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Transcrição:

28 Qualidade de energia Capítulo XII Tópicos avançados e desafios futuros associados à QEE Por Paulo Ribeiro, Carlos Duque e Gilson Paulillo* No período compreendido entre 1990 e 2007, o número de contribuições técnicas apresentadas pelos diversos segmentos da sociedade academia, institutos de pesquisa, indústrias, fabricantes de equipamentos, consultorias e empresas de engenharia e órgãos governamentais cresceu quase que linearmente, conforme mostra a Figura 1, sendo que, somente em 2007, mais de 800 artigos técnicos foram publicados sobre o tema Qualidade da Energia Elétrica (QEE). Muitas das questões técnicas foram equacionadas e um relevante progresso tem sido alcançado em alguns temas não totalmente equacionados. Isso mostra que ainda existem muitos temas a serem tratados e muita pesquisa a ser realizada na área, principalmente com a inserção de novas tecnologias em equipamentos e suas aplicações em sistemas elétricos de potência. Neste contexto, este artigo introduz alguns dos desafios futuros na área de QEE até o presente momento, o que inclui aspectos relacionados às novas fontes de geração de energia elétrica, equipamentos com front end ativos, links HVDC, a necessidade de métodos de análise automática de grande volume de dados de medição, dentre outros aspectos. Assim este artigo indica algumas potenciais direções para o futuro da pesquisa em QEE. Diferentes tipos de distúrbios Existem diferentes formas de se definir um problema ou distúrbio associado à QEE. Para tanto, deve-se lembrar da definição de QEE: Qualquer desvio que possa ocorrer na magnitude, forma de onda ou frequência da tensão e/ou corrente elétrica, que resulte em falha ou operação indevida Figura 1 Número de artigos publicados, por ano, com o termo Power Quality no título, resumo ou palavras-chave Fonte: Banco de dados INSPEC.

29 de equipamentos elétricos. Outras definições importantes, como as normas IEEE 1100 e IEC 61000-1-1, relacionam este conceito com o nível de compatibilidade e de interferência entre o funcionamento satisfatório de um equipamento ou sistema com os distúrbios e interferências intoleráveis que provocam o seu mau funcionamento. Estes níveis de interferência referem-se à falha ou danos no equipamento e que provocam a redução de sua vida útil ou má operação e limitações nas funcionalidades do equipamento e que estão diretamente relacionadas à inadequada qualidade da energia elétrica. Como exemplo, uma variação de tensão de curta duração afundamento de tensão é um distúrbio que pode ou não resultar em uma interferência na operação de um equipamento elétrico, bem como provocar ou não uma parada de produção de um processo continuo ao qual este mesmo equipamento é utilizado. Um aspecto importante associado a esta questão são os estudos relacionados aos impactos econômicos associados à qualidade da energia elétrica, o qual tem sido objeto de estudos por diversos grupos de trabalho e de discussão internacionais, como o JWG CIGRE CIRED C4.107 Economic Framewok for Voltage Quality. Partindo das características técnicas intrínsecas a cada um dos fenômenos associados à QEE, o trabalho avalia o impacto econômico sob o ponto de vista dos diversos agentes e propõe uma metodologia de avaliação econômica para ponderar os custos para a indústria e as concessionárias associadas a um fenômeno de QEE não mitigado, bem como dos custos para a prevenção e mitigação deste mesmo fenômeno. O entendimento das diferentes tipos de distúrbios de QEE é fundamental para proporcionar um bom entendimento dos impactos associados, o que tem sido objeto de diversas normas e recomendações relacionadas ao tema QEE. Contudo, pesquisas devem ser contínuas no sentido de ampliar o entendimento de cada um dos diversos fenômenos e seus diversos aspectos e aprimorar estas referências normativas. Podem ser considerados os seguintes exemplos: Normas relacionadas a harmônicos cobrem uma faixa de frequência típica de 2 khz a 2.4 khz. Contudo, existem estudos que apontam que esta faixa deve ser ampliada para avaliar o impacto de harmônicos de ordens elevadas; A distorção de forma de onda é quantificada por de um espectro que envolve uma janela de até 200 ms, o que não deve limitar novas pesquisas no sentido de desenvolver e ampliar métodos alternativos com elevadas resolução de tempo, o que será muito útil no estudos de interharmônicos individuais, o que seguramente é um objeto de estudos avançados; A quantificação da cintilação luminosa deve considerar as

