Manuel Rodrigues de Freitas Filho 1 Joel Robert Georges Marcel Pellerin 2

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Transcrição:

Aplicação de geotecnologias na análise da dinâmica da cobertura e uso da terra de um enclave úmido do ambiente semi-árido cearense: O setor da APA da Serra de Baturité entre 1958 e 2004 Manuel Rodrigues de Freitas Filho 1 Joel Robert Georges Marcel Pellerin 2 1 Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos-FUNCEME Caixa Postal D-3221 - CEP 60115-221 - Fortaleza-CE - Brasil manuelrff@gmail.com 2 Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC/PPGG Caixa Postal 476 - CEP 88.040-970 Florianópolis-SC Brasil pellerin@cfh.ufsc.br Abstract. The main objective of this work is to identify the main space transformations happened in the last five decades in the cover and land-use of an area inserted in the context of the semi-arid from Ceará, with base the successive cartographic registrations of the cover and land-use. The geographic space of the study, is delimited by Area of Environmental Preservation of the Mountain range of Baturité, in the state of Ceará. The humid forest of the Mountain range of Baturité consists in one of the few remainder of the Atlantic forest, and one of the threatened ecosystems of the Brazilian territory. Palavras-chave: remote sensing, image processing, environmental systems, sensoriamento remoto, processamento de imagens, Áreas de Preservação Permanente, uso da terra, land-use 1. Introdução As atitudes humanas sempre tiveram uma tendência em sentido contrário à manutenção do equilíbrio ambiental impondo uma pressão cada vez maior sobre os recursos naturais. Nas últimas décadas, observou-se em várias partes do planeta uma crescente demanda de investigações sobre a degradação do meio ambiente em seus diversos níveis de intensidade. Este grande impacto das atividades predatórias do homem sobre os recursos naturais, tem proporcionado em diferentes áreas do globo terrestre níveis críticos de degradação ambiental. Ab Saber (2006) cita a carência de planos e ações abrangentes para a manutenção da biodiversidade brasileira enfatizando que o mais preocupante no Brasil não é a devastação ocorrida ao longo dos seus quinhentos anos de povoamento, e sim nas últimas quatro décadas. Referido autor coloca ainda que o ritmo de destruição da biodiversidade brasileira obteve um crescimento alarmante a partir da década de 1960 e que há uma necessidade cada vez maior de se conhecer não só o domínio básico da natureza e seus ecossistemas, como também, o de se obter conhecimentos da tipologia dos espaços geográficos e sociais criados por processos antrópicos ao longo dos tempos. No contexto do semi-árido nordestino brasileiro encontram-se alguns ambientes de exceção situados em áreas serranas, formando ilhas de florestas úmidas em meio ao bioma da caatinga. De acordo com FUNCEME(2005), dentre os estados do Nordeste brasileiro, o que detêm maior percentual de área inserida no ambiente semi-árido é o Ceará, com quase 92% de sua extensão territorial. Contrastando com esta relativa uniformidade do domínio paisagístico da vegetação de caatinga, encontram-se as serras úmidas cearenses, que assim como as demais nordestinas, representam ambientes de grande riqueza biológica. Neste contexto, destaca-se o maciço de Baturité, um dos mais expressivos compartimentos do relevo cearense, sendo o mais importante dispersor de drenagem da porção norte-ocidental do Estado do Ceará. Nas últimas décadas a pressão antrópica sobre o maciço serrano de Baturité, principalmente em seus níveis mais elevados, intensificou-se bastante. Além de ter se tornado 5797

