AQUECIMENTO GLOBAL, OCEANOS & SOCIEDADE



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Conseqüência do acúmulo de gases de efeito estufa de origem antrópica na atmosfera, o aquecimento global vem causando o aumento das temperaturas do ar e dos oceanos, a elevação do nível médio do mar e a retração das geleiras globais (Figura 1), além do aumento da ocorrência de fenômenos meteorológicos extremos. Tal aquecimento é o resultado da amplificação de uma característica natural da atmosfera terrestre chamada efeito estufa ; consiste na transparência atmosférica para a radiação solar de onda curta, na faixa do espectro das radiações visíveis, e a opacidade atmosférica à radiação terrestre de onda longa, ou infra-vermelho, emitida para o espaço. Na ausência do efeito estufa, a temperatura média da superfície da terra seria -15 C a -18C, ou seja, toda a água seria congelada e não haveria vida. Os principais gases de efeito estufa são o dióxido de carbono (CO 2 ), o metano (CH 4 ) e os óxidos nitrosos (N 2 O). O vapor d água é também um potente gás de efeito estufa, com forte potencial de retroalimentação positiva (por exemplo, a solubilidade do vapor d água na atmosfera é diretamente proporcional à temperatura); assim, uma atmosfera mais aquecida (por exemplo, em razão do aumento dos gases de efeito estufa de origem antropogênica) dissolverá maior quantidade de vapor d água, o qual aumentará ainda mais a retenção de calor nas camadas baixas da atmosfera, amplificando assim o aquecimento inicial. Na ausência de mecanismos compensadores (por exemplo, a fotossíntese e o ciclo hidrológico) os processos de retroalimentação positiva da água somente permitiriam dois tipos de clima estáveis: ou uma atmosfera onde toda a água estaria na forma de vapor (o caso de uma perturbação inicial de aquecimento, como descrito acima), ou uma em que toda a água estaria congelada (no caso de uma perturbação inicial de resfriamento, através do processo de retroalimentação positivo da radiação solar e o albedo da neve: uma diminuição inicial da temperatura levaria ao aumento das regiões cobertas por neve, que levaria à diminuição da temperatura). A ALTERAÇÃO DA COMPOSIÇÃO QUÍMICA DA ATMOSFERA Resultado do desequilíbrio entre as emissões de carbono pelas atividades humanas, ou seja, queima de combustíveis fósseis (6,4 GtC/ano) e desflorestamentos tropicais (1,6 GtC/ano), e a remoção do CO 2 atmosférico pelas plantas (3,0 GtC/ano) e pelos oceanos (1,8 GtC/ano), restam aproximadamente 3,2 GtC/ano que se acumulam na atmosfera. Tal aumento na massa de gases de efeito estufa na atmosfera é ilustrado 2 Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente - v.3, n.1, Artigo 1, jan./ abril 2008

pelas medidas da concentração de CO 2 atmosférico realizadas no observatório de Mauna Loa, no Havaí, desde 1958 até o presente (Figura 2). É notável observar não somente o aumento monotônico das concentrações de CO 2 (curva principal azul e vermelha na Figura 2), que presentemente já ultrapassa a marca de 380 ppm, mas principalmente a taxa de aumento da concentração anual do CO 2 atmosférico (mostrado no quadro do canto inferior direito na Figura 2), que dobrou num período de aproximadamente 30 anos, passando de ~1 ppm/ano em 1965 para 2+ ppm/ano em 2005. Além disso, inferências feitas da concentração de dióxido de carbono atmosférico e temperatura do ar a partir de testemunhos de gelo da Antártica mostram que as concentrações de CO 2 atmosféricos não ultrapassaram a marca de 300 ppm durante os últimos 400 mil anos. Adicionalmente, as temperaturas do ar guardaram uma proporção direta com a concentração de CO 2 durante o período, como se pode ver na Figura 3 (FEDOROV et al., 2006). Associado ao forte aquecimento de economias de países emergentes com bases energéticas no carbono e às emissões dos países industrializados durante a década atual, o aumento da concentração dos gases de efeito estufa tem acompanhado os cenários de mais altas taxas de emissões formulados pelo Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC), ilustrados na Figura 4. Somam-se ao aumento das emissões dos gases de efeito estufa mostrado na Figura 4, evidências observacionais recentes que sugerem que os oceanos estariam dando sinais de redução da taxa de dissolução de CO 2 atmosférico (CANADELL et al., 2007), possivelmente resultante do aumento da temperatura das águas do mar. DETECÇÃO E ATRIBUIÇÃO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS Há décadas a comunidade científica mundial debate se o aquecimento global da atmosfera e dos oceanos, detectado de modo inequívoco pelas redes de observações atmosféricas e oceânicas globais, pode ser atribuído às atividades humanas. Contribuindo para esclarecer este sofisma, a Figura 5 mostra séries temporais de temperaturas médias globais simuladas pelo estado da arte de modelos de circulação geral da atmosfera e dos oceanos para o século XX, comparados aos valores observados da temperatura média global do período. É notável observar na Figura 5 que as simulações que utilizaram o conjunto completo de forçantes, ou seja, de origem natural (por exemplo, erupções vulcânicas e a variabilidade da irradiância solar) e de origem antropogência (por exemplo, 3 Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente - v.3, n.1, Artigo 1, jan./ abril 2008

