Certificado digitalmente por: SALVATORE ANTONIO ASTUTI APELAÇÃO CÍVEL N. 1527666-3, DA 1ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA. APELANTES: IRINEU CHRISTOFOLLI E OUTROS. APELADO: MUNICÍPIO DE CURITIBA/PR. RELATOR: DES. SALVATORE ANTONIO ASTUTI. Tributário e Civil. ITBI. Escritura pública de compra e venda com cláusula resolutiva. Negócio jurídico condicional. Fato gerador. Registro do título aquisitivo. Art. 1.245, do Código Civil. Ocorrência. Arts. 116 e 117, do CTN. Desfazimento do negócio. Necessidade de nova transferência imobiliária. ITBI. Incidência. Sentença mantida, por fundamento diverso. Apelação cível não provida. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 1527666-3, da 1ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, em que são apelantes IRINEU CHRISTOFOLLI E OUTROS e apelado MUNICÍPIO DE CURITIBA/PR. RELATÓRIO Trata-se de apelação cível interposta por IRINEU CHRISTOFOLLI E OUTRO contra os termos da sentença de mov. 72.1 que, nos autos de repetição de indébito n. 0030327-89.2013.8.16.0182, julgou Página 1 de 8
improcedente o pedido inicial, extinguindo o processo, com resolução do mérito, nos termos do art. 269, I, do CPC. Por força da sucumbência, condenou os apelantes ao pagamento das custas e despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$ 500,00. Em suas razões recursais (mov. 79.1), IRINEU CHRISTOFOLLI E EVANIRDE CHRISTOFOLLI sustentam a necessidade de reforma da sentença, ao argumento de que havia cláusula resolutiva e suspensiva na escritura pública de compra e venda levada a registro, que previa que a propriedade do imóvel somente se transferiria para IRMA ROSSATO SE E QUANDO PAGA A ÚLTIMA PARCELA, o que não ocorreu, acarretando o desfazimento do negócio. Dizem não concordar que houve a transferência da propriedade do imóvel com o simples registro da escritura na matrícula do imóvel, uma vez que IRMA ROSSATO nunca pôde exercer todos os direitos inerentes à propriedade, pelo que o ITBI não poderia ter sido cobrado. Argumentam que, tendo em vista a condição estabelecida na escritura pública de compra e venda, a aquisição da propriedade era apenas uma expectativa concedida à compradora, que se consumaria com o adimplemento da última parcela da obrigação. Discorrem sobre os fatos geradores do ITBI, aduzindo que a mera transferência da posse, com a expectativa de aquisição da propriedade, não é capaz de autorizar a cobrança do imposto, já que a posse não é um direito real. Pedem a reforma da sentença para que possam reaver o ITBI recolhido por ocasião do registro da venda, bem como para que seja reconhecida a não incidência do imposto no cancelamento do registro. Contrarrazões apresentadas no mov. 87.1. Página 2 de 8
A Procuradoria-Geral de Justiça optou por não se manifestar acerca do mérito recursal (fls. 10 a 12). É o relatório. VOTO O recurso não comporta provimento. Observa-se dos autos que IRINEU CHRISTOFOLLI e sua esposa EVANIRDE CHRISTOFOLLI firmaram com IRMA ROSSATO, em 29/04/2009, escritura pública de compra e venda de bem imóvel com cláusula resolutiva (seq. 1.3). Em 06/05/2009, a escritura foi levada a registro na matrícula do imóvel (seq. 1.5), com o consequente recolhimento de ITBI. Em 29/04/2009, em razão do não pagamento do preço ajustado pelas partes, IRINEU e EVANIRDE exerceram a cláusula resolutiva anotada na escritura, firmando com IRMA ROSSATO escritura pública de desfazimento da compra e venda (seq. 1.4). Para registrar o cancelamento do negócio na matrícula do imóvel, foram informados de que seria necessário novo recolhimento de ITBI. Não conformados, ajuizaram a presente ação de repetição do indébito, na qual requerem a repetição do ITBI pago no primeiro registro, além da não incidência do imposto no segundo registro. Argumentam que a existência de cláusula resolutiva tem o condão de impedir a ocorrência do fato gerador do tributo (transferência da propriedade), tanto na celebração quanto no desfazimento do negócio jurídico. A sentença julgou improcedentes os pedidos, autorizando a cobrança dos dois ITBIs. Página 3 de 8
Pois bem. Em primeiro lugar, ao contrário do que defendem os recorrentes, a condição aposta na escritura pública de compra e venda não é suspensiva, mas apenas resolutiva, no sentido de que, caso não fossem pagas todas as parcelas ajustadas, haveria a possibilidade desfazimento do negócio. Vejamos o que consta no documento:...ficando convencionado entre as mesmas expressamente neste ato, a instituição da Cláusula Resolutiva para a presente negociação, na forma dos artigos 474 e 475 do Código Civil Brasileiro, ficando estabelecido que a última Nota Promissória, devidamente quitada, se constitui em documento hábil para o cancelamento do débito junto ao registro imobiliário. Referidos artigos do Código Civil dispõem o seguinte: Art. 474. A cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito; a tácita depende de interpelação judicial. Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos. Diante do inadimplemento da adquirente, Sra. IRMA ROSSATO, os vendedores exerceram a cláusula resolutiva estipulada na Página 4 de 8