30 Qualidade de energia novas tecnologias de iluminação e os novos tipos de lâmpadas, o que indica a necessidade de novos conceitos associados a essa quantificação. Um exemplo de como este aprimoramento deve ser contínuo pode ser tomado a partir do risco de sobrecarga de um transformador de distribuição, o qual é impactado pelas potências ativa e reativa, pela corrente desequilibrada e seu conteúdo harmônico, pelos transitórios de chaveamento das cargas, dentre outros aspectos. O desafio, neste caso, é combinar todos os tipos de distúrbios de uma forma que resulte em indicadores que estimem a perda de vida ou o risco de sobrecarga devido às características da corrente de carga. Novos tipos de geração A penetração de novas fontes de geração nos sistemas de distribuição e transmissão é uma realidade nos dias atuais no Brasil e em diversas partes do mundo. As vantagens e desvantagens associadas a estes desenvolvimentos têm sido apontadas e discutidas em diversos fóruns de discussão. Todavia, existem muitos desafios associados a este desenvolvimento no âmbito da QEE. Indicadores de desempenho Um dos primeiros desafios está associado à conexão da geração em baixa e média tensão, o que tem muita similaridade com as conexões utilizadas em plantas industriais. Isso implica que o nível de QEE no ponto de conexão deve ser adequado para a conexão da geração distribuída. O termo "capacidade de hospedagem" recentemente desenvolvido no âmbito de um projeto de investigação europeu combina indicadores de desempenho adequados com um limite de suprimento que resulta em desempenho aceitável do sistema. O principal desafio é definir este conjunto de indicadores e limites que cobrem todas os parâmetros elétricos de qualidade do suprimento de energia. Variações na magnitude de tensão As variações na magnitude da tensão em redes de distribuição têm impacto significativo na geração distribuição. A injeção de potência ativa resultará em sobretensões consideradas aceitáveis, conforme mostra a Figura 2. Nesta, a introdução da geração em um alimentador de distribuição eleva o nível de tensão. Por sua vez, isso demanda a adoção de um controle de tensão mais complexo na rede de distribuição devido ao inesperado impacto que estas sobretensões podem acarretar nos equipamentos. Além disso, a geração distribuída pode ocasionar transitórios, aumento do nível de curto-circuito e demandará ajustes na proteção do circuito. Para evitar transtornos, devem-se equilibrar os limites de sobretensões e demais parâmetros de desempenho com os riscos nos inerentes nas cargas. Isso inclui considerar os equipamentos de baixa tensão utilizados em residências e no comércio em geral, tais como TVs, computadores, lâmpadas e refrigeradores, etc., os quais muitas vezes não são considerados nos estudos associados à QEE. Outro aspecto importante trata das variações na magnitude da tensão ao longo do tempo, que podem ocorrer desde um segundo a 10 minutos ou varações ainda maiores. Isso ocorre em fontes de geração que sofrem influência climática, como a geração solar e a fotovoltaica. Nestes casos, o desafio consiste em desenvolver modelos estocásticos da potência a ser gerada, incluindo a correlação com diferentes escalas de tempo e entre os geradores instalados em diferentes locais. Emissões harmônicas e ressonâncias A emissão de harmônicos devido à integração de fontes renováveis depende da interface com a rede. Quando máquinas rotativas (indução ou síncronas) são utilizadas, o nível de emissão é geralmente pequeno. Essa situação se modifica quando são utilizadas interfaces baseadas em eletrônica de potência. Como exemplo, alguns conversores de baixo custo Figura 2 Perfil de tensão de um sistema de distribuição com geração distribuída (GD).

