileiras são insalubres, superlotadas, esquecidas. A maioria de seus habitantes não exerce o direito de defesa. Milhares de condenados cumprem penas em locais impróprios. Freqüentes discursos acerca do sistema prisional brasileiro denunciam, por um lado, abusos de autoridade, corrupção da carceragem e de juízes, tortura de presos, péssimas condições de higiene e de alimentação, superlotação dos estabelecimentos prisionais, e por outro lado, reivindicam por penas mais duras, denunciam o excesso de direitos dos internos, a diminuição da disciplina presidiária, organizações criminosas que comandam atos de dentro dos presídios, violência entre os internos, fugas, etc. Do lado de fora dos muros da prisão, assistimos quase que diariamente notícias sobre o aumento do índice de criminalidade e de violência, sobre o sentimento de impunidade e insegurança que assolam a população, censo penitenciário que aponta crescimento acelerado do número de presos. Diante de tais discursos, temos que o sistema é, muitas vezes, como um fator de incentivo à violência. Enquanto que o encarceramento gira em torno de propostas como isolar e recuperar o infrator, e ainda 2
reabilitá-lo na vida social, tais apontamentos colocam em questão a eficácia do sistema. É provável, então, que projetos de lei, como o pacote antiviolência citado anteriormente, venham em resposta às fragilidades apontadas por muitos lados no cotidiano que abrangem todo o sistema penal brasileiro. Segundo Goifman (1999), a tecnovigilância na sociedade contemporânea vem se unir a diversas outras formas de uma máquina vigilante que atua em diversos âmbitos sociais. Se pensarmos com relação aos presídios, temos que as formas articuladas do vigiar compreendem tanto a proximidade física entre internos, guardas e carcereiros, quanto o uso de câmeras de circuito fechado. As imagens capturadas pelas câmeras vão além dos muros da prisão, e a própria rua converte-se em local de vigilância. As máquinas do olhar são encontradas nas ruas, capturando pessoas e automóveis, nos espelhos das lojas, em eventos sociais, nos aeroportos, e acabam transformando-se em práticas rotineiras que têm como objetivo a vigilância e o controle de informações. A vigilância é, para Foucault (2005b), a noção central do modelo do Panóptico proposto por Bentham: Na periferia uma construção em anel; no centro, uma torre; esta é vazada de largas janelas que se abrem sobre a face interna do anel; a construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda a espessura da construção; elas têm duas janelas, uma para o interior, correspondendo às janelas da torre; outra, que dá para o exterior, permite que a luz atravesse a cela de lado a lado. Basta então colocar um vigia na torre central, e em cada cela trancar um louco, um doente, um condenado, um operário ou um escolar. Pelo efeito da contraluz, pode-se perceber da torre, recortando-se exatamente sobre a claridade, as pequenas silhuetas cativas nas celas da periferia [...]. O dispositivo panóptico organiza unidades espaciais que permitem ver sem parar e reconhecer imediatamente. Em suma, o princípio da masmorra é invertido; ou antes, de suas três funções trancar, privar de luz e esconder só se conserva a primeira e suprimem-se as outras duas. A plena luz e o olhar de um vigia captam melhor que a sombra, que finalmente protegia. A visibilidade é uma armadilha. Goifman (1999), através de Machado, faz um atualização desse dispositivo na sociedade contemporânea, apontando a tecnovigilância nas instituições carcerárias como modelo pautado nos princípios do panoptismo. Dois princípios fundamentais do modelo do Panóptico são apontados como incorporados na prática da implantação das câmeras: (1) a visão unilateral onde os internos, apesar de verem as câmeras, não sabem quem está por trás delas (desindividualização e despersonificação do poder), e (2) a sensação de estar sempre sendo vigiado (os detidos são vistos, sem verem a si próprios). A novidade, para este autor, é que no panóptico eletrônico produz- 3