emissões globais de gases de efeito estufa e particulados), mostram uma notável concordância com as temperaturas observadas (Figura 5a), enquanto as simulações que utilizaram somente as forçantes naturais (Figura 5b) não conseguem explicar o aquecimento atmosférico das últimas décadas. Isto é uma evidência robusta de que os gases de efeito estufa de origem antrópica são responsáveis por grande parte do aquecimento atmosférico global observado após a Revolução Industrial. As estimativas publicadas pelo IPCC (2007) são de que o calor adicional médio retido no sistema soloplanta-oceano-atmosfera-criosfera devido à contribuição humana no acúmulo de gases de efeito estufa seja de 1,6 W/m 2 (+0,6 a +2,4 W/m 2 ). Ou seja, totalizando para a superfície do globo terrestre o equivalente à potência elétrica gerada por 58 mil usinas hidrelétricas de Itaipu (hoje a maior geradora de energia hidrelétrica instalada do planeta) à sua capacidade máxima de 14 mil MW. Como ocorre, então, que a média global da temperatura do ar não tenha aumentado muito mais do que os 0,7 C medidos durante os últimos cem anos (ver Figura 1a)? Ocorre que 80% do calor adicional retido graças ao acúmulo de gases de efeito estufa na atmosfera tem sido absorvido pelos oceanos, cuja capacidade de armazenar calor é da ordem de mil vezes a da atmosfera e do solo juntos. A Figura 6 mostra a variação da quantidade de calor armazenada na camada superior dos oceanos globais durante os últimos séculos e simulações numéricas do calor armazenado em razão do aquecimento global (HANSEN et al., 2005). Tal absorção do calor adicional pelos oceanos, se por um lado tem amortecido grandemente o aumento das temperaturas atmosféricas globais, por outro lado afeta o sistema climático da Terra em vários aspectos: (a) o aumento da temperatura da água do mar e a conseqüente diminuição da solubilidade do CO 2 pelos oceanos; (b) o aumento do nível médio do mar por causa da expansão térmica da água (o gelo marinho, embora importante para os processos de balanço energético à superfície, não afeta o nível médio dos mares); (c) o derretimento da calota polar Ártica, afetada pelo aquecimento do ar e, também, do mar. Séries históricas de temperaturas do ar à superfície indicam que o aumento das temperaturas do ar no Ártico tem sido o dobro da média global (IPCC, 2007). Em decorrência, a taxa de degelo do Ártico, com sucessivos recordes de degelo em 2002, 2005 e 2007 (com a perda de mais de um milhão de quilômetros quadrados de gelo ao final do verão de 2007, relativo ao recorde anterior), tem superado os cenários mais pessimistas do IPCC (por exemplo, cenário A2) ilustrado na Figura 7. 4 Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente - v.3, n.1, Artigo 1, jan./ abril 2008

Assim, em conjunto, a observação da elevada taxa de degelo do Ártico e do aumento das emissões antropogênicas de gases de efeito estufa permite antever a possibilidade de que os cenários de aquecimento global gerados pelo IPCC (Figura 8) possam ocorrer num prazo menor e com magnitude maior do que antecipado. O PAPEL DOS OCEANOS E DAS FLORESTAS Diante desse quadro, as atividades fotossintéticas principalmente das florestas tropicais úmidas representam um fator preponderante para o ciclo de CO 2 atmosférico e para a manutenção da estabilidade climática global. Aumentando a atividade fotossintética com o aumento da disponibilidade de dióxido de carbono (CO 2 ), temperatura e água (até o limite do ponto de estresse hídrico, no qual a planta morre e se torna fonte de CO 2 ), as florestas tropicais funcionam como poderosos resfriadores da baixa troposfera, consumindo quantidades gigantescas de calor no processo de evapotranspiração. Por exemplo, a quantidade de calor envolvida na evapotranspiração pela floresta Amazônica, numa área de 5,5 milhões de quilômetros quadrados, durante um dia equivale à potência gerada pela usina hidroelétrica de Itaipu durante um período de aproximadamente 145 anos! (A. D. Nobre, comunicação pessoal). As árvores não somente participam na diminuição da temperatura atmosférica à superfície, mas atuam também ativamente no processo gerador de chuva, com a emissão de compostos químicos voláteis (ARTAXO et al., 1998). As conexões entre a floresta, a chuva e o clima foram evidenciadas em resultados recentes de pesquisa utilizando o modelo de circulação geral acoplado oceano-atmosfera do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), com cenários de savanização da Amazônia. Tais resultados indicam que a floresta tem um papel importante na manutenção das chuvas sobre a Amazônia, e ao mesmo tempo contribui para modular tanto a intensidade quanto a freqüência do fenômeno El Niño no Pacífico Equatorial e o aquecimento da superfície do mar sobre o Atlântico Tropical (NOBRE et al., 2007). Assim, o resultado combinado da savanização da Amazônia provocada pelo aquecimento global (IPCC, 2007) e da ação antrópica de desmatamento da floresta amazônica por pressões extrativistas e agropecuaristas é a diminuição da pluviometria sobre a Amazônia e o aumento da variabilidade climática sazonal sobre o Brasil, com conseqüências adversas sobre o meio ambiente, a economia e a sociedade. 5 Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente - v.3, n.1, Artigo 1, jan./ abril 2008

