A DIGESTÃO ANAERÓBICA



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Transcrição:

A DIGESTÃO ANAERÓBICA Eng. Agr. Jorge A. Hilbert A realidade atual obriga a incluir nas agendas dois temas críticos para qualquer empresa: o fornecimento energético e o adequado tratamento e disposição dos resíduos orgânicos produzidos. Ainda, ao falarmos em contaminação, não só aludimos à água e o solo, mas também à atmosférica, porque a emissão de gases de efeito estufa, como o metano liberado das lagoas sem controle, contribui em grande medida para o aquecimento global do planeta. A fermentação anaeróbica é um processo natural que acontece espontaneamente na natureza e faz parte do ciclo biológico. Assim, podemos encontrar o denominado "gás dos pântanos" que brota em águas estagnadas, o gás natural metano das jazidas petrolíferas e o gás produzido no trato digestivo dos ruminantes e dos bovinos. Em todos esses processos participam as denominadas bactérias metanogênicas. O biogás é um produto da digestão anaeróbica produzido pela atividade de bactérias metanogênicas. As condições anaeróbicas acontecem somente na ausência de oxigênio. Para reproduzir essas condições são empregadas estações de biogás ou biodigestores como unidades bem fechadas, como lagoas cobertas ou silos de concreto com teto de lona ou membrana. O biogás gerado é uma mistura de metano e dióxido de carbono. O metano é o vector energético e sua composição varia entre 50 até 75 %. O metano proporciona poder calorífico que oscila entre 5500 e 6000 Kcal, e é possível utilizá-lo em todas as aplicações deste gás. A produção de biogás é um tema muito atual na Argentina e também no resto do mundo. Em grande parte das estratégicas energéticas, o biogás está na consideração dos políticos com poder de decisão, em função das implicâncias energéticas e no meio ambiente dessa tecnologia. Se comparado com outras fontes de energias renováveis, como a eólica ou fotovoltaica, o biogás pode gerar eletricidade durante 24 horas do dia. O biogás representa uma parte muito importante no mix de diversas tecnologias que geram energia limpa, no cuidado do meio ambiente e na diminuição do efeito estufa. Argentina possui um sólido setor agropecuário e agroindustrial, produção de grãos, carnes, derivados do leite, alimentos, etc. Essa atividade produz grande quantidade e diversidade de resíduos e subprodutos agropecuários, como resíduos de processos agroindustriais e estrumes. Embora os resíduos animais não sejam de boa qualidade em seu potencial unitário de geração, eles contêm bactérias provenientes dos tratos digestivos de animais responsáveis pelo processo. A geração de biogás, mistura formada principalmente por metano (CH4) dióxido de carbono (CO2 e pequenas quantidades de hidrogênio (H), sulfuro de hidrogênio (SH2) e nitrogênio (N), constitui um processo chave dentro do ciclo da matéria orgânica na natureza. As bactérias metanogênicas realmente representam o último elo da cadeia de micro-organismos encarregados de digerir a matéria orgânica e de devolver ao ambiente os elementos básicos para reiniciar o ciclo. Estima-se que, anualmente, a atividade microbiológica libera na atmosfera entre 590 e 880 milhões de toneladas de metano.

Após as guerras mundiais, foram promovidas na Europa as denominadas fábricas produtoras de biogás, cujo produto era empregado em tratores e automóveis da época. No mundo todo, são difundidos os denominados tanques Imhoff para tratamento de águas pluviais coletivas. O gás produzido foi utilizado no funcionamento das próprias estações, em veículos do município e em algumas cidades foi injetado na rede de gás comunal. Durante os anos da segunda guerra mundial, começou a difusão dos biodigestores a nível rural, tanto na Europa quanto na China e na Índia, que se transformaram em líderes neste segmento. Essa divulgação foi interrompida pelo fácil acesso aos combustíveis fósseis e, só durante a crise energética da década de 70, é que foi reiniciada, e com grande fôlego, a pesquisa e extensão no mundo, incluindo a maioria dos países latino-americanos. Os últimos 20 anos foram frutíferos no relativo a descobertas sobre o funcionamento do processo microbiológico e bioquímico, graças ao novo material de laboratório que permitiu o estudo de micro-organismos participantes em condições anaeróbicas (ausência de oxigênio). Um dos países líderes em tecnologia de biogás orientada especificamente à geração de energia é Alemanha, com mais de 6000 estações operacionais que superam os 2300 MW. Nesse país é utilizado, como fonte de matéria-prima, uma mistura de resíduos animais com ensilagem de plantas de alto rendimento, como milho e sorgo, que oferecem alto potencial de produção de gás. Tanto o desenvolvimento da Índia como o da China tem como base, principalmente, os digestores de pequeno porte a nível rural. A Índia conta com mais de 4 milhões de digestores instalados no setor agrícola, com volumes que alcançam entre 2 e 5 metros cúbicos. Acrescenta-se ainda mais de 3.500 estações agroindustriais e um crescimento de 25 estações que geraram 30 Mwatts. China, por sua vez, possui mais de 9 milhões de digestores nas pequenas comunidades rurais. A isso acrescentam-se estações de médio e grande porte em estabelecimentos intensivos e agroindústrias. Este país conta com um dos centros de pesquisa e desenvolvimento mais importante a nível mundial, situado em Chengdú, na província de Sichuan. Após alguns anos, a tecnologia da digestão anaeróbica foi se especializando atualmente diferentes campos de aplicação com objetivos bem diversos (ver quadro I). Como é possível observar no quadro, conforme os campos de aplicação da tecnologia de fermentação anaeróbica, os objetivos buscados são diferentes ou têm uma diversa ordem de prioridades. Analisaremos brevemente a evolução e o estado atual de cada campo descrito.