se uma prova instantânea, intransferível e personalizada. Fazendo ainda um paralelo com as análises de Foucault (2005b) acerca do Panóptico, podemos dizer que os novos aparatos tecnológicos, além de se constituírem enquanto dispositivo-vigilância, também disciplinam corpos. Neste sentido, os internos sabem que seus movimentos estão sendo monitorados e funcionam de acordo com uma conduta adequada, a fim de não receberem represálias. Para Foucault (2005b), a disciplina é um exercício de poder voltado para o corpo. O monitoramento através de pulseiras, tornozeleiras ou cintos, pode ser apontado como um dispositivo de vigilância nos moldes do panóptico atualizado. Sob a luz da mobilidade dos corpos fora dos muros da prisão, movimentos são vigiados e controlados, colocando os corpos em seu devido lugar, fazendo-os cumprir sua devida função, mesmo que à distância. A proposta que fazemos é pensar acerca da implantação do monitoramento eletrônico dos internos nas ruas e nos presídios brasileiros, problematizando esta prática de vigilância como dispositivo de controle. Para tanto, teremos como base a contextualização do sistema prisional enquanto instituição numa sociedade da disciplina e do controle, incluindo análise de documentos que veiculam na mídia, como notícias de jornais e revistas que abordam o tema, e ainda o projeto de lei que regula a questão e sua tramitação no Congresso Nacional. Análise histórica A proposta deste estudo é problematizar a implantação do monitoramento eletrônico nos presídios brasileiros, recorrendo às análises históricas com Foucault, para buscar compreender como se constroem os dispositivos de vigilância, e quais as viabilizações que instituem tal prática. As práticas de controle e vigilância serão tomadas como desnaturalizadas, a fim de se perceber sua constituição frente aos jogos de saber e poder que se articulam nesse cenário. Salientamos que este trabalho é o início de um estudo que ainda engatinha, e que não pretendemos aqui construir todo um conjunto fechado de formulações, nem esgotar outros investimentos a respeito do tema. É importante pontuar que se escolhemos utilizar o método foucaultiano de investigação, não queremos dizer com isso que existe uma metodologia demarcada pelo autor, como se houvessem técnicas servindo de modelo para serem usadas em diferentes situações de pesquisa. Com isso queremos destacar a fluidez nas análises, afirmando com Machado (1981) que tal método é instruído pelos documentos pesquisados, e 4
construído ao longo da trajetória e da experiência de cada pesquisa, o que remete a pensar em termos de um olhar, ou de uma perspectiva. Podemos falar que os objetos analisados por Foucault são contemporâneos, mas os processos de desconstrução e desnaturalização propostos têm como base a dilatação do tempo. Assim, ao remeter ao passado, os objetos que comumente são pensados como parte intrínseca dos modos de ser do homem desde sempre, aparecem como uma construção histórica realizada pelo próprio homem ao longo de sua história. Foucault (1987) analisa tais construções pensando na concretização destes objetos através de práticas discursivas e de práticas sociais. Ao dizer que utilizamos bases históricas, é importante pontuar como é estudado este processo histórico. Foucault critica a visão de história construída por um progresso contínuo, negando as pretensas continuidades estabelecidas pelas análises retrospectivas que privilegiam os temas ou teorias (MACHADO, 1981). Pesquisas históricodescritivas, limitadas a apontar precursores, celebrar datas e eventos grandiosos são contrárias ao pensamento foucaultiano sobre o estudo da história que, por outro lado, não parte dos grandes marcos, mas privilegia acontecimentos pequenos que não são facilmente percebidos por se encontrarem muito na superfície das coisas. Ele procura por acontecimentos que estão nas sombras, nos lugares empoeirados, mofados, não visitados (PRADO FILHO, 2005). É importante também considerar a questão da descontinuidade histórica presente na formas de análises foucaultianas que não se caracterizam por um processo homogêneo, nem atingem todas as formações discursivas ou conceituais de uma época (MACHADO, 1981). Assim, deve ser considerado que o tempo do saber, ou o tempo do discurso, não está disposto da mesma forma que o tempo vivido mas apresenta descontinuidades e transformações específicas (FOUCAULT, 2005a). É neste sentido que a cronologia não é nem linear e nem homogênea, ou seja, o que tornam contemporâneas determinadas transformações não são suas exatas coincidências cronológicas (FOUCAULT, 1987). Disciplina e vigilância A disciplina surge, segundo Foucault (2005c, p. 187), nos séculos XVII e XVIII coma a burguesia, enquanto uma "nova mecânica de poder, com procedimentos específicos, instrumentos totalmente novos e aparelhos bastante diferentes". Apesar do poder disciplinar ser um fundamental instrumento para a construção do capitalismo industrial e da sociedade capitalista, ele não causou o desaparecimento do edifício 5
