Curso de Direito do Consumidor 4ª Série - UNIARA. Períodos Diurno e Noturno: Prof. Marco Aurélio Bortolin

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Transcrição:

Curso de Direito do Consumidor 4ª Série - UNIARA. Períodos Diurno e Noturno: Prof. Marco Aurélio Bortolin Aulas 11 e 12 Ementa: A Responsabilidade do Fornecedor por Danos na Relação de Consumo (2ª parte). Fato do serviço (regime de apuração, excludentes e responsabilização dos profissionais liberais). Responsabilidade pelo vício do produto (qualidade, quantidade e informação); garantia legal e reparação; Aplicação distinta da Teoria do Vício no Direito dos Contratos e no Direito do Consumidor. I - Responsabilidade pelo fato do serviço. 1. Danos no fornecimento de serviços. Após abordarmos a responsabilidade do fornecedor pelo fato do produto, passaremos a enfrentar a chamada responsabilidade do fornecedor pelo fato do serviço, tratado no artigo 14, do Código de Defesa do Consumidor 1. O dispositivo em questão é uma clara adaptação da regra encartada no artigo 12, do mesmo Diploma Legal, ou seja, dos produtos para as atividades, e, basicamente, podemos estabelecer que também para os serviços prevalece, como regra, o mesmo regime de responsabilização civil e a mesma teoria informadora, ou seja, na maciça maioria dos casos é objetiva fundada na teoria do risco do negócio, com os mesmos pressupostos de caracterização 2 que prescindem de um elemento subjetivo como culpa ou dolo, salvo em se tratando de serviços prestados por profissionais. Contudo, sua aplicação é mais simples, já que não apresenta a mesma concentração legal de responsáveis (fabricante, produtor, importador e construtor), devendo ser responsabilizado pelo fato do serviço o prestador da atividade contratada mediante remuneração direta ou indireta. 2. Categorias de defeitos em serviços. Antes de qualquer outra consideração, devemos perceber que o citado artigo 14, caput, do Código de Defesa do Consumidor 1 Art. 14, caput, CDC. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. 1 O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I - o modo de seu fornecimento; II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III - a época em que foi fornecido. 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas. 3 O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. 4 A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. 2 Pressupostos: fornecimento, no caso, do serviço; dano sofrido pelo consumidor; nexo causal entre o serviço defeituoso e o dano experimentado pelo consumidor. 1

estabelece que o prestador de serviços responderá objetivamente por danos oriundos do defeito na prestação dos serviços, e sobre informações insuficientes ou inadequadas sobre a fruição dos serviços e seus respectivos riscos inerentes ou potenciais. Temos, portanto, duas categorias de defeitos que podem decorrer dos serviços, quais sejam: a) defeitos decorrentes da prestação propriamente dita dos serviços, em que falhas na execução do serviço atingem bens jurídicos fundamentais do consumidor; b) defeitos decorrentes da falta, insuficiência ou da inadequação das informações necessárias para que o consumidor se utilize daquele serviço sem riscos à sua saúde e segurança, que evidentemente também pode gerar danos ao consumidor, causados por discrepância entre o que foi anunciado e o que efetivamente recebeu o consumidor após contratar o serviço. 2.1. O serviço e o produto associados. Outra categoria que devemos cuidar é a associação do serviço com o produto, já que alguns produtos necessitam de um serviço de instalação para que possam ser desfrutados em toda a sua plenitude e algumas formas de prestação de serviços se apresentam com tal associação (fornecimento também do produto). Nesse caso, é evidente que a regra de solidariedade estudada no artigo 7º, único, do CDC, estende a responsabilidade ao prestador do serviço que se utiliza de um produto defeituoso, em hipótese frequente que também não está expressamente incluída no Art. 14, caput, do Código de Defesa do Consumidor. Fica aqui a observação. 3. Identificação. O artigo 14, 1º e 2º, do CDC, assim como já foi analisado em relação ao fato do produto, procura apresentar formas de identificação do serviço defeituoso, fixando as seguintes hipóteses: a) será defeituoso o serviço se não fornecer a segurança que dele normalmente se espera, considerando-se o modo de fornecimento normal desse tipo de serviço (artigo 14, 1º, I, CDC): nessa primeira hipótese legal, a responsabilidade do fornecedor passa a ser decorrência da forma ofensiva, descuidada, desatenta ou negligente pela qual o serviço é prestado ao consumidor; temos uma atividade de prestação defeituosa, desvalorizada, que no seu agir gera danos à vida, saúde, segurança ou honorabilidade do consumidor ou de terceiro 3 ; b) será defeituoso o serviço se não fornecer a segurança que dele normalmente se espera, considerando-se o resultado e os riscos normais desse tipo de serviço (artigo 14, 3 Exemplo (art. 14, 1º, I, CDC): tomemos hipoteticamente a situação em que um aplicador de verniz em assoalhos deixa descuidadamente e desnecessariamente o produto químico cair sobre os olhos de um morador que estava em um andar mais baixo e posicionado adequadamente em seu apartamento, pois isso não é uma periculosidade inerente ou potencial do serviço, mas sim, indica descuido, negligência na execução de um serviço que não teria tamanho risco em sua execução normal; 2