escritura pública de compra e venda, resolvendo o contrato e retomando o imóvel para si. Constou assim na escritura pública de desfazimento de compra e venda:...em virtude do não cumprimento do pagamento previsto na escritura acima citada, exerce-se o cumprimento da cláusula resolutiva constante naquela escritura de compra e venda, ora desfeita e na melhor forma de direito, DESFAZ a aludida escritura, o que fazem para todos os fins, em caráter irrevogável e irretratável. (SIC) Note-se que em nenhum momento se fez registrar que a transferência da propriedade do imóvel estaria condicionada ao pagamento da última parcela, como defendem os recorrentes, motivo pelo qual não se pode falar que a cláusula convencionada era, também, suspensiva. A condição suspensiva é, de fato, aquela que tem o condão de suspender os efeitos do negócio jurídico até o momento do implemento da condição. Nesse sentido, dispõem os artigos 116, II, e 117, I, do CTN: Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos: (...) II tratando-se da situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos do direito aplicável. Página 5 de 8
Art. 117. Para os efeitos do inciso II do artigo anterior e salvo disposição de lei em contrário, os atos ou negócios jurídicos condicionais reputam-se perfeitos e acabados: I sendo suspensiva a condição, desde o momento de seu implemento: Logo, estando o negócio jurídico subordinado a condição suspensiva, a incidência do imposto somente seria autorizada após o implemento da condição, pois, nos termos do CTN, apenas nesse momento o negócio se torna perfeito e acabado. De outro lado, o negócio jurídico firmado sob condição resolutiva, como no caso dos autos, gera efeitos desde logo, sendo irrelevante o implemento da condição para se falar na incidência do tributo. A esse respeito, dispõe o inciso II, do art. 117, do CTN: Art. 117. Para os efeitos do inciso II do artigo anterior e salvo disposição de lei em contrário, os atos ou negócios jurídicos condicionais reputam-se perfeitos e acabados: (...) II sendo resolutória a condição, desde o momento da prática do ato ou da celebração do negócio. Amaro 1 : Sobre o tema, oportunas são as lições de Luciano 1 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 299. Página 6 de 8
Na identificação do momento de ocorrência do fato gerador, quando este corresponda a uma situação jurídica (art. 116, II), dispõe, supletivamente, o art. 117 do Código Tributário Nacional que, se se cuidar de atos ou negócios jurídicos condicionais, o fato gerador se considera ocorrido: I sendo suspensiva a condição, desde o momento de seu implemento; II sendo resolutória a condição, desde o momento da prática do ato ou da celebração do negócio. O ato ou negócio jurídico que corresponda à descrição legal do fato gerador pode ter sua eficácia subordinada a evento futuro e incerto. Assim, ao ato (ou negócio) jurídico condicional pode ou não desde logo corresponder a um fato gerador. Se a condição é suspensiva, não há efeito na esfera tributária, enquanto não se realiza o evento de cuja implementação depende justamente a produção dos efeitos do ato ou negócio jurídico. Implementada a condição, o ato ou negócio (que era condiciona e que se torna puro e simples) tem o efeito de gerar a obrigação tributária, que até então inexistia, pois ainda não se podia considerar ocorrido o seu fato gerador. Se é resolutiva a condição, o ato ou negócio reputa-se desde logo apto à produção dos efeitos tributários, ainda que, no futuro, eventualmente, possam ser resolvidos, ex nunc, os efeitos que o ato ou negócio tenha produzido na esfera do direito privado. Página 7 de 8
Desse modo, tendo havido o registro da escritura pública de compra e venda na matrícula do imóvel, ato formal de transmissão da propriedade imobiliária, conforme art. 1.245 2, do Código Civil, caracterizado está o fato gerador do ITBI, não havendo que se falar em necessidade de repetição dos valores pagos pela primeira transferência. Não bastasse isso, como houve o desfazimento da compra e venda, com a devolução do imóvel aos proprietários originários, haverá a necessidade de uma nova transferência imobiliária, incidindo, consequentemente, um novo ITBI. Diante do exposto, ainda que por fundamento diverso do adotado na sentença, nega-se provimento à apelação cível. DECISÃO Acordam os integrantes da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso. Participaram do julgamento os Desembargadores Jorge de Oliveira Vargas e Ruy Cunha Sobrinho. Curitiba, 19 de julho de 2016 Des. Salvatore Antonio Astuti Relator 2 Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis. 1º Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel. 2º Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do imóvel. Página 8 de 8