DESENVOLVIMENTO E CARACTERIZAÇÃO MECÂNICA DE COMPÓSITOS POLIPROPILENO/FIOS UNIDIRECIONAIS DE JUTA Joselito M. de F. Cavalcante 1, Laura H. Carvalho 2 * 1 Instituto Centro de Ensino Tecnológico - CENTEC/Faculdade de Tecnologia CENTEC Cariri, joselito@centec.org.br; 2 *Unidade Acadêmica de Engenharia de Materiais, UFCG, Av. Aprígio Veloso, 882, Bodogongó, Campina Grande, PB, 58109-900, laura@dema.ufcg.edu.br DEVELOPMENT AND MECHANICAL CARACTERIZATION PP/ UNIDIRECTIONAL JUTE YARN COMPOSITES The use of long, continuous, aligned fiber yarns in combination with polymer films potentially offers a simple, low cost means of manufacturing composites through film stacking, heating and press consolidation. This paper shows a new way to incorporate jute yarns into thermoplastic matrices to make long, unidirectional and aligned fiber reinforced composites. The tensile properties of such composites, manufactured with two polypropylene matrices with different MFI, were determined as a function of fiber content and compared. The results showed a slight influence of matrix MFI on the composites tensile properties. In general, higher properties were displayed by the composites manufactured with the matrix with higher MFI. As expected, mechanical properties increased with fiber content. Introdução No transcorrer dos últimos anos vem crescendo o interesse por materiais lignocelulósicos como reforço em compósitos. Isto se deve tanto às propriedades inerentes às fibras naturais, como baixa densidade, abrasividade e custo, quanto às características como abundância, disponibilidade e por serem provenientes de fontes renováveis, dentre outras [1]. Entretanto, as propriedades destas fibras estão associadas e são dependentes de fatores externos tais como: época de plantio, clima, características do solo e método de colheita e estocagem. Além disso, a polaridade e higroscopia destas fibras limitam sua compatibilidade com a grande maioria dos materiais poliméricos, o que tem promovido estudos visando minimizar estas deficiências e viabilizar o uso destas fibras em aplicações mais exigentes [2-4]. Dentre as fibras lignocelulósicas, a fibra de juta, apresenta um balanço de propriedades físicas e mecânicas, que as recomendam como reforço para materiais poliméricos. Além disto, aquelas apresentam um baixo custo, baixa densidade e abrasividade, são de fácil aquisição e são biodegradáveis [5]. Tomando por base as propriedades dos componentes individuais (fibra e matriz) é de se esperar que compósitos poliméricos reforçados por fibras de juta apresentem propriedades relativas como módulo elástico, resistência à tração, módulo em flexão e resistência ao impacto, bastante elevadas. Uma das matrizes que vêm ganhando espaço neste sentido é o polipropileno [6-8]. Este polímero é um termoplástico semicristalino, normalmente isotático com cristalinidade variando
entre 40 70%. Os PP podem ser homopolímeros ou copolímeros. Os homopolímeros apresentam elevada taticidade e, por conseguinte, elevada cristalinidade, alta rigidez, dureza e resistência ao calor. Os copolímeros, por sua vez apresentam maior transparência, menor temperatura de fusão e são mais resistentes ao impacto à temperatura ambiente que os homopolímeros [9]. Além, destas características que são repassadas ao compósito, propriedades inerentes à matriz, como o índice de fluidez, podem ter uma grande influência sobre as propriedades do compósito. O índice de fluidez é uma medida indireta do peso molecular, isto é quanto maior o índice de fluidez menor será o peso molecular e conseqüentemente mais fluido será o polímero fundido. Esta maior fluidez pode facilitar o molhamento da fibra e, consequentemente, melhorar a interface e, por conseguinte, as propriedades mecânicas do compósito. Além das propriedades dos componentes individuais, as propriedades dos compósitos estão ligadas à forma, distribuição, alinhamento