AVALIAÇÃO DA OPERAÇÃO EM REGIMES HIDRÁULICOS PERMANENTE E TRANSIENTE DE UM SISTEMA DE APLICAÇÃO SUPERFICIAL DE ESGOTOS NO SOLO PARA O PÓS- TRATAMENTO DE EFLUENTES DE REATORES UASB Gustavo Curi Araújo (1) Engenheiro Civil pela UFMG (19), Mestre em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos pela UFMG. Raquel da Silveira Cota Engenheira Civil e Sanitarista pela UFMG (19). Mestranda em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos pela UFMG. Carlos Augusto de Lemos Chernicharo Engenheiro Civil e Sanitarista, Doutor em Engenharia Ambiental pela Universidade de Newcastle upon Tyne UK. Professor Adjunto do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG. Marcos Von Sperling Engenheiro Civil e Sanitarista. Doutor em Engenharia Ambiental pelo Imperial College - UK. Professor Adjunto do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG. Endereço (1) : Rua Equador, 264/63 - Bairro Sion - Belo Horizonte - MG - CEP: 333-39 - Brasil - Tel: (31) 238-12 - Fax: (31) 238-1879 - e-mail: calemos@desa.ufmg.br RESUMO O presente trabalho aborda a investigação de um sistema de aplicação de esgotos no solo por escoamento superficial, aplicado ao pós-tratamento de efluentes de um reator UASB. O sistema era constituído de um reator anaeróbio de manta de lodo (reator UASB) com volume de 477m 3, tratando os esgotos brutos do bairro Nova Vista, na cidade de Itabira- MG. Uma pequena parcela do efluente do reator era encaminhada a um conjunto de três rampas de escoamento superficial no solo, em escala de demonstração, que foram operadas com diferentes taxas de aplicação linear:,6,,4 e,2 m 3 /m.h. De uma maneira geral, o sistema de escoamento superficial no solo funcionou de forma bastante promissora como pós-tratamento de efluentes de reatores UASB, principalmente em função das baixas concentrações de sólidos e de matéria orgânica no efluente final. Com relação à concentração final de nutrientes, pode-se considerar que o sistema também alcançou níveis de eficiência satisfatórios. Foram observadas eficiências médias de remoção complementar de matéria orgânica (DQO e DBO) variando de 48 a 53%, conferindo ao efluente final concentrações médias variando de 48 a 52 mg/l para DBO, 98 a 13 mg/l para DQO e 17 a 21 mg/l para SST. Com base na experiência obtida por meio deste estudo, conclui-se que o sistema de aplicação de esgotos no solo, funcionando como pós-tratamento de reatores UASB, pode trabalhar com taxas de aplicação menos conservadoras, da ordem de,4 a,5 m³/m.h. PALAVRAS-CHAVE: Reator UASB, Pós-tratamento, Disposição no Solo, Escoamento Superficial. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 278
INTRODUÇÃO O crescimento e desenvolvimento da tecnologia de tratamento de esgotos por via anaeróbia abriu novos caminhos para a área de tratamento de esgotos em nosso país. São várias as características favoráveis à aplicação do tratamento anaeróbio dos esgotos, entre elas o baixo custo, simplicidade operacional e baixa produção de sólidos. Aliado a tais características estão o clima e as condições ambientais propícias do Brasil, que oferecem durante todo o ano temperaturas relativamente elevadas, acelerando o mecanismo de tratamento. Com esses atrativos, o tratamento anaeróbio passou a ocupar uma posição de destaque no saneamento do país. Especificamente, os reatores de manta de lodo (UASB) constituem um dos sistemas de tratamento anaeróbio que mais se desenvolveram ultimamente. Entretanto, mesmo com tantas características favoráveis e propícias, o tratamento anaeróbio demonstra grande dificuldade em produzir um efluente dentro dos padrões estabelecidos pela legislação ambiental do país. Daí se observa a grande necessidade do uso de sistemas de pós-tratamento de efluentes de reatores anaeróbios, adequando tal efluente aos requisitos da legislação ambiental. A função do pós-tratamento, portanto, é complementar a remoção de matéria orgânica (DBO e DQO) que se iniciou no reator anaeróbio e remover os nutrientes e patogênicos que não foram afetados durante a fase inicial do tratamento. Reconhecida como uma prática bastante antiga de tratamento de águas residuárias, a disposição de esgotos no solo tem se afigurado, atualmente, como uma das principais alternativas para o pós-tratamento de efluentes gerados pelos reatores anaeróbios, pois constitui um método natural de tratamento bastante eficiente, envolvendo mecanismos físicos, químicos e biológicos de remoção da carga poluidora (PAGANINI, 19). Seguindo a mesma tendência dos reatores anaeróbios, a disposição de esgotos no solo é um processo simples e de baixo custo. A integração entre o tratamento anaeróbio e as diversas alternativas de pós-tratamento, incluindo-se a disposição no solo, ainda foi muito pouco estudada em todo o mundo, salvo por algumas pesquisas feitas de maneira isolada. O conhecimento, analisando-se os reatores anaeróbios e o pós-tratamento individualmente, é relativamente grande, entretanto, o conhecimento da ação integrada do dois processos ainda é incipiente (CHERNICHARO,19). Passa a ser de grande importância, portanto, o desenvolvimento de pesquisas que tratem conjuntamente a questão do tratamento em reatores anaeróbios e do pós-tratamento dos efluentes desses sistemas, otimizando e sistematizando os parâmetros de projeto, para que haja uma maior difusão dessas tecnologias simplificadas e a adequação do efluente tratado aos requisitos da legislação ambiental. Para efeito deste trabalho, será detalhado o processo de disposição de esgotos no solo por escoamento superficial, como pós-tratamento de efluentes de reatores UASB. O escoamento superficial é, dentre todos os métodos de disposição de esgotos no solo, o mais completo, pois é o único no qual todos os fatores naturais de depuração do esgoto participam ativamente. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 279
METODOLOGIA Características físicas do sistema de tratamento O sistema de tratamento foi implantado junto à ETE Nova Vista, na cidade de Itabira- MG, como parte de um convênio firmado entre o DESA/UFMG e o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) de Itabira. Tal projeto integra as pesquisas que vêm sendo desenvolvidas no âmbito do Programa de Pesquisas em Saneamento Básico (PROSAB), financiadas pela FINEP, CNPq, CAPES e CEF. O reator UASB em escala real que alimenta as rampas de aplicação de esgoto no solo possuia volume de reação de 477 m³ e é originário do projeto padrão da SANEPAR, encontrando-se em operação desde o início de 1996. O sistema de aplicação de esgotos no solo constava de três rampas com área unitária igual a 75 m 2 (comprimento de 25 m e largura de 3 m), construídas com declividade igual a 4%. Uma pequena parcela do efluente do reator UASB era distribuída nas cabeceiras das rampas, por meio de tubos de PVC perfurados. O esgoto, depois de escoar pelo solo, era encaminhado a 3 caixas de passagem (CP1, CP2, CP3) que recolhiam o efluente de cada uma das rampas. Cada rampa possuia cinco pontos de coleta de amostras, espaçados de 5 metros, que permitiam o monitoramento ao longo do comprimento das rampas. A Figura 1 apresenta lay-out do sistema. Figura 1: Lay-out do sistema com os pontos de amostragem Como cobertura vegetal nas rampas foi utilizada a espécie de capim Brachiaria humidicola. Os capins do gênero Brachiaria são reconhecidamente resistentes ao alagamento e possuem ótima taxa de absorção de nutrientes do solo. Características operacionais e de monitoramento O trabalho consistiu de duas fases distintas, diferenciadas pelo regime hidráulico aplicado às rampas. A 1 a fase foi desenvolvida no período de junho/ a março/98, tendo sido aplicadas vazões constantes em cada uma das rampas, porém com taxas diferenciadas (vide Tabela 1). A 2 a fase, considerada de maior relevância, caracteriza-se pela aplicação de vazões variáveis e, portanto, taxas de aplicação também variáveis ao longo do dia. A segunda fase será iniciada logo após a conclusão da etapa de automação do sistema. A seguir são apresentadas as características principais das duas fases operacionais: ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 28