um importante pólo agrícola, destacando-se nos setores de fruticultura e olericultura, o crescimento das áreas urbanas situadas sobre o referido maciço, juntamente com o extrativismo vegetal, têm estimulado a exploração predatória de seus recursos naturais. Outras atividades voltadas para o turismo, referentes a implantação de grandes projetos arquitetônicos, direcionados para a construção de hotéis, pousadas e casas de veraneio, tem ocasionado uma expressiva perda da diversidade de seus ecossistemas. Normalmente estas ações antrópicas não tem sido acompanhada por práticas sustentáveis, levando determinados setores da referida serra a um quadro preocupante de degradação. Convém destacar que as mencionadas ações humanas são totalmente inadequadas para um ambiente frágil e susceptível ao desequilíbrio ambiental. Objetivando prevenir a ocupação desordenada da terra e melhoria das condições ecológicas na serra de Baturité, em 1990 o Governo do Estado do Ceará, através do Decreto Estadual n 20.956, de 18/09/90, criou a Área de Proteção Ambiental (APA) do maciço de Baturité. Sua delimitação foi realizada a partir da curva de nível de 600 (seiscentos) metros, ocupando uma extensão territorial em torno dos 32.690ha. Este ambiente de exceção do semiárido cearense possui fundamental importância ecológica por abrigar diversas fontes hídricas e por sua função como habitat para diferentes grupos de espécies da fauna local. Todavia, mesmo com a implantação da referida APA, muitos problemas envolvendo a diversidade biológica e o uso da terra, persistem até os dias atuais. Esta pesquisa tem como principal objetivo identificar as principais transformações espaciais ocorridas nas últimas cinco décadas em um espaço geográfico inserido em um ambiente de exceção do semi-árido cearense, tendo como base os sucessivos registros cartográficos da cobertura e uso da terra. Pretende-se, assim, compreender, de forma mais abrangente e precisa, a dinâmica atual do espaço geográfico delimitado pela APA da Serra de Baturité, tendo como um de seus principais parâmetros a evolução histórica da cobertura e uso da terra. Para atingir os objetivos desta pesquisa serão utilizados os recursos disponíveis nas geotecnologias, essenciais no mundo atual na execução de mapeamentos e monitoramento do espaço geográfico. Com os avanços geotecnológicos ocorridos nas últimas décadas, o homem passou a ter a sua disposição a possibilidade de monitorar a evolução e transformação dos diversos fenômenos, naturais ou artificiais, que ocorrem na superfície terrestre de uma forma cada vez mais precisa. 2. A APA da Serra de Baturité-CE como área de estudo A delimitação APA da serra de Baturité-CE foi realizada a partir da curva de nível de 600 (seiscentos) metros, ocupando uma extensão territorial em torno dos 32.690ha (Figura 01). Este ambiente de exceção do semi-árido cearense encontra-se situado a uma distância aproximada de 100km do litoral cearense, possuindo fundamental importância ecológica por abrigar diversas fontes hídricas e por sua função como habitat para diferentes grupos de espécies da fauna local. Sua temperatura média anual fica em torno de 24 o C, a média das máximas 28 o C e a das mínimas 17 o C. Os índices pluviométricos possuem uma média anual aproximada de 1.700mm, distribuídos regularmente ao longo do primeiro semestre do ano, ocorrendo algumas precipitações de forma esporádica entre os meses de Agosto e Dezembro. Sua cobertura vegetal comporta padrões fisionômicos bastante representativos, inclusive de espécies da Mata Atlântica. Ceará(2006) ressalta que a serra de Baturité, em virtude principalmente de sua contextualização geográfica, apresenta um alto grau de espécies endêmicas, representando um verdadeiro banco genético da biodiversidade. 5798

Figura 01 Localização da área de estudo 3. Procedimentos metodológicos Para execução desta pesquisa foi realizado inicialmente um levantamento bibliográfico e cartográfico relacionados a área de estudo. Foram disponibilizados produtos de sensoriamento remoto, mapas temáticos, planilhas, equipamentos e softwares. 3.1 Produtos Cartográficos, orbitais e aéreos Carta Planialtimétrica, escala 1:100.000, Folhas Canindé e Baturité,DSG/SUDENE, 1972; Mapa Político-Administrativo do Estado do Ceará, escala 1:600.000, IPLANCE, 2002; Imagem orbital do satélite francês SPOT5, resolução espacial de 2,5m, formato digital, bandas 1,2 3, datada de Set/2004; Fotografias aéreas pancromáticas obtidas através de levantamento aerofotogramétrico datado de 1958, escala de 1:40.000; Ortofotocartas planialtimétricas pancromáticas em escala de 1:10.000, resultantes de um levantamento aerofotogramétrico datado de 1987, escala de 1:32.500; A compilação e integração em uma única base de dados dos materiais cartográficos, orbitais e aéreos levantados, bem como a geração de textos, planilhas e todos os demais produtos cartográficos necessários para esta pesquisa, foi realizada através da utilização dos equipamentos e softwares especificados a seguir. 3.2 Equipamentos e softwares Microcomputador Plotter colorido de alta resolução, tamanho A0; Scanner A4; Scanner A0; GPS; Câmara fotográfica digital; ArcGIS 9.2; SPRING 4.3; ENVI 4.3; 5799