OBJETIVOS BUSCADOS Estabilizar efluentes Produção de energia Higiene e proteção ambiental Produção de energia Fertilizantes orgânicos Produção de energia Produção de energia Alimentação animal. Higiene Quadro I Os reatores anaeróbicos agroindustriais possuem enormes dimensões (mais de 1.000 m de capacidade), trabalham em temperaturas misofílicas (20º C a 40º C), ou termofílicas (mais de 40º C) contam com sofisticados sistemas de controle e, geralmente, estão conectados a equipamentos de cogeração que oferecem, como produtos finais, calor, eletricidade e um efluente sólido de alto conteúdo proteico para ser utilizado como adubo ou alimento de animais. A utilização do biogás na área rural foi muito importante. Dentro dela, é possível diferenciar dois segmentos claramente diferentes. No primeiro, o objetivo buscado é proporcionar energia, sanidade e fertilizantes orgânicos a agricultores de áreas marginais ou a produtores médios de países com setores rurais de baixíssima renda e difícil acesso a fontes convencionais de energia. Nesse caso, a tecnologia desenvolvida buscou a obtenção de digestores de mínimo custo e fácil manutenção, mas com eficiências pobres e baixos níveis de produção de energia. O segundo tipo de tecnologia está voltado ao setor agrícola e agroindustrial de renda média e alta. O objetivo, neste caso, é fornecer energia e solucionar graves problemas de contaminação. Os digestores de alta eficiência desenvolvidos para esta aplicação têm maior custo inicial e possuem sistemas que tornam mais complexo seu gerenciamento e manutenção. Ambos os tipos de digestores encontram-se atualmente em contínua divulgação. Os reatores simples tiveram amplo recebimento na China e na Índia, já que nesses países são implementados importantes planos governamentais que impulsionaram e apoiaram, com assistência técnica e financeira, sua utilização. Nos outros países do mundo, a divulgação alcançada por este tipo de digestores não foi significativa. Respeito dos digestores de alta eficiência, a maioria está instalada na Europa.