1º,II, CDC): nessa segunda hipótese legal, o defeito não reside na prestação em si, mas sim no resultado, mais precisamente, na periculosidade ou nocividade normais do resultado do serviço prestado, caso aquelas sejam maiores do que o normalmente esperado; a insegurança gerada pelo resultado da prestação do serviço é maior que a normalmente esperada (portanto, inesperada) causando dano 4 ; c) será defeituoso o serviço se não fornecer a segurança que dele normalmente se espera, considerando-se a época em que foi fornecido (artigo 14, 1º, III, CDC): considera a norma importante destacar que a insegurança pode decorrer da comparação entre a época em que o serviço foi colocado no mercado e o que poderia existir na ciência ou tecnologia para impedir a ocorrência de danos ao consumidor, ressalvando a norma, porém, que o serviço prestado não será considerado defeituoso pela adoção futura de novas técnicas (artigo 14, 2 o, CDC), mas nós já sabemos em razão de regra análoga para o fato do produto que não estamos a tratar de uma comparação entre o serviço aplicado no passado com o modelo atual, e sim, com o serviço ultrapassado e atualmente mais perigoso que continua a ser prestado como antigamente, o que revelaria clara imprudência e descaso do prestador de serviço 5. 4. Excludentes. Novamente, alinhando o regime de apuração do fato do serviço ao regime já estudado em aula anterior para o fato do produto, temos que a responsabilidade objetiva será a regra (artigo 14, caput, CDC), fundada na teoria do risco do negócio, mas não se trata de risco integral, já que a dita responsabilização objetiva comporta excludentes. Isso mesmo, assim como ocorre com os produtos, a norma consumerista admite que o fornecedor possa eximir-se dessa responsabilização através da comprovação de excludentes, o que sem dúvida suaviza essa responsabilização objetiva. Consoante dispõe o artigo 14, 3º, do CDC, a responsabilidade do prestador de serviços pode ser excluída frente a danos sofridos pelo consumidor, se comprovado que: a) que no serviço prestado, o defeito não existe (artigo 14, 3º, I, CDC): típica hipótese de defesa direta que integra o próprio raciocínio de configuração do regime de responsabilização, e que não representa bem uma excludente, mas sim, própria defesa direta de mérito, hábil a indicar a ausência de nexo causal entre eventual dano e o serviço prestado, o que antes de representar propriamente uma excludente exterior ao regime de responsabilização, é, repetimos, própria 4 Exemplo (art. 14, 1º, II, CDC): desta feita, imaginemos o mesmo serviço de aplicação de verniz em assoalho, mas na hipótese sugerida, o aplicador de verniz em assoalhos usa uma substância mais tóxica do que a comumente utilizada, e mesmo passados vários dias da aplicação do produto, seguindo as instruções do fornecedor, ainda assim a família é intoxicada ao retornar para a residência após aguardar um período normal de secagem do produto aplicado; 5 Exemplo (art. 14, 1º, III, CDC): por fim, ainda com o mesmo serviço proposto nos exemplos anteriores, adotemos a hipótese em que um aplicador de verniz em assoalhos usa técnica e produto causador de danos aos familiares, já existindo naquela mesma época e de forma disseminada no mercado, técnicas e produtos bem menos agressivos à saúde dos consumidores, cujos danos decorreram dessa inesperada insegurança que estes últimos não poderiam legitimamente esperar. 3