Primeira fase Foram estabelecidos ciclos operacionais de 8 horas para as rampas, com período de aplicação de 7: h às 15: h. Esse período do dia foi escolhido por abranger os picos de vazão e de carga orgânica que normalmente ocorrem na parte da manhã e na hora do almoço, além de facilitar o monitoramento do sistema. Apresenta-se a seguir a Tab.1 com as condições operacionais de alimentação do sistema de escoamento superficial no solo. Tabela 1: Características operacionais de alimentação das rampas (Fase 1) Parâmetro Vazão aplicada (m 3 /h) 1,8 1,2,6 Taxa aplicação linear (m 3 /m h),6,4,2 Taxa de aplicação superficial (cm/d) 19,2 12,8 6,4 O programa de monitoramento do projeto envolveu a coleta de amostras semanais, objetivando a determinação das principais características físico-químicas, bacteriológicas e parasitológicas dos esgotos. As amostras diárias e semanais foram colhidas na elevatória e nas 3 caixas de passagem (CP1, CP2 e CP3). A Figura 1, que compõe o layout da ETE Nova Vista, detalha os pontos onde foram feitas as amostragens. Os parâmetros físico-químicos analisados foram: ph, OD, temperatura, condutividade, alcalinidade, ácidos voláteis, DQO total, DQO filtrada, DBO total, SST, SSV, NTK, sólidos sedimentáveis, N-NH 4 e nitrato. Os métodos de análises utilizados na maioria dos casos estão descritos Standart Methods for the Examination of Water and Wastewater (AWWA/APHA/WEF,1995) Segunda fase A fim de se obter uma maior representatividade e precisão dos resultados, optou-se pela automação do sistema de tratamento, conseguida com a implantação de válvulas medidoras e controladoras de vazão, além de válvulas solenóide e amostradores automáticos. Adicionalmente, foi implantada junto à área da ETE uma estação meteorológica que permite a aquisição de diversos dados de interesse para o trabalho de pesquisa. O estudo dos dados armazenados possibilitará uma avaliação criteriosa em relação à interferência das condições climáticas da região na eficiência do tratamento. As válvulas medidoras e controladoras de vazão foram instaladas junto ao tanque de nível (Caixa CI) e tem como objetivo o controle da vazão afluente às rampas. Este conjunto de medição e controle permite tanto a leitura quanto o controle da vazão afluente ao sistema, feito através de uma placa de interface e de um software especialmente desenvolvido para essa finalidade. A abertura e o fechamento da válvula são feitos por meio de sinais elétricos enviados pelo programa de gerenciamento, de acordo com um hidrograma horário de vazões previamente estabelecido pelo usuário do sistema. O programa de gerenciamento é também responsável pela abertura ou fechamento de três válvulas solenóides (uma aberta e duas fechadas), possibilitando que apenas uma rampa seja alimentada de cada vez. Um outro software desenvolvido realiza a discretização de um hidrograma típico de vazões. O hidrograma discretizado que alimentará as rampas de aplicação no solo é apresentado na Figura 2. Figura 2: Hidrograma de alimentação das rampas ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 281
