Diário do Nordeste Fortaleza, 26 de julho de 2015 Caderno: Política Pág; 14 Menos recursos Transposição e Cinturão das Águas sob ameaças Os recursos federais para importantes obras no Ceará já estão escassos e os prejuízos podem ser bem grandes O Ceará está recebendo, neste ano, menos recursos das liberações obrigatórias do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e das transferências voluntárias, estas fruto de convênios para execução de obras de infraestrutura, dentre outras o Metrofor e o tão ressaltado "Cinturão das Águas", construção tão importante quanto a Transposição de Águas do Rio São Francisco, por complementá-la, garantindo o abastecimento para o consumo humano de tão significativo número de cearenses, em parte já necessitado de água em face da prolongada estiagem e o consequente esvaziamento dos nossos açudes e barragens. A falta de tais recursos federais já acendeu a luz vermelha nos cofres do erário estadual. Como se não bastasse a escassez desses numerários da União, indispensáveis para a manutenção dos serviços na dimensão exigida pelos cearenses, as despesas com o custeio da máquina estadual, inclusive de pessoal, só crescem, motivadas até por razões alheias ao próprio Estado, como no caso dos subsídios de juízes e promotores, além dos pisos de categorias funcionais, tudo decidido, sem interferência das unidades federativas, pela esfera federal. A arrecadação dos impostos estaduais, o ICMS, é insuficiente para sustentar as obrigações do Poder, quanto mais agora, com o País tomado por uma crise descomunal, obrigando a todos a conter gastos por precaução ou por necessidade, impondo um jejum de vendas ao comércio, a fonte geradora do tal imposto. Abala A queda do Fundo de Participação, ainda não tão sentida no Estado em razão de sempre ser a sua distribuição no primeiro semestre do ano um pouco mais generosa, abala consideravelmente o tesouro nacional que, em razão de arrecadar menos reduz os investimentos, até em obras imprescindíveis para a sobrevivência de pessoas, como é o caso da Transposição de Águas do Rio São Francisco. O Orçamento do Ministério da Integração Nacional para execução pela Secretaria de Infraestrutura Hídrica daquela Pasta, responsável pelas obras da Transposição, como mostra o Portal da Transparência da Controladoria Geral da União, é bem aquém do executado em 2014, nos conduzindo a entender que a obra vai sofrer um atraso maior, para a infelicidade de parte da nossa população.
Além de menos dinheiro, na fase final da obra, necessária não só para o Ceará como para outros estados da Região nordestina, as informações oficiais existentes na Comissão de Orçamento da Câmara dos Deputados, na última sexta-feira, mostram que as construtoras envolvidas na obra da Transposição ainda têm muito dinheiro a receber de exercícios anteriores, e isso é uma ameaça a novas interrupções, como acontece já em relação ao Cinturão das Águas, por atraso na liberação das verbas correspondentes aos trabalhos executados. Funciona O Governo Federal, apesar do discurso otimista do próprio governador Camilo Santana, está em falta com o Ceará, também em outras ações. A questão da Saúde, mesmo a parte de responsabilidade da União, está longe de ser resolvida e, por isso, não funciona o Hospital da Região Centro, no Município de Quixeramobim, um equipamento de ponta, como são os de Juazeiro do Norte e Sobral. Inaugurado há oito meses, equipado, mas sem o tesouro estadual ter dinheiro para bancar o seu custeio, não passa de um "elefante branco", pior ainda, com risco de deterioração. No Ministério da Saúde se discute, há algum tempo, se são reais os custos da Saúde no Ceará para só depois decidir como pagar o débito, se reconhecer, e passar a desembolsar a sua parte para garantir um atendimento universalizado e melhor à população carente que precisa do Sistema Único de Saúde. O Município de Fortaleza, também, tem unidade de Saúde pronta para funcionar, mas falta a garantia da União de desembolsar os recursos para tal. Sem dinheiro para custear o pleno atendimento, a ampliação da rede de hospitais estaduais não será concretizada, e a Região Metropolitana de Fortaleza tão cedo não poderá contar com o Hospital de Maracanaú, mesmo sua edificação fazendo parte de uma Parceria Público Privada. Equipamentos O novo corte no Orçamento deste ano anunciado pela equipe econômica da presidente Dilma Rousseff, reclama, por ameaçador às nossas necessidades, a união das forças políticas para, ao mostrarem a ameaça de um colapso na oferta de água e na sofrível distribuição dos serviços de saúde para a população, reagirem contra o contingenciamento de verbas para a Transposição, o Cinturão das Águas e o custeio de ao menos para o funcionamento dos equipamentos já existentes.