defesa de mérito da obrigação de reparar, voltada para a comprovação de ausência de um dos requisitos legais configuradores da obrigação; b) que a despeito do serviço ter sido prestado pelo fornecedor, o defeito gerador de dano foi causado por culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (artigo 14, 3º, II, CDC): consideravelmente importante é destacar que a redação do dispositivo exclui a possibilidade de concorrência do fornecedor e de outrem no dever de reparar (como ocorre no Direito Civil em que a culpa é dimensionada e admite-se a repartição de responsabilidade entre o causador do dano e quem o suporta, se este último contribuiu para o dano, nos termos do artigo 945, do Código Civil), ou seja, se houver negligência do consumidor e do fornecedor, e neste caso, o consumidor sofreu danos com a prestação do serviço, ou em decorrência da oferta, ou ainda, por informações insuficientes, terá o fornecedor a obrigação de reparar totalmente o consumidor, pois somente a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro isenta o fornecedor dessa obrigação. Aliás, por terceiro devemos ter mente pessoa física ou jurídica completamente dissociada do ciclo de produção dos produtos e serviços que compõem a prestação daquele serviço ao consumidor. 5. Profissionais liberais. Excepcionalmente, a responsabilidade pelo fato do serviço prestado por profissionais liberais não é objetiva, mas sim, pautado pela responsabilização subjetiva, cujos pressupostos são muito conhecidos pelo alunado (ação ou omissão, dano, nexo causal e culpa ou dolo). A razão de essa exceção ser conferida aos fornecedores profissionais liberais segue a ideia de o contrato firmado entre o consumidor e um médico, ou advogado, não ser típico de adesão, a contratação foi eleita pelo consumidor em razão da honorabilidade e reputação do profissional (intuitu personae), e que a atividade oferecida, na maior parte das vezes (não todas) é de meio e não de resultado, daí porque não poderia o prestador desse serviço responder objetivamente. Para essa exceção, destacamos duas questões relevantes: a) a regra é restrita ao profissional liberal autônomo em contratação negociada (por exemplo, o advogado, o médico, o dentista, o arquiteto, o engenheiro, etc., e não associação, cooperativa ou sociedade de profissionais liberais), pois o que busca resguardar o Código de Defesa do Consumidor é o não oferecimento de um serviço massificado, com contratação de adesão, pois nesta situação a responsabilidade será objetiva; b) a ausência de responsabilidade objetiva não exclui a possibilidade de inversão do ônus da prova, mesmo na hipótese do fornecedor ser um profissional liberal autônomo, se a relação for tipicamente de consumo. A Doutrina igualmente estabelece: Em seu sistema de responsabilidade objetiva, o Código do Consumidor abre exceção em favor dos profissionais liberais no 4º do seu art. 14: A responsabilidade dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. Vale dizer, os profissionais liberais, embora prestadores de serviço, 4

respondem subjetivamente. No mais, submetem-se aos princípios do Código informação, transparência, boa-fé etc. Quem e profissional liberal? E preciso ser portador de diploma superior (médico, advogado, dentista, engenheiro etc.) para ser considerado profissional liberal? Ha quem assim sustente; em nosso entender, sem razão. Profissional liberal, como o próprio nome indica, e aquele que exerce uma profissão livremente, com autonomia, sem subordinação. Em outras palavras, presta serviço pessoalmente, em caráter permanente e autônomo, por conta própria e sem vínculo de subordinação, independentemente do grau de intelectualidade ou de escolaridade. Não só o médico, o advogado, o engenheiro, o psicólogo, o dentista, o economista, o professor, o enfermeiro, o consultor podem ser profissionais liberais, mas também o eletricista, o pintor, o sapateiro, o carpinteiro, o marceneiro, o mecânico, a costureira, desde que prestem serviço com autonomia, sem subordinação enfim, por conta própria. Pela ótica do Código, o melhor caminho e definir o profissional liberal pelas características de sua prestação de serviços, e não pelo seu grau de escolaridade, ou pelo enquadramento na regulamentação legal. Por que o profissional liberal foi excluído do sistema geral da responsabilidade objetiva? Essa e outra questão que suscitou controvérsia, mas hoje esta pacificada. A atividade dos profissionais liberais e exercida pessoalmente, a determinadas pessoas (clientes), intuitu personae, na maioria das vezes com base na confiança recíproca. Trata-se, portanto, de serviços negociados, e não contratados por adesão. Sendo assim, não seria razoável submeter os profissionais liberais a mesma responsabilidade dos prestadores de serviço em massa, empresarialmente, mediante planejamento e fornecimento em série. Em suma, não se fazem presentes na atividade do profissional liberal os motivos que justificam a responsabilidade objetiva dos prestadores de serviços em massa. O Código do Consumidor não criou para os profissionais liberais nenhum regime especial. A única exceção que se lhes abriu foi quanto a responsabilidade objetiva. E se foi preciso estabelecer essa exceção e porque estão subordinados aos demais princípios do CDC. Assim, o médico, o advogado, o mecânico, o marceneiro, o costureiro, todos estão subordinados aos princípios da boa-fe, da informação, da transparência, da inversão do ônus da prova etc. (Filho, Cavalieri, Sergio. Programa de Direito do Consumidor, 4ª edição. Atlas, 08/2014. P. 339/340). II Responsabilidade pelo vício do produto. 1. Introdução. Primeiramente, ao tratarmos de responsabilidade pelo vício na relação de consumo, devemos lembrar que um mesmo problema a incidir sobre o produto ou sobre o serviço poderá gerar para o fornecedor o dever de reparar, de acordo com o alcance da propagação desse fator na esfera do consumidor ou de terceiro vítima do evento, ou seja, se do problema apurado sobre o produto ou serviço decorrer de uma insegurança maior do que a esperada, e o produto ou serviço causar danos ao consumidor, estaremos diante do surgimento de uma responsabilidade do fornecedor pelo fato (anômalo, diga-se) do consumo, ou seja, aquela que provoca um autêntico acidente de consumo (justamente por se tratar de um desdobramento negativo do fornecimento que não era de se esperar, tampouco de se prever ou admitir). Contudo, se o problema decorre da qualidade ou quantidade, ou simplesmente da deficiência ou inexistência da informação do produto ou do serviço a se caracterizar como um fator de depreciação (real ou presumido) do próprio elemento objetivo da relação de 5