MUDANÇAS CLIMÁTICAS & SOCIEDADE Reverter o sinal do atual desmatamento no Brasil (responsável por 75% de todas as emissões brasileiras de gases de efeito estufa) para uma taxa sustentada de reflorestamento com espécies nativas de florestas tropicais úmidas é um desafio cuja grandeza não ficará atrás da construção das Pirâmides do Egito, da Grande Muralha da China, ou do caminhar do homem na Lua... mas que será lembrada com gratidão pelas gerações que seguirão. Na visão do autor deste artigo, não existe fórmula mágica para enfrentar o aquecimento global, que não passe por mudanças paradigmáticas profundas da sociedade, de cada indivíduo. Tais mudanças vão muito além do simples entendimento das interrelações da biosfera-hidrosfera-criosfera-atmosfera e incluem, fundamentalmente, o ser humano na profundidade de suas dimensões psíquica, física e mental, e todas as suas atitudes no confronto da realidade de que o homem faz parte do meio ambiente, com suas responsabilidades inerentes a um ser espiritual. REFERÊNCIAS ARTAXO, P.; FERNANDES, E. T.; MARTINS, M. V.; YAMASOE, M. A.; HOBBS, P. V.; MAENHAUT, W.; LONGO, K. M.; CASTANHO, A. Large-scale aerosol source apportionment in Amazonia. J. Geophys. Research-Atmospheres, v.103, p.31837-31847, 1998. CANADELL, J. G.; QUÉRÉ, C. L.; RAUPACH, M. R.; FIELD, C. B.; BUITENHUIS, E. T.; CIAIS, P.; CONWAY, T. J.; GILLETT, N. P.; HOUGHTON, R. A.; MARLAND, G. Contributions to accelerating atmospheric CO 2 growth from economic activity, carbon intensity, and efficiency of natural sinks. Nat. Acad. Sci. USA, Proc. Nat. Acad. Sci. USA, 10.1073/pnas.070273104, 2007. FEDOROV, A. V.; DEKENS, P. S.; MCCARTHY, M.; RAVELO, A. C.; DEMENOCAL, P. B.; BARREIRO, M.; PACANOWSKI, R. C.; PHILANDER, S. G. The Pliocene Paradox (Mechanisms for a Permanent El Niño). Science, v.312, p.1485-1489, 2006. HANSEN, J.; NAZARENKO, L.; RUEDY, R.; SATO, M.; WILLIS, J.; GENIO, A. D.; KOCH, D.; LACIS, A.; LO, L; MENON, S.; NOVAKOV, T.; PERTWITZ, J.; RUSSELL, G.; 6 Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente - v.3, n.1, Artigo 1, jan./ abril 2008

SCHIMIDT, G. A.; TAUSNEV, N. Earth s energy imbalance: confirmation and implications. Science, v.308, p.1431-1435, 2005. IPCC. Fourth Assessment Report, 2007. NOBRE, P.; MALAGUTTI, M.; GIAROLLA, E.; URBANO, D.; ALMEIDA, R. D. On the effects of the Amazon rainforest on climate in a coupled ocean-atmosphere model. J. Climate, TBS, 2007. Artigo recebido em 07.12.07. Aprovado em 29.01.08. 7 Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente - v.3, n.1, Artigo 1, jan./ abril 2008

Figuras 8 Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente - v.3, n.1, Artigo 1, jan./ abril 2008

9 Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente - v.3, n.1, Artigo 1, jan./ abril 2008

10 Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente - v.3, n.1, Artigo 1, jan./ abril 2008

11 Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente - v.3, n.1, Artigo 1, jan./ abril 2008

12 Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente - v.3, n.1, Artigo 1, jan./ abril 2008

13 Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente - v.3, n.1, Artigo 1, jan./ abril 2008

14 Revista de Gestão Integrada em Saúde do Trabalho e Meio Ambiente - v.3, n.1, Artigo 1, jan./ abril 2008