do sistema de aplicação de esgoto no solo vazão (m 3 /h) 2.5 2 1.5 1.5 vazão variável vazão média 6 12 18 24 horas do dia As principais condições operacionais das rampas durante a segunda fase são apresentadas na Tabela 2 a seguir. Cada uma das rampas será alimentada durante 8 horas por dia, ficando portanto 16 h em repouso, diariamente. Na rampa 3 (que receberá o efluente no período de 2: às 4: h), será avaliado o efeito da ausência da radiação solar (radiação ultravioleta) na remoção de patogênicos. Tabela 2: Características operacionais de alimentação das rampas (Fase 2) Parâmetro Vazão mínima (,6 m³/h) Vazão média (1,2 m³/h) Vazão máxima (2,16 m³/h) Taxa de aplicação linear (m³/m x h),2,4,72 Taxa de aplicação superficial (cm/d) 6,4 12,8 23, RESULTADOS Matéria orgânica e sólidos A seguir são apresentados os resultados de monitoramento do efluente do reator UASB e dos efluentes das três rampas. Tais dados foram obtidos por meio da bateria de análises físico-químicas semanais realizadas no laboratório central do SAAE de Itabira e compreendem o período operacional de junho de 19 a março de 1998 (Fase 1). As Figuras 3, 4 e 5 mostram as variações temporais das concentrações de DQO, DBO e SST nos efluentes do reator UASB e das rampas de escoamento superficial. Pode-se observar pelas Figuras 3, 4 e 5 que as rampas seguem a tendência do reator UASB. Quando há um aumento da carga orgânica aplicada, o efluente das rampas sai com uma maior concentração de material orgânico. No entanto, o aumento da concentração de matéria orgânica no efluente das rampas pode não significar uma diminuição de sua eficiência. Em sistemas de tratamento de esgoto resistentes à variação de carga orgânica, a eficiência permanece estável mesmo com o aumento da carga orgânica. No caso das rampas de escoamento superficial, devido ao pouco número de dados, não se pode definir ao certo qual é a tendência da eficiência do tratamento. Em alguns pontos das Figuras 3, 4 e 5, o sistema se mostra bastante resistente ao aumento da carga orgânica efluente do reator. Outros pontos dos mesmos gráficos demonstram que a eficiência diminui com o aumento da carga orgânica. Nesse caso, a variação do clima da região pode se constituir em um importante fator de influência. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 282
Figura 3: Variação temporal da concentração de DQO DQO Total Efluente (mg/l) 5 UASB 45 4 35 3 25 2 15 1 5 Jun- Jul- Ago- Set- Out- Nov- Dez- Jan-98 Fev-98 Mar-98 Figura 4: Variação temporal da concentração efluente de DBO DBO Total Efluente (mg/l) 2 18 16 14 12 1 8 6 4 2 UASB Jun- Jul- Ago- Set- Out- Nov- Dez- Jan- 98 Fev- 98 Mar- 98 Figura 5: Variação temporal da concentração efluente de SST 25 SST Efluente (mg/l) 2 15 1 5 UASB Jun- Jul- Ago- Set- Out- Nov- Dez- Jan-98 Fev-98 Mar-98 As Figuras 3, 4 e 5 permitem ainda inferir que a taxa de aplicação (único parâmetro de operação que variou intencionalmente em cada rampa) parece não ter influído na remoção de matéria orgânica no pós-tratamento. O esperado era que a rampa 1, que operou com a taxa de aplicação de,6 m³/m.h, tivesse uma eficiência menor e a rampa 3, que operou com a taxa de aplicação de,2 m³/m.h, tivesse uma eficiência maior. As eficiências de cada rampa foram bastante variáveis ao longo do tempo sem que nenhuma das rampas se destacasse em relação às outras. O grau de remoção de matéria orgânica foi bastante similar em todas as três rampas, conforme demonstrado através de estudos estatísticos de análises de variância. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 283
Atendimento aos padrões de lançamento As Figuras 6, 7 e 8 apresentam as distribuições de freqüência dos dados obtidos para as concentrações de DQO, DBO e SST nos efluentes do reator UASB e das rampas, possibilitando uma visualização do percentual de resultados que atenderam aos padrões de lançamento estabelecidos pela legislação ambiental no estado de Minas Gerais. Os resultados encontram-se sistematizados na Tabela 3. Figura 6: Distribuição de freqüências dos dados de DQO DQO Total Efluente (mg/l) 5 45 UASB 4 35 3 25 2 15 1 5 % 2% 4% 6% 8% 1% Percentis Figura 7: Distribuição de freqüências dos dados de DBO DBO Total Efluente (mg/l) 2 18 UASB 16 14 12 1 8 6 4 2 % 1% 2% 3% 4% 5% 6% 7% 8% 9% 1% Percentis Figura 8: Distribuição de freqüências dos dados SST 25 SST Efluente (mg/l) 2 15 1 5 UASB % 1% 2% 3% 4% 5% 6% 7% 8% 9% 1% Percentis ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 284