consumo (produto ou serviço), estaremos diante do surgimento de uma responsabilidade do fornecedor por esse fator de depreciação chamado de vício do produto ou do serviço, originado por um problema de impropriedade ou de inadequação (qualidade), ou de quantidade, ou mesmo de informação, mas que não se propagou pelo campo da insegurança maior que a esperada, e se manteve depreciando apenas o elemento objetivo da relação jurídica (produto ou serviço), a gerar um desequilíbrio obrigacional e econômico para o negócio (em regra de cargas obrigacionais comutativas). Portanto, esse chamado vício é o fator de depreciação que recai sobre o próprio produto ou serviço, diminuindo-lhe o valor, ou fazendo com que o produto (ou serviço) revele ser diverso das informações que apresentava ter, ou ainda tornando-o imprestável ao fim a que se destina, o que é bem diferente do chamado defeito, pois este é um fator de depreciação do produto ou serviço que acaba por atingir o consumidor em seu patrimônio jurídico pessoal material ou moral. Enfim, um mesmo problema pode simplesmente caracterizar o chamado vício, ou causar um acidente de consumo, transformando-se em defeito, tudo dependendo das consequências decorrentes desse problema do produto ou serviço na vida do consumidor. 2. Aplicação da Teoria do Vício no Direito do Consumidor. O vício do produto. O produto, entendido como elemento objetivo da relação jurídica de consumo, poderá apresentar vício, cujo conceito legal no Código de Defesa do Consumidor abrange o fator depreciativo da qualidade ou de quantidade da coisa, em ambos os casos diminuindo o valor do produto ou tornando-o inadequado ou imprestável (total ou parcialmente) ao fim a que se destinava; no Direito do Consumidor, ainda, tem-se como fator de depreciação da coisa o chamado vício de informação, decorrente da objetiva disparidade entre o produto e a sua mensagem publicitária ou própria embalagem, e nesse último caso o dano é presumido pois não necessariamente ocorrerá uma diminuição do valor da coisa ou o bem se tornará (total ou parcialmente) inadequado ou imprestável ao fim ao qual se destinava. É o que prevê o artigo 18, caput, do CDC 6. Viável e interessante é comparar a redação do artigo 18, caput, do CDC com o já estudado artigo 441, do Código Civil, pois iremos claramente notar uma diferença de profundidade na aplicação da Teoria do Vício em um e outro sistema, embora, na essência, ambos 6 Art. 18, CDC. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas. 6

regulem as consequências de fatores de depreciação sobre bens alvos de contratos comutativos translatícios de propriedade, valendo destacar que no Direito do Consumidor a aplicação da teoria do vício é mais abrangente do que sua aplicação no Direito Privado. Conforme aprendemos ao longo do estudo da teoria geral dos contratos no Direito Civil, em um contrato comutativo há a certeza de onerosidade para os contratantes, impondo-se neste tipo de negócio jurídico um natural sinalagma próprio do campo contratual em que há transferência onerosa de bens, ou seja, o preço assumido pelo comprador representa uma carga obrigacional naturalmente relacionada à carga obrigacional recíproca da contraprestação do vendedor que é a de entregar coisa 7. Caso o objeto do contrato comutativo não possa ser apropriado para o uso comumente esperado porque apresentava um vício oculto, escondido, não aparente, ou se por esse mesmo vício a coisa até serve ao uso, mas tem o seu valor diminuído, haverá um claro desequilíbrio entre as cargas obrigacionais em desajuste frente às vontades privadas formadoras do negócio, afetando sua vinculação justa, pois o comprador adquiriu um bem por certo valor de algo próprio ao uso a que se destinava. Contudo, se o bem apresenta um vício oculto que lhe diminui o valor de mercado, ou que torna impróprio esse bem para o uso normalmente esperado, fica evidente que o comprador acabou pagando valor superior ao devido, pois, afinal de contas, não teria pagado tal preço se soubesse que o bem apresentava vício que lhe diminuía o valor ou não possibilitava seu total uso. O vício sobre a coisa móvel ou imóvel na relação contratual translatícia de posse ou propriedade de bem fora da relação de consumo, ou seja, na relação de Direito Privado (em regra, contratos de compra e venda ou de troca por adquirentes que não sejam destinatários finais ou por vendedores que não explorem habitualmente o mercado) será o fator de depreciação totalmente oculto, exclusivamente existente até a tradição, e que obrigatoriamente deva acarretar a diminuição do valor do bem ou tornar este impróprio ao uso a que se destinava, permitindo que o alienatário adquirente possa desfazer o negócio, redibindo-o (com ou sem perdas e danos conforme a má-fé do alienante), ou reposicionar o equilíbrio das cargas contratuais com a estimação do prejuízo a gerar um necessário abatimento do preço, como é tratado nos artigos 441 a 444, todos do Código Civil, que já tivemos a oportunidade de estudar 8. 7 Sabemos, outrossim, que a mesma proteção se aplica para a doação onerosa, que é contrato unilateral e gratuito, mas é uma exceção reconhecida pelo legislador por aproximação ao contrato comutativo, segundo o artigo 441, do Código Ciivl. 8 Art. 441, Código Civil. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor. Parágrafo único. É aplicável a disposição deste artigo às doações onerosas. 7

