Composição centesimal de grãos de duas cultivares de soja hortaliça submetidos a diferentes tempos de branqueamento Daniela Xenofonte Pereira Valle¹; Rafaella Eustáquia Monteiro Pereira¹; Simone Cristina de Oliveira¹; Sueli Ciabotti²; Hamilton César de Oliveira Charlo² ¹Graduanda em Engenharia Agronômica do IFTM - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Triângulo Mineiro- Campus Uberaba, Rua João Batista Ribeiro n. 4000 Mercês 38064-790 Uberaba - MG. danielaxenofonte@hotmail.com, rafaella_e.monteiro@hotmail.com, sueliciabotti@iftm.edu.br, simoninha7@hotmail.com. ²Professor Doutor do IFTM Instituto Federal de Educação, Ciêcncia e Tecnologia do Triângulo Mineiro Campus Uberaba, Rua João Batista Ribeiro n. 4000 Mercês 38064-790 Uberaba - MG. hamiltoncharlo@iftm.edu.br. RESUMO O trabalho teve por objetivo avaliar a composição centesimal de soja hortaliça [Glycine max (L.) Merrill] submetida a diferentes tempos de branqueamento. Foram utilizadas as cultivares BRSMG 790A e BRSMG 800A, oriundas do programa de melhoramento genético desenvolvido pela parceria Embrapa, EPAMIG e Fundação Triângulo. Os grãos de ambas as cultivares foram submetidas á água fervente (3 e 5 minutos) e analisadas no decorrer de 90 dias (0, 30, 60 e 90 dias). Os valores médios da composição centesimal foram significativos apenas entre as duas cultivares, com exceção da proteína que diferiu também entre os tratamentos térmicos. Embora tenha ocorrido diferenças entre alguns teores, ambas as cultivares possuem características favoráveis para fins de utilização na alimentação humana ou para processamento pela indústria alimentícia. Palavras- chave: Glycine max (L.) Merril, edamame, proteínas, lipídios, cinzas, carboidratos ABSTRACT Centesimal composition of grains of two early-cycle soybeans cultivars submmitted to different types of blanching This research aimed the assessment of centesimal composition of early-cycle soybean [Glycine max (L.) Merrill] submitted to different types of blanching. Cultivars BRSMG 790A and BRSMG 800A from the genetic improvement program developed in partnership with Embrapa, EPAMIG and Fundação Triângulo were used in the experiment. Both cultivars grains underwent boiling water (3 to 5 minutes) and analysed during 90 days (0, 30, 60 and 90 days). The average centesimal composition values were significant only between the two cultivars, except for the protein that also differed between the termic treatments. Although some differences have also occurred among some teores, both cultivars possess favorable features for human consumption or for food processing. Key-words: Glycine max (L.) Merril, edamame, proteins, lipids, ashes, carbohydrates Constitui a chamada soja verde, hortaliça ou tipo vegetal ou edamame, as vagens de soja colhidas com os grãos totalmente desenvolvidos, mas ainda verdes (estádio R6). A Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 263
soja para este tipo de consumo deve apresentar grãos de tamanho grande e sabor mais adocicado que no estádio R8. Nos grandes centros brasileiros, o consumo da soja-hortaliça tem recebido atenção pública considerável (Embrapa soja, 2004), principalmente no estado paulista, onde várias marcas vêm sendo comercializadas, em pacotes congelados. Do ponto de vista nutricional, a soja representa um alimento que contém componentes essenciais para a alimentação humana, constituindo-se em excelente fonte de proteína. A soja-verde, soja-hortaliça ou edamame pode ter boa aceitabilidade e se constituir num hábito saudável, é rica em proteínas (13%), contêm reduzido teor de óleo (5,7%), não contêm colesterol e gordura hidrogenada e apresenta teores razoáveis de minerais, fósforo, cálcio e vitamina B1 e B2 (Shanmugasundaram & Yan, 2004). O programa de melhoramento genético da soja desenvolvido pela parceria Embrapa/EPAMIG/Fundação Triângulo vem desenvolvendo cultivares de soja com características especiais para alimentação humana, que objetivam também a introdução da soja verde ou tipo hortaliça na dieta do brasileiro. Estes produtos, por sua vez, sofrem restrições de consumo pela população em consequência do sabor característico desagradável atribuído à ação das lipoxigenases em alguns ácidos graxos poliinsaturados (AXEROLD et al., 1981; DAVIES & NIELSEN, 