Tabela 3: Verificação do atendimento ao padrão de lançamento de Minas Gerais Parâmetro de atendimento Dados de acordo com o padrão (%) Ref. DN 1/86 do COPAM (*) Reator UASB DQO total < 9 mg/l 3,3 5, 53,3 5, DBO total < 6 mg/l 3, 7, 7, 73,3 SST < 6 mg/l 56,7 93,3 96,7 96,7 (*) Conselho de Política Ambiental de Minas Gerais Torna-se evidente pela Tabela 3 a necessidade de um sistema de pós-tratamento para o polimento do efluente do reator UASB, já que os percentuais de dados que atendem ao padrão de lançamento são muito baixos, notadamente para os parâmetros DQO e DBO. Os resultados indicam uma melhoria na qualidade do efluente ao passar pelas rampas, com um aumento significativo da percentagem de dados que passaram a atender o padrão de lançamento da DN 1/86, notadamente em relação aos parâmetros DBO e SST. Cabe ressaltar o quão restritivo é o padrão de lançamento da DN 1/86 do COPAM para o parâmetro DQO. Nitrogênio A Figura 9 mostra as variações das concentrações de Nitrogênio Total Kjeldhal efluentes do reator UASB e das rampas de escoamento superficial, podendo-se observar que houve conversão de NTK em todas as rampas, durante todo o período experimental. Grande parcela da amônia (constituinte do NTK) que sai do reator UASB sofre nitrificação (oxidação da amônia a nitrito e nitrato) ao passar pelas rampas de escoamento superficial. A nitrificação constitui o primeiro passo para a remoção por completo do nitrogênio da massa líquida. Os nitratos formados pela nitrificação serão então absorvidos pela cobertura vegetal ou utilizados pelas bactérias desnitrificantes para a realização da desnitrificação. Figura 9: Variação temporal da concentração de NTK NTK Efluente (mg/l) 5 45 4 35 3 25 2 15 1 5 Jul- Ago- Set- Out- Nov- Dez- Jan-98 Fev-98 Mar-98 UASB A DN 1/86 do COPAM fixa o padrão de lançamento para a amônia em 5 mg/l. As outras formas do nitrogênio nos esgotos não possuem padrões de lançamento fixados pelo COPAM nem pelo CONAMA. Dessa forma, conclui-se que o sistema de escoamento superficial não foi capaz de cumprir tais padrões de lançamento em nenhuma fase do período experimental. Entretanto, dadas as pequenas dimensões do sistema piloto e as taxas de aplicação maiores que as usuais, a concentração de nitrogênio no efluente final ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 285
pode ser considerada satisfatória. O aumento das taxas de aplicação, acima dos valores usualmente praticados, juntamente com a falta de oxigênio do efluente do reator UASB, pode ter prejudicado a performance das rampas de escoamento superficial na remoção de nitrogênio. A Tabela 4 resume as concentrações médias de nitrogênio no sistema de póstratamento. Tabela 4: Concentrações médias de nitrogênio no sistema de pós-tratamento Parâmetro Concentrações médias (mg/l) Efl. UASB Efl. Efl. Efl. NTK 39 21 21 18 Amônia 34 18 18 14 Pela análise dos valores médios, percebe-se que a rampa 3 teve uma melhor performance na remoção de nitrogênio que as outras rampas. No entanto, testes estatísticos de análise de variância mostraram haver igualdade entre as médias das amostras de NTK e amônia efluentes das três rampas, com um intervalo de confiança de 95%. Portanto, não se pode afirmar que houve uma diferença estatística entre as amostras de dados das rampas. Segunda fase Com a finalização dos ajustes do sistema de automação, notadamente em relação à calibração dos medidores, será iniciado o programa de monitoramento do sistema com a operação em regime hidráulico transiente. CONCLUSÃO De uma maneira geral, o sistema de escoamento superficial no solo funcionou de forma bastante promissora como pós-tratamento de reatores UASB, principalmente em função das baixas concentrações de sólidos e de matéria orgânica no efluente final. Com relação à concentração final de nutrientes, pode-se considerar que o sistema de escoamento