Assim, no Direito Civil, temos uma clara disposição da norma em manter o equilíbrio das cargas obrigacionais em fase pós-contratual, afetadas que foram por um fator de depreciação da coisa transferida pelo contrato e que gera claro desequilíbrio às cargas obrigacionais ajustadas, sem decorrer de mora ou inadimplemento. É visível, também, que a lei civil se volta para constituir um sistema de manutenção do equilíbrio das cargas obrigacionais e não propriamente para proteger o adquirente, pois não há presunção de vulnerabilidade de qualquer das partes no negócio (ao contrário da relação de consumo), tanto que a satisfação da necessidade do comprador com a aquisição do bem viciado no regime do direito privado não é um alvo da norma, tanto que prevê apenas como consequências a redibição do contrato ou a estimação do prejuízo, consoante dispõem os Arts. 441 a 446, Código Civil. abrangente e ampla, pois: No Direito do Consumidor, contudo, a aplicação da teoria do vício é mais a) a responsabilização do fornecedor não está restrita aos mesmos pressupostos dos artigos 441 e 442, do Código Civil, o que significa estabelecer que não precisa o vício ser obrigatoriamente oculto (alcançará, portanto, problemas aparentes, além, é claro, dos ocultos); b) a mesma responsabilização do fornecedor não se restringe a vícios exclusivamente preexistentes à tradição como também fixado nos já citados dispositivos do Código Civil (alcançando vícios preexistentes à tradição, mas também outros surgidos ou adquiridos após a tradição em um período que a norma de consumo presume que o produto deva conservar suas características); c) não é necessário que os vícios provoquem a diminuição do valor do produto ou que tornem o bem imprestável total ou parcialmente ao fim destinado, bastando que estejam em disparidade com o conteúdo da embalagem. Vê-se, portanto, porque não está em jogo apenas a restauração do equilíbrio da relação jurídica, mas, sobretudo, uma clara disposição da lei de consumo em proteger o consumidor por sua vulnerabilidade e para a melhor satisfação de suas necessidades. Portanto, a análise do vício na relação jurídica de consumo é realmente Art. 442, Código Civil. Em vez de rejeitar a coisa, redibindo o contrato (art. 441), pode o adquirente reclamar abatimento no preço. Art. 443, Código Civil. Se o alienante conhecia o vício ou defeito da coisa, restituirá o que recebeu com perdas e danos; se o não conhecia, tão-somente restituirá o valor recebido, mais as despesas do contrato. Art. 444, Código Civil. A responsabilidade do alienante subsiste ainda que a coisa pereça em poder do alienatário, se perecer por vício oculto, já existente ao tempo da tradição. 8

diferente da análise do vício sobre a coisa para uma relação jurídica contratual regida pelo Direito Civil, pois o presumido equilíbrio da relação contratual comutativa que o Direito Civil busca manter, exige que exista um fator de desequilíbrio concreto para sua aplicação; ao revés, no Direito do Consumidor, há a presunção legal de que a relação jurídica é naturalmente desequilibrada, daí porque notamos diversas diferenças de tratamento jurídico pela maior ou menor aplicação da teoria do vício num e noutro sistema, não se exigindo sequer cautela média do consumidor na verificação de um vício, que pode ser, inclusive, aparente, recebendo sempre o consumidor na relação jurídica de consumo, objetivamente, a proteção da norma especial. Fica aqui a observação. Passemos a analisar o vício no CDC, portanto. 3. Vício de qualidade do produto. Após definir no artigo 18, caput, que fornecedores responderão por vícios que tornem os produtos inadequados ou impróprios para o consumo, bem como, que lhes diminuam o valor, o mesmo artigo 18, 6º, do CDC, procura dimensionar esse campo do vício de qualidade, ficando englobados por essa regra de impropriedade os produtos que apresentarem o prazo de validade vencido (artigo 18, 6º, I, CDC), ou que se apresentarem adulterados, falsificados, deteriorados, ou em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação, que possam tornar o produto nocivo à vida, saúde ou segurança do consumidor (artigo 18, 6º, II, CDC). Tratam-se de conceitos específicos de impropriedade para produtos. Já a inadequação segue um critério genérico de imprestabilidade para definir o vício sempre que o produto não se revelar apto ao fim a que se destinava originariamente (artigo 18, 6º, III, CDC) 9. 3.1. Reparação do vício de qualidade. Basicamente, temos como regra de reparação o direito do consumidor à substituição da parte viciada do produto (artigo 18, caput, CDC). Esse dever primário de reparar precisa ser cumprido pelo fornecedor no bojo de um prazo decadencial de exercício pelo consumidor que veremos mais à frente. E, para cumpri-lo adequadamente, faz-se mister que o fornecedor o faça em no máximo 30 (trinta) dias, sob pena de o direito básico de reparação da parte viciada se converter para o consumidor nas possibilidades distintas de reparação do artigo 18, 1º, do CDC, e que são: a) substituição do produto por outro da mesma espécie (marca e modelo), em perfeitas condições de uso (artigo 18, 1º, I, CDC); b) restituição imediata da quantia 9 Art. 18, CDC. [...] 6. São impróprios ao uso e consumo: I - os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos; II - os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação; III - os produtos que, por qualquer motivo, se revelem inadequados ao fim a que se destinam. 9

paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos, sendo que esse plus indenizatório não se confunde com a responsabilidade pelo fato prevista no artigo 12 do CDC, mas sim, perdas que correspondam indiretamente em decorrência do desfazimento do contrato, tais como despesas de transporte ou postagem (artigo 18, 1º, II, CDC); c) abatimento proporcional do preço (artigo 18, 1º, III, CDC). Trata-se de uma obrigação legal imposta pela lei ao fornecedor na relação de consumo, e que, portanto, não pode ser contratualmente dispensada de forma válida. Seu alcance é o de obrigar o fornecedor a promover o reparo do vício (ressalvadas as hipóteses legais do Art. 18, 3º, do CDC). O prazo legal é de trinta dias, mas embora não possa tal prazo ser extinto por acordo entre as partes, poderá ser alterado por livre consenso a não menos que sete dias, bem como ampliado a não mais do que cento e oitenta dias, sendo que se o contrato for de adesão, essa fixação de prazo reduzido ou ampliado deverá constar de termo expresso redigido em separado e com concordância expressa do consumidor, nos termos do artigo 18, 2º, do CDC 10. Isso não significa que além da garantia legal ditada e imposta pelo sistema legal de reparação pelo vício do produto no Código de Defesa do Consumidor, não possa o fornecedor firmar uma segunda garantia ao consumidor, chamada de garantia contratual, e que deverá observar o disposto no artigo 50, do Código de Defesa do Consumidor (natureza de garantia complementar, dada por escrito e com redação clara e simples). Já a garantia legal não precisa ser expressamente convencionada por escrito, posto que decorre da própria lei (artigo 24, CDC). Outrossim, essa regra de substituição da parte viciada (artigo 18, caput, CDC) comporta duas exceções. A primeira exceção repousa na ressalva legal de que se a substituição da parte viciada comprometer a qualidade ou características do produto que gerem a diminuição do seu valor, o consumidor poderá desde logo lançar mão de quaisquer das opções de reparação do artigo 18, 1º, do CDC; também não se admite simplesmente a substituição da parte viciada, se o vício recair em produto essencial. Nessas duas hipóteses específicas não se cogita de substituição das partes viciadas, e sim, diretamente o exercício de qualquer das possibilidades de reparação do 1º do artigo 18, do CDC, no bojo do prazo decadencial de exercício do direito de reparação (artigo, 26, CDC) 11. 10 Art. 18, CDC. [...] 2 Poderão as partes convencionar a redução ou ampliação do prazo previsto no parágrafo anterior, não podendo ser inferior a sete nem superior a cento e oitenta dias. Nos contratos de adesão, a cláusula de prazo deverá ser convencionada em separado, por meio de manifestação expressa do consumidor. 11 Art. 18, 3º, CDC. [...] O consumidor poderá fazer uso imediato das alternativas do 1 deste artigo sempre que, em razão da extensão do vício, a substituição das partes viciadas puder comprometer a qualidade ou características do produto, diminuir-lhe o 10