e razão de aspecto do reforço fibroso [10]. Neste sentido, propriedades otimizadas são obtidas em compósitos reforçados por fibras finas, longas, contínuas e alinhadas. Contudo, na maioria das vezes fibras são incorporadas a matrizes termoplásticas em equipamentos dotados de rosca, o que inviabiliza a utilização de fibras longas e contínuas [11]. Métodos complexos e onerosos como os que utilizam a matriz em solução, o uso de fios mistos (comigled yarn) e, mais recentemente, o uso de fios híbridos micro-trançados (microbraid yarns) [6] necessitam ser empregados quando se deseja produzir compósitos termoplásticos reforçados por fibras contínuas e alinhadas. Visando a obtenção deste tipo de compósito termoplástico é que, um processo extremamente simples e de baixo custo foi desenvolvido. Considerando os argumentos mencionados, no presente trabalho um método de confecção deste tipo de compósito termoplástico é apresentado. As propriedades mecânicas de compósitos PP/fios de juta longos e alinhados foram determinadas em função dos teores de fibra no compósito e do índice de fluidez da matriz. Experimental Materiais Foram utilizados dois polipropilenos homopolímeros, produzidos pela Braskem, de referência H-103 e H-301, tendo índices de fluidez de 40 e 10 g/10 min, respectivamente. A juta, na forma de fio de classificação 10/2, isto é, um fio formado por duas pernas retorcidas, por sua vez foi fornecido pela Companhia Têxtil Castanhal, PA (Figura 1). Figura 1 Fio de juta 10/2
Preparação dos Filmes Para este fim foi utilizada uma prensa hidráulica (Schulz) com aquecimento. Filmes de PP foram produzidos por compressão a 170 ±.5 C, com 5 min de pré-prensagem seguindo de prensagem sob 2 toneladas durante por 5 min. O filme foi retirado das lâminas e cortado nas dimensões do molde metálico (Figura 2(a)). Preparação dos Compósitos Para a confecção dos compósitos reforçados por fibras unidirecionais, longas e alinhadas, os filmes de polipropileno foram cortados nas dimensões do molde a ser utilizado, pesados e colocados ao redor de uma placa de alumino. O fio de juta foi sendo enrolado ao redor deste conjunto até que toda a placa fosse recoberta. Em seguida, o sistema foi recoberto com outra camada de filme de PP e o conjunto consolidado, em molde metálico medindo 200 x 150 x 1mm, por compressão a quente a 170 ± 5 C sendo 10 minutos em pré-prensagem e 5 minutos sob 2,5 ton. Este procedimento está ilustrado na Figura 2. (a) (b) (c) (d) (e) Figura 2 Confecção dos compósitos: a) placa de alumínio envolta em filme; b) enrolamento do fio; c) placa recoberta pelos fios; d) conjunto envolto em outra camada de filme; e) compósito obtido após consolidação a quente por compressão. Diferenças nos índices de fluidez dos PP utilizados como matrizes fizeram com que a espessura do filme de PPH-103 (maior índice de fluidez) fosse menor do que a obtida para o filme de PPH-301. Sendo assim, e visando a obtenção de compósitos que apresentassem teores de fibra praticamente equivalentes, nos compósitos de matriz PPH-103 foram utilizados três filmes para recobrir a placa metálica e as fibras enquanto, para os de matriz PPH-301, foram utilizados dois filmes. Após a consolidação por compressão a quente, as lâminas foram pesadas a fim de se determinar o teor mássico de fibra em cada lâmina. Compósitos laminados, com teores de fibras distintos, foram obtidos através do empilhamento destas lâminas que foram consolidadas por compressão a quente, intercalando-as ou não com outra(s) camada(s) de filme, nas mesmas condições operacionais descritas anteriormente. Neste caso foi utilizado um molde metálico com dimensões equivalentes às mencionadas anteriormente (200 x 150 mm), exceto espaçamento interno que é maior, passando de 1 para 3 mm. Laminados contendo 1 a 3 lâminas obtidas conforme descrito acima foram obtidos nas composições descritas na Tabela I.