O Povo Fortaleza, 26 de julho de 2015 Caderno: Política Pág. 22 REPORTAGEM.DOM Eleições 2016. Quem ganha e quem perde com o cerco aos doadores Com ou sem constitucionalização do financiamento empresarial de campanhas, os cofres dos partidos estarão mais esvaziados para as disputadas municipais A generosidade de empresas que costumam financiar campanhas eleitorais milionárias está em discussão a partir da Operação Lava Jato. Conclusões preliminares dos investigadores, do Ministério Público e da Polícia Federal, apontam que vigorava o regime de troca de favores. Patrocínio eleitoral por benesses em contratos com a Petrobras, por exemplo. De forma indireta e, em tese, lícita, milhões de reais supostamente despendidos pelo setor privado saíam, em verdade, dos cofres públicos. Agora, empresários estão na mira do Ministério Público e já começam a responder por acusações de lavagem de dinheiro. A curto prazo, o resultado das punições será um volume menor de doações no pleito de 2016. A sensação de redução da impunidade de empresas e corruptos gera uma reação: eles querem se prevenir porque percebem que é para valer, diz o diretor-presidente do Instituto Ethos, Jorge Abrahão. A organização se compromete a orientar empresas a gerir os negócios de modo socialmente responsável. Abrahão relata que o Instituto passou a ser mais procurado por empresas que buscam ajuda para evitar se envolver em situações de corrupção, especialmente com financiamento de campanhas. O até então crescente gráfico do custo das eleições fará uma curva para baixo pela primeira vez em décadas. Nas eleições do ano passado, mais de 70% das doações vieram de empresas. As maiores chegaram a doar para mais de 20 partidos. A intenção é contribuir para o debate democrático no Brasil. Não há ligação partidária. Prova disso é que nossas doações foram para maioria das grandes legendas, justifica a JBS (Friboi), maior financiadora da última corrida presidencial. No entanto, o cientista político Valeriano Costa alerta que empresas têm uma relação prática com a política e são voltadas para resultados. É até imoral que uma empresa de cigarros, por exemplo, financie um parlamentar que possa legislar em prol dela. Sempre há um interesse por trás, argumenta. O economista Celio Fernando encara o efeito Lava Jato de maneira positiva. O dinheiro gasto nas campanhas continuará circulando na economia. Mas, em vez de propinas, ele será usado para o bem social, pondera. Por outro lado, ele reconhece que setores ligados ao marketing político podem sair prejudicados. É possível que afete mais gráficas e a distribuição de material promocional, explica. E os partidos? O caixa das agremiações deve sofrer com o baque da retração de seus maiores patrocinadores. Mesmo assim, há quem olhe para situação com otimismo. O presidente estadual do PSDB, Luiz Pontes, diz que a provável inibição de empresas em doar vai reduzir o custos. Partidos e empresas estão todos mal vistos. O melhor dessa crise é baratear a campanha. Isso facilita, diz.