3.2. Ausência de produto idêntico. Caso a opção do consumidor seja a de substituição do produto viciado por outro da mesma espécie (artigo 18, 1º, I, CDC), não havendo outro de igual marca ou modelo, a opção por produto diverso comportará pagamento ou restituição da diferença (artigo 18, 4º, CDC). 3.3. Responsabilidade por vícios em produtos in natura. Por vícios de qualidade em produtos in natura (produto que não é industrializado), responde diretamente o fornecedor imediato (no caso, o comerciante), salvo se o produtor puder se claramente identificado no produto, alinhando a previsão da responsabilidade subsidiária do comerciante pelo fato do produto, antes estudado ao analisarmos o artigo 13, I e II, do Código de Defesa do Consumidor, com a presente regra da responsabilidade pelo vício 12, praticamente de mesmo conteúdo, ao dispor a norma: 4. Vícios de quantidade do produto. Como já salientado, a responsabilidade do fornecedor pelo vício do produto compreende o vício de qualidade, o vício de quantidade, e o vício de informação decorrente da disparidade entre o objeto da relação de consumo e a informação da embalagem ou mensagem publicitária, tornando o produto impróprio ou inadequado para o consumo, ou diminuindo-lhe o valor. Já no artigo 19, caput, do CDC, procura o legislador identificar o chamado vício de quantidade. Para tanto, estabelece o referido dispositivo legal que, se respeitadas as variações normais decorrentes da própria natureza do produto, ainda assim apurar-se alguma disparidade entre o conteúdo líquido do produto e as indicações constantes da embalagem ou mensagem publicitária, poderá o consumidor, alternativamente, e a sua escolha, optar pelas três alternativas já estudadas para a responsabilidade pelo vício de qualidade (devolução da quantia paga atualizada, mais perdas e danos; abatimento proporcional do preço, ou a substituição do produto por outro da mesma espécie, marca ou modelo, sem os aludidos vícios), além de uma quarta opção, que é a complementação do peso ou medida (artigo 19, II, CDC). 5. Características importantes do chamado vício de quantidade. Possível destacar quatro características principais: valor ou se tratar de produto essencial. 12 Art. 18, 5º, CDC. No caso de fornecimento de produtos in natura, será responsável perante o consumidor o fornecedor imediato, exceto quando identificado claramente seu produtor. 11

a) contém a norma em questão, o equívoco de restringir o defeito de quantidade ao conteúdo líquido do produto, o que é restritivo demais no dispositivo legal (artigo 19, caput, CDC), pois poderá ocorrer o vício de quantidade em relação ao número de unidades do produto, como na hipótese de caixas de fósforos ou de canetas; b) as variações normais do peso em razão da desidratação natural de alguns produtos, não determinam por si apenas eventuais vícios de quantidade, pois as normas técnicas costumam levar em consideração o volume de perda natural de peso do produto, de forma a identificar realmente o vício de quantidade sem qualquer confusão com a desidratação normal esperada e conhecida (exemplo: alho in natura embalado); c) a responsabilidade pelo vício do produto é solidária, mas será direta do fornecedor imediato (comerciante), toda vez que o vício de quantidade for apurado em razão de defeito do instrumento de pesagem ou medição em relação aos padrões oficiais (artigo 19, 2º, CDC); d) se o consumidor se deparar com o vício de quantidade, e optar pela substituição do produto por outro da mesma espécie, marca ou modelo, será aplicável a mesma regra do artigo 18, 4º, do CDC, ou seja, desde que aceite complementar o preço ou receber eventual diferença, poderá o consumidor aceitar produto de outra espécie, marca ou modelo (artigo 19, 1º, CDC). III. Dispositivos legais referidos nesta aula. Art. 14, CDC. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. 1 O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I - o modo de seu fornecimento; II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III - a época em que foi fornecido. 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas. 3 O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. 4 A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. Art. 18, CDC. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas. 1 Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente 12

atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III - o abatimento proporcional do preço. 2 Poderão as partes convencionar a redução ou ampliação do prazo previsto no parágrafo anterior, não podendo ser inferior a sete nem superior a cento e oitenta dias. Nos contratos de adesão, a cláusula de prazo deverá ser convencionada em separado, por meio de manifestação expressa do consumidor. 3 O consumidor poderá fazer uso imediato das alternativas do 1 deste artigo sempre que, em razão da extensão do vício, a substituição das partes viciadas puder comprometer a qualidade ou características do produto, diminuir-lhe o valor ou se tratar de produto essencial. 4 Tendo o consumidor optado pela alternativa do inciso I do 1 deste artigo, e não sendo possível a substituição do bem, poderá haver substituição por outro de espécie, marca ou modelo diversos, mediante complementação ou restituição de eventual diferença de preço, sem prejuízo do disposto nos incisos II e III do 1 deste artigo. 5 No caso de fornecimento de produtos in natura, será responsável perante o consumidor o fornecedor imediato, exceto quando identificado claramente seu produtor. 6 São impróprios ao uso e consumo: I - os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos; II - os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação; III - os produtos que, por qualquer motivo, se revelem inadequados ao fim a que se destinam. Art. 19, CDC. Os fornecedores respondem solidariamente pelos vícios de quantidade do produto sempre que, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, seu conteúdo líquido for inferior às indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou de mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I - o abatimento proporcional do preço; II - complementação do peso ou medida; III - a substituição do produto por outro da mesma espécie, marca ou modelo, sem os aludidos vícios; IV - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos. 1 Aplica-se a este artigo o disposto no 4 do artigo anterior. 2 O fornecedor imediato será responsável quando fizer a pesagem ou a medição e o instrumento utilizado não estiver aferido segundo os padrões oficiais. IV. Julgados relacionados aos temas da aula (Fonte:www.tjsp.jus.br). APELAÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DE BITO CUMULADA COM DANOS MORAIS. Decreto de procedência. Fixação quantitativa de reparação em R$ 10.000,00. Pedido de reforma do ofensor. Descabimento. Imprudência pela ação de prestar informação aos órgãos de proteção ao crédito - Abertura indevida de registro no sistema - Patente conduta faltosa de cautela na verificação da autenticidade da qualificação do solicitante e comprovação da identidade do verdadeiro inadimplente - Existência de culpa subjetiva - Ônus de prova de incumbência do fornecedor de produtos e serviços sobre a regularidade do negócio - Ausência de relação jurídica direta com o terceiro estranho à contratação - Responsabilidade objetiva independente do ânimo - Teoria do risco da atividade - Latente ofensa à honra objetiva - Abalo à credibilidade financeira - Suspeita de inidoneidade a compromisso pecuniário - Ampla divulgação à consulta pública - Presença de lesão subjetiva - Presunção de prejuízo à intimidade é resultado imediato e puro - Nexo de causalidade configurado entre o ato considerado ilícito e a violação do direito de imagem do consumidor - Elementos da responsabilidade civil extracontratual devidamente preenchidos - Reparação extrapatrimonial cabível - Aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade - Dosimetria fundada no caráter punitivo aliado à preocupação de evitar o enriquecimento sem causa e o empobrecimento injustificado - Vultosa capacidade econômica do transgressor - Extensão do dano retratada pela 13