GTM Pro Microsoft Office (Word, Excel, Power Point e Access). 3.3 Trabalho de campo Foram realizadas algumas viagens de campo visando um levantamento e reconhecimento da área a ser pesquisada. Nesta oportunidade procurou-se observar as condições da cobertura vegetal, dos solos, das formas de relevo e dos principais tipos de uso e ocupação da terra. Em etapas posteriores foram realizadas outras viagens de campo visando a coleta de dados e verificação do mapeamento da cobertura e uso da terra a executado. Para visualização em campo dos dados cartografados, foi utilizado um computador portátil com o SIG ArcGIS devidamente instalado. Outro programa utilizado nesta etapa foi o GTM Pro, o qual, juntamente com um aparelho GPS, permitiu a visualização do posicionamento instantâneo nos mapas previamente inseridos no ArcGIS. Outro método utilizado para obtenção dos dados em campo foi a aplicação de entrevistas. Com este procedimento, coletou-se informações relevantes para a compreensão dos processos responsáveis pelas alterações da paisagem da área de estudo, no período de 1958 a 2004. 3.4 Edição e estruturação dos dados espaciais em ambiente SIG No decorrer deste trabalho foram utilizadas as funções disponíveis nos SIGs SPRING, ArcGIS e ENVI. Inicialmente foi providenciada a elaboração da base cartográfica planialtimétrica na escala de 1:100.000.Com base nas funções de registro de imagens disponíveis no ENVI, foi providenciado o georreferenciamento dos arquivos digitais das ortofotocartas datadas de 1987..Após georreferenciados, estes arquivos foram utilizados como base para o georreferenciamento das fotografias aéreas datadas de 1958 e da imagem SPOT5, datada de 2004.. Nesta etapa, foram selecionadas feições comuns, e perfeitamente identificáveis, tanto no arquivo utilizado como base do registro (ortofocarta) como no que estava sendo georreferenciado. Adotou-se como valor para controle de precisão do georreferenciamento um erro aceitável de 25 metros no terreno. O erro médio dos pontos de controle deverá sempre ser inferior a esse valor. Este controle de precisão do registro é fundamental em uma análise entre imagens de diversas datas. Em seguida, no SPRING, tendo as ortofotocartas como plano de fundo e com aplicação de técnicas de interpretação visual, de imagens foi realizada a vetorização das seguintes camadas: recursos hídricos superficiais, rede viária, áreas urbanas, curvas de nível com eqüidistância de 10m e limites político-administrativos municipais e distritais. As informações planimétricas referentes aos espelhos d água, áreas urbanas e rede viária, foram atualizadas com base na imagem do satélite francês SPOT5. Os limites políticoadministrativos municipais e distritais foram vetorizados tendo como apoio, além das ortofotocartas, as leis de criação dos municípios envolvidos na área de estudo. Após concluída a edição vetorial dos temas relacionados a base cartográfica, foi iniciada a execução do mapeamento da cobertura e uso da terra em diferentes períodos. Inicialmente procurou-se definir uma legenda compatível com os objetivos da pesquisa com base em uma análise visual dos padrões de textura, tonalidade e formas geométricas observadas nos produtos de sensoriamento remoto utilizados. O mapeamento deste tema foi iniciado pela imagem SPOT5, possibilitando assim que os padrões de interpretação definidos fossem checados em campo e posteriormente adotados nos produtos resultantes dos aerolevantamentos. Desta forma, a legenda temática do mapeamento da cobertura e uso da terra adotada foi a seguinte: áreas agrícolas, floresta perenifólia, floresta subcaduciifólia, sede municipal e povoado. 5800