superficial alcançou níveis bastante satisfatórios. Em grande parte das vezes, o sistema foi capaz de atender aos padrões de lançamento da DN 1/86 do COPAM e da Resolução 2/86 do CONAMA. A seguir são apresentadas algumas conclusões mais específicas do presente trabalho de pesquisa: as eficiências médias de remoção complementar de matéria orgânica (DQO e DBO total) nas rampas variaram de 48 a 53%, podendo ser considerada elevada para um sistema de pós-tratamento; as três rampas de escoamento superficial alcançaram resultados médios de DBO total que variaram em torno de 48 a 52 mg/l, abaixo, portanto, do valor máximo permitido pela DN 1/86 do COPAM (< 6 mg/l); as três rampas de escoamento superficial alcançaram resultados médios de DQO total que variaram em torno de 98 a 13 mg/l. Apesar dos valores médios de DQO total terem sido superiores ao limite da DN 1/86 do COPAM (< 9 mg/l), pode-se dizer que os resultados foram muito bons, tendo em vista que o referido padrão de lançamento para a DQO é reconhecidamente bastante restritivo; ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 286
as três rampas de escoamento superficial alcançaram resultados médios de SST efluente que variaram em torno de 17 a 21 mg/l, abaixo, portanto, do valor máximo permitido pela DN 1/86 do COPAM (< 6 mg/l); as eficiências médias de remoção de NTK e amônia nas rampas variaram, respectivamente, de 45 a 54% e 47 a 59%; as três rampas de escoamento superficial alcançaram resultados médios de amônia que variaram em torno de 14 a 18 mg/l, acima, portanto, do valor máximo permitido pela DN 1/86 do COPAM (< 5 mg/l). Com base na experiência obtida por meio deste estudo, conclui-se que o sistema de aplicação de esgotos no solo, funcionando como pós-tratamento de reatores UASB, pode perfeitamente vir a trabalhar com taxas de aplicação menos conservadoras (,4 a,5 m³/m.h). Todavia, novas pesquisas devem ser feitas de modo a corroborar a presente pesquisa, estendendo o conhecimento acerca dos sistemas de aplicação de esgoto no solo. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Itabira pelo apoio na realização dos trabalhos de campo e à FAPEMIG, à FINEP, ao CNPq e à CAPES pelo financiamento da pesquisa. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ARAÚJO, G.C.; CHERNICHARO, C.A.L.; VON SPERLIG, M. (1998). Avaliação do póstratamento de efluentes de reatores UASB através de um sistema de aplicação superficial de esgotos no solo. In: Anais VIII Simpósio Luso-Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental. p 366-378. 2. ARAÚJO, G.C. (1998). Avaliação do pós-tratamento de efluentes de reatores UASB através de um sistema de aplicação superficial de esgotos no solo. Dissertação de mestrado. Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG. 3. AWWA/APHA/WEF (1995). Standard methods for the examination of water and wastewater. 19 th edition. Washington. 4. CHERNICHARO, C.A.L. (19). Princípios do tratamento biológico de águas residuárias. Vol. 5. Reatores Anaeróbios. Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG. 246p. 5. CORAUCCI FILHO, B.; ALÉM SOBRINHO, P.; FIGUEIREDO, R.F. (1995). Tratamento de esgoto doméstico no solo pelo método de escoamento superficial: efeito da taxa hidráulica na eficiência. In: Anais do 18 º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental. 6. MINAS GERAIS. (1986). Deliberação Normativa/COPAM N.º 1, de 16 de dezembro de 1986. Estabelece normas e padrões para qualidade das águas, lançamento de efluentes nas coleções de água, e dá outras providências. 7. PAGANINI, W.S. (19). Disposição de esgotos no solo (escoamento à superfície). Fundo editorial da AESABESP. São Paulo. 232 p. 8. ZUCCOLO, A.C.F.; PAGANINI, W.S.; TERADA, M. (1985). Tratamento de esgotos domésticos por disposição no solo com implantação de gramíneas. Projeto Piloto de Populina-SP. SABESP. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 287