publicidade imotivada à restrição creditícia e ao foro íntimo - Manutenção do arbitramento quantitativo assaz parcimonioso - Sentença mantida Recurso desprovido (TJSP - Apelação 0002023-06.2012.8.26.0322 Rel. Des. Salles Rossi Comarca: Lins 8ª Câmara de Direito Privado j. 06/03/2013). AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS Indenização por danos materiais e morais - Transporte coletivo - Assalto à mão armada no interior do coletivo - Afastada a responsabilidade da transportadora pelo evento danoso - Configurada a força maior - Ônibus que foi abordado por assaltantes armados Fato excludente de responsabilidade da empresa transportadora - Precedentes do STJ - RATIFICAÇÃO DO JULGADO - Hipótese em que a sentença avaliou corretamente os elementos fáticos e jurídicos apresentados pelas partes, dando à causa o justo deslinde necessário - Artigo 252, do Regimento Interno do TJSP - Aplicabilidade - Sentença mantida - RECURSO NÃO PROVIDO (TJSP - Apelação 0006896-43.2011.8.26.0400 Rel. Des. Spencer Almeida Ferreira Comarca: Olímpia 38ª Câmara de Direito Privado j. 06/03/2013). BEM MÓVEL. COMPRA E VENDA DE VEÍCULO USADO. AÇÃO REDIBITÓRIA. CRITÉRIO DA VIDA ÚTIL DO BEM DURÁVEL. DESGASTES NORMAIS E APARENTES DO VEÍCULO DEVIDO AO TEMPO DE USO. NEGLIGÊNCIA DO ADQUIRENTE QUANTO À VISTORIA DO VEÍCULO. VÍCIO NÃO CONSTATADO. RECONHECIMENTO DA DECADÊNCIA AFASTADO. DIREITO À REPARAÇÃO INEXISTENTE. Os problemas mecânicos de veículo com vários anos de uso e quilometragem elevada não constituem vícios ocultos, mas, sim, desgastes normais e aparentes do veículo devido ao tempo de uso. Ausência de vício oculto que afasta a aplicação do art. 18 e do art. 26, ambos do CDC. Improcedência da pretensão inicial mantida, entretanto, por outro fundamento, nos termos do art. 269, inciso I, do CPC. Recurso desprovido, com observação (TJSP Apelação 0012072-69.2012.8.26.0066 Rel. Des. Gilberto Leme 27ª Câmara de Direito Privado Comarca: Barretos j. 19/03/2013). AGRAVO RETIDO - Pedido para a realização de prova pericial - Não cabimento - Constatada que parte das cápsulas do medicamento ingerido pelo autor estavam vazias, se mostra desnecessária a realização da prova pericial, vez que restou demonstrado em audiência o vício contido no produto - RECURSO NÃO PROVIDO. INDENIZAÇÃO - Vício no produto - Medicamento utilizado pelo autor que apresentou cápsulas vazias - Configurada a existência de vício no produto das apelantes, estas devem ser responsabilizadas, nos termos do art. 18, do CDC. Não há que se falar na existência da decadência do dano material sofrido pelo apelado, visto que restou incontroverso que o autor entrou em contato com o Serviço de Atendimento ao Consumidor das rés para solucionar o problema, afastando-se, assim, o prazo decadencial de 30 dias do art. 26 do CDC, por força de seu 2º, I. Valor da fixação do dano moral em R$ 62.200,00 se mostrou adequado - RECURSO NÃO PROVIDO (TJSP Apelação 0013220-27.2011.8.26.0084 Rel. Des. Renato Rangel Desinano 36ª Câmara de Direito Privado Comarca: Campinas j. 14/03/2013). 14