A estruturação e organização de todos os dados espaciais deste trabalho foi efetivada no SIG ArcGIS. Este SIG oferece aos seus usuários eficientes ferramentas para geração, visualização, edição e manipulação dos dados espaciais, permitindo ainda consultas complexas das informações geográficas armazenadas em seu banco de dados. 3.5 Análise da dinâmica espaço-temporal da cobertura e uso da terra A análise da dinâmica espaço-temporal da cobertura e uso da terra da área em estudo, foi realizada a partir de cruzamentos espaciais entre os diferentes períodos mapeados. Inicialmente foi cruzado o mapa de 1958 com o de 1988, resultando em um terceiro mapa, 1958 x 1988. O resultado deste cruzamento viabilizou a análise das alterações ocorridas entre o primeiro período mapeado (1958) até 1988. Em seguida o mapa de 1988 foi cruzado com o de 2004, resultando no produto cartográfico com as transformações ocorridas entre 1988 e 2004. A análise das transformações ocorridas até 2004 foi efetivada com base no cruzamento entre o mapa 1958 x 1988 com o mapa de 2004. Em seguida foram realizadas diversas análises visando uma compreensão lógica da evolução dos padrões espaciais cartografados 4. Resultados Após a conclusão do mapeamento da cobertura e uso da terra em diferentes períodos, 1958, 1988 e 2004, e com as funções de análise espacial disponíveis no ArcGIS 9.2, foi possível a realização da análise das alterações da cobertura e uso da terra da área em estudo. Inicialmente é colocado a situação da cobertura e uso da terra na área de estudo por período mapeado, permitindo, desta forma, uma análise evolutiva entre as décadas de 1958 a 2004. Com os dados apresentados na Tabela 01 e na Figura 02 verifica-se que neste período ocorreu uma considerável recuperação da cobertura florestal perenifólia, passando de 41,06% da área mapeada em 1958 para 59,48% em 2004. A análise revela ainda uma redução das áreas ocupadas pelas atividades agrícolas, passando de 56,38% em 1958 para 32,05% em 2004. Tabela 01 Evolução da cobertura e uso da terra na APA da serra de Baturité entre as décadas de 1958 e 2004 Área (ha) Classe mapeada 1958 % em relação ao total 1988 % em relação ao total 2004 % em relação ao total Floresta perenifólia 13.421,06 41,06 15.089,05 46,17 19.443,81 59,48 Floresta subcaducifólia 756,63 2,32 910,66 2,79 2.542,34 7,78 Áreas agrícolas 18.431,28 56,38 16.560,07 50,64 10.477,98 32,05 Água 7,73 0,02 19,28 0,06 50,86 0,16 Povoado 8,04 0,02 11,02 0,03 50,53 0,15 Sede municipal 65,26 0,20 99,33 0,31 124,48 0,38 Total 32.690,00 100,00 32.690,00 100,00 32.690,00 100,00 Fonte: elaborado pelos autores Foram realizados cruzamentos espaciais entre os diferentes períodos mapeados do tema cobertura e uso da terra da área em estudo, onde foi possível gerar os dados que se encontram organizados na Tabela 02. Este procedimento possibilitou uma melhor compreensão das transformações ocorridas nas últimas cinco décadas no setor delimitado pela APA da Serra de Baturité-CE. 5801

Tabela 02 - Dinâmica da Cobertura e Uso da Terra da APA da Serra de Baturité-CE entre os períodos de 1958 e 2004 Dinâmica das classes mapeadas Área % em relação a 1958 1988 2004 (ha) área total Água Água Água 6,95 0,02 Água Área agricola Área agrícola 0,61 0,00 Área agrícola Área agricola Área agrícola 5566,08 17,03 Área agrícola Área agricola Floresta perenifólia 4785,37 14,64 Área agrícola Área agricola Floresta subcaducifólia 1433,61 4,39 Área agrícola Floresta perenifólia Floresta perenifólia 4651,40 14,23 Área agrícola Floresta perenifólia Área agrícola 1467,21 4,49 Área agrícola Floresta perenifólia Floresta subcaducifólia 122,49 0,37 Área agrícola Floresta subcaducifólia Floresta subcaducifólia 348,80 1,07 Área agrícola Área agricola Área urbana 2,98 0,01 Área agrícola Área agricola Água 0,42 0,00 Área agrícola Área urbana Área urbana 73,34 0,22 Área urbana Área urbana Área urbana 119,25 0,36 Floresta perenifólia Área agricola Floresta perenifólia 2804,35 8,58 Floresta perenifólia Área agricola Área agricola 1547,00 4,73 Floresta perenifólia Área agricola Floresta subcaducifólia 137,07 0,42 Floresta perenifólia Floresta perenifólia Área agrícola 1563,08 4,78 Floresta perenifólia Floresta perenifólia Floresta subcaducifólia 158,21 0,48 Floresta perenifólia Floresta perenifólia Floresta perenifólia 7220,23 22,09 Floresta perenifólia Floresta subcaducifólia Floresta subcaducifólia 51,85 0,16 Floresta perenifólia Área agrícola Área urbana 2,17 0,01 Floresta perenifólia Água Água 15,61 0,05 Floresta perenifólia Área urbana Área urbana 22,71 0,07 Floresta subcaducifólia Área agricola Floresta subcaducifólia 127,10 0,39 Floresta subcaducifólia Floresta subcaducifólia Floresta subcaducifólia 252,31 0,77 Floresta subcaducifólia Área agricola Área agricola 135,40 0,41 Floresta subcaducifólia Floresta subcaducifólia Área agricola 74,40 0,23 Área total 32690,00 100,00 Fonte: elaborado pelos autores Realizando uma análise entre os dados contidos nas Tabelas 01 e 02, verifica-se que dos 19.443,81ha da cobertura florestal perenifólia observada em 2004, 7.220,23ha permaneceram inalterados entre as décadas de 1958 e 2004. Outro dado que se destaca, comparando as duas tabelas acima mencionadas, é o de áreas ocupadas com atividades agrícolas.. Neste caso, verifica-se que dos 10.477,98ha mapeados em 2004, 5.566,08ha ficaram permanentemente ocupados com áreas agrícolas no período estudado. De acordo com a Tabela 02, o percentual de floresta perenifólia mapeada em 1958 que se transformou em área agrícola em 2004 é de 9,51%, ou seja, 3.110,08ha. Aproximadamente a metade desta área, ou seja, 1.547,0ha, foi identificado como área agrícola já no mapeamento de 1988, enquanto que o restante, 1.563,08ha, foi verificado somente na execução do mapeamento de 2004. Constatou-se ainda que 9.436,77,3ha da classe mapeada em 1958 como área agrícola, transformou-se em 2004 para floresta perenifólia. Observa-se, assim, uma importante regeneração da floresta perenifólia entre as décadas de 1958 e 2004. 5802