Tabela I Composição dos compósitos laminados Lâminas Composição 1 3 filmes lâmina PP/juta 3 filmes (PPH-103); 2 filmes lamina PP/juta 2 filmes (PPH-301) 2 lamina PP/juta 1 filme - lamina PP/juta 3 3 laminas PP/juta Obs. Todas as laminas foram colocadas na mesma posição, isto é, todas as fibras estão alinhadas em uma mesma direção Corpos-de-prova para testes em tração, nas dimensões preconizadas pela norma ASTM D 3039, foram recortados a partir dos laminados obtidos. Os ensaios mecânicos foram realizados em uma máquina universal de ensaio - LLOYD Instruments LR10K operando na temperatura ambiente e com uma velocidade de deslocamento de travessa de 10 mm/min. Os ensaios mecânicos foram realizados nas direções longitudinal e transversal ao eixo longo das fibras. Resultados e Discussão Na Tabela II estão apresentados os resultados obtidos para os testes tênseis conduzidos em compósitos manufaturados com os dois polipropilenos homopolímeros, com distintos valores de índice de fluidez, testados longitudinal e transversalmente à orientação do reforço fibroso. Tabela II Propriedades mecânicas dos compósitos PP/fios alinhados de juta testados nas direções longitudinal e ortogonal às fibras Direção do teste Longitudinal Transversal Matriz # Lâminas Fibra (%) E (GPa) σ (MPa) ε (%) E (GPa) σ (MPa) ε (%) PPH-103 (MFI=40/g 10 min) - 0 1,05±0,08 30,5±1,4 12,1±4,1 1,05±0,08 30,5±1,4 12,1±4,1 1 14,00 2,78±0,33 42,5±5,2 2,4±0,3 1,26±0,10 16,4±1,5 3,3±0,8 2 23,00 3,82±0,38 64,8±3,1 2,4±0,3 1,34±0,08 12,7±2,4 2,8±0,8 3 26,00 2,77±0,55 67,1±4,8 3,6±0,5 1,52±0,12 11,0±0,9 1,2±0,2 PPH-301 (MFI = 10 g/10 min) - 0 0,87±0,04 28,7±0,8 20,8±3,6 0,87±0,04 28,7±0,9 20,8±3,6 1 12,00 2,50±0,25 40,0±1,7 2,9±0,6 1,24±0,04 16,4±2,7 3,1±1,1 2 20,00 3,42±0,16 54,4±3,6 2,6±0,3 1,40±0,21 15,7±1,6 3,5±0,6 3 24,00 2,84±0,15 64,5±4,3 4,2±0,5 1,20±0,05 11,3±2,1 2,3±1,1
Como esperado, verifica-se que os valores de módulo elástico e a resistência à tração dos compósitos testados longitudinalmente às fibras são bem superiores aos dos testados na direção transversal. Isto porque, as propriedades de compósitos reforçados por fibras longas, alinhadas e unidirecionais, testados na direção do reforço, são dominadas pelas fibras enquanto as propriedades daqueles testados ortogonalmente ao reforço são dominadas pela matriz [12]. Os resultados indicam que, independente das características da matriz utilizada (PPH-103 e PPH-301), em compósitos testados longitudinalmente, módulos elásticos maiores foram exibidos por compósitos reforçados por duas lâminas (23% e 20% em volume de fibras, respectivamente). Este comportamento pode ser atribuído aos seguintes fatores, de forma isolada ou combinada: a) o teor ótimo de fibras situar-se nesta faixa (20 a 23%, em volume); b) haver recobrimento incompleto das fibras em compósitos com elevado teor de reforço ou mesmo c) haver melhor adesão entre as lâminas, já que, nesta configuração, um filme de PP foi colocado entre as lâminas de reforço antes da consolidação do compósito por compressão o que pode ter melhorado a adesão entre as mesmas. A resistência à tração dos compósitos testados longitudinalmente às fibras aumentou com o teor de reforço, o que era previsto, já que tanto a resistência das fibras é superior à da matriz quanto, nesta direção, as propriedades do compósito são controladas pelas fibras [12]. Portanto, quanto maior o teor de fibras alinhadas na direção do esforço, maior a resistência à tração. Nossos dados também indicam que, apesar dos valores nominais de resistência à tração dos compósitos confeccionados com a matriz PPH-103 serem mais elevados, a resistência à tração dos compósitos manufaturados com o PPH-301 (menores propriedades mecânicas e menor índice de fluidez) apresentou maior aumento relativo. Comportamentos similares foram reportados para outros sistemas e associados ao fato de que quanto maior a diferença entre as propriedades dos constituintes individuais, maior é o ganho relativo em nas propriedades do compósito [12]. Os resultados indicam que houve uma diminuição drástica no alongamento na ruptura dos compósitos com o aumento do teor de fibra, o que é consistente com o fato da fibra de