1986). Nelson et al. (1979) propuseram o processo de branqueamento (ou tratamento térmico) dos grãos, visando a inativação dessas lipoxigenases, que pode proporcionar mudanças no seu teor de nutrientes e, consequentemente, na sua qualidade nutricional (CIABOTTI, et al. 2006) Portanto, este trabalho teve como objetivo avaliar parâmetros físico-químicos dos teores de umidade, lipídeos, proteínas e fibra bruta dos grãos de soja verde submetidos a dois tempos de branqueamento. MATERIAL E MÉTODOS Foram utilizados grãos verdes de duas cultivares de soja desenvolvidas especialmente para a alimentação humana. A cultivar BRSMG 790A que possui grãos de tegumento amarelo e BRSMG 800A de tegumento marrom, quando maduros. Essas cultivares são provenientes do programa de melhoramento genético da parceria Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 264
Epamig/Embrapa/Fundação Triângulo, cultivadas na região de Uberaba MG. As vagens foram colhidas no estádio R6, na safra 2010/2011. Os grãos de ambas as cultivares foram submetidas ao branqueamento, utilizando água fervente durante 3 e 5 minutos e, em seguida, foram resfriadas. Depois, os grãos foram submetidos ás analises de composição centesimal no decorrer de 90 dias (30, 60 e 90 dias). A umidade foi determinada pelo método gravimétrico conforme AOAC (1990) com emprego de calor, baseando-se na perda de peso do material submetido ao aquecimento a 105º C, até peso constante. O valor de proteína bruta foi obtido pelo método de Kjeldahl por meio da determinação do nitrogênio do grão verde, multiplicando-se pelo fator 6,25, seguindo a metodologia descrita pela AOAC (1990). Para determinação do extrato etéreo foi utilizado o método de Soxhlet gravimétrico (AOAC, 1990), baseando-se na quantidade do material solubilizado pelo solvente. O resíduo mineral fixo (cinzas) foi determinado pela calcinação da amostra em mufla a 550 C, até a obtenção de cinzas claras. A fração glicídica foi obtida por diferença do somatório de umidade, lipídeo, proteínas, fibras e cinzas. Segundo a equação a seguir: Extrato não nitrogenado = 100 - (umidade + proteína + cinzas + lipídeos). Foi utilizado o delineamento experimental inteiramente casualizado (DIC), em esquema fatorial 2x2, sendo duas cultivares e dois tempos de tratamento térmico. A análise de variância e o teste de médias foram realizados segundo técnicas usuais do software Sisvar (FERREIRA, 2008). RESULTADOS E DISCUSSÃO Houve diferença significativa entre as cultivares, BRSMG 790A e BRSMG 800A, submetidos a diferentes tempos de tratamento térmico (Tabela 1). As cultivares diferiram significativamente quanto ao teor de umidade. Os valores encontrados estão próximos aos obtidos por Smiderle et al. (2007). Estes autores obtiveram variação de 57,1 a 64,5% no teor de umidade de 10 genótipos de soja hortaliça cultivadas no estado de Roraima. Callegari et al. (2011) encontrou 61,17% de média de umidade da mesma soja verde deste estudo, a cultivar BRSMG 790A, em uma Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 265
avaliação da composição centesimal e fatores antinutricionais de genótipos de soja em diferentes estádios de maturação. Este valor é menor do que o obtido para esta cultivar, apesar de próximo. Segundo Ciabotti et al. (2006), o processo de branqueamento pode solubilizar proteínas e consequentemente aumentar o teor de água do grão, o que provavelmente explica a diferença de umidade nos grãos desta cultivar. Por outro lado, vários fatores podem influenciar no teor de umidade desta leguminosa de maneira geral, tais como a porcentagem deste constituinte na operação de colheita, o constante processo de troca de umidade com o ar circundante (Ahrens & Peske, 1994), fatores climáticos, época de colheita, entre outros. Não houve diferença significativa em relação ao tempo de branqueamento para as duas cultivares, quanto ao teor de umidade. O teor protéico foi significativo entre as cultivares e nos tempos de tratamento térmico. A média do teor de proteínas aos três minutos foi maior que aos cinco minutos, para as duas cultivares estudadas. Segundo Ciabotti et al. (2006), esta diferença pode ser explicada pela reação dos derivados da oxidação dos ácidos graxos pela lipoxigenase, reações que criam ligações com proteínas, deixando