32 Qualidade de energia utilizados na conexão de painéis solares injetam um elevado nível de harmônicos de baixa ordem na rede elétrica. Ademais, a introdução da GD está associada à introdução de capacitâncias à rede. Como exemplos podemos citar os filtros de interferência eletromagnética de painéis solares, os capacitores para correção do fator de potência para os geradores de indução e a rede de conexão de parques eólicos os sistema de transmissão. Esta capacitância adicional pode adicionar frequências de ressonância e alterar as ressonâncias dominantes em baixa frequência. Em redes de baixa tensão, frequências de ressonância abaixo do 10º harmônico não são comuns, porém, análises devem ser conduzidas para eliminar qualquer dúvida. No caso de redes de transmissão, frequências de ressonância de baixa ordem podem ocorrer no futuro. Como exemplo, uma frequência de ressonância de 140 khz foi encontrada na conexão de um parque eólico marítimo a uma rede de 150 kv. Vale destacar que as principais emissões devido às novas fontes de geração ocorrerão em frequência acima das quais são normalmente consideradas, tendo como origem, por exemplo, os conversores baseados em eletrônica de potência usados em turbinas eólicas, painéis solares e microturbinas, que utilizam elementos de chaveamento como transistores, IGBTs e GTOs. Análise automática de registros de distúrbios A disponibilização de um grande volume de dados de medições torna impossível que a análise e a manipulação dos mesmos ocorra de forma manual. Logo, métodos que possam automatizar e extrair informações úteis e necessárias para a análise de distúrbios e ocorrências associadas à QEE são necessárias para a gestão e a definição de soluções. Um primeiro nível de extração da informação já está disponibilizado e implantado na maioria dos monitores de QEE disponíveis no mercado. Estes tratam da classificação do evento (transitório, afundamento de tensão, interrupção, etc.) e do cálculo das características padrão intrínsecas a cada evento associado (magnitude, duração, etc.) e suas variações (THD, rms, etc.). Além disso, devem-se aprofundar estudos de forma a proporcionar a extração automática de informação associada a um grande volume de dados. Como exemplo, a definição e a extração automática de características pode proporcionar informações adicionais sobre a origem dos eventos. O método de segmentação introduzido em Expert system for classification and analysis of power system events (ver referências) mostrou ser uma base adequada para a análise automática de interrupções e afundamentos de tensão. Embora o método possa ser aprimorado, um grande desafio futuro é o desenvolvimento de métodos similares para análise de dados de transitório de tensão e corrente. Esta situação é mostrada na Figura 3. Figura 3 Exemplo de segmentação de evento aplicado a uma forma de onda de tensão. Neste exemplo, a segmentação resultou em um intervalo de tempo de 4.8 a 25 ciclos, consistindo de quatro segmentos de transição (marcados em amarelo) e três segmentos de eventos entre cada um dos segmentos de transição. Nestes casos, o segmento anterior ao primeiro segmento de transição (segmento pré-evento ) e o segmento posterior ao último segmento de transição (segmento pósevento ) são relacionados aos estados normais. Este método resulta em diversas características associadas à QEE e é apenas um primeiro passo para uma análise automática de um grande volume de dados associados a afundamentos de tensão e interrupções. Os próximos passos incluem a associação de métodos automáticos de classificação, os quais podem ser um sistema especialista, uma rede neural ou um método de processamento avançado de sinais, juntamente com a aplicação de métodos estatísticos. Distúrbios de alta frequência A introdução de equipamentos com front end ativos resulta na injeção de novos componentes de frequência no sistema elétrico. Um exemplo é mostrado na Figura 4, em que a parte superior mostra a corrente medida nos terminais de uma lâmpada fluorescente compacta. A forma de onda é senoidal e a distorção harmônica é claramente inferior em comparação com os tipos mais comuns desta lâmpada. Apesar da ausência de harmônicos de baixa ordem (3, 5 e 7), esta carga apresenta distorções em frequências de alta ordem, conforme mostra a parte inferior da Figura 4. Neste, observam-se oscilações em alta frequência e com diversas amplitudes.

33 mas outros métodos de processamento de sinais avançados podem ser aplicados para extrair mais informação. Figura 4 Medições de corrente em uma lâmpada fluorescente compacta. A fim de descrever os níveis de emissão destes equipamentos e estudar o impacto de sua disseminação no sistema elétrico é fundamental a adoção de novas ferramentas de análise. O espectograma, desenvolvido para analisar estes sinais, têm se mostrado uma ferramenta útil. Um exemplo de espectograma é mostrado na Figura 5, resultante da aplicação de um filtro passa alta sobre uma janela de 20 ms. Este espectograma foi resultante da utilização da transformada discreta de Fourier, Figura 5 Espectograma da corrente de uma lâmpada fluorescente compacta. Vale destacar que outros equipamentos provocam emissões nestas faixas de frequência, tais como turbinas eólicas, painéis solares, microturbinas, conversores de fonte de tensão para HVDC e outros dispositivos FACTS. O crescimento da penetração deste tipo de equipamento no sistema elétrico