juta ser bem menos extensível do que a matriz polimérica [12]. O motivo para o pequeno aumento observado para o alongamento na ruptura de compósitos longitudinais em teores mais elevados de fibras não é claro, mas pode estar relacionado a uma redução na interação entre as camadas. As propriedades dos compósitos testados ortogonalmente à orientação do reforço, como esperado, são dominadas pela matriz e inferiores às dos testados longitudinalmente às fibras. Mesmo não sendo a direção preferencial para atuação das fibras como reforço, verifica-se que há um crescimento no módulo elástico com o aumento do teor de fibra. Tal como observado para os compósitos testados longitudinalmente ao reforço, maiores valores nominais em módulo elástico foram obtidos para os compósitos de matriz PPH-103. Maiores aumentos relativos (em torno de
60%) foram obtidos para os compósitos manufaturados com a matriz de menor índice de fluidez (PPH-301), que é menos rígida e resistente tornando maior o ganho relativo em propriedades com a incorporação das fibras. Para compósitos testados ortogonalmente ao reforço, observou-se um decréscimo na resistência à tração com o aumento do teor de fibras. Isto porque, como a fibras estão alinhadas perpendicularmente ao esforço, estas agem como descontinuidades na matriz polimérica, reduzindo a resistência à tração do compósito. Um decréscimo mais acentuado nesta propriedade foi observado para os compósitos tendo o PPH-103 como matriz. O alongamento na ruptura tendeu a diminuir com o aumento no teor de fibras, o que é consistente já que estas restringem o movimento livre da matriz e, em testes transversais, podem atuar como inclusões ou defeitos. Conclusões Os dados obtidos demonstram que o processo desenvolvido para a obtenção de compósitos de matriz termoplástica reforçados por fibras contínuas e alinhadas é simples, de baixo custo e viável, podendo inclusive ser utilizado com filmes provenientes de plástico reciclado. A incorporação de fios de juta alinhados e contínuos, mesmo sem qualquer tratamento superficial, em ambas as matrizes empregadas, levou a aumentos relativos significativos nos módulos elásticos e nas resistências à tração dos compósitos. Compósitos com teores de fibras na faixa de 20 a 23% em volume apresentaram propriedades superiores. Os resultados demonstram que, apesar de propriedades nominais mais elevadas terem sido alcançadas quando a matriz de maior índice de fluidez (propriedades mais elevadas) foi utilizada, maiores aumentos relativos foram obtidos polipropileno com menor índice de fluidez (PPH-301). Agradecimentos Nossos agradecimentos à Braskem e à Companhia Têxtil Castanhal pela doação dos materiais utilizados nesta pesquisa; à Fapesq/MCT/CNpq (projeto # 008-04) e ao CNPq pelo apoio financeiro (Projetos 4773932003-9; 4784512006-7) e pela bolsa de pesquisa (PQ) em favor de Carvalho. Referências Bibliográficas 1. J.P. Park, S.T. Quag, B.S. Hwang, K.L. DeVries Composites Science and Technology, 2006, vol. 66, 28686. 2. A. Valadez-Gonzalez, J.M. Cervantes-Uc, P.J. Herrera-Franco, R. Olayo, P.J. Herrera-Franco, Composites: Part B, 1999, vol.30, 309. 3. P.J. Herrera-Franco, A. Valadez-Gonzalez, Composites: Part A, 2004, vol. 35, 339.
4. S.Th. Georgopoulos, P.A. Tarantili, E. Avgerinos, A.G. Andreopoulos, E.G. Koukios, Polymer Degradation and Stability, 2005, vol. 90, 303. 5. S. Mohanty, S.K. Nayak, S.K. Verma, S.S. Tripathy, Journal of Reinforce Plastics and Composites, 2004, vol. 23, 625. 6. O.A. Khondker, U.S. Ishiaku, A. Nakai, H. Hamada, Composites: Part A, 2006, vol. 37, 2274. 7. M.A. López-Machando, M. Arroyo, Polymer, 2000, vol. 41, 7761. 8. T.V. Dieu, L.T. Phai, P.M. Ngoc, N.H. Tung, L.P. Thao, L.H. Quang, JSME International Journal Serie A, 2004, vol. 47, nº 4, 547. 9. J.A.C. Albuquerque, O Plástico na Prática, Editora Sagra Luzatto, Porto Alegre, 1999. 10. J.M.F. Cavalcante, Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Campina Grande, 2001. 11. K. Jayaraman, Composites Science and Technology,2003, v.63, Iss. 3-4, pg 367-374. 12. E. Laranjeira, L.H. Carvalho, S.M.L. Silva, J.R.M. d Almeida Journal of Reinforced Plastics and Composites, 2006, vol. 25, 1269.