jurídico articulado na época anterior. A soberania era, até então, a forma de poder vigente que exercia dominação e sujeição. É em torno da soberania que a teoria do direito organiza-se, a partir da Idade Média, com a principal função de fixar a legitimidade de tal poder. "Na verdade, a teoria da soberania continuou não só existindo como uma ideologia do direito como também organizando os códigos jurídicos inspirados nos códigos napoleônicos de que a Europa se dotou no século XIX" (FOUCAULT, 2005c, p. 188). Houve, assim, uma democratização da soberania, onde encontramos os mecanismos da disciplina sobrepostos a um sistema de direito, atualizado num direito público e numa soberania coletiva, que são fixados através da coerção disciplinar. Para Foucault (2005b), a disciplina é um exercício de poder voltado para o corpo. Tratemos agora, mais especificamente a respeito da vigilância. No início do século XIX, ocorre uma transformação da penalidade. Mecanismos de vigilância e de controle ajustam o sistema judiciário, integrando mecanismos e sistema num aparelho de Estado centralizado (FOUCAULT, 1997). Ligada a esta integração está a constituição de várias instituições que servem de base ao aparelho principal: um sistema geral de vigilância-reclusão penetra por toda a espessura da sociedade, tomando formas que vão desde as grandes prisões, construídas a partir do modelo do Panopticon, até as sociedades de patronagem e que encontram seus pontos de aplicação não somente nos delinqüentes, como também nas crianças abandonadas, órfãos, aprendizes, estudantes, operários etc (...). O século XIX fundou a idade do panoptismo (FOUCAULT, 1997, p. 38). Este é um ponto importante a ser destacado: a vigilância estende-se não somente aos criminosos, mas também aos loucos, aos estudantes, aos trabalhadores, às famílias, enraizando-se como novo modelo para a sociedade ocidental de forma bem abrangente. A noção central da vigilância equivale ao modelo do Panopticon, ou Panóptico, proposto por Bentham, em 1787 (FOUCAULT, 1997). Trata-se de uma arquitetura detalhadamente descrita em termos de construção, funcionamento, operacionalização, utilidade e vantagens. O plano deste edifício aplica-se "sem exceção, a todos e quaisquer estabelecimentos, nos quais, num espaço não demasiadamente grande para que possa ser controlado ou dirigido a partir de edifícios, queira-se manter sob inspeção um certo número de pessoas" (BENTHAM, 2000, p. 17). Pegando uma citação de Foucault (2005b, p. 165-66), podemos visualizar o edifício de Bentham: 6
Na periferia uma construção em anel; no centro, uma torre; esta é vazada de largas janelas que se abrem sobre a face interna do anel; a construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda a espessura da construção; elas têm duas janelas, uma para o interior, correspondendo às janelas da torre; outra, que dá para o exterior, permite que a luz atravesse a cela de lado a lado. Basta então colocar um vigia na torre central, e em cada cela trancar um louco, um doente, um condenado, um operário ou um escolar. Pelo efeito da contraluz, pode-se perceber da torre, recortando-se exatamente sobre a claridade, as pequenas silhuetas cativas nas celas da periferia (...). O dispositivo panóptico organiza unidades espaciais que permitem ver sem parar e reconhecer imediatamente. Em suma, o princípio da masmorra é invertido; ou antes, de suas três funções trancar, privar de luz e esconder só se conserva a primeira e suprimem-se as outras duas. A plena luz e o olhar de um vigia captam melhor que a sombra, que finalmente protegia. A visibilidade é uma armadilha. Atualização do dispositivo Atualizando o dispositivo da vigilância, encontramos a tecnovigilância que se une a diversas formas de vigilância que atuam nos mais diversos âmbitos sociais (GOIFMAN, 1999). As imagens capturadas pelas câmeras vão além dos muros da prisão, e a própria rua converte-se em local de vigilância. As máquinas do olhar são encontradas nas ruas, capturando pessoas e automóveis, nos espelhos das lojas, em eventos sociais, nos aeroportos, e acabam transformando-se em práticas rotineiras que têm como objetivo a vigilância e o controle de informações. Goifman (1999), através de Machado, faz uma atualização desse dispositivo na sociedade contemporânea, apontando a tecnovigilância nas instituições carcerárias como modelo pautado nos princípios do panoptismo. Dois princípios fundamentais do modelo do Panóptico são apontados como incorporados na prática da implantação das câmeras: (1) a visão unilateral onde os internos, apesar de verem as câmeras, não sabem quem está por trás delas (desindividualização e despersonificação do poder), e (2) a sensação de estar sempre sendo vigiado (os detidos são vistos, sem verem a si próprios). A novidade, para este autor, é que no panóptico eletrônico produz-se uma prova instantânea, intransferível e personalizada: na prisão, a imagem eletrônica do erro do preso constitui-se em prova (GOIFMAN, 1999, p. 70). Monitoramento eletrônico O Senado brasileiro aprovou, no dia 25 de abril de 2007, um projeto de lei que prevê o monitoramento eletrônico em relação ao livramento condicional e a progressão para regime semi-aberto e aberto. Foi aprovado, inclusive, um outro projeto que prevê que este rastreamento também poderá ser feito em presos que cumprem pena em regime 7