Na Câmara dos Deputados, a atual proposta de reforma política prevê que a doação de empresas, que é legal, passe a ser também constitucional. Embora a questão siga indefinida no Congresso, partidos já se preparam para encontrar novas formas de captação de recursos. Teremos que ser mais criativos. Vamos buscar a ajuda de pessoas próximas, diz o deputado estadual Heitor Férrer (PDT-CE). Para o presidente estadual do PT, Diassis Diniz, a saída é investir em militância. Saiba mais Os apoios no Ceará em 2014 Enquanto Camilo Santana (PT) esteve entre os candidatos mais beneficiados por doações da JBS, o comitê do rival Eunício Oliveira (PMDB) aparece entre os que mais receberam da iniciativa privada no Brasil. Grandes nomes Na primeira acusação formal contra empreiteiros dentro da Lava Jato, o Ministério Público denunciou seis executivos da Odebrecht e cinco da Andrade Gutierrez, na última sexta-feira. Processo no STF A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedido para que o financiamento empresarial seja considerado inconstitucional. Segundo a Ordem, empresas não podem eleger nem ser eleitas, portanto não deveriam ter direito de participar de pleitos. Há mais de um ano, o requerimento segue com pedido de vistas pelo ministro Gilmar Mendes. Caderno: Política Pág. 23 REPORTAGEM.DOM Custo de campanha. Efeito é passageiro, afirma especialista Segundo o cientista político Flávio Britto, as leis precisam ser ainda mais duras para coibir a corrupção. Empresas voltarão a financiar eleições se mecanismo continuar legal O efeito intimidante da Lava Jato tem data de validade, segundo o especialista em direito eleitoral e cientista político Flávio Britto. Ele argumenta que, enquanto a lei permitir, empresas continuarão a se envolver no pleito em troca de favores. Britto lembra de um caso dos anos 1990, quando o então presidente Fernando Collor foi acusado de usar aporte de empresas em sua campanha. Foi um escândalo na época. O tempo fez com que as pessoas esquecessem, conta. Considerando que parte do que era doado voltava para as empresas em forma de contratos superfaturados, Britto admite que o fluxo de dinheiro deve ser reduzido, mas não será completamente interrompido. Mesmo que a prática se torne ilegal, ainda pode haver caixa dois. Por isso, acho que a legislação tem de ser mais dura para coibir a corrupção, afirma. O presidente estadual do PT no Ceará, Diassis Diniz concorda com o especialista. A lógica permanecerá a mesma. Mudará, talvez, o modus operante, mas terá a mesma repercussão na política, avalia. As empresas confirmam a possibilidade de continuar como doadoras caso a lei permita. Uma das investigadas na Lava Jato, a Odebrecht afirma, em nota encaminhada ao O POVO que conforme é
previsto por lei no Brasil, as doações são sempre devidamente registradas nos cartórios eleitorais. O financiamento de campanha é uma iniciativa legal de apoio aos candidatos e partidos políticos brasileiros. Já a construtora Andrade Gutierrez, também na lista das supostas envolvidas no esquema da Petrobras, deixa a participação nas eleições 2016 indefinida. Procurada, disse, através da assessoria, que que o orçamento para o próximo ano ainda não está em andamento. Para o cientista político Valeriano Costa, a solução está nas urnas. Financiamento privado é um dilema da política no mundo todo. O melhor é que tenhamos cautela na hora de votar, diz. Para as companhias que querem continuar como financiadoras, o Instituto Ethos recomenda que o façam de forma o mais transparente possível. De acordo com o diretor-presidente da instituição, Jorge Abrahão, o ideal é que o Congresso reduza de modo drástico o teto das doações. Nova direção O deputado federal Chico Alencar (Psol-RJ) aposta numa queda no apoio ao financiamento empresarial de campanha. Segundo o parlamentar, o assunto deve voltar à Casa com uma abordagem diferente. A proposta de constitucionalizar o financiamento de empresas sofreu um grande abalo. O levantamento do Ministério Público prova esquemas milionários, diz. Chico acredita que haverá mudança na votação da matéria pela Câmara, em agosto, após o recesso. Pesquisa do Instituto Datafolha, publicada em 6 de julho, mostra que 74% da população é contra o financiamento empresarial de campanha. Apenas 16% se disseram a favor. Ainda é possível que o Senado Federal faça modificações na proposta. Parlamentares trabalham mais numa perspectiva de limitar o teto de doações ou aplicar regras que restrinjam o financiamento. Por exemplo, empresas que tenham contratos com órgãos públicos ficam impedidas de doar.