Figura 02 Evolução da cobertura e uso da terra na APA da Serra de Baturité-CE entre os períodos de 1958 a 2004. (elaborado pelos autores) 5803

Aproximadamente a metade da área em que se constatou este processo de regeneração da cobertura florestal, 4.651,40ha, foi observada entre as décadas de 1958 e 1988, enquanto que o restante, 4.785,37ha, verificou-se entre 1988 e 2004, identificando-se assim, diferentes estágios de regeneração. A baixa rentabilidade, verificada a partir de 1960, nos produtos derivados da cana-deaçúcar, resultou em uma drástica redução dessa atividade no contexto da área em estudo. Com isto, parte das áreas ocupadas anteriormente com o cultivo da cana-de-açúcar foram abandonadas, favorecendo a regeneração da cobertura florestal. mapeada. O impacto da exploração antrópica na área de estudo, principalmente em suas vertentes a sotavento (ventos secos e quentes), favoreceu o considerável aumento da área ocupada pela floresta subcaducifólia, a qual passou de 756,63ha em 1958 para 2.542,34ha em 2004. Em algumas áreas da Serra de Baturité onde ocorreu o desmatamento da floresta perenifólia/subperenifólia, no processo de sucessão secundária verificou-se a invasão de espécies da floresta subcaducifólia, no caso a caatinga, que são mais adaptadas as condições determinadas pelos impactos resultantes da ação antrópica. 5. Considerações finais O enfoque temporal apresentado nesta pesquisa, com análises das alterações espaciais ocorridas em três períodos, permitiu uma compreensão mais abrangente e precisa, considerando o inevitável dinamismo da paisagem, das transformações espaciais ocorridas nas últimas cinco décadas na área delimitada atualmente pela APA da Serra de Baturité-CE. Com a metodologia aplicada neste trabalho, foi possível a identificação de áreas que necessitam de uma maior atenção, tanto no que se refere a preservação da cobertura florestal como da recuperação de áreas que foram permanentemente exploradas pelo homem no período considerado nesta pesquisa. Desta forma, os dados disponibilizados nesta pesquisa constituem-se em um importante instrumento a ser utilizado no planejamento e gestão da unidade de conservação estudada. As técnicas de geoprocessamento mostraram-se bastante eficientes no que se refere ao alcance dos objetivos deste trabalho, comprovando sua eficácia nas pesquisas geográficas. 6. Referências bibliográficas AB SABER, Aziz. N.,Plataforma de florestas sociais para o Brasil. In: Cadernos Geográficos.Universidade Federal de Santa Catarina-CFH. nº 10. Florianópolis. Imprensa Deptº de Geociências. 2006. p. 13-58; CEARÁ, Superintendência Estadual do Meio Ambiente, Unidades de Conservacação do Estado do Ceará, SEMACE, Fortaleza, 2006. Disponível em: <http://www.semace.ce.br > Acesso em: 15 Out 2006; FUNCEME. Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos. Proposta de dimensionamento do semi-árido brasileiro. Banco do Nordeste do Brasil. Fortaleza. 2005.109p. 5804