34 Qualidade de energia demandará novos estudos para avaliar estas emissões em frequências superiores a 2 khz. Harmônicos variantes no tempo O conceito associado a harmônicos os associa a condições periódicas e de regime permanente. A técnica mais comum para análise harmônica aplica a Transformada Rápida de Fourier (FFT), em geral implementada computacionalmente de forma eficaz por meio da Transformada Discreta de Fourier (DFT). Este algoritmo apresenta resultados satisfatórios nas seguintes condições: sinal estacionário; frequência de amostragem duas vezes maior que a frequência do sinal; número de períodos de amostragem inteiros; e a forma de onda não contém frequências que não sejam múltiplas inteiras da frequência fundamental. Caso as condições mencionadas sejam atendidas, a FFT fornece resultados com boa exatidão, sendo, neste caso, necessária apenas uma amostragem do sinal. Por outro lado, caso estejam presentes interharmônicos, múltiplos períodos devem ser amostrados a fim de se obter magnitudes harmônicas precisas. No entanto, em condições reais, os níveis de distorção de tensão e corrente, bem como suas componentes fundamentais, estão constantemente variando no tempo. As variações no tempo dos harmônicos individuais são, nesse caso, analisadas por meio das transformações de Fourier de curto período (em janelas de tempo) e cada espectro harmônico corresponde a cada janela de tempo aplicada em um sinal contínuo. Mas, devidos aos existentes em cada menor janela de tempo possível, diferentes tamanhos de janela resultam em diferentes espectros harmônicos e a seleção da menor janela de tempo mais adequada é uma questão complexa que ainda carece de discussões e consenso. Muitas abordagens vêm sendo propostas nos últimos anos para equacionar esta questão e melhorar a exatidão das magnitudes dos harmônicos em condições variáveis no tempo. Isso incluem os analisadores baseados em filtros de Kalman, filtros adaptativos e PLL, uma combinação usando redes neurais adaptativas e uma abordagem por decomposição de bancos de filtragem. Cada um dos métodos possuem vantagens e desvantagens e a busca pelo melhor método continua com uma das mais ativas e promissoras áreas no âmbito do processamento de sinais. Como ilustração, considere uma corrente de energização típica de um transformador, mostrada na Figura 6. A Figura 7 apresenta a decomposição harmônica variando no tempo de alguns harmônicos utilizando um método de composição por bancos de filtros. Este método de analise pode levar ao desenvolvimento de uma nova filosofia para proteção e controle de redes elétricas. Figura 6 Corrente de inrush Fase A. Figura 7 Decomposição da corrente de inrush. Processamento de sinais e qualidade da energia Conforme mencionado anteriormente, os requisitos de análise de desempenho da rede elétrica no tocante aos aspectos relacionados à QEE são viabilizados pela utilização de métodos e técnicas de processamento de sinais, especialmente o processamento de grande quantidade de dados gerada por meio das redes elétricas inteligentes, ao qual deverão ser aplicadas técnicas de processamento de dados em larga escala (Big Data). Estas serão utilizadas para explorar todas as condições proporcionadas pela complexa interação entre as fontes de suprimento, consumidores e operadores das redes. Neste ambiente de interação entre múltiplos agentes, os sinais resultantes são complexos e devem ser monitorados e processados a fim de se determinar o estado e os desenvolvimentos dos dispositivos e sistemas, conforme mostra a Figura 8.

36 Figura 8 Sinais, tecnologias e interações da REI e a qualidade da energia elétrica. Figura 9 Conceito básico dos sinais e parâmetros que podem ser processados e derivados para a QEE no âmbito das REIs.

37 Por meio da medição e da análise dos sinais em diferentes pontos, o estado da rede pode ser avaliado. Este conceito é mostrado na Figura 9, que mostra como os sinais e os parâmetros de avaliação podem ser processados em etapas sucessivas. O resultado proporcionará ao engenheiro visualizar a natureza das condições variantes no tempo das REIs no tocante aos diferentes aspectos da QEE. Conclusões Este trabalho apresentou as principais tendências e desafios em termos de áreas de interesse e de pesquisa na área de QEE para os próximos anos. Devido ao impacto técnico e econômico associado, a área de QEE continuará sendo foco de grande interesse por parte de todos os agentes do setor elétrico concessionárias, consumidores, fabricantes de equipamentos e órgãos reguladores. Para tanto, contribui fortemente a proliferação de novas fontes de energia na rede, estimulada pelo crescimento da geração distribuída, a intensificação do uso da eletrônica de potência em conjunto com novas tecnologias, principalmente as abordagens que demandam grande frequência de chaveamento, a adoção de dispositivos FACTS, os novos investimentos em HVDC, a ampliação dos investimentos em redes elétricas inteligentes, dentre outros aspectos. Este contexto caracteriza um ambiente complexo para as redes de transmissão e distribuição e proporciona novos desafios para estudos e pesquisas no contexto da Qualidade da Energia Elétrica. Referências BOLLEN, M. H. J.; GU, I. Y. H. Signal processing of powerquality disturbances. Wiley IEEE Press, 2006. ARRILLAGA, J., Watson, N. R. Power system harmonics. Wiley. 2nd Edition. Chichester, 2003. PAULILLO, G. et. al. Conceitos associados a QEE. Revista O Setor Elétrico, jan. 2013. 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Sua atuação é voltada para áreas de qualidade de energia elétrica, geração distribuída, eficiência energética e distribuição. Paulo F. Ribeiro é engenheiro, pesquisador e professor de engenharia com experiência nos Estados Unidos, Europa e Brasil, nas áreas de eletrônica de potência, qualidade de energia, redes inteligentes e processamento de sinais em sistemas de potência. Atualmente, é professor na Universidade de Eindhoven na Holanda e registrado com Engenheiro Profissional (PE) no estado de Iowa, USA. É membro do IEEE e do IET. Carlos A. Duque possui graduação pela Universidade Federal de Juiz de Fora (1986), mestrado e doutorado em Engenharia Elétrica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e Pós-doutorado pela Florida State University, FL USA. Atualmente é Professor Associado da Universidade Federal de Juiz de Fora. Fim Acesse todos os capítulos deste fascículo em www.osetoreletrico.com.br.