fechado, quando o juiz achar necessário. O equipamento que viabiliza este monitoramento é feito de material plástico ou emborrachado, em forma de pulseiras, tornozeleiras ou cintos, com a finalidade de detectar e controlar movimentos à distância, enviando informações via satélite para um banco de dados do sistema judiciário de cada estado, rastreando o corpo do interno fora do presídio. O projeto de lei está em pauta no Congresso Nacional, dependendo agora da aprovação da Câmara dos Deputados. Ele faz parte de uma proposta chamada pacote antiviolência que integra oito mediadas de combate à violência. Entre tais medidas encontram-se a polêmica redução da maioridade penal, o afastamento e a suspensão do pagamento de salário de funcionários públicos sob suspeita de corrupção, a produção de alimentos pelos próprios internos, entre outras. O monitoramento eletrônico é um dispositivo de vigilância que efetiva a disciplina dos corpos e dos seus atos enquanto mecanismo de poder, autorizado em forma de Lei Federal. Fazendo um paralelo com as análises de Foucault (2005b) acerca do Panóptico, podemos dizer que os novos aparatos tecnológicos, além de se constituírem enquanto dispositivo-vigilância, também disciplinam corpos. Neste sentido, os internos sabem que seus movimentos estão sendo monitorados e funcionam de acordo com uma conduta adequada, a fim de não receberem represálias. O monitoramento através de pulseiras, tornozeleiras ou cintos, pode ser apontado como um dispositivo de vigilância nos moldes do panóptico atualizado. Sob a luz da mobilidade dos corpos fora dos muros da prisão, movimentos são vigiados e controlados, colocando os corpos em seu devido lugar, fazendo-os cumprir sua devida função, mesmo que à distância. Partindo das idéias de Foucault, podemos inferir que os discursos formulados e as práticas que estão por ser instituídas no cenário do sistema prisional brasileiro com o monitoramento eletrônico, sejam em forma de projeto de lei, opiniões a respeito dessa inovação, ou veiculação do tema pela mídia, são construídos e instituídos ao longo da história pelos próprios homens. Não há um processo natural nessa trajetória, como se os valores éticos ou morais, os discursos acerca das aplicações das penas, e a própria instituição penal já estivessem dentro do modo de viver dos homens, como uma essência que dirige as ações de uma sociedade. No entanto, existem outros discursos que podem contribuir para um maior entendimento acerca dessa questão, que asseguram a proposta e a viabilização dessa forma de vigilância, com conexões estratégicas que não merecem ser excluídos dessa 8
temática. Destacamos nosso interesse em continuar esta pesquisa, buscando outros discursos nas obras de Foucault, de outros autores que dialogam nessa perspectiva, entrando em lugares empoeirados, visitando lugares que muitas vezes não são percebidos por estarem muito na superfície das coisas. Referências bibliográficas BENTHAM, Jeremy. O Panóptico ou a casa de inspeção. In: SILVA, Tomaz Tadeu da (org.) O Panóptico / Jeremy Bentham. Trad. Tomaz Tadeu da silva. Belo Horizonte: Autêntica, 2000. FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber. Trad. Luiz Felipe Baeta Neves. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1987.. A sociedade punitiva. In: FOUCAULT, Michel. Resumo dos cursos do Collège de France (1970-1982). Trad. Andréa Daher. Rio de janeiro: Jorge Zahar, 1997.. Michel Foucault explica seu último livro. In: Arqueologia das ciências e história dos sistemas de pensamento / Michel Foucault. Coleção Ditos & Escritos Vol. II. Trad. Elisa Monteiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005a.. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Trad. Raquel Ramalhete. 30. ed. Petrópolis: Vozes, 2005b.. Soberania e disciplina. In: FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Org. e trad. Roberto Machado. 21 ed. São Paulo: Graal, 2005c. GOIFMAN, Kiko. Das duras às máquinas do olhar a violência e a vigilância na prisão. São Paulo em Perspectiva. Vol. 13 n. 3. São Paulo July/Sept. Violência e mal estar na sociedade, 1999. MACHADO, Roberto. Ciência e saber: a trajetória da arqueologia de Michel Foucault. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1981. PRADO FILHO, Kleber. Para uma arqueologia da psicologia (ou: para pensar uma psicologia em outras bases). In: Guareshi, N. & Hüning, S. (org.). Foucault e a psicologia. Porto Alegre: Abrapso Sul, 2005. 9