As matérias-primas fermentáveis incluem, dentro de um amplo leque, os excrementos animais e humanos, águas residuais orgânicas das indústrias (produção de álcool, processamento de frutas, verduras, derivados do leite, carnes, alimentos em geral), restos de colheitas e diferentes tipos de lixo, como os efluentes de determinadas indústrias químicas. Basicamente, o sistema integral inclui instalações apropriadas para coleta e limpeza de resíduos, uma câmara de recepção, uma de digestão comumente denominada reator, e um depósito de efluentes tratados que devem ser empregados adequadamente. Por outro lado, estão as linhas de gás e os depósitos e sistemas de uso. Cada uma das partes mencionadas é chave, e um projeto pode falhar se alguma não estiver corretamente em funcionamento A produção de gás de um digestor anaeróbico é contínua durante as 24 horas do dia. Não acontece o mesmo com o consumo que, geralmente, concentra-se em uma curta fração de tempo. Por esse motivo, será necessário armazenar o gás produzido durante as horas em que não for consumido. A dispersão do consumo e sua intensidade determinarão o volume de armazenamento necessário. Portanto, quanto mais concentrado for o consumo em um curto período de tempo, maior será a necessidade de armazenamento. Geralmente, o volume de armazenamento não é inferior a 50% da produção diária. No caso de estações a instalar no setor agropecuário, a análise preliminar de qualquer tecnologia deve considerar, como ponto inicial, o aspecto humano. Nesse tema, considera-se então a capacidade da mão-de-obra, o tempo disponível que é possível dedicar à nova atividade e sua predisposição para realizá-la. Esses fatores se tornam limitantes em muitos lugares e estabelecimentos por causa da sobrecarga de tarefas e responsabilidades a cargo do pessoal e a predisposição à manipulação do estrume ou resíduo, condicionada ao tipo de manipulação que era realizada anteriormente à introdução dessa nova técnica. Consequentemente, deve-se buscar análise, um tipo de digestão que não altere de forma significativa as tarefas e a manipulação até então realizada, tentando economizar a quantidade de horas/homem na operação. Do ponto de vista da matéria-prima, será necessário contar com um sistema de fácil coleta e manipulação, que evite lavar com água as instalações em zonas frias, porque pode produzir grandes volumes com altas diluições e baixas temperaturas. O meio ambiente, com suas características climáticas e de solo, condiciona o tipo de digestor a construir e incide também na seleção do modelo e no montante do investimento inicial necessário, por existirem parâmetros que podem ser modificados, como a temperatura de funcionamento, o tempo de retenção hidráulica e a velocidade de carga volumétrica. Esses fatores estão relacionados entre si e determinam a eficiência final do digestor e a energia líquida disponível. Em virtude de sua importância na determinação de custos e na definição da técnica a empregar, analisaremos com maior profundidade este aspecto. Para áreas temperadas e frias existem duas opções principais a serem consideradas a fim de dimensionar e projetar o reator. Essas opções estão estabelecidas, principalmente, pela temperatura de trabalho do equipamento, pudendo optar entre temperaturas

ambiente 10º C a 25ºC, mesofílica 30º C a 40º C, e termofílica 40º C a 55º C. A faixa de temperatura em que finalmente trabalhe o sistema determinará o tempo de permanência da matéria no digestor ou o tempo de retenção, e a eficiência de produção de biogás. No quadro observa-se como são modificados cada um dos parâmetros mencionados. Relação entre a temperatura de funcionamento e tempo de retenção e eficiência A alteração dos tempos de retenção influi de forma direta no tamanho do digestor necessário para um mesmo volume de material a digerir, com a consequente alteração do investimento inicial necessário. O processo não gera calor suficiente para elevar e conservar a temperatura, portanto, serão necessários sistemas de aquecimento, isolamento e controle em caso de selecionar trabalhar na faixa meso ou termofílica. Esses sistemas e controles também incidem nos custos iniciais e de manutenção dos digestores. Para ajudar na análise de onde terá maior possibilidade de sucesso esta tecnologia, brindaremos as seguintes diretrizes: Insumos ou matéria-prima com baixo custo de oportunidade: Para locais que apresentem as seguintes características: Zonas de produção intensiva, com concentração do substrato ou da matériaprima a empregar devido à viabilidade de sua manipulação e transporte. Não existem restrições de tipo social para manipulação de detritos e aproveitamento de estrume. Existe uma tradição, costume ou metodologia de coleta de resíduos. Existe água em forma, quantidade e qualidade suficientes para alimentar os digestores. Existe capital suficiente, com um baixo custo de oportunidade, por ter abrangido os principais investimentos alternativos de alta rentabilidade ou existem créditos preferenciais. Existe disponibilidade de mão-de-obra com capacidade e vontade para operar os digestores. A eficiência do sistema seja adequada : Existe alta probabilidade de obter rendimentos adequados onde: Há certeza de fornecimento constante em tipo e qualidade de substrato fermentável. Variações no material a digerir dificultam o funcionamento dos reatores. Existe assistência técnica para as etapas de projeto, início de operações e manutenção do digestor. A temperatura ambiente não é diminuída. Zonas de menor temperatura obrigam a utilizar sistemas de aquecimento e isolamento de maior custo, e deixam disponível uma menor quantidade de energia.