estas mais desnaturadas, menos solúveis e menos expostas ao processo de lixiviação, durante o processo do branqueamento. Os valores médios dos tratamentos obtidos para a cultivar BRSMG 790A foram superiores ao encontrado por Callegari et al. (2011), que foi de 15,29% para a mesma cultivar porém, não submetida ao branqueamento. Santana et al. (2008) relataram teores de 16,65% a 17,04% de proteína em soja verde colhida em diferentes horas do dia. Já Shanmugasundaram & Yan (2004) encontraram 13% de proteína em soja verde. Segundo Chiba & Konovsky et al. (1994), vários fatores podem interferir nos resultados do teor de proteína de diferentes tipos de soja, tais como genótipos, fertilidade do solo, umidade, exposição solar e suplementação de fertilizantes. Ao comparar a soja verde e ervilha, Masuda (1991) observou que os valores médios de proteína foram de 13,4 % e 7,3 %. Diante destes resultados, pode-se afirmar que o uso da soja tipo hortaliça como fonte protéica é bastante superior ao da ervilha e o seu consumo podem aumentar o aporte nutricional. Houve diferença para os valores de lipídeos entre as cultivares, entretanto não houve diferença significativa entre os tempos de branqueamento (Tabela 1). A BRSMG 800A expressou maior teor lipídico do que a cultivar BRSMG 790A. Para esta cultivar, Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 266
Callegari et al. (2006) encontraram valor médio de lipídeos de 6,03%, quando não submetida ao tratamento térmico, valor próximo ao obtido neste trabalho, podendo-se então, inferir que o tratamento não interferiu no teor de lipídeos. Os resultados encontrados, de modo geral, foram inferiores aos encontrados por Santana et al. (2008), que analisando a soja verde colhida em diferentes horários do dia, encontraram valores entre 8,19% a 9,03%. Shanmugasundaram & Yan (2004) afirmaram que a soja verde contém reduzido teor de óleo, em torno de 5,7%, o que também, de fato, foi maior que ao observado neste estudo. Os distintos teores de lipídeos encontrados é explicado por Hamawaki (1998), que atribuiu essa diferença ao local, ás condições de cultivo e principalmente aos diferentes genótipos. No presente trabalho, o teor de cinzas obtido apresentou diferença significativa apenas entre os genótipos (p<0,05). A cultivar BRSMG 800A apresentou maiores valores de cinzas (Tabela 1), nos tempos de branqueamento 3 e 5 minutos. O aumento da concentração de cinza em relação á outra cultivar pode ser explicado pelos valores de umidade, que também foi superior na BRSMG 800A. Os teores de cinzas, em ambos tratamentos térmicos, da cultivar BRSMG 790A, foram inferiores ao encontrado por Callegari et al. (2011) para a mesma cultivar sem a exposição ao processo térmico, sendo este de 1,95%. Segundo Ciabotti et al. (2006), o processo de branqueamento pode promover a migração de sais, pois a exposição ao calor úmido pode expor os minerais e outros componentes químicos á perdas, ocorrendo portanto, a componentes químicos para água do branqueamento. migração destes As cinzas em alimentos se referem ao resíduo inorgânico remanescente da queima da matéria orgânica, sem resíduo de carvão. Basicamente, representam os minerais, sejam eles microminerais ou macrominerais, que desempenham inúmeras funções corporais. O teor de carboidrato foi significativamente diferente entre as duas cultivares de soja verde. Estes resultados foram inferiores aos de Santana et al. (2008), que obtiveram teores de 13,66 a 17,98% de carboidratos em soja colhida em diferentes horários do dia. Callegari et al. (2011) obteve teor médio de carboidratos para a cultivar BRSMG 790A de 15,49%, valor este, superior ao encontrado neste estudo para a mesma cultivar em ambos os tratamentos térmicos. Vale salientar a importância dos carboidratos na soja Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 267