Obtém-se um adequado desenho do digestor, que permite melhor manipulação, economia de tempo de operação e aumento da confiabilidade. Contar com um adequado serviço de manutenção. Os produtos gerados contam com um significativo valor: Essa condição acontecerá em lugares onde: Existe uma limitação para o livre acesso aos combustíveis tradicionais. Há escassez no meio convencional de obtenção de energia, por exemplo: lenha. Não há disponibilidade de dinheiro para atender à demanda de energia e fertilizantes. Os tipos de tratamento de detritos devem ser realizados com altos custos. O custo de manipulação de matérias-primas e do efluente é baixo e competitivo. As características do solo são tais que obtêm-se altas respostas no rendimento dos cultivos com aplicações de adubos. Cada um deve efetuar uma análise cuidadosa e somar a quantidade de características enumeradas. Quanto maior for a quantidade desses fatores que aconteçam positivamente, maiores serão as possibilidades de implementar este tipo de tecnologia com sucesso e de forma lucrativa. A política governamental será o fator chave na distribuição e alcance desta tecnologia nas zonas previamente selecionadas. A contribuição de capital será um dos fatores de maior incidência em uma primeira etapa, junto com a disponibilidade de assistência técnica que está sendo empregada no INTA e no INTI. Campo agroindustrial: A aplicação desta tecnologia no campo agroindustrial na Argentina está experimentando um crescimento lento mas contínuo. Nos últimos anos, estão sendo realizados fortes investimentos neste campo liderados pela indústria agroindustrial Tucumana (estações citrícolas, fermentos e indústria do açúcar (bioetanol). Assim, encontramos estações de enormes dimensões em funcionamento que, em grande medida, também incorporaram os benefícios dos mecanismos de desenvolvimento limpo com os denominados bônus de carbono gerados através de um processo de certificação de redução de emissões de gases efeito estufa por parte dessas indústrias. Outro polo importante é encontrado ainda na província de Santa Fe, com aplicações em indústrias como a dos derivados do leite, cerveja e frigorífica. As tecnologias empregadas são diversas bem como os provedores, onde misturam-se empresas nacionais com internacionais. A essas indústrias devemos acrescentar as de processamento de milho e cervejas na província de Buenos Aires embora, em alguns casos, só é queimado gás tochas. Outras aplicações: Existem também em nosso país exemplos de coleta deste tipo de gás em aterros sanitários, onde são geradas importantes quantidades de gás que, de outra forma, seriam liberadas na atmosfera. Os aterros sanitários adequadamente equipados e manipulados são capazes de gerar enormes quantidades de biogás.

A essa fonte devemos acrescentar o tratamento e aproveitamento de resíduos cloacais mediante estações de tratamento mistas adequadas. Nelas, é possível aproveitar os volumes de gás com múltiplos usos. Existem em nosso país modernas plantas de tratamento e aproveitamento de gás neste campo. Um caso paradigmático, por suas dimensões, é a planta de tratamento de águas servidas da cidade de Santiago de Chile da empresa Aguas Andinas, o complexo la farfana verdadeiramente impactante e de recente construção, trata 50 % das águas da cidade com um fluxo variável entre 8 e 15 metros cúbicos por segundo. A estação integral ocupa 60 hectares e possui, para digestão de lodos, quatro digestores de mistura completa, funcionando a uma temperatura de 36 graus centígrados que geram 100.000 metros cúbicos de biogás diariamente. Atualmente, apresentam-se grandes oportunidades de expansão desta tecnologia, que não deixa de incorporar inovações e melhorias que possibilitam o aumento de sua confiabilidade e rendimento. Entre essas oportunidades, o programa GENREN, com tarifas diferenciais para geração de energia de fontes não convencionais, pode servir como estímulo para o investimento neste tipo de tecnologias no país. Dentro das diversas ações promovidas a nível internacional, encontra-se a Iniciativa Global do Metano GMI (http://www.globalmethane.org/), que tem como objetivo impulsionar a ação cooperativa multilateral e multinacional tendente a mitigar as emissões de metano na atmosfera, geradas pela intervenção do homem. Atualmente, já são 33 países membros e mais de 1.000 entidades públicas e privadas incorporadas, com a Argentina como coordenadora da Comissão de Agricultura. Nos últimos anos, realizaram-se estudos nacionais que permitem quantificar o potencial regional de aproveitamento. Esses estudos são a base para a localização de futuros centros de aproveitamento. O INTA está produzindo um conjunto de informação, como manuais, sistemas de cálculo e estudos regionais, disponibilizados em sua página web de bioenergia em uma seção específica para este tipo de energia http://www.inta.gov.ar/info/bioenergia/bio.htm Existem outras instituições, como o INTI, universidades de diferentes partes do país que possuem experiência e capacidade de assessoramento neste tema, e que ingressam ao setor privado que está em crescimento e consolidação.