tipo hortaliça, pois este componente é responsável por caracterizar o sabor mais suave e adocicado dos grãos (BOURGES et al., 1981; KONOVSKY et al., 1994). Os valores médios da composição centesimal foram significativos entre as duas cultivares, com exceção da proteína que diferiu também quanto ao tratamento térmico. Embora tenha ocorrido diferenças entre alguns teores, ambas as cultivares possuem características favoráveis para fins de utilização na alimentação humana ou para processamento pela indústria alimentícia. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AHRENS, DC; PESKE, ST. 1994. Flutuações de umidade e qualidade em semente de soja após a maturação fisiológica: avaliação do teor de água. Revista Brasileira de Sementes 16: 107-110p. AXEROLD, B; CHEESEBROUGH, TM.; LAAKSSO, S. 1981. Lipoxygenase from soybeans. Methods Enzymology 71: 441-451p. BOURGES, H; CAMACHO, JL; BANAFUNZI, N. 1981. Composition and nutritive value of green soybeans of the BM2 variety. Journal of the American Oil Chemists Society 58: 371-372p. CALLEGARI, FL; CIABOTTI, S; SÁ, EL de; GARCIA, D de F; PEREIRA, REM; SANTOS, ARRS. 2011. Avaliação da composição centesimal e fatores antinutricionais de genótipos de soja nos estádios de maturação R6 e R8. Enciclopédia Biosfera, Centro Científico Conhecer Goiânia: 1-13p. CIABOTTI, S; BARCELLOS, MFP; MANDARINO, JMG; TARONE, AG. 2006. Avaliações químicas e bioquímicas dos grãos, extratos e tofus de soja comum e de soja livre de lipoxigenase. Ciênc. Agrotec. 30 : 920-929p. CHIBA, Y. 1991. Postharvest processing, marketing and quality degradation of vegetable soybean in Japan. Vegetable soybean: research needs for production and quality improvement: 108-112p. DAVIES, CS.; NIELSEN, NC. 1986. Genetic analysis of a nullallele for lipoxygenase: 2 in soybeans. Crop Science 26 : 460-436p. EMBRAPA SOJA. 2004. Soja na alimentação. Disponível em: <http:www.cnpso.embrapa.br/soja_alimentação/index.php>. Acessado em 01 de maio de 2012. FERREIRA, DF. 2008. SISVAR: um programa para análises e ensino de estatística. Revista Symposium 6: 36-4p. HAMAWAKI, OT. 1998. Potencial de progênies selecionadas emcruzamentos óctuplos de soja com ênfase na produtividade de óleo. Piracicaba: USP - ESALQ. 124p (Tese Doutorado). Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 268
KONOVSKY, J.; LUMPKIN, TA.; McCLARY, D. 1994. Edamame: the vegetable soybean. Understanding the Japanese food and greenmarket: a multifaceted opportunity. Haworth Press: 173-18p. MASUDA, R. 1991. Quality requirement and improvement of vegetable soybean. Vegetable soybean: research needs for production and quality improvement: 92-102p. NELSON, AI; WEI, SL.; STEINBERG, MP. 1979. Foods from whole soybeans. In: WORD SOYBEAN RESEARCH CONFERENCE, 2. Anais... Corbinn. p. 745-761. SANTANA, AC; OLIVEIRA, GAB de.; CARRÃOPANIZZI,MC; MANDARINO, JMG. 2008. Composição Centesimal e Teor de Isoflavonas da Soja Verde Colhida em diferentes horas do dia. III Jornada acadêmica, Embrapa Soja, resumos expandidos. SHANMUGASUNDARAM, S; YAN, MR. 2004. Global expansion of high value vegetable soybean. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE SOJA, 3. Anais... Foz do Iguaçu. p. 915-920. SMIDERLE, OJ. 2007. Soja verde para alimentação humana - alternativa para agricultura familiar. Disponível em: <http://www.infobibos.com/artigos/2007_2/sojaverde/index.htm>. Acessado em 1 de maio de 2012. Tabela 1. Valores* médios da composição centesimal de cultivares de soja hortaliça submetidos a tratamento térmico por 3 e 5 minutos. (Average values of the centesimal composition of early-cycle soybean cultivars submitted to heat treatment for 3 to 5 minutes.) Composição Centesimal (%) Umidade Proteína Lipídeos Cinzas ENN Cultivar 3' 5' 3' 5' 3' 5' 3' 5' 3' 5' BRSMG 790 A 61,27 ba 61,33 ba 16,19 ba 16,02 bb 6,04 ba 6,02 ba 1,63 ba 1,74 ba 14,9 aa 14,9 aa BRSMG 800 A 62,88 aa 62,89 aa 17,21 aa 17,02 ab 6,42 aa 6,34 aa 1,96 aa 2,10 aa 11,53 ba 11,65 ba CV% 0,52 2,29 4,77 6,65 1,15 Médias seguidas de letras minúsculas distintas nas colunas diferem pelo teste de Scott-knott a 5% de probabilidade. (Averages followed by different lower case letters in the column differ according to Scott-Knott test 5% probability level.) Médias seguidas de letras maiúsculas distintas nas linhas diferem pelo teste de Scott-knott, a 5% de probabilidade. (Averages followed by different capital letters in the lines differ according to Scott-knott test 5% probability level) ENN = Extrato não nitrogenado ou carboidratos. (ENN = extract non nitrogenated or carbohydrates) *Dados expressos em matéria integral. (Data expressed in integral material) Hortic. bras., v. 30, n. 2, (Suplemento - CD